Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI

Economia e Negócios

O Primeiro-Ministro, Adriano Maleiane, disse esta quarta-feira (17) que o Executivo já pagou mais da metade do valor das horas extras em dívida, em todo o país. Maleiane falava no Parlamento, durante a sessão de perguntas ao Governo.

 

“O processo de fiscalização das horas extras em curso levado a cabo pelo Ministério da Economia e Finanças permitiu constatar que não existe qualquer evidência clara da sua realização, para além de ter contabilizado os feriados e os dias de descanso semanal”.

 

Neste âmbito, Maleiane explicou que o Governo pagou até ao presente momento, de horas extraordinárias, a nível nacional, um valor equivalente a 323.4 milhões de Mts de um total local apurado de 457.6 milhões de Mts, o que corresponde a uma realização de 70 por cento.

 

Recorde-se que o Governo iniciou com o processo de pagamento de horas extras que datam de 2022 depois que os professores ameaçaram boicotar o arranque do ano lectivo 2024.

 

Relacionado com o assunto, a ministra da Educação e Desenvolvimento Humano, Carmelita Namashulua, disse em Novembro de 2023 que o pagamento de horas extraordinárias aos professores estava a ser feito de “forma gradual”, informação que naquela altura veio a ser refutada pelos professores, considerando a governante “mentirosa”.

 

Recentemente, professores das províncias de Maputo e Inhambane manifestaram-se, alegando o facto de alguns dos seus colegas já terem sido pagos em detrimento de outros que não reuniam provas de terem feito horas extraordinárias. (M.A)

A cada ano, a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) e o Governo têm assinado acordos para a implementação de medidas para a melhoria do ambiente de negócios no país. Entretanto, em 2023, a CTA disse que as medidas acordadas durante a Conferência Anual do Sector Privado (CASP) não foram devidamente implementadas.

 

“Da monitoria feita, constatamos que foram realizados encontros sectoriais (quer a nível técnico como a nível superior). Todavia, os encontros não produziram resultados satisfatórios, uma vez que, nenhum problema foi solucionado na sua plenitude, resultando num balanço de 20% de acções não realizadas, e 80% de acções em curso”, afirmou o Presidente da CTA, Agostinho Vuma, durante a IX reunião de monitoria do ambiente negócios realizada esta quarta-feira (17) em Maputo.

 

Vuma destacou a medida de pagamento de facturas por parte do Estado aos empreiteiros e fornecedores de bens e serviços, cuja proposta foi de se criar os limites máximos de acumulação das facturas atrasadas, para que a despesa seja controlada e monitorada; e incluir-se no Orçamento de 2023 uma rubrica específica de pagamento de facturas atrasadas aos fornecedores.

 

Nesta questão de contratação de bens e serviços pelo Estado, o Presidente da CTA adicionou a falta de implementação da retirada da obrigatoriedade de garantias provisórias, no âmbito dos concursos públicos. Entretanto, dirigindo-se ao Primeiro-ministro, Adriano Maleiane, Vuma disse que os ministérios insistem em exigir este requisito, sem base legal.

 

Mencionou ainda a adopção de mecanismos que permitem a redução do tempo do reembolso do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) que, legalmente, deve ser processado num período de 30 dias. “Aqui, a CASP discutiu um modelo denominado SAFT para evitar o acúmulo de valores a reembolsar, no âmbito do COMPACTO II, Millenium Challenge Corporation. Não sabemos, ao certo, quando é que este sistema entra em vigor e não foi respondida a proposta de se ajustar a taxa de aprovisionamento para o reembolso do IVA, dos actuais 16% para 25%”, sublinhou Vuma.

 

Adicionalmente, a CTA indicou que o pelouro fiscal da agremiação apresentou, várias vezes, propostas de alteração da Lei de Compensação dos Créditos Fiscais para se acomodar a flexibilidade que se pretende na resolução das situações de reembolso do IVA, bem como de pagamento de facturas em atraso, todavia, para Vuma tem havido pouco progresso neste aspecto.

