Membros da Casa Militar, a guarda oficial do Presidente da República, confiscaram, na tarde de hoje, o telemóvel da jornalista moçambicana Sheila Wilson, do Centro para Democracia e Direitos Humanos (CDD), uma organização da sociedade civil.
O facto ocorreu quando a jornalista fazia uma transmissão em directo na página oficial do Director do CDD, Adriano Nuvunga, em torno do bloqueio, sem qualquer aviso, da Avenida Julius Nyerere (no troço entre a Praça do Destacamento Feminino e o Hotel Polana), uma das principais avenidas da capital do país.
Conforme documenta o vídeo gravado em directo, ao se aperceber da presença da repórter na Praça do Destacamento Feminino (nas proximidades da Presidência da República), os militares deslocaram-se ao seu encontro e, sem sequer saudá-la, arrancaram o telemóvel das suas mãos. O militar protagonista da façanha, cuja cara foi captada pela câmara frontal, deixou o telemóvel a gravar por longos três minutos, antes de interromper a transmissão.
Refira-se que este é o segundo caso público de violência contra jornalistas, protagonizada por elementos da Guarda de Filipe Jacinto Nyusi. O primeiro teve lugar em Setembro de 2023, no Estádio Nacional do Zimpeto, quando um dos guardas do Presidente da República agrediu o jornalista desportivo Alfredo Júnior, do jornal online LanceMz, por alegadamente ter captado a reacção do Chefe de Estado (à qualificação de Moçambique ao CAN 2023), através do telemóvel.
Da agressão protagonizada pela Guarda do Presidente da República, conhecida pelo seu comportamento intimidatório contra jornalistas, sublinhe-se, Alfredo Júnior perdeu o seu equipamento de trabalho (o telemóvel, estabilizador da câmara e auscultadores), para além de danos morais.
Igualmente, este é o segundo telemóvel a ser arrancado por elementos das FDS (Forças de Defesa e Segurança) das mãos de Sheila Wilson em pouco mais de seis meses. O primeiro telemóvel foi arrancado em Junho último por agentes da Polícia, quando a jornalista fazia uma cobertura em directo na página de Adriano Nuvunga sobre as condições desumanas em que se encontravam os antigos agentes dos serviços secretos moçambicanos.
Os antigos agentes da secreta moçambicana estavam acampados em frente às instalações das Nações Unidas, reivindicando as suas pensões. Para além de perder o telemóvel, Sheila Wilson esteve detida por quase 24 horas, na quarta Esquadra da PRM da Cidade de Maputo. A câmara da STV, por sua vez, foi roubada por desconhecidos diante da Polícia. (Carta)
A Montepuez Ruby Mining (MRM) sofreu na semana passada (15 de Novembro) outra incursão de grande dimensão na sua mina Maningue Nice, que foi invadida por cerca de 150 pessoas. O incidente aconteceu três semanas depois de uma outra invasão.
No início da última incursão, os envolvidos fizeram reféns um membro da Polícia da República de Moçambique (PRM) e um segurança contratado, ameaçando-os para não pedirem ajuda. Quando os reforços chegaram, os dois reféns foram libertos sem ferimentos.
As equipas de segurança da MRM identificaram Airos Samuel Tolecha (também conhecido como “Boica”) como o líder dos invasores. De acordo com o comunicado da MRM, Tolecha foi acusado em ocasiões anteriores, na esquadra de polícia de Namanhumbir, de outras incursões na MRM. “A seis de Setembro de 2024, Tolecha foi detido pela PRM e levado para a esquadra de polícia de Namanhumbir. Ele evadiu-se da prisão pouco tempo depois”, lê-se no comunicado do MRM.
A nota da MRM detalha ainda que outras informações adicionais foram fornecidas por pessoas envolvidas na incursão, nomeadamente, que os participantes recebiam 200 Meticais para se juntarem à incursão e ganhavam mais 500 Meticais se regressassem com sacos de “camada” contendo cascalho com rubis.
“A incursão foi organizada por “Laye”, um conhecido comprador ilegal de rubis da Guiné; e a incursão foi financiada por um indivíduo de nome “Zacare Idrisse” que se crê ser de nacionalidade nigeriana ou guineense. No total, foram detidos 44 cidadãos estrangeiros relacionados com a exploração mineira ilegal na MRM em 2024”, lê-se no comunicado.
