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Política

A permanência em liberdade do antigo conselheiro político de Armando Guebuza na Presidência da República, Renato Matusse, um dos arguidos das "dívidas ocultas", que recebeu subornos directamente da Privinvest, começa a levantar suspeitas de que ele esteja a ser “protegido”, diferentemente dos que já foram detidos, nomeadamente da sua ex-colega Inês Moiane.  

 

Matusse é um dos 11 arguidos sobre quem o Ministério Público não aplicou medidas de coação (9 estão em prisão preventiva e 1 em liberdade mediante caução). Os investigadores do processo 1/PGR/2015 juntaram evidências segundo as quais Matusse recebeu valores transferidos directamente da Privinvest, tendo “lavado” parte deles na compra de um apartamento na “Julius Nyerere”, já apreendido pela PGR. Uma das razões evocadas no seio da investigação para a sua permanência em liberdade é ele estar a "colaborar".

 

Mas...contesta parte dos arguidos em privado, houve quem também colaborou mas que acabou sendo detido preventivamente. De que protecção goza Renato Matusse?, questiona-se. E levanta-se a suspeita de que ele possa estar a ser protegido politicamente. Um facto recente é mostrado para sustentar essa alegação: no passado dia 15 de Fevereiro, quando os cinco arguidos mais famosos do caso acordavam da sua primeira noite nas celas, Renato Matusse viajava para Tete, onde seria uma das figuras de destaque na homenagem póstuma ao Monsenhor Domingos Gonçalo Ferrão, sacerdote da diocese da cidade, falecido em 2001. 

 

Ferrão é tio da primeira-dama, Isaura Ferrão Nyusi. O homenageado distinguiu-se por ser a voz dos sem voz no tempo colonial, pagando com cadeia e tortura o amor ao seu povo. A ele deveu-se a divulgação do massacre de Wiriamu. O Presidente Nyusi marcou presença no evento, que também serviu para o lançamento de um livro sobre a luta armada de libertação nacional, intitulado “Frente de Tete”, onde também constam relatos sobre os feitos de Domingos Ferrão. E quem escreveu o livro? Renato Matusse, o autor da famosa biografia de Armando Guebuza, que lhe catapultou para o lugar de conselheiro do ex-presidente. Na cadeia, Inês Moiane, contam as nossas fontes, não se cansa de se interrogar sobre se o facto de Matusse ter escrito uma obra onde são exaltados os feitos do tio da primeira-dama vale alguma protecção, mencionando também o facto de um filho de Renato Matusse ser afilhado de casamento do actual casal presidencial. 

 

Nos últimos dias, Inês tem exibido face de revoltada. No princípio, não resistiu à prisão, embora, devido às suas ausências constantes na Austrália (onde terá investido alguma fortuna), não foi ouvida antes de ser detida no dia 14, numa manhã negra em que o seu escritório na Avenida do Zimbabwe foi completamente revirado por investigadores à busca de evidências documentais. Sua revolta decorre também disso: da percepção de que ela podia também estar em liberdade “colaborando”, não compreendendo como é que, na sua qualidade de ex-secretária presidencial, foi-lhe dada ordem de prisão, ela que guarda muitos “segredos do Estado”. (M.M.)

A subida de Ossufo Momade à liderança da Renamo trouxe novos actores políticos no seio do maior partido da oposição. Alguns são militantes de há longa data na ‘perdiz, outros nem por isso. Entre as figuras que vieram ‘à ribalta’ com a eleição de Ossufo Momade está Muhamad Yassine, deputado do partido na AR  que passou a ser o porta-voz da sua bancada

 

Formado em Relações Internacionais, Yassine é um dos proeminentes jovens políticos que, antes de abraçar a política, era um “assertivo crítico” da governação do antigo Presidente da República, Armando Guebuza. Muhamad Yassine foi eleito deputado da Renamo em 2014 pelo círculo de Nampula, onde era o 6º da lista em que o actual líder (Ossufo Momad) ocupava a primeira posição. Uma vez na AR em 2015, Yassine assumiu o cargo de vice-presidente da Comissão das Relações Internacionais, Cooperação e Comunidades.

 

Segundo fontes de “Carta”, Muhamad Yassine é hoje um dos principais assessores de Ossufo Momade, o que não foi confirmado nem desmentido pelo visado na entrevista que concedeu ao nosso Jornal. Yassine limitou-se a dizer que era apenas mais um membro da Renamo, sempre disposto a trabalhar para o seu partido em tudo que lhe for confiado. Afirmou que quando é chamado a dar o seu contributo fá-lo sem qualquer hesitação. Destacou o facto de ser formado em Relações Internacionais e Diplomacia, e também por pertencer a algumas organizações internacionais, como uma vantagem porque, segundo ele, em certos momentos isso enquadra-se na estratégia do partido.