 

“Sobre a isenção do IVA nas transmissões de óleo alimentar e sabões, o diálogo com o Ministro da Indústria e Comércio progrediu, e acreditamos que existe espaço para instituir-se um programa de incentivos baseado em critérios claros de acesso aos mesmos. No caso concreto das indústrias de óleo alimentar e sabões, cerca de 80% da matéria-prima é importada. A proposta da CTA seria renovar o incentivo fiscal de isenção do IVA nas transmissões de óleo alimentar e sabões, e associar este incentivo à obrigação das indústrias aumentarem a incorporação das matérias-primas locais dos actuais 20% para 60%, em dois anos”, afirmou o Presidente da CTA.

 

Em relação à carga tributária excessiva, proliferação de taxas e “taxinhas”, duplicação e ilegalidade de impostos, Vuma apontou que não houve avanço digno de registo, por isso pediu, em nome da CTA, a intervenção urgente do Primeiro-Ministro.

 

“Um exemplo simples: os investidores em áreas longínquas são obrigados a fazer acordos com a Electricidade de Moçambique (EDM) para o fornecimento de corrente eléctrica e, em sede deste contrato, há uma taxa que são obrigados a pagar ao Ministério dos Recursos Minerais e Energia (MIREME). Isto reflecte uma duplicação de taxas, dado que a empresa já paga à EDM, tutelada pelo MIREME”, afirmou o Presidente da CTA.

 

Todavia, o Primeiro-Ministro assegurou que o Governo continua empenhado na implementação de acções que concorram para a criação de um ambiente facilitador e conducente à atracção de investimento, num quadro que promova a transferência de tecnologia, capacidade técnica e de gestão para as empresas e mão-de-obra nacional.

 

“Neste prisma, renovamos o nosso compromisso de prosseguir, com determinação, o aprimoramento do quadro legal vigente e a implementação de reformas que garantam a simplificação administrativa e a contínua melhoria do ambiente de negócios, com o envolvimento activo do sector privado, nosso parceiro estratégico no processo de desenvolvimento económico e social do nosso país”, afirmou Maleiane.

 

No âmbito da melhoria do ambiente de negócios, o governante destacou a Revisão da Lei de Investimento, do Código Comercial e de vários instrumentos de política fiscal, nomeadamente o código do IVA, o código do Imposto sobre o Consumo Específico (ICE), actualização da Pauta Aduaneira de modo a assegurar a sua adequação às novas exigências do comércio internacional; aprovação do licenciamento por mera comunicação, para mais de 80 actividades; implementação do e-VISA e isenção de vistos para os nacionais de 29 países; e aprovação da Lei das Pequenas e Médias Empresas. (Evaristo Chilingue)

A Electricidade de Moçambique (EDM), empresa pública, lançou esta terça-feira (16), em Maputo, o portal de fornecedores de bens e serviços, no âmbito da reforma do processo de procurement que decorre internamente desde 2020, com o financiamento dos Reinos da Suécia e Noruega e Consultoria da Deloitte.

 

Durante a apresentação do portal, o Director de Aquisições na EDM, João Aleluia, disse que o portal visa fornecer uma plataforma digital e centralizada para gestão e comunicação com fornecedores, maior transparência de processos de contratação, igualdade de oportunidade, maior eficiência e eficácia dos processos de aquisição, bem como alavancar o processo de contratação da EDM a níveis internacionais.

 

De entre vários requisitos para o cadastro, os fornecedores deverão apresentar dados legais da empresa, informações dos accionistas ou catálogos de bens e serviços, informação bancária do fornecedor, bem como aceitação de adesão ao Código de Ética da EDM. O cadastro é validado por especialistas internos da EDM, no período máximo de sete dias.

 

Segundo Aleluia, depois de cadastrados, os fornecedores têm acesso à informação sobre oportunidades de negócios com a EDM, acessibilidade a documentos de concurso para fornecedores elegíveis, dados sobre resultados de concursos, informação sobre contratos vigentes, incluindo acesso a um canal para reclamações.