De acordo com a fonte, as autoridades a nível distrital, provincial e nacional foram notificadas do incidente, na esperança de que sejam tomadas medidas mais proactivas contra aqueles que financiam, facilitam e encorajam o comércio ilegal de rubis moçambicanos, que prejudica Moçambique e o seu povo devido à perda de vidas e à privação das tão necessárias receitas fiscais provenientes dos recursos minerais de Moçambique.
A MRM desenvolve actividades de comunicação contínuas para alertar para os perigos da exploração mineira ilegal, sensibilizando as comunidades vizinhas (onde os mineiros ilegais muitas vezes se abrigam temporariamente) para os perigos da exploração mineira ilegal, a fim de dissuadir os indivíduos de se colocarem a si próprios e aos outros em risco. (Carta)
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O país registou uma diminuição de 60% no número de pacientes atendidos nas unidades sanitárias, no âmbito das manifestações convocadas pelo candidato presidencial, Venâncio Mondlane, em repúdio contra a fraude eleitoral.
Os dados foram apresentados esta terça-feira (19) pelo Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, na sua comunicação à Nação sobre o balanço das consequências das manifestações que vêm ocorrendo por todo o país, após o anúncio dos resultados das eleições de 09 de Outubro, considerados fraudulentos.
Nyusi destacou que os danos da violência, no contexto das manifestações, afectaram principalmente os mais vulneráveis socialmente, ou seja, os trabalhadores desprotegidos, que são os que mais sofrem neste tipo de contexto.
“A primeira e talvez a mais grave consequência dessa onda de violência manifestou-se na área da saúde, onde se registou uma redução de 60% no número de pacientes atendidos nos serviços de urgência de pediatria e de adultos, respectivamente”, destacou o Presidente.
Mais adiante, o Presidente da República anunciou ainda uma redução de 54% no número de doações de sangue, num período em que se aproxima a quadra festiva.
Por outro lado, disse Nyusi, foram ainda encerrados mais de 60 postos de vacinação e adiadas 54 brigadas móveis, o que resultou na perda ou adiamento da vacinação de mais de 6.500 crianças. Notou-se também uma redução de mais de 60% no número de profissionais de saúde nas unidades sanitárias.
Os números partilhados por Filipe Nyusi mostram que, nos últimos dias, ocorreram mais de 200 manifestações, marcadas pela vandalização de bens públicos e privados, roubo, saque em estabelecimentos comerciais, queima de pneus, bloqueio das vias públicas, entre outros.
Essas manifestações resultaram ainda em 807 cidadãos feridos, dos quais 66 eram membros da Polícia da República de Moçambique (PRM), e 19 pessoas mortas, cinco das quais eram membros da PRM. (M.A.)
O Hospital Central de Maputo (HCM), concretamente no Serviço de Neonatologia, regista o nascimento de uma média de 95 bebés prematuros por dia, o que corresponde a 53,6 por cento (uma cifra de 1.150 bebés ao longo do presente ano).
A informação foi partilhada esta segunda-feira (18), pelo director clínico daquela unidade sanitária, António Cossa, que aponta a desinformação como uma das principais causas da prematuridade em Moçambique.
Neste âmbito, aponta que a prematuridade tem sido uma das principais causas de morte no serviço de Neonatologia, onde os prematuros extremos (aqueles que nascem antes das 28 semanas) são apontados como líderes das estatísticas, com uma taxa equivalente a 85 por cento, seguida dos que nascem entre as 54 e 36 semanas, com 16 por cento.
Falando no âmbito do dia Mundial da Prematuridade que se assinalou a 17 de Novembro, a directora da Neonatologia disse que a gravidez precoce em adolescentes, hipertensão e diabetes não controladas, HIV, infecção urinária não tratada, anemia e malária são indicados como principais factores da prematuridade, além de ser responsáveis pelas mortes.
Entretanto, a fonte esclareceu que a prematuridade pode também ter repercussão na fase infantil e adulta, isto porque há chances de os bebés nascidos precocemente apresentarem sequelas, problemas neurológicos e outras doenças.
Porém, para fazer face à situação, o HCM pretende ampliar os seus serviços com a construção de uma unidade de Neonatologia.
“Estamos numa fase muito avançada do projecto de edificação e implantação do novo bloco de neonatologia que terá melhores condições, em comparação com o actual”, frisou o director-geral do HCM, Mouzinho Saide. (AIM)
Eleições 2024: Reduziu para 60% o número de pacientes atendidos nas unidades sanitárias
O país registou uma diminuição de 60% no número de pacientes atendidos nas unidades sanitárias, no âmbito das manifestações convocadas pelo candidato presidencial, Venâncio Mondlane, em repúdio contra a fraude eleitoral.
