Tomás Vieira Mário
O dicionário Universal da Língua Portuguesa, da Moçambique Editora, define fé como “crença religiosa; crença, convicção em alguém ou alguma coisa; convicção…
Com efeito, na maioria das vezes, a ideia de fé convoca-nos para a crença religiosa. Não sendo estudioso de teologia, o meu sonho de infância, de um dia me tornar bispo (sim, bispo!) motivou-me, nalgum período da minha vida, a obter alguns conhecimentos básicos sobre a religião. Pelo menos para algumas divagações em torno de determinadas significações que dão corpo a fé, enquanto crença religiosa.
Aprendi, por exemplo, que a base de todas as religiões é a crença na existência de uma outra vida, para além desta, que vivemos na terra. E, a partir da crença nessa vida no “além”, emerge a ideia de um ser superior, que ai impera; é o Deus. Assim, fé é uma virtude daqueles que aceitam como verdade absoluta os princípios difundidos por sua religião. Ter fé em Deus – um só! - e acreditar na sua existência e na sua onisciência.
Para as religiões judaico-cristãs e islâmica, tratar-se-á do Deus que se anunciou ao Abrão, o patriarca, aquele a quem tanto o Judaísmo como o Cristianismo e o Islão referem como seu Pai. Assim, o fiel deve crer, em pelo menos, duas proposições: existe a vida eterna e Deus.
Fora do mundo religioso, “fé" surge também em algumas expressões populares e no mundo jurídico. Por exemplo, “fazer fé” significa acreditar em alguém ou em algum acto; ter esperança; “fazer fé em juízo” significa um dado ou prova aceites como verdadeiros ou legítimos em sede de foro judicial.
Ao longo de milénios, as diferentes religiões foram cimentando ideias, princípios em proposições em cuja crença deve sustentar-se a vida dos fiéis. As épicas batalhas dos Hebreus em busca da Terra Prometida, sob a liderança de Moises, só podem ser imaginadas, consentidas e sustentadas pela fé em Deus, que lhes prometera tal terra, desde os tempos do patriarca fundador, Abrão.
Com base na fé, homens e mulheres de extraordinária qualidade emergiram ao longo da Historia da Humanidade, quer como líderes espirituais ou destemidos guerreiros, lideres de movimentos de massas, reis ou ambos. Moisés, Salomão, Jesus Cristo, o Profeta Maomé…Martin Luther King, Madre Teresa de Calcutá… Como é que estas extraordinárias criaturas humanas lograram arrastar atrás de si, e muito para além do seu tempo, multidões e nações, pelo mundo fora? Não foi incutindo fé nas pessoas? Convencê-las e persuadi-las a seguir uma certa missão ou objectivo?
Ora vejamos: com o seu bastão, não dividira Moises o mar vermelho em dois pedaços, permitindo passagem ao seu povo, ante a estupefação do Rei dos Egípcios? E Jesus Cristo: não vencera ele a morte, ressuscitando ao terceiro dia da sua morte? E o Profeta Maomé? Não recebera ele a mensagem de Deus, nos montes Sinai, através do Anjo São Gabriel? E a Maria, mãe de Jesus: não concebera ela sem pecado?
O verdadeiro crente deve tomar conhecimento destes “factos”, proposições ou princípios, e acreditar profundamente neles, sem os questionar; sem pretender prova da sua ocorrência; sem os debater. E deve estar disponível para os divulgar e defender, incluindo com o próprio sangue, se necessário for. Assim estas crenças são designadas por dogmas. O dicionário acima citado descreve dogma como “ponto fundamental e indiscutível de uma crença religiosa; proposição apresentada e aceite como incontestável e indiscutível”.
Porém, todas estas complexíssimas construções metafisicas, enunciadas em lendas, parábolas e crónicas literalizadas, aliás escritas com muita beleza, não são senão criação da mente humana, ao longo de seculos revisitada, reformulada e aprimorada, quantas vezes com derramamento de muito sangue! Não tivemos aí a Santa Inquisição? Não tivemos aí as Cruzadas? Não temos aí diferentes cruzadas violentíssimas, associadas ao Islamismo: a Jihad, o Al Qaeda, o Estado Islâmico…? Não temos aí as tempestuosas igrejas evangélicas, hoje em dia com tendência para controlar o poder político de muitas nações? Tudo na base ou a pretexto da fé!