 

Intervindo na cerimónia, o Presidente do Conselho de Administração da EDM, Marcelino Gildo, contextualizou que o portal de fornecedores é um instrumento que se enquadra no processo de Reforma de Procurement, em curso na EDM, desde 2020, alicerçado essencialmente na modernização dos processos e Sistemas de Tecnologias de Informação e Comunicação para, em última instância, servir melhor os clientes.

 

“O portal de fornecedores da EDM visa, sobretudo, promover a integridade, transparência, igualdade, competitividade e celeridade no processo de contratação de serviços, em toda a cadeia de valor da EDM. O Portal de gestão de fornecedores vai igualmente gerar poupanças significativas, ao possibilitar o controlo das aquisições, em tempo real, bem como a melhoria da performance na relação com os fornecedores”, enfatizou Gildo.

 

Das vantagens, o PCA da EDM destacou ainda que o portal vai garantir auditorias aos fornecedores, identificando problemas e possíveis soluções, visando antecipar tendências no escopo do fornecimento de bens e prestação de serviços à EDM, para além de uma gestão consolidada e estratégica alinhada às melhores práticas internacionais de transparência e eficiência de gestão dos processos em cadeia de abastecimento, bem como nas áreas específicas de procurement, logística, inventário e armazéns. (Carta)

E o cumprimento de padrões internacionais ambientais é essencial para mobilizar financiamento para o projeto da futura Hidroelétrica de Mpanda Nkua, no centro de Moçambique, orçada em 4,5 mil milhões de euros, disse hoje o responsável pelo empreendimento.

 

“Se nós não obedecermos a isso [às exigências ambientais], mais difícil será o financiamento”, disse aos jornalistas o diretor do gabinete do Projeto da Hidroelétrica de Mpanda Nkua, Carlos Yum.

 

Carlos Yum falava à margem das reuniões de primavera do Banco Mundial (BM) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), que decorrem em Washington.

 

“Hoje em dia, essas instituições financeiras internacionais, sejam multilaterais ou comerciais, têm a obrigação de, no seu balanço, estarem bem visíveis estas preocupações sociais e ambientais”, avançou Yum.

 

Referindo-se ao facto de a futura Hidroelétrica de Mpanda Nkua ter como base a fonte hídrica, o responsável assinalou que o peso daquele recurso na transição energética também torna atrativo o financiamento do empreendimento.

 

Carlos Yum defendeu que o projeto tem também compromissos com a componente social, nomeadamente o reassentamento das populações dentro da lei, e a boa governança.

 

“Isso é parte do nosso ADN e quanto melhor cumprirmos estas premissas, melhor é a qualidade de financiamento”, enfatizou Yum.

 

O projeto, prosseguiu, está estruturado de forma credível para mobilizar os recursos necessários ao seu desenvolvimento.

 

O empreendimento vai levar cinco anos a ser construído e prevê-se que comece a operar em 2031.

 

Será composto por uma central hidroelétrica com capacidade de produção de 1.500 megawatts e por uma linha de transporte de alta tensão com 1.350 a 1.400 quilómetros, que vai sair de Tete, no centro de Moçambique, até Maputo, sul.

 

Em dezembro último, o Governo moçambicano e um consórcio liderado pela Eletricidade de França (EDF) assinaram acordos para a implementação do Projeto Hidroelétrico de Mphanda Nkua.

 

Além da EDF, o consórcio internacional é constituído pela petrolífera francesa TotalEnergies e pela japonesa Sumitomo Corporation, detendo conjuntamente 70% da hidroelétrica.

 

Em representação do Estado moçambicano, a Hidroelétrica de Cahora Bassa (HCB) e a Eletricidade de Moçambique (EDM) detêm os restantes 30%.

 

Com a entrada em funcionamento de Mpanda Nkua, a HCB continuará a ser a maior do país, com capacidade de produção atual de 2.075 MW.

