Chamem-lhe o que quiserem, “uma fuga para frente” ou “estratégia ardilosa de caloteiro”, uma coisa deve ficar clara para a maioria dos moçambicanos. As duas acções promovidas pela Privinvest em instâncias arbitrais internacionais, em Genebra e em Paris (aqui no habitual ICC-International Chamber of Commerce), são um bom serviço para a sociedade moçambicana.
Porquê? Porque, com elas, mais detalhes sobre os contornos obscuros do calote e suas envolvências vão emergir. Antes da revelação das acções arbitrais na semana passada, os moçambicanos só conheciam os detalhes da componente financeira do ruinoso negócio com a Privinvest: os 2 mil milhões de USD contraídos junto do Credit Suisse para pagar os fornecimentos da Privinvest, a roubalheira subsequente, o “default”, e um outro caloteiro acordo de princípios entre o Governo e parte dos credores (no âmbito do qual o executivo irá oferecer de “bacela” ao credores 500 milhões de USD provenientes do gás do Rovuma - através dos tais “instrumentos de valorização” - só pelo facto de os fulanos terem abandonado a taxa de juros especulativa).
Esse acordo foi alcançado em Novembro do ano passado, antes dos detalhes mais sórdidos do calote virem ao de cima com a prisão de Manuel Chang em Joanesburgo em Dezembro, e as escabrosas revelações constante da acusação americana contra o antigo Ministro das Finanças e seus pares na trama serem tornadas públicas. O acordo com esses credores resultou da assessoria que o Governo contratou à Lazard and Freres, em Julho de 2016 (ninguém sabe quanto é que o Governo paga a Lazard por uma assessoria financeira que mais não fez do que amarrar o pagamento de uma dívida claramente ilegal ao gás do Rovuma). Mas este é apenas um parêntesis ao essencial deste artigo.
Desde que a prisão de Manuel Chang que o Governo tem-se baralhado no tratamento da questão da dívida, tomando decisões às escondidas da opinião pública. Em Fevereiro deste ano, através da Procuradoria-Geral da República (PGR), o governo intentou em Londres uma acção de responsabilidade civil contra o Crédit Suisse, a Privinvest (e suas e empresas), mais os antigos funcionários do CS. Essa acção interposta no High Court of Justice, de Queens, procura invalidar a garantia soberana da Proindicus e exige uma compensação pela fraude praticada pelos citados. Este procedimento civil, frise-se, não procura invalidar os contratos. O Governo nunca entrou por essa via.
Aliás, tal como o acordo de Novembro com os credores, a acção de Londres decorre de uma assessoria legal externa contratada, na mesma data que a Lazard, à White and Case (que em Moçambique sub-contratou a Sal e Caldeira). A acção do Governo em Londres resulta do contrato de financiamento que estabelece como praça de disputa a praça londrina, como aliás é regra geral nos grandes contratos de crédito.
Mas e por que é que a Privinvest optou por duas acções arbitrais? A resposta é simples: foi uma retaliação.
E isso é bom? Sim, pois, a partir da semana passada, tomamos conhecimento de uma coisa: para além do contrato de financiamento com os bancos e a Privinvest, há um contrato de construção e manutenção com a Privinvest. Com base nos detalhes ainda limitados sobre a sua acção arbitral em Genebra, percebe-se que a Privinvest está a dizer que, para além fornecer os 24 barcos atuneiros, e que estão a apodrecer no porto de pesca de Maputo, o Governo devia ter criado condições para que ela instalasse seu serviço de manutenção no quadro do contrato com a MAM. Isso não aconteceu, alega, levando à perda de cerca de 200 milhões de USD. A Privinvest quer agora ser ressarcida. E informa que, de acordo com o contrato de construção e manutenção, a pessoa a citar em Moçambique é o Presidente Filipe Nyusi.
O caso não é para menos! Mas o Governo continua calado, sem ideias nem norte sobre como reagir. É certo que a PGR já veio confirmar na quinta-feira da existência duas acções arbitrais da Privinvest na Europa e que ela já estava a trabalhar no assunto – esta pronta informação teve o objectivo de sacudir dos ombros do PR a carga de ver o seu nome como pessoa a citar, embora ainda não se saiba se a aparição do seu nome decorre apenas do facto ser ele quem ocupa as funções de PR hoje (cremos que seja isso).
Mas, e agora? Vir a PGR dizer que vai reagir às acções da Privinvest não basta. O facto é que o descalabro é imenso e a forma como o Governo lida com o caso desastrosa. Durante estes anos todos, nunca nos foi revelado que havia um contrato directo de construção e manutenção com a Prinvivest, no âmbito do qual o Governo tinha de pagar 200 milhões de USD. Onde está esse dinheiro? Em que contas bancárias? Quem meteu no bolso? Que outros contratos existem com a Privinvest que obrigam o Estado moçambique? Quanto paga o Governo à Lazard e à White and Case? Porque é que o Governo escondeu este contrato da opinião pública e a White and Case não fez nada para evitar uma abordagem litigiosa subsequente à acção civil em Londres?