Na vida real, de acordo com o nosso próprio contexto, temos, todos, desenvolvido nossa fé em determinados “factos”, “ideias” ou proposições, cristalizadas em pessoas que, de uma forma ou outra, tenham marcado as nossas vidas. Podemos criar tais crenças com as nossas mentes fertilizadas por circunstâncias ou experiências diversas, de natureza particularmente extraordinária. Podem ser nossos pais. Ou um professor (geralmente do ensino primário). Um carismático líder religioso. Ou um líder político.
Em consequência de um volume de certezas que fomos criando, dentro de nós, sobre as virtudes que apreendemos (ou que nos foram vigorosa e intensamente apregoadas ao longo de um tempo significativo) das ideias e da conduta desta pessoa, criamos fé nela. Portanto dogmas em torno dele ou dela. E com estes dogmas nos protegemos de dúvidas, de perguntas, de incertezas. As nossas crenças são a única verdade!
Assim, não tenho qualquer dúvida – nem me vou surpreender - se um dia, for provado, em juízo, que um alto dirigente do nosso Estado, em funções ou não, participou e beneficiou pessoalmente, das odiosas dívidas ilegais. Muitos moçambicanos, gente de boa-fé, não vão acreditar! Vão, até ao fim dos seus dias, dizer que tal decisão judicial terá sido fabricada, na base de calúnias e conluios de gente sem autoestima, mancomunada com mão externa!
Temo que eu próprio venha a ser um deles.
Pois só assim poderei encontrar algum alívio à insuportável dor de ter sido traído, tão vilmente, na minha fé!
A exoneração da vice-Ministra de Economia e Finanças, Isaltina Lucas, era previsível. E necessária. Envolvida no escândalo do calote bilionário, sua legitimidade estava arrasada, sobretudo depois que a PGR incluiu seu nome na lista de figuras que devem ser responsabilizadas financeiramente pelo seu papel na contratação da dívida ilegal. Isaltina está a ser investigada em foro administrativo e, se for condenada, deverá pagar uma multa ao Estado, correspondente a uma soma de salários a determinar.
Para já, seu papel na contratação da dívida parece resumir-se aos pareces que subscreveu, com base nos quais o ex-Ministro das Finanças, Manuel Chang, accionou as garantias do Estado para o endividamento ilegal. Depois sentou-se no “board” da Ematum, numa situação ética de conflito de interesses. Por essa presença nos órgãos sociais da sinistra atuneira, ela recebeu remuneração que, se se tivesse dado a um julgamento ético razoável, teria declinado. Mas tomou a opção que tomou e hoje seu nome está sob o crivo da opinião pública. E da justiça em foro administrativo. Em abono da verdade, era enorme o coro dos que exigiam a sua cabeça.
Tanto quanto “Carta” tem conhecimento, Isaltina Lucas não é arguida na lista das mais de 18 figuras arroladas pelo Ministério Público no processo 1/PGR/2015. Ou seja, não consta que ela tenha recebido subornos da Privinvest. No entanto, isso não impediu que o Presidente Filipe Nyusi a exonerasse, numa atitude de extrema coerência, abrindo caminho para que o julgamento do Tribunal Administrativo seja isento. Nyusi dá assim um sinal positivo, protegendo a independência do judiciário, ao retirar sua confiança a figuras por si nomeadas, designadamente quando estas figuras estão sob a alçada da justiça. É uma atitude louvável, de indismentível coerência. Mas...
Mas e Helena Taipo?
Pior que Isaltina Lucas, que não é arguida em qualquer processo crime até prova em contrário, a Embaixadora de Moçambique em Angola é arguida num processo de corrupção, que vai ser julgado brevemente. O Ministério Público já reuniu provas suficientes que sustentam a acusação contra Taipo e, sendo assim, o Presidente também deve exonerá-la e já. Espera-se que Filipe Nyusi não desminta, por omissão neste caso, a coerência que mostrou ao exonerar Isaltina Lucas. O estatuto de arguida em processo-crime é muito mais grave que o de arguida em processo de responsabilização financeira dirimido em foro administrativo.