Os dados foram apresentados esta terça-feira (19) pelo Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, na sua comunicação à Nação sobre o balanço das consequências das manifestações que vêm ocorrendo por todo o país, após o anúncio dos resultados das eleições de 09 de Outubro, considerados fraudulentos.
Nyusi destacou que os danos da violência, no contexto das manifestações, afectaram principalmente os mais vulneráveis socialmente, ou seja, os trabalhadores desprotegidos, que são os que mais sofrem neste tipo de contexto.
“A primeira e talvez a mais grave consequência dessa onda de violência manifestou-se na área da saúde, onde se registou uma redução de 60% no número de pacientes atendidos nos serviços de urgência de pediatria e de adultos, respectivamente”, destacou o Presidente.
Mais adiante, o Presidente da República anunciou ainda uma redução de 54% no número de doações de sangue, num período em que se aproxima a quadra festiva.
Por outro lado, disse Nyusi, foram ainda encerrados mais de 60 postos de vacinação e adiadas 54 brigadas móveis, o que resultou na perda ou adiamento da vacinação de mais de 6.500 crianças. Notou-se também uma redução de mais de 60% no número de profissionais de saúde nas unidades sanitárias.
Os números partilhados por Filipe Nyusi mostram que, nos últimos dias, ocorreram mais de 200 manifestações, marcadas pela vandalização de bens públicos e privados, roubo, saque em estabelecimentos comerciais, queima de pneus, bloqueio das vias públicas, entre outros.
Essas manifestações resultaram ainda em 807 cidadãos feridos, dos quais 66 eram membros da Polícia da República de Moçambique (PRM), e 19 pessoas mortas, cinco das quais eram membros da PRM. (M.A.)
Pelo menos três pessoas morreram e outras 14 ficaram feridas em manifestações pós-eleitorais em dois dias na província de Manica, centro de Moçambique, disse ontem o diretor clínico do Hospital Provincial de Chimoio (HPC), citado pela Lusa.
“Na tarde e na noite de ontem [segunda-feira] recebemos mais quatro doentes (...). Dois deles tinham lesões abdominais muito graves e foram a óbito pouco depois terem dado entrada no hospital”, disse Juvenal Chitovele, em declarações aos jornalistas, explicando que outros dois feridos foram submetidos a cirurgia e estão estáveis.
A terceira vítima mortal registou-se durante as manifestações da noite de domingo, na mesma província. O diretor clínico explicou que o HPC soma um “cumulativo de 14 atendidos, cinco internados, seis altas e um total de três óbitos” na sequência das manifestações pós-eleitorais em Manica, sendo que a maior parte vítimas foi baleada.
De acordo com o CIP Eleições, tudo começou na segunda-feira no mercado 38 Milímetro, na cidade de Chimoio, em Manica, quando membros da Polícia queimaram a banca de Paulino White, amigo pessoal de Venâncio Mondlane e mobilizador de massas em apoio ao PODEMOS e ao próprio candidato Venâncio Mondlane. Os vendedores revoltaram-se contra os polícias e vários manifestantes queimaram pneus e bloquearam vias.
A publicação assegura que suas fontes afirmam que o número de mortos pode vir a subir porque entre os feridos há alguns mais graves, um dos quais é o chefe da Praça dos Trabalhadores, terminal de transporte da rota Chimoio-Macate. Uma jovem, supostamente vendedeira do mesmo mercado, foi baleada na perna. A bala perfurou e partiu a perna.
Sedes da Frelimo incendiadas
Nos distritos de Dondo e Nhamatanda, em Sofala, diversos bens do partido Frelimo e de seus membros foram vandalizados e queimados durante o final de semana. No Posto Administrativo de Mafambisse, em Dondo, um grupo de manifestantes queimou o mercado pioneiro e a sede do partido Frelimo. O primeiro acto aconteceu na madrugada do último sábado. No total foram 25 barracas queimadas.
Ainda na madrugada desta segunda-feira, cinco membros do partido Frelimo foram ameaçados de morte nas suas residências nos bairros de Munhonha e Mussassa, e uma sede do partido Frelimo foi incendiada.