 

A ascensão de Yassine como uma das figuras mais próximas de Ossufo Momade decorre, de acordo com as nossas fontes, não por ele ser originário de Nampula, tal  como Momade, mas por ter fortes ligações com vários Estados, entre africanos, ocidentais islâmicos, onde a Renamo pode buscar apoio. Yassine tem sobretudo muita inserção em Estados do mundo islâmico, sobretudo porque ele é fluente em árabe. (Omardine Omar)  

sexta-feira, 01 março 2019 16:28

O que a PGR pede ao tribunal londrino de Queens

Na sua acção de responsabilização civil intentada no Supremo Tribunal de Justiça de Londres (Divisão de Queen's Bench, Tribunal Comercial) contra o Credit Suisse, seus três antigos funcionários (Surjan Singh, Andrew Pearse e Detelina Subeva) e as empresas fornecedores dos serviços contratados no quadro do endividamento oculto (Privinvest Shipbuilding SAL, Abu Dhabi Mar LLC e Privinvest Shipbuilding Investment LLC), a Procuradoria Geral da Republica (PGR), em representação do Estado moçambicano, requere o seguinte:

 

  • ·A declaração de que a garantia dada a ProIndicus não constitui uma obrigação válida, legal ou exequível;
  • ·Rescisão da garantia e a sua entrega à Credit Suisse para o seu cancelamento imediato;
  • ·Danos de direito comum e compensação equitativa pela fraude incluindo, em razão do suborno, conspiração por actuar por meios ilícitos, deturpação e engano, incluindo todas as perdas sob as garantias, pela fraude praticada dos arguidos;
  • ·Indemnização e contribuição dos arguidos em relação a todas as obrigações incorridas como resultado das garantias, incluindo todos os passivos decorrentes da garantia da empresa MAM;
  • ·Um relato dos lucros, incluindo todas as comissões recebidas pelos arguidos e um relato e restituição com base em enriquecimento sem causa ou outra forma, de todos os subornos pagos, incluindo a liquidação patrimonial; e
  • ·Ressarcimento contra todos os arguidos, juros compostos sob o capital próprio, alternativamente juros legais em todas as quantias recebidas. (Carta)

O Estado moçambicano está a processar judicialmente, através da Procuradoria Geral da República (PGR), as seguintes entidades: o Credit Suisse International, o Credit Suisse AG,  a Privinvest Shipbuilding S.A.L. Abu Dhabi (Branch), a Abu Dhabi Mar LLC,  a Privinvest Shipbuilding Investments LLC, a Logistics International SAL (Offshore) e a Logistics International Investments. 

 

Os cidadãos Surjan Singh, Andrew James Pearse e Detelina Subeva também são réus no mesmo processo. Uma fonte da PGR confirmou o facto à “Carta de Moçambique”, esta tarde. Trata-se de uma acção de responsabilidade civil.

 

A acção foi intentada junto do High Court of Justice/Queens Bench Division, tendo dado entrada ontem, dia 27 de Fevereiro. Singh, Detelina e Pearse eram funcionários do Credit Suisse quando o calote dos mais de 2 bilhões de USD começou a ser montado. Os três estão acusados como réus processo americanos em que o libanês Jean Bostani e o deputado Manuel Chang são os principais réus detidos. Singh, Detelina e Pearse estão sob liberdade provisória. Na acção do Estado moçambicano ficou de fora Jean Bostani e o VTB (banco russo que também, por enquanto, não foi acusado pelos EUA).

 

Mas, e pela primeira vez desde que este caso estoirou em Dezembro, a Privinvest e todo o conglomerado à volta do empresário franco-libanês, Iskander Safa, está a ser processado. “Carta” confirmou junto de suas fontes que se trata de uma acção de responsabilidade civil. Ou seja, o Estado moçambicano pretende receber uma indemnização de cada um dos acusados por seu papel no calote. A opção por uma acção cível, e não criminal, está a ser comentada como comportando riscos, nomeadamente o risco do insucesso. Há quem considere que o ideal seria a PGR ter intentado primeiro uma acção criminal, e através dela exigir uma indemnização, uma vez que já está praticamente provado que houve fraude, negligência e incumprimento de regras de prudência por parte do banco suíço. Por essa via, seria mais prático os visados serem responsabilizados criminalmente primeiro e, depois e como consequência, civilmente. (Carta)

As detenções de Manuel Chang, Ndambi Guebuza, Gregório Leão, Inês Moiane e outros arguidos no famigerado caso das dívidas ilegais fizeram com que a bancada da Frelimo tomasse uma atitude camaleónica. Com efeito, a 9ª Sessão da Assembleia da República que arrancou nesta quinta-feira (28) em Maputo serviu para o partido no poder afirmar e reafirmar que distanciava-se “de forma inequívoca” dos “comportamentos desviantes”, e que as garantias soberanas e avales na Conta Geral do Estado “não significa a legalização das dívidas não declaradas”.

