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sexta-feira, 27 março 2020 04:00

Militares malawianos e o roubo de carvão em Mocambique: Incidente de Calomue é mais um dentre vários

O recente incidente em Calomue, protagonizado por militares malawianos que entraram ilegalmente em território moçambicano e apoderaram-se de forma violenta de 543 sacos de carvão vegetal aos comerciantes moçambicanos, é mais um dentre vários que amiúde se tem registado ao longo da linha fronteiriça, alguns dos quais nunca chegam a ser reportados.

 

Calomue fica situado no distrito de Angónia, província de Tete. Depois do Malawi reconhecer a violação da fronteira estatal pelos seus militares para se apoderar do carvão, as autoridades daquele país desembolsaram cerca de cento e sessenta mil meticais para ressarcir os comerciantes moçambicanos.

 

O palco destes incidentes tem sido sobretudo os distritos fronteiriços, neste caso Tsangano, Moatize, Angónia, Mutarara e Doa na província de Tete. Mas também não escapam as incursões ilegais de alguns malawianos, incluindo militares e polícias, os distritos fronteiriços das províncias do Niassa e Zambézia.

 

O incidente de Calomue acontece numa altura de relativa estabilidade nas relações entre Maputo e Lilongwe, com a diplomacia moçambicana defendendo relações de boa-vizinhança entre os dois países e povos da SADC que partilham laços históricos e culturais comuns.  Não obstante a apresentação do pedido de desculpas pelas autoridades malawianas tal como aconteceu no passado, o recente incidente de Calomue pode ter várias interpretações tendo em conta o envolvimento das forças de defesa.

 

Basta recordar que alguns incidentes na fronteira comum já atingiram níveis diplomáticos como foi o caso de um grupo de polícias malawianos que, a 3 de Agosto de 2009, introduziu-se em território moçambicano onde destruiu um posto policial, queimou o equipamento e material de trabalho da guarda-fronteira em Caloca, distrito de Ngauma, no Niassa. Na altura, o incidente acabou perturbando a visita do falecido presidente Bingu wa Mutharika a Moçambique.

 

Fronteira porosa

 

Fundamentalmente, a travessia ilegal da fronteira, o contrabando do milho e de combustíveis, o abate indiscriminado da floresta e a vandalização de marcos são alguns dos crimes mais frequentes na linha limítrofe. Moçambique e Malawi partilham uma extensa fronteira de cerca de 1400 quilómetros, dos quais 888 de terra firme, 190 fluvial e 322 lacustre. A linha de 888 quilómetros de fronteira terrestre é considerada porosa com movimentos descontrolados por não possuir nenhuma vedação. Deliberadamente ou não, a falta de vedação encoraja alguns malawianos a atravessar a fronteira terrestre ilegalmente, uma prática que já vem desde os tempos do falecido presidente Kamuzu Banda.

 

Reafirmação fronteiriça

 

Os dois países praticamente concluíram a reafirmação fronteiriça à luz das decisões da União Africana, mas falta ainda a assinatura de um Tratado sobre a matéria conforme está estabelecido. No entanto, a reafirmação da fronteira comum nem sempre foi pacífica. Registaram-se alguns episódios sensíveis que exigiram da parte técnica moçambicana muita paciência e ponderação. O processo de demarcação ou reafirmação visava a reposição de marcos originais da linha divisória. (Faustino Igreja)

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