Cada dia que passa, somos surpreendidos com informações cruciais sobre estes casos, arrancadas a ferro a partir do estrangeiro. Cá dentro o Governo se fecha em copas, como se estivesse já tudo dito. Mas não é bem assim. Há muitos mais detalhes escondidos que serão revelados por ocasião do julgamento americanos e das acções arbitrais na Europa. Aspectos que revelam uma propensão doentia para a sonegação de informação. Mas ninguém pára a verdade com as mãos.
Mais valeria o Governo vir agora abrir todo o jogo. Todo o jogo!
(Marcelo Mosse)
A defesa de Samito Machel, face a uma Nota de Acusação que recomenda sua expulsão do partido Frelimo, é mais do que uma defesa: é um libelo acusatório. Viperino. Incisivo. Em boas partes do seu argumento, ele desfere golpes de forma ininterrupta. O principal visado é o Presidente da Frelimo, Filipe Nyusi, a quem acusa de estar a transformar o partido num grupo que depende da vontade de uns poucos, numa formação anti-democrática descambando para a tirania.
E desafia o Comité de Verificação do Comité Central (CVCC) a abrir um inquérito para levantar as evidências que mostram como Nyusi manipula o partido para implantar um regime de pensamento único, autocrático.
O ex-ministro moçambicano Manuel Chang, detido na África do Sul desde dezembro a pedido dos Estado Unidos, continua a gozar de imunidade parlamentar e não será julgado em Moçambique em caso de extradição para o seu país, pode ler-se no pedido submetido por Moçambique à justiça sul-africana.
O académico sul-africano Andre Thomashausen considerou que o pedido da Procuradoria-Geral de Moçambique para a extradição do deputado Manuel Chang, detido na África do Sul desde dezembro, é uma "finta técnica" à justiça sul-africana. "É de duvidar que seja por lapso, é muito mais provável que foi intencionado e que seja uma finta técnica para criar aqui na África do Sul a ilusão de que o processo Chang em Moçambique está preparado e vai seguir até ao dia do julgamento, o que não é verdade", disse o professor catedrático de Direito Comparado da UNISA (Universidade da África do Sul) e especialista em Direito Internacional.
Andre Thomashausen, que analisava para a Lusa o pedido da PGR de Moçambique remetido em 8 de abril pelo juiz William Schutte para decisão do Governo sul-africano, salientou que "o que temos aqui é uma tecnicidade da lei moçambicana", mais especificamente da lei do Estatuto do Deputado, que distingue no artigo 13 a inviolabilidade do deputado a ser submetido a uma detenção preventiva e a julgamento.
Milhares de documentos foram desclassificados e estão agora acessíveis ao público que pode consultar testemunhos das operações militares na Guerra Colonial ou relativos à saída de Timor Leste, revelou a Marinha Portuguesa. “Operações militares nas antigas colónias, acções de combate e planeamento assim como correspondência trocada entre unidades militares, relatórios de comandantes e interacção entre as ex-colónias e a metrópole da altura” são alguns dos tipos de documentos que a Comissão de Desclassificação de Documentos decidiu tornar públicos, contou à Lusa o tenente Mário Dias, da Marinha Portuguesa.
Nos dois últimos anos, a Comissão de Desclassificação de Documentos (CDD) analisou “milhões de documentos”, na sua maioria relacionados com a Guerra Colonial, com ocupariam 1,3 quilómetros de extensão, explicou. Foram quase todos desclassificados e estão agora acessíveis ao público na Biblioteca Central de Marinha - Arquivo Histórico, situado no edifício da Cordoaria Nacional, em Lisboa.
Estão ultrapassados os pontos que dividiam as duas maiores bancadas que compõe o parlamento moçambicano, nomeadamente a Frelimo e a Renamo, isto no âmbito do pacote legislativo sobre a descentralização. Ontem, as três bancadas que compõem o órgão, nomeadamente a Frelimo, Renamo e Movimento Democrático de Moçambique, aprovaram, por consenso e em definitivo, os “dois instrumentos da discórdia”, abrindo espaço para que as VI Eleições Gerais, agendadas para 15 de Outubro próximo, tenham lugar obedecendo o novo texto constitucional, resultante dos consensos alcançados pelo Presidente da República, Fillipe Nyusi e o então líder da Renamo, Afonso Dhlakama.
Concretamente, trata-se da lei dos Serviços de Representação do Estado na Província e a que estabelece o Quadro Jurídico para a Eleição do Presidente da República e dos Deputados da Assembleia da República. Estes dois dispositivos legais forçaram, lembre-se, o adiamento dos trabalhos da Assembleia da República na semana transata.