 

Margarida Talapa, chefe da bancada parlamentar da Frelimo, disse que “desde que se desvendou o caso das dívidas não declaradas, a Frelimo tem reafirmado a necessidade da responsabilização exemplar daqueles que aproveitando-se das suas funções ter-se-ão eventualmente apropriado de parte dos valores em benefício próprio, lesando o Estado Moçambicano”.  

 

Talapa afirmou que AR criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a missão de investigar e recomendar as medidas apropriadas, cujo relatório foi apreciado, aprovado e posteriormente encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR) para os trâmites legais subsequentes. A chefe da bancada da Frelimo disse que o seu partido distancia-se de forma inequívoca dos comportamentos desviantes que põem em causa a gestão transparente da coisa pública.Acrescentou que a Frelimo continuará a pugnar pelo combate tenaz e cerrado contra a corrupção, branqueamento de capitais e outras formas de crime organizado praticados por quem quer que seja.

 

Sobre garantias soberanas e avales

 

Para Margarida Talapa, o registo das garantias soberanas e avales na Conta Geral do Estado quando feito consoante a Legislação em vigor não significa a legalização das dívidas não declaradas, muito menos representa impedimento às actividades em curso nas instituições da justiça. Acrescentou que a Conta Geral do Estado (CGE) é equivalente ao Relatório e Balanço de Contas do exercício económico de uma empresa. “Nela devem ser registadas todas as operações que alteram ou possam alterar o património do Estado, como são os casos de garantias emitidas pelo Estado”, afirmou.

 

A chefe da bancada da Frelimo reiterou que o registo é necessário para o Tribunal Administrativo, enquanto auditor externo da CGE, poder fazer o devido julgamento e envio, com ou sem reservas, à AR para deliberar, aprovar ou, havendo matéria que justifique, criar CPI, como foi o caso das garantias soberanas. Talapa referiu também que sem o registo na CGE não haveria nada a julgar.

 

Salvaguardar os interesses dos moçambicanos

 

Numa outra passagem do seu discurso, Margarida Talapa encorajou o Governo a continuar focalizado na identificação de melhores soluções que salvaguardem os interesses dos moçambicanos, sem prejuízo do exercício do direito de regresso, ou seja, responsabilizar os agentes estatais que por actuação ou omissão tenham causado danos ao próprio Estado. Exortou os órgãos de administração da justiça a fazerem justiça com celeridade para a protecção dos direitos, liberdades e garantias de todos os moçambicanos. (Omardine Omar)  

A situação da insegurança que se regista em alguns distritos de Cabo Delgado desde o passado dia 5 de Outubro de 2017 e os novos contornos do famigerado caso das dívidas ilegais foram os assuntos de maior destaque nos discursos da presidente da Assembleia da República (AR), Verónica Macamo, bem como das chefias das três bancadas parlamentares, durante a cerimónia que esta quinta-feira (28) em Maputo marcou o arranque da 9ª sessão da AR.

 

Na sua intervenção, Verónica Macamo referiu-se à situação de Cabo Delgado afirmando que “nada justifica a morte de gente inocente, pacata e trabalhadora. Nem os recursos minerais, nem as diferenças religiosas, de raça ou de ideologia, podem ser evocados para a prática de actos macabros e ignóbeis”. Acrescentou que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e as populações devem trabalhar em colaboração para uma maior vigilância e denúncia, visando a neutralização das acções dos malfeitores.

 

Por sua vez, a chefe da bancada parlamentar do partido no poder, Margarida Talapa, afirmou que “nada justifica a barbárie que os nossos concidadãos vivem em alguns distritos da província de Cabo Delgado. Nenhum ser humano dentro das suas faculdades mentais, com respeito à vida e sentido patriótico, é capaz de tamanha insensatez”. Para Talapa, as Forças de Defesa e Segurança devem fazer de tudo para que o “jacaré não cresça”.

 

Na opinião de Mário Ali, vice-chefe da bancada parlamentar do maior partido da oposição (Renamo), as FDS estão impávidas, impotentes e desnorteadas por causa da “situação da instabilidade social e confrontação armada que se regista na província de Cabo Delgado, que originou até ao presente cerca de 200 mortos, inúmeros feridos, centenas de deslocados e números não especificados de casas queimadas ou destruídas”. Adiantou que as FDS, “que sempre se mostram tenazes, implacáveis contra o cidadão pilha-galinha e o povo indefeso que simplesmente pretende manifestar-se para exigir seus direitos constitucionais, estão descaracterizadas, demonstram fragilidade e incapacidade de repor a ordem e tranquilidade em Cabo Delgado”.