Em Nhamatanda, desconhecidos foram incendiar, na madrugada de sábado, cinco casas e um alpendre (Machessa) onde funcionava a sede da Frelimo do bairro. Na cidade de Xai-Xai, em Gaza, foi queimada a sede do partido Frelimo num dos bairros e no bairro Santa Isabel, em Maputo, também foi incendiada uma sede do partido.
O número de mortos durante as manifestações entre os dias 13 e 18 de Novembro aproxima-se a 30, a maioria das quais manifestantes. Na segunda-feira, foram confirmados três mortos, incluindo um suposto agente da polícia morto por populares em Murrupula, em Nampula.
Os outros dois óbitos foram em Chimoio e Matola. No total já são 28 mortos, entre 13 e 18 de Novembro. As quatro fases já resultaram na morte de mais de 60 pessoas. (Lusa/CIP Eleições)
Moçambique é um dos países onde a perseguição aos cristãos se intensificou desde junho de 2022, registando-se um aumento dos relatos de ataques de jihadistas contra comunidades cristãs, aponta o relatório “Perseguidos e Esquecidos?”, da Fundação AIS.
O relatório, que hoje será apresentado em Lisboa, no auditório do MUDE (Museu do Design), pelo jurista e docente universitário Jorge Bacelar Gouveia, dá conta de que, neste país lusófono, 2024 “assistiu a um recrudescimento dos ataques do autoproclamado Estado Islâmico (…), na província de Cabo Delgado, no Nordeste do país”.
O Bispo de Pemba, António Juliasse, aponta, citado no relatório, “a pobreza endémica e a falta de educação” como “os motores da insurreição islamista, e não a religião”. No entanto, outra fonte diocesana indica que “desde julho deste ano, parece que o Estado Islâmico assumiu o controlo” dos insurgentes e “a situação é mais sensível do que no ano passado, porque agora os cristãos começam a ser visados e a guerra está a assumir uma dimensão mais religiosa”.
O relatório “Perseguidos e Esquecidos?” analisa os desafios que os cristãos enfrentam em 18 países, onde sofrem problemas que vão desde o assédio à detenção, deslocação forçada ou assassinato e compreende o período entre agosto de 2022 e junho deste ano.
No documento é apontado um aumento da violência e/ou opressão sobre os cristãos na maioria dos 18 países escrutinados, embora se reconheça que, em muitos casos, esses problemas abrangeram apenas regiões específicas e não o total do país.
Assim, registou-se um agravamento na perseguição aos cristãos na Nicarágua, Burquina Fasso, Nigéria, Moçambique, Iraque, Irão, Paquistão, Índia, China, Sudão e Eritreia. Por sua vez, registou-se uma melhoria ligeira no Vietname e a manutenção da situação em Mianmar, Síria, Egito, Turquia, Arábia Saudita e Coreia do Norte.
Como uma das principais conclusões, o relatório da Fundação AIS reconhece que “o epicentro da violência militante islamista deslocou-se do Médio Oriente para África”, onde se registou uma “intensificação da perseguição dos cristãos como inimigos do Estado e/ou da comunidade local”.
Nessas zonas, “os intervenientes estatais e não estatais utilizaram cada vez mais como arma a legislação existente e nova legislação que criminaliza atos considerados desrespeitosos para com a religião do Estado como forma de oprimir os cristãos e outros grupos religiosos minoritários” e assistiu-se a um incremento da “ameaça às crianças cristãs, especialmente as raparigas”.
Entretanto, a Fundação AIS recorda que em 2024, quase 50% do mundo terá participado em eleições, desde logo os Estados Unidos da América, a França ou o Reino Unido, sublinhando que “durante anos, os governos têm sido criticados por, na melhor das hipóteses, se limitarem a falar da necessidade de tomar medidas contra a perseguição dos cristãos e de outras minorias religiosas”.
Neste contexto, também antecipa que “é pouco provável que os governos recentemente (re)eleitos tomem medidas para pôr termo à perseguição, porque têm outras prioridades em termos de assuntos internacionais”.
No entanto, avisa que “ignorar a situação dos cristãos é ignorar os sinais de alarme, pois onde quer que aqueles sejam perseguidos, o direito à liberdade religiosa para todos é posto em causa”. “Onde quer que os cristãos sejam assediados ou presos, detidos ou discriminados, torturados ou assassinados, os governos cometem ou toleram abusos também contra outros”.