 

Com Mpanda Nkua em operação, o Governo moçambicano espera garantir a segurança energética para as necessidades domésticas e colocar o país como polo regional no fornecimento deste recurso. (Lusa)

Um estudo mensal levado a cabo pelo Standard Bank Moçambique revela que a actividade económica do sector privado moçambicano caiu ligeiramente em Março passado, de 49.7 pontos, de um máximo de 50.7 em Fevereiro, após ter permanecido abaixo do nível neutro de 50 de Novembro de 2023 a Janeiro de 2024.

 

Comentando os resultados do estudo denominado Purchasing Managers’ Index (PMI), o Economista-chefe do Standard Bank, Fáusio Mussá, explica que o facto se deveu à queda dos níveis de stock das empresas, o que aponta para uma fraca procura agregada, mas também para constrangimentos do lado da oferta.

 

“O PMI de Março sinaliza uma fraca actividade económica no fim do primeiro trimestre deste ano, com contracções nos sectores da manufactura e do comércio, mas com a agricultura e os serviços em geral a crescerem”, afirma Mussá, citado em relatório do estudo.

 

Para o Economista-chefe, o nível de expectativas futuras dos empresários permaneceu em território positivo no mês analisado, mas registou uma descida para um mínimo de seis meses, o que, para ele, sugere que os fenómenos climáticos recorrentes, assim como os atrasos na implementação dos projectos de gás natural liquefeito (GNL) em Cabo Delgado têm impactado a confiança dos empresários.

 

Em linha com as instituições estatais, o Standard Bank Moçambique prevê que a inflação se mantenha a um dígito, tendo baixado para 4% em termos homólogos em Fevereiro, o que permitiu ao Banco de Moçambique cortar a taxa de juro MIMO em 150 pontos base (pb) no primeiro trimestre deste ano para o nível de 15.75%, com as previsões a indicarem mais 50 pb de cortes este ano.

 

Para o Economista-chefe do Standard Bank, a descida nas taxas de juro alivia o custo de financiamento, tanto para o Estado como para o sector privado. “No entanto, o Banco de Moçambique manteve inalterados e num nível alto os coeficientes de reserva obrigatória, o que associado a pressões fiscais recorrentes e à oferta intermitente de moeda externa sugere que as condições de financiamento se mantenham apertadas”, sublinha o Mussá no seu comentário anexo ao estudo. (Carta)

\

 

Os ataques à navegação no Mar Vermelho pela milícia Houthi do Iémen expuseram a vulnerabilidade da segurança marítima africana. Desde Novembro de 2023, registaram-se 133 incidentes relatados, incluindo 14 navios atingidos por mísseis ou drones e 18 navios sequestrados por piratas somalis. As perturbações causadas por intervenientes não estatais, não limitados pelo direito internacional e com acesso a stocks de armamentos isolados, colocam desafios fundamentais à segurança e ao desenvolvimento económico de África.

 

Os Houthis ameaçaram ainda interromper os 20 cabos submarinos que fornecem redes de comunicação submarinas em torno do Mar Vermelho. Pouco depois, um navio que transportava 21 000 toneladas métricas de fertilizantes de sulfato de fosfato de amónio, o Rubymar, foi atingido por um míssil dos Houthi e começou a afundar. Acredita-se que sua âncora arrastada tenha danificado três cabos submarinos.

 

Os ataques condicionaram o transporte marítimo desde o Mar Vermelho, através do Golfo de Aden, até à parte Ocidental do Oceano Índico, através do qual flui 25% do tráfego marítimo global. As repercussões foram imediatamente visíveis. Os cidadãos africanos estão a pagar o preço dos atrasos, dos bens de consumo mais caros, das perturbações nas entidades económicas locais e dos cursos de água poluídos.

 

As companhias marítimas globais desviaram rotas do Mar Vermelho, alterando os fluxos marítimos entre os enormes mercados globais da Ásia e da Europa. Os prémios de seguro para transporte marítimo aumentaram, aumentando os custos dos bens para os consumidores em África e em todo o mundo. Os desvios em torno da África do Sul podem acrescentar até 2 semanas e 6 000 milhas náuticas extra à viagem de um navio.