 

Regime "persegue" jornalistas

 

Ainda na sua intervenção, Mário Ali acusou o regime vigente de perseguir jornalistas, que são detidos por apenas estarem no exercício da sua actividade profissional de informar a sociedade.

 

Já o chefe da bancada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Lutero Simango, entende que a situação de terror que se vive em algumas zonas da província de Cabo Delgado está a ganhar uma dimensão alarmante de instabilidade. Para Simango, “o povo moçambicano já não suporta mais nem deseja viver em ciclos de confrontação armada, pois temos a plena consciência de que temos a responsabilidade de preparar um futuro de harmonia, concórdia nacional e uma nação livre para as futuras gerações”.

 

Na óptica do MDM, a partilha de informação sobre o perfil e identidade, em termos de origem, dos autores responsáveis e sua motivação, vai galvanizar a nação inteira e mobilizar os moçambicanos para o mesmo objectivo: defesa da integridade territorial. “Por isso, esperam que o Governo seja franco na sua interação porque é uma preocupação nacional e já esta a ter uma dimensão regional”, disse Lutero Simango.  

 

Novos contornos das dívidas ilegais

 

Outro assunto de destaque na abertura da nona sessão ordinária da AR foi o dos novos contornos das famigeradas dívidas ocultas. É que num passado recente a AR aprovou a inclusão das mesmas na Conta Geral do Estado (CGE), através do voto maioritário da bancada da Frelimo. Entretanto, na sua intervenção Verónica Macamo referiu-se ao papel desempenhado pela AR logo que soube da detenção de Manuel Chang, antigo ministro das Finanças e deputado da “Escolinha do Barulho” pela bancada da Frelimo. Macamo disse que a AR aprovou favoravelmente o pedido do Tribunal Supremo para que a Manuel Chang fosse imposta a medida de coação máxima (prisão preventiva). Macamo acrescentou que a vontade da AR é de serem exclusivamente obedecidas as disposições legais aplicáveis.

 

Enquanto Margarida Talapa, da Frelimo, disse que o seu partido distanciava-se de todos os seus membros que têm comportamentos desviantes, e que põem em causa a gestão transparente da coisa, Mário Ali, do partido Renamo, defendeu que por existirem rostos como Manuel Chang, Gregório Leão, Ndambi Guebuza e outros, “ não é justo nem honesto que se obrigue todo um povo a pagar dívidas que foram contraídas para fins particulares”. Ali afirmou ser estranho que a administração da justiça estar muito preocupada com a extradição de Manuel Chang para Moçambique, enquanto o antigo presidente da República, Armando Guebuza, ainda nem foi chamado pela justiça. Para a Renamo, não se deve entreter os moçambicanos com detenções aqui e acolá de “peixe miúdo”. Numa outra passagem do seu discurso, o vice-chefe da bancada do maior partido da oposição desafiou a AR para revogar o dispositivo legal que tenta transformar dívidas inconstitucionais e ilegais em dívida limpa na Conta Geral do Estado de 2015, em resposta às inúmeras vozes da sociedade moçambicana que defendem o não pagamento das ‘dívidas ocultas’.

 

Para Lutero Simango, com os novos desenvolvimentos das ‘dívidas ilegais’ quem está no ‘banco de julgamento’ não são os réus, por culpa do partido que governa desde 1975, mas sim o país. Simango disse que não é ao Chang, Ndambi Guebuza ou ao Gregório Leão que o mundo quer julgar. O mundo globalizado em que vivemos hoje está a julgar o sistema judiciário moçambicano e o seu sistema político.

 

Responsabilizar autores das dívidas

 

O MDM reiterou que os responsáveis e os mentores da engenharia financeira das dívidas ocultas, ilegais e não autorizadas pela AR devem ser criminalmente responsabilizados e o Estado moçambicano não deve assumir estas dívidas.

 

Serão discutidas 30 matérias

 

A sessão ordinária da AR que arrancou esta quinta-feira (28) decorrerá até 23 de Maio. Nesta reunião do órgão máximo legislativo serão analisadas 30 matérias incluindo Perguntas ao Governo, Informações do Governo, Informação Anual da PGR, Propostas Legislativas (a proposta de Lei para a Eleição dos membros da Assembleia Provincial, Proposta de Lei de tutela do Estado sobre os órgãos de governação, descentralizada provinciais e das autarquias locais), a Proposta de Lei de Organização e Funcionamento das Assembleias Provinciais, entre outras. (Omardine Omar)