Neste sentido, o Presidente não tem escolha. Ou exonera imediatamente a Embaixadora Taipo ou deixa ficar no ar uma imagem de tamanha incoerência, num momento em que ele precisa de mostrar uma vigorosa vontade política contra a corrupção em Moçambique, essencial para si e para a Frelimo em ano eleitoral.
FELIZMENTE, já tomaram posse os Presidentes dos Conselhos Autárquicos eleitos. Falo daqueles candidatos que foram verdadeiramente eleitos pelo povo, com voto verdadeiro no boletim de voto, numa urna verdadeira e com edital também verdadeiro. Falo de voto limpo. Urna limpa. Edital limpo. Falo desses Presidentes legítimos que tomaram posse para cumprirem os seus manifestos eleitorais que foram legitimamente eleitos pelos munícipes.
Mas também, INFELIZMENTE, tomaram posse os pseudo-presidentes. Falo dos presidentes falsos, dos presidentes artificiais, dos presidentes piratas. Falo daqueles presidentes dos Conselhos Autárquicos que, na realidade, são candidatos derrotados. Aqueles que viraram presidentes graças aos atletas contratados que conseguiram correr e fugir com urnas e editais. Aqueles presidentes que tiveram "mais" votos na urna do que eleitores inscritos nos cadernos eleitorais. Falo daqueles candidatos que viraram presidentes graças às armas e cassetetes da FIR. Falo igualmente daqueles presidentes que são fruto dos cortes de energia e da escuridão. Aqueles que começaram a vencer o escrutínio na calada da noite.
Também falo daqueles presidentes que, em última instância, foram apadrinhados pela Cê-Ene-É e pelo Cê-Cê. Aqueles que tiveram dois resultados de apuramento diferentes. Aqueles cuja vitória foi parida por via de votos no gabinete. Aqueles que perderam na mesa, mas ganharam no acórdão. Aqueles que mandaram plantar blindados nos quintais dos seus oponentes. Não vou esquecer aqueles presidentes que não tiveram adversários. Aqueles cujos adversários foram antecipadamente derrotados pelos órgãos de gestão eleitoral e pelo poder judiciário, como aqueles meninos mimados que não sabem jogar, mas que devem jogar e ganhar a partida porque são os donos da bola.
Tomaram posse presidentes de todos os tamanhos e feitios. O azar é que, quando estão juntos, é difícil distinguir uns dos outros. É difícil saber quem é quem. A sorte é que o povo sabe a quem votou e eles sabem que o povo sabe. Assim que entraram nos gabinetes já estão a tremer sozinhos. Não têm planos, porque nunca tiveram projectos. O que resta agora é fingir que estão a trabalhar, enquanto montam filósofos e sentinelas de plantão na imprensa e nas redes sociais para digitarem o "enter" e activarem o modo insulto, hossana e aleluia durante os cinco anos de mandato que se seguem. O que se segue é confundirem a opinião pública, as vezes, atribuindo obras do governo central a esses pseudo-edis. O que se segue é a exaltação de tudo no meio do nada.
O povo sabe das coisas. Assim como o "ministro das dívidas ocultas", esses também são "presidentes das urnas ocultas". São gatunos também. Um dia desses vão tomar sumo de maracujá ali na vizinhança, felizmente, mas também infelizmente.
- Co'licença!
O cidadão está ansioso por escutar o noticiário. Assuntos graves, de urgência nacional pairam no ar. Ele liga a rádio e a notícia de abertura é a seguinte: no distrito de Namacurra a produção de milho deve ultrapassar a meta anual em 25 por cento. O cidadão suspira fundo e sintoniza uma estação televisiva: a notícia de abertura dá conta que um ministro realizou essa coisa completamente extraordinária que foi apelar para que se aumente a produtividade. O cidadão procura uma outra estação. E fica a saber que num bairro periférico de Lichinga um jovem matou a sogra à paulada.