 

A incerteza sobre os fluxos de energia e de frete está a afectar muitos países que dependem das importações, contribuindo para um ambiente empresarial altamente imprevisível. Esta incerteza tem um impacto directo nos 10 mil milhões de dólares em receitas anuais do Egipto provenientes das portagens dos navios que utilizam o Canal de Suez. Entretanto, a poluição causada pelos detritos gerados pelos ataques e respostas degradou as águas e os ecossistemas marinhos ao longo da costa africana do Mar Vermelho.

 

Os 57 milhões de habitantes da África Oriental que enfrentam uma insegurança alimentar aguda, incluindo mais de 10 milhões de refugiados e pessoas deslocadas internamente (PDI), também estão na linha de fogo. Todos os fornecimentos de alimentos para o Corno de África e para a África Oriental fluem através do Mar Vermelho vindos da Europa, Rússia e Ucrânia, e do Hemisfério Ocidental. Os 6,6 milhões de deslocados internos no Sudão, em particular, dependem fortemente da ajuda alimentar entregue através do Mar Vermelho.

 

Em suma, são os cidadãos africanos que estão a pagar o preço dos atrasos, dos bens de consumo mais caros, das perturbações nas entidades económicas locais e das vias navegáveis poluídas devido à insegurança marítima no Mar Vermelho e na parte Ocidental do Oceano Índico.

 

Um ambiente de segurança em rápida deterioração

 

A segurança marítima é vital para o continente africano – por vezes referido como a maior ilha do planeta. A súbita escalada dos ataques reavivou as ameaças colocadas pela perturbação latente de uma década causada pela pirataria somali nos primeiros anos do século XXI. A insegurança no mar ao largo do Iémen também revelou a natureza desgastada da segurança marítima africana, cujos impactos não são sentidos apenas no Mar Vermelho, mas em todo o continente.

 

O aumento dos custos do frete enviado para África aumenta os preços para os consumidores e as empresas de praticamente todos os artigos importados ou exportados. Para as economias frágeis e as dos países sem litoral da África Oriental, mais dependentes do livre fluxo de mercadorias provenientes do Mar Vermelho, qualquer aumento no custo dos bens de consumo tem um efeito directo nas vidas e nos meios de subsistência.

 

As capacidades limitadas de segurança marítima de África

 

Nenhuma marinha da África Oriental é actualmente capaz de organizar operações anti-pirataria nas suas águas. Quaisquer meios navais empenhados em impedir os ataques nos Mares Vermelho e Arábico deixam menos navios para policiar os pontos críticos marítimos africanos ao longo da costa leste do continente – incluindo a crise humanitária do Sudão, a potencial regionalização da Somália e a disputa diplomática da Etiópia sobre o acesso marítimo através da Somalilândia, e um possível cenário de militantes extremistas que empregam tácticas Houthi contra infra-estruturas energéticas ao largo da costa norte de Moçambique.

 

O aumento dos incidentes marítimos no Mar Vermelho e no Oceano Índico está a criar espaço para um aumento dos incidentes de pirataria e do tráfico ilícito. O desvio do transporte marítimo no resto de África também cria mais alvos de pirataria noutros locais, especialmente onde mais navios têm de navegar perto da costa.

 

A milícia Houthi também demonstrou uma capacidade robusta para mísseis balísticos, drones e perturbação tecnológica submarina. Estas mobilizações sinalizam a proliferação de material moderno para grupos armados não estatais. A crescente militarização marítima de intervenientes não estatais e grupos criminosos representa uma ameaça directa aos activos, infra-estruturas e interesses nacionais africanos em outras partes do continente.

 

Todos os países africanos, costeiros ou sem litoral, dependem de mercadorias transportadas por navios e redes de cabos submarinos. A crise marítima do Mar Vermelho mostrou como os actos daquele que pode parecer um actor não estatal distante tiveram impacto na dinâmica económica global. Os governos africanos devem considerar que as tácticas que os Houthis estão a utilizar poderiam ser utilizadas noutros locais do continente e, assim, estar preparados para salvaguardar os seus interesses marítimos e económicos.