A Fundação AIS depende diretamente da Santa Sé e ajuda os Cristãos onde quer que eles se encontrem perseguidos, refugiados ou ameaçados. Foi fundada em 1947, pelo P. Werenfried van Straaten, inspirado na mensagem de Fátima, sendo em Portugal dirigida atualmente por Catarina Martins de Bettencourt.
Ao final da tarde de hoje, após o lançamento do relatório, será iluminado de vermelho a estátua de D. José I, na Praça do Comércio, em Lisboa, e o monumento ao Cristo Rei, em Almada, lembrando as situações de perseguição religiosa, em particular dos cristãos, que se verificam em muitos países. Outros monumentos nacionais, um pouco por todo o país, vão ficar iluminados de vermelho durante esta semana.
O gesto é repetido em mais de 20 países, “para lembrar que a perseguição religiosa não é uma coisa do passado, mas sim uma realidade bem cruel dos dias de hoje”, frisa a Fundação AIS. (Lusa)
Enquanto cidadãos e organizações da sociedade contabilizam o assassinato de pelo menos 50 pessoas pela Polícia da República de Moçambique, no âmbito das manifestações populares convocadas pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, o Presidente da República e Chefe do Governo anuncia a morte de apenas 19 pessoas, das quais cinco são membros da Polícia.
Os dados foram anunciados ontem por Filipe Jacinto Nyusi, na sua primeira comunicação à nação em torno dos protestos em curso no país, que completam amanhã 30 dias desde o seu início. Recorde-se que os protestos iniciaram no dia 21 de Outubro, dois dias após o bárbaro e covarde assassinato do advogado Elvino Dias (assessor de Venâncio Mondlane) e do mandatário do PODEMOS, Paulo Guambe.
Segundo Filipe Nyusi, as manifestações resultaram no ferimento de 807 pessoas, das quais 66 são membros da Polícia. Não revelou o número de detidos. No total, o Chefe de Estado contabiliza “mais de 200 manifestações violentas” em todo o país desde 21 de Outubro.
No entanto, os números do Presidente da República estão longe da realidade reportada dia-a-dia por diversas organizações da sociedade. Por exemplo, até ao dia 05 de Novembro, o porta-voz da Associação Médica de Moçambique, Napoleão Viola, reportava a morte de 16 pessoas, de um total de 108 vítimas de baleamento policial, no âmbito das manifestações.
Catorze dias depois deste pronunciamento, mais de duas dezenas de assassinatos foram anunciadas, com destaque para o atropelamento de sete jovens na passada sexta-feira, no município da Matola, o assassinato de sete pessoas, em Nampula, e de uma pessoa, em Quelimane, na passada quarta-feira. Aliás, a Plataforma da sociedade civil DECIDE reporta 25 mortes entre os dias 13 e 17 de Novembro.
Numa comunicação de pouco mais de 37 minutos, proferida quatro horas após mais uma transmissão em directo do candidato presidencial Venâncio Mondlane, que anunciou três dias de luto nacional pelas vítimas mortais das manifestações, o Chefe de Estado limitou-se apenas a lamentar pela perda de vidas humanas e apelou à sociedade a preservar o seu maior valor, “que é a vida”.
Segundo o Chefe de Estado, os confrontos entre a Polícia e os manifestantes deveram-se à falta de observância dos pressupostos de uma manifestação, como a definição do percurso a ser levado pelos protestantes. Não explicou, no entanto, se terá sido por essa razão que a Unidade de Intervenção Rápida impediu a marcha pacífica do dia 21 de Outubro, lançando gás lacrimogéneo contra os manifestantes, o candidato Venâncio Mondlane e jornalistas.
Filipe Nyusi afirma ainda que as “manifestações muito violentas” foram caracterizadas pela vandalização de bens públicos e privados; pelo roubo e saque de estabelecimentos comerciais; pela queima de pneus, bloqueio de vias e actos de sabotagem contra antenas de telefonia móvel.
O também Presidente da Frelimo, organização política que governa Moçambique desde a independência nacional, apelou à Polícia a privilegiar a contenção e evitar uma intervenção violenta. Defende que as Forças de Defesa e Segurança devem continuar a servir o povo e que o uso da força deve ser sempre em situações de “extrema necessidade”.