O cidadão percebe que, para saber da realidade nacional, ele tem que procurar uma fonte noticiosa estrangeira. E foi o que ele fez naquele dia. E o que fez nos restantes dias. Para saber do seu país, ele passou a escutar noticiários de fora. Um dia, o vizinho, acusa-o de falta de orgulho nacional. E defende que a planificação agrícola no distrito de Namacurra é um assunto absolutamente global. E que é ainda mais vital saber o que diz um nosso ministro sobretudo quando ele não diz nada. E conclui o vizinho: você, meu caro, é um pobre manipulado. O cidadão não reage bem, exige explicações. Está a ver, isso de exigir explicações já é coisa da mão externa, declara o vizinho. O que acontece quando a pessoa começa a saber. Vai querer saber mais, vai quer debater, vai querer pensar pela sua cabeça. E a pessoa pensar pela sua cabeça, isso só pode ser uma ideia vindas de fora.
Veja o caso do Manuel Chang. Se continuássemos a não falar dele tudo estaria melhor. Não teríamos nada para falar. Você ficaria satisfeito com os noticiários nacionais que falam do cumprimento das metas do milho em Namarrói. Em Namacurra, corrige o cidadão. Um autêntico patriota, como eu, tem confiança, não anda para aí a querer saber de tudo e mais alguma coisa. Isso de querer saber, meu caro, não faz parte da autêntica cultura africana, isso é coisa que vem de fora, queixa-se o vizinho. Mas não acha, argumenta timidamente o cidadão, não acha que é bom que se discuta, dentro de Moçambique e entre moçambicanos, os assuntos que nos dizem respeito? E não acha, pergunta o cidadão já mais empolgado, que os que reclamam que não paguemos as dívidas ilegais sejam mais patriotas que os que aceitam tudo e mais alguma coisa? E não há mão externa nas dívidas ocultas dos que, como eu, querem saber de como iremos pagar?
O vizinho, suspira exausto e, já em desespero, pergunta: quem lhe está a pagar, meu caro caro cidadão? Quem lhe paga para questionar os que receberam empréstimos de fora e que, coerentes com o seu amor pátrio, colocam esse dinheiro sujo no exterior? Não lhe passou na cabeça que esses que lavam o dinheiro no exterior o fazem por verdadeiro nacionalismo, apenas para não sujar o chão da nossa bela pátria amada?
O cidadão retirou-se e afastou-se pela rua movimentada. Sentiu que lhe mexiam no bolso do casaco. Não reagiu com medo que fosse a mão externa.
É preciso ficar claro para os irmãos Simango, o Daviz e o Lutero, que foram eles que mataram o partido Eme-Dê-Eme. Quando começaram as desavenças entre o falecido Mahamudo Amurane e o Eme-Dê-Eme, escrevi algures que era eminente a cisão naquele partido. Disse isso porque em nenhum momento houve um pronunciamento institucional do partido sobre o caso. Ou seja, o caso foi gerido pelos irmãos Simango como pessoal. Se se lembram, só se mandavam farpas na imprensa. Se chamavam cobras e lagartos na imprensa até o desaparecimento físico do edil.
Depois do assassinato de Amurane, o que se seguiu foi o descalabro que todos vimos. Iniciou-se um processo de parcerias com a Frelimo que culminaram com um festival de perseguições sem cabimento. Ao invés de fazer uma introspecção, o Eme-Dê-Eme preferiu disparar para tudo quanto é canto, acabando, por vezes, em dar tiros no próprio pé. Depois disso, vimos o que vimos: membros influentes saindo a voar do Eme-Dê-Eme, com sensação de liberdade, como se estivessem numa gaiola, anemia nas fileiras e derrotas eleitorais de retumbâncias inimagináveis.
Dizia eu, nessa altura, que o comportamento dos irmãos Simango fazia-nos acreditar na versão da história sobre o seu pai contada pela Frelimo. E parece que foi isso que Afonso Dhlakama descobriu no Daviz a ponto de lhe afastar como candidato da Renamo a edil da Beira. Provavelmente, Dhlakama descobriu essa forma pessoalista e casmurra de ser de Daviz. Pessoas como os Simangos não têm lugar na Frelimo, nem hoje nem ontem.