 

Ter a capacidade de reencaminhar as telecomunicações, por exemplo ao longo das redes de cabos submarinos em torno da África do Sul, proporciona um apoio valioso. A rota do Cabo da Boa Esperança oferece assim uma alternativa dupla provisória para serviços marítimos de superfície e subterrâneos para o continente.

 

A crise também pôs em evidência a funcionalidade deficiente de alguns portos africanos, que obrigam os navios a esperar durante períodos prolongados fora do porto, tornando estes navios alvos mais atraentes para a pirataria ou outra criminalidade. Os portos que funcionam bem, localizados em passagens estratégicas nas rotas marítimas em constante mudança, serão beneficiados. Actualmente, a maioria dos portos de África está a lutar para lidar com o actual volume de carga e lidar com os impactos na segurança destes atrasos e chegadas tardias.

 

O aumento dos fluxos marítimos em todo o resto do continente exige uma maior sensibilização e prontidão para assistência off-shore, possível reabastecimento, serviços de abastecimento confiáveis, apoio médico e segurança de busca e salvamento. No entanto, muitos países carecem de capacidades credíveis de policiamento marítimo. Alguns possuem navios de guerra modernos, mas estes têm em grande parte destinos portuários, deixando o comércio navegar através de rotas marítimas vulneráveis e mal governadas.

 

Fortalecimento da consciencialização sobre o domínio marítimo africano

 

A sensibilização para o domínio marítimo (MDA) é a base para alargar a boa ordem no mar ao largo de África. Existem cinco centros sub-regionais de coordenação de salvamento marítimo (MRRC) e 26 subcentros em todo o continente para cobrir toda a costa africana para fins de coordenação de busca e salvamento. Dois centros começaram a operar em 2022: o Centro Regional de Fusão de Informações Marítimas (RMIFC) em Madagáscar, que fornece monitoramento e partilha de actividades suspeitas de navios na região, e o Centro Regional de Coordenação Operacional (RCOC) em Seychelles, que utiliza as informações do RMIFC para coordenar as respostas de segurança marítima na parte Ocidental do Oceano Índico (WIO). Embora existam meios para uma melhor AMM através da rede de MRRC e dos dois centros da WIO, existe muito pouca ou nenhuma capacidade na região africana que faz fronteira com o Mar Vermelho para ajudar a mitigar a gama de ameaças em jogo – apesar da informação disponível e compartilhada.

 

As marinhas ocidentais e a Marinha da Índia intervieram para conter o cenário de ameaças emergentes através de respostas navais multinacionais, incluindo o Prosperity Guardian, a Operação Aspides (EUNAVFOR) e a Operação ATALANTA (anti-pirataria). Estes esforços destinam-se a manter a integridade da componente marítima que sustenta a economia global. No entanto, as marinhas africanas estão visivelmente ausentes. Nem mesmo o Egipto, que tem uma marinha muito capaz e que deverá sofrer perdas económicas significativas com a crise, mobilizou um único navio.

 

Como partes no Direito do Mar (UNCLOS), 47 países africanos têm a responsabilidade partilhada de manter os mares protegidos contra interferências armadas, para um trânsito livre e seguro nas vias navegáveis internacionais. No entanto, muitos governos africanos aparentemente não levam a sério os seus interesses marítimos nacionais, ignorando as suas obrigações e as múltiplas convenções que regulam o transporte marítimo seguro e a cooperação internacional.

 

A nível nacional, as estratégias e programas individuais de segurança marítima para promover oportunidades da economia azul têm estado sob pressão. Os processos políticos nacionais para muitos países do litoral africano não resultaram no reforço da segurança marítima. Vários países como o Gana, a Nigéria e o Quénia, organismos regionais como a Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD) e os estados insulares das Seychelles e das Maurícias estão a abordar esta questão. No entanto, para a maioria há necessidade de alargar a segurança para além das zonas litorais de África, se quiserem alcançar as ambições marítimas da União Africana (UA) de desenvolver uma economia azul sustentável e próspera através da sua Estratégia 2050, bem como da Agenda 2063 da UA.