“Ninguém, em nome de qualquer causa, deve impedir outro cidadão de ir trabalhar para garantir o sustento da sua família, (…) ninguém pode violar as leis municipais que protejam o repouso depois de certas horas da noite”, defendeu, em referência ao “panelaço” que vigorou entre passada sexta e segunda-feira, nas cidades de Maputo e Matola, e que deverá regressar hoje às 21h00.
“A nossa democracia é jovem e está a aprender a caminhar porque as velhas democracias, por si só, ainda não se reencontram na totalidade. Não existem, aqui, professores e nem alunos, todos estamos a aprender. A amarga experiência de guerra de desestabilização e todo o processo de reconciliação nacional ensinou-nos algo que não podemos esquecer”, disse, pedindo aos mais velhos para passar a referida experiência aos mais novos.
Sem avançar os pontos de agenda – num momento em que os resultados das eleições de 09 de Outubro ainda estão em análise pelo Conselho Constitucional – o Chefe de Estado disse convidar os quatro candidatos a Presidente da República para um diálogo, de modo a se ultrapassar os nós de estrangulamento.
No entanto, não deu quaisquer garantias de segurança ao candidato Venâncio Mondlane, que se encontra em parte incerta por temer seu assassinato. Aliás, a PGR abriu um processo criminal contra o político e outro civil, no qual exige o pagamento de 32.3 milhões de Meticais pelos danos causados pelas manifestações. (Carta)
O candidato presidencial Venâncio António Bila Mondlane anunciou, na tarde desta terça-feira, um luto nacional de três dias em homenagem às vítimas mortais das manifestações populares, apelidadas de “mártires do panelaço”, assassinadas pela Polícia durante os 14 dias de protestos, convocados pelo político em reivindicação aos resultados eleitorais de 09 de Outubro, que dão vitória à Frelimo e ao seu candidato Daniel Chapo com mais de 73% dos votos.
Em mais uma transmissão em directo feita hoje, na sua página oficial do Facebook, Venâncio Mondlane defende que toma esta medida por saber que a mesma jamais será tomada pelo Presidente da República que, na sua óptica, não se preocupa com o povo, mas sim com o partido que preside (Frelimo) e o candidato daquela formação política. “O Presidente da República não veio abraçar o povo, as famílias que perderam os seus filhos, os partidos que foram roubados votos. Apenas abraçou o seu partido”, disse o candidato.
Segundo Venâncio Mondlane, os três dias de luto nacional serão observados em todo país, a partir das 00h00 desta quarta-feira. O político explica que cada cidadão que se identifica com a causa deverá vestir de preto ou colocar um laço preto em homenagem aos “mártires do panelaço”. Refira-se que pelo menos 50 pessoas foram assassinadas pela Polícia desde o início das manifestações, a 21 de Outubro.
Venâncio Mondlane disse ainda que o luto nacional deverá ser vivido nos quintais e nas ruas próximas às residências dos manifestantes, como forma de separar estes dos “vândalos”, que semeiam terror nas estradas das cidades de Maputo e Matola e dos distritos de Boane e Marracuene. O “panelaço” diário das 21h00, disse Mondlane, deverá continuar dentro dos quarteirões, mas sem longas caminhadas, de modo a se controlar os “infiltrados”.
Mondlane afirma ainda que durante os três dias de luto nacional, os condutores que se identificam com a causa deverão paralisar as suas viaturas ao meio-dia e accionar as suas buzinas por um período de 15 minutos. Os manifestantes, por sua vez, deverão levantar os seus cartazes, à mesma hora, nas rotundas, cruzamentos e entroncamentos.
O político garantiu que as manifestações não irão parar até à reposição da verdade eleitoral. Criticou o facto de a sociedade “subalternizar” as mortes causadas pela Polícia por causa da vandalização de viaturas e saqueamento de bens, protagonizados, no seu entender, por “infiltrados” com propósito de “desviar as atenções do essencial das manifestações”.
Refira-se que o luto nacional de três dias enquadra-se na segunda fase da quarta e última etapa das manifestações populares convocada por Venâncio Mondlane e deverá encerrar na sexta-feira.
Com esta fase, totalizar-se-ão 17 dias de manifestações, de um conjunto de “25 dias de terror”, prometidos pelo candidato em homenagem ao advogado Elvino Dias, crivado com 25 balas no passado dia 18 de Outubro por indivíduos até aqui desconhecidos. (Carta)
As manifestações populares contra os resultados das eleições gerais convocadas pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane começaram no mês de Outubro, pouco depois do anúncio dos resultados gerais pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), considerados fraudulentos. Desde então, já são contabilizados mais de 100 feridos a tiros pela Polícia da República de Moçambique (PRM), só em Maputo.