Daviz pode ser um bom gestor público, mas temos de assumir que o homem tem problemas sérios de aceitar ideias diferentes. Definitivamente, Daviz não gosta de ser contrariado. Digere a crítica com bastante dificuldade. Ele leva tudo para o lado pessoal. E isso não é bom para um líder. Liderança é capacidade de engolir sapos; é aceitar a liberdade da diferença; é saber gerir expectativas.
Esse complô contra o Manuel de Araújo era desnecessário. Não precisava descer tanto. Há coisas que só põem os outros mais fortes. A vingança mata o carácter. Eme-Dê-Eme já foi uma alternativa, mas hoje nem parece que algum dia existiu.
- Co'licença!
Ao Carlos Beirão, o eterno “Rei Momo” dos beireinses
Amiga, escrevo-te esta carta sem lágrimas nos olhos. Secaram. Acabaram. Comecei a chorar quando o pai do João ainda estava vivo. Doente. O meu rosto não parava de ser uma albufeira. Hoje é o coração que escorre e molha-me a alma toda. Já não sinto nada, senão a dor de viver sem o meu marido. Sem o meu filho, João. Que também morreu como o pai, sentado na borda da cama. Eram eles que davam luz à minha vida. Levantava-me da cama cedo por eles. A comida que eu cozinhava todos os dias era para eles. Quando fossem ao trabalho e à escola, eu ficava em casa alagada de demora. Queria que eles voltassem depressa para me abraçarem.
É isso, amiga, agora tudo isto é um vazio. Já não está aqui o meu marido para me dizer que as minhas mãos são leves como pluma. Ele lisonjeava-me. Tudo o que eu fazia merecia da parte dele elogios que me davam felicidade. Se eu cometesse um erro, reconfortava-me com palavras lindas. Dizia assim: amor, as próprias estrelas por vezes são ofuscadas pelas nuvens, mas não deixam de ser estrelas, tu és a minha estrela. Falava enquanto afagava-me. Passava a mão dele por sobre o meu cabelo curto e puxava levemente a minha cabeça para o seu peito.
Nhenhezi, amiga, o coração dele quando batia, tinha um compasso que parecia de mapiko. E quem dançava era a minha cabeça. Mas tudo isso passou como o orvalho que seca depois de molhar alegremente o capim. É isso! O João copiava o pai. Ele também fazia-me feliz, de outra forma. Chegava perto de mim, abraçava-me e dizia assim: mãe, tá tudo bem? Eu sorria. Transformava-me em criança perante o meu o meu filhote.
E hoje quando oiço a música do Carlos Beirão: Wassaíka João (João morreu), é como se o meu filho estivesse aqui ao meu lado. Este bairro de Muchatazina que tu conheceste já não é o mesmo, amiga. Mudou. Aliás toda a cidade da Beira está a mudar. Até o meu rosto mudou, já não é banhado pelas lágrimas. Mas lá dentro o coração continua a chorar. Batendo como batia o coração do meu marido, tipo batuque de mapiko. Houve um tempo que passei a ter a casa um pouco negligenciada, porém achei que isso não faria bem à alma dos meus dois amores. Voltei a dedicar-me à ela. Continua a brilhar como eles gostavam de a ver. Assim como sempre a conheceste. As fotos deles mantêm-se nos mesmos lugares. Representando aqueles que serão para sempre os meus ídolos. Isso reconforta-me.
Nhenhezi, minha amiga, como vai esse Portugal? Tens te dado bem com esses tugas? As cenas de racismo que volta e meia têm-se relatado por aí ainda não te afectaram directamente? E tu como és reguila, imagino! Mas eu também não “bato cem”. Existe porventura um ndau que não seja reguila? Kkkkkkkkkkk! Pronto, minha irmã, esta carta já vai longa. Chega, antes que eu meta os pés pelas mãos, se bem que ainda não meti. Beijo, beijo.
Da tua amiga Dzuwa, com muita saudade.