 

Prioridades para mitigar a insegurança marítima em África

 

A crise marítima do Mar Vermelho exige uma recalibração dos esforços de segurança marítima africana para ajudar a manter abertas as rotas comerciais, salvaguardar os cabos de comunicações submarinos e proteger o Estado de Direito.

 

Expandir a escala e o âmbito dos centros de fusão de informação marítima para aumentar a sensibilização para o domínio marítimo. Os MIFCs podem promover o domínio marítimo (MDA) através da recolha e análise de informações sobre riscos relacionados com o mar e depois partilhar informações com decisores políticos e profissionais de segurança. Para tornar a informação mais significativa, África precisa de aumentar o número de centros de Fusão de Informações Marítimas, bem como alargar o âmbito da informação recolhida para incluir crimes ambientais (pesca INN, despejo de resíduos tóxicos) e ameaças de grupos militantes não estatais. A arquitectura de segurança marítima existente e as lições da experiência da pirataria somali devem ser incorporadas e refinadas para responder a futuras ameaças do tipo Houthi.

 

Ampliar as estruturas existentes de cooperação em segurança para responder às crises marítimas

 

Ao longo da última década, muito trabalho foi feito para incutir conhecimento, capacidade, cooperação e competências para lidar com ameaças marítimas, nomeadamente através da arquitectura zonal do Protocolo de Yaoundé e da rede de partilha de informações do Código de Conduta do Djibuti. Esta base de conhecimento deve ser actualizada para as ameaças mais graves possibilitadas pelas tecnologias utilizadas na agressão da milícia Houthi. Aqui, estruturas e protocolos adormecidos devem ser reactivados ou ampliados. A Somália serve como um campo frutífero para aprender e desenvolver conhecimentos, redes e experiência de capacitação existentes. Um passo urgente é criar redes próprias de África para interagir e partilhar conhecimentos sobre os fluxos de tecnologias de drones e mísseis para grupos militantes africanos.

 

Impõe-se a necessidade de elevar a diplomacia africana para melhorar a protecção geral das rotas comerciais, das redes de cabos submarinos e da assistência humanitária. Todos os países africanos dependem do fluxo contínuo e ininterrupto de bens e de redes de telecomunicações. A ameaça da milícia Houthi e a ruptura dos cabos no Mar Vermelho demonstram as vulnerabilidades no domínio marítimo e a necessidade de alinhar a protecção, a redundância e a cooperação internacional.

 

Vários assuntos estão em jogo neste esforço. Os líderes africanos devem estar conscientes das crescentes rivalidades regionais para estabelecer instalações navais estrangeiras em águas africanas. Ao mesmo tempo, e mantendo-se em sintonia com as preferências africanas para a cooperação Sul-Sul, a Turquia e a Índia podem ser potenciais parceiros. Isto inclui a cooperação com empresas multinacionais seleccionadas para proteger e reparar sistemas de cabos submarinos em toda a África.

 

As iniciativas de diplomacia marítima africana devem agora incluir um elemento explícito de cooperação marítima para passar das declarações e comunicados ministeriais populares (e a sua colcha de retalhos resultante de acordos políticos) para a estrutura, programas e operações reais como formas e meios ordenados para abordar os interesses marítimos africanos.

 

Os países africanos devem fazer uso da sua voz colectiva e colocar em prática as suas estratégias e programas nacionais de segurança marítima para melhor proteger um bem internacional baseado em interesses e segurança comuns. África tem voz em organizações internacionais como as Nações Unidas e na Organização Marítima Internacional, bem como no Comité Internacional de Protecção de Cabos. Deve também começar a usar a sua voz na organização intergovernamental BRICS para influenciar os membros, como o Irão e a China, a serem fornecedores de segurança marítima mais construtivos, em vez de coercivos, e a envolverem-se numa diplomacia marítima e naval cooperativa.

 

Colectivamente, os acima mencionados são passos incrementais no sentido de posicionar África como um fornecedor emergente de segurança marítima para abordar os interesses marítimos em rápida evolução. (Centro Africano de Estudos Estratégicos)

Pág. 47 de 494