No último domingo, "Carta" visitou vários jovens que se encontram internados na maior unidade sanitária do país, o Hospital Central de Maputo (HCM), e que foram vítimas das atrocidades cometidas pela Polícia, no âmbito das manifestações que ocorrem por todo o país, para entender as razões de suas lutas.
Num primeiro momento, as voltas que a nossa reportagem deu na ortopedia do HCM fizeram soar vozes de jovens que, de longe, pareciam estar numa roda de conversa, de tanto que gritavam entre eles. Quando entramos no quarto escolhido para agrupar os jovens "vítimas das manifestações", encontramos logo na entrada Vasco Daniel, de 36 anos de idade, pai de dois filhos, trabalhador por conta própria (biscateiro) e sonhador.
Daniel foi alvejado com um tiro na perna durante as manifestações do dia 7 de Novembro, quando se encontrava marchando pacificamente com outros jovens. No lugar de dialogar com os manifestantes, a Unidade de Intervenção Rápida (UIR) lançou gás e começou a disparar balas verdadeiras para matar indiscriminadamente, em nome do Estado.
“Este país precisa de melhorar, ninguém me vai parar. Vivemos na miséria há mais de 40 anos. Neste país não há emprego, somos obrigados a viver de ‘biscate’ para sustentar as nossas famílias. Eu estou mal agora, mas quando sair daqui, vou continuar com a minha luta. O que eu comecei tenho de concluir. Mesmo no estado em que me encontro, não vou parar de lutar. Mesmo com muletas, eu vou sair para me manifestar até que a verdade eleitoral seja restabelecida e que o meu presidente Venâncio Mondlane tome o seu lugar para a melhoria da situação do país”, clamou o nosso interlocutor.
“Não vou desistir da minha luta, não posso desistir. Não posso construir uma casa e deixá-la pela metade. Tenho de concluir e entrar para dormir em paz com a saída da Frelimo do poder. Portanto, a luta que iniciei vai até ao fim”, disse.
Neste momento em que seus “biscates” estão parados, por estar internado no Hospital Central de Maputo, consegue comprar comida para seus filhos graças ao apoio que tem recebido de pessoas de boa-fé, que quase todos os dias depositam um valor na sua conta M-pesa.
Conversamos também com Raimundo Alexandre, de pouco mais de 35 anos, pai de um filho e que trabalha por conta própria, pois, até ao momento não consegue emprego. Frustrado com a situação em que vive há muito tempo, saiu às ruas para ver se as coisas mudam.
“Fui baleado nas manifestações do dia 24 de Outubro, em Maxaquene, a lutar pelo bem-estar dos meus irmãos, dos meus filhos e da minha família. Eu estava no meio das manifestações a defender os meus direitos e não estava a vandalizar nenhum bem, quando a Unidade de Intervenção Rápida, a dita Polícia da Frelimo, chegou e começou a balear-nos com intenção de matar”.
“Quando eu sair desta cama do hospital, volto às ruas para defender aquilo que são os meus direitos. Eu e muitos de nós votamos em Venâncio Mondlane, mas o governo de Nyusi quer roubar o nosso direito de voto. Há muito tempo que a minha vida foi alienada. Toda a riqueza deste país tem donos. Eu quero defender a honra deste país, não tive a chance de estudar porque, muito cedo, me tornei pai e tive de procurar sustento para o meu filho. Nunca tive acesso ao emprego, por isso tive de me reinventar”, frisou Alexandre.
Sem se identificar, outro jovem internado no hospital disse que a luta que os jovens estão a travar é devido à frustração que carregam por conta de várias injustiças perpetradas pelo governo. “Grande parte de nós, os jovens que saímos para marchar na Vladimir Lenine, não trabalhamos. Não tivemos oportunidades de estudar. Por vezes, dormimos duas a três noites sem comer, mas lutamos para pôr um pouco no prato dos nossos filhos. Nós engolimos muito e hoje dizemos ‘basta’. Não queremos que essa desgraça, que hoje vivemos, se perpetue por outras gerações”, frisou.
“Eu saí à rua em busca de um futuro melhor para os meus filhos e para os moçambicanos. Não luto por mim, mas sim pelo povo que vive injustiçado dia após dia. Sei que, neste momento, meus filhos podem estar sem o que comer. Mas tenho orgulho de ter dado o meu corpo às balas para libertar este país das mãos destes ladrões. Sairei às ruas quantas vezes forem necessárias para não permitir que a FRELIMO continue a governar este país e as nossas vidas e a nos fazer viver debaixo de tanta miséria. Tenho meus sonhos e meus anseios e quero um país melhor e digno para os meus filhos”, concluiu.
Denilson Alves, outro sobrevivente das manifestações, que levou um tiro no braço no dia 7 de Novembro, diz que a sua luta vai continuar até que a verdade eleitoral seja reposta pelo Conselho Constitucional.
“Não é à toa que milhares de jovens saem às ruas para contestar. São milhares de jovens que gritam nas ruas pelo bem desta nação. São vários anos a sermos escravizados por este governo. Para mim, valeu a pena toda esta luta. Quando eu sair da cama deste hospital, vou continuar a lutar porque nós PODEMOS viver uma vida melhor neste país. Para que haja mudanças, é necessário que alguns de nós enfrentem o perigo por uma causa justa. Neste país, vivemos situações muito injustas e hoje eu só quero um Moçambique digno e justo para os meus filhos e netos. Quando tudo passar, vou dizer em viva voz: valeu a pena”.
Em conversa com Afonso Muchanga, de 18 anos de idade, estudante da 11ª classe, e um dos sobreviventes do fatídico acidente da “Texlon”, ocorrido na noite do último sábado, que ceifou a vida de outros sete jovens, ele contou que o seu sonho é viver num país melhor, onde todos os seus irmãos tenham uma educação de qualidade e melhores condições de vida.
“Eu saí à rua com os meus amigos para fazermos a greve do ‘panelaço’. Estávamos na zona quando decidimos nos aproximar da estrada para nos juntarmos a outro grupo da área, mas ficamos parados no passeio, tocando as nossas panelas. Quando dei por mim, já estava estatelado no chão e sangrando muito”, afirmou.
“Não vi sequer como aquele carro veio, porque foi tudo tão rápido. Ele deixou a estrada e veio para cima de nós, que estávamos no passeio. Se eu pudesse voltar atrás, teria dado ouvidos à minha mãe, que sempre disse para eu não sair de casa durante essas manifestações. Hoje estou aqui, nesta cama, e não sei o que vai ser da minha perna quando eu sair daqui. Hoje sou chamado de vândalo, mas eu estava apenas fazendo uma manifestação pacífica. Mas estou muito arrependido”, lamentou Muchanga, com um olhar sereno e olhos quase a lacrimejar.
À "Carta” também falou Fábio Cipriano Alberto, de 22 anos de idade, residente no bairro Luís Cabral. Conta que deu entrada no HCM no último sábado (16), vítima de cinco tiros nas duas pernas, quando tentava fugir da polícia que decidiu fazer “uma caça às bruxas” dentro do bairro.
“Eu estava na zona com outros vizinhos a fazermos a manifestação das panelas quando, de repente, nos apercebemos que homens da UIR decidiram entrar no bairro à procura de jovens que estavam a participar das manifestações. Meus vizinhos correram para uma direcção que eu julguei ser a errada, mas afinal de contas caí na minha própria emboscada”, conta.
“Deparei-me com um agente que me deu cinco tiros nas duas pernas e mesmo em meio a tanta dor, tive de simular a minha própria morte. E, para o agente ter a certeza de que eu morri, pisou-me a cara, do lado do olho e disse ‘este já nos deixou’ e foi embora. Eles só te deixam quando têm a certeza de que tu já morreste. Por isso, a UIR sempre atira para matar civis. Mas estou orgulhoso de mim, apesar de estar hoje aqui deitado nesta cama do hospital em meio a muita dor”, continuou.
Já Aldo Moisés, um jovem militar que também conversou com a nossa reportagem, contou que foi vítima de uma bala perdida no bairro Luís Cabral quando acompanhava os seus amigos que o foram visitar.
“Não entendo essa forma de actuação da UIR. Muitos jovens que estão na rua estão cansados das injustiças deste país. Um país rico em recursos minerais, mas que tem donos; um país que tem tudo para proporcionar as melhores escolas para os nossos filhos, mas não se importam. O sector da saúde do nosso país é deplorável. É disto que os jovens estão cansados. Por isso, saem à rua para lançar um grito de socorro. (Marta Afonso)