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quinta-feira, 09 setembro 2021 04:51

ONG forma deslocadas para auto-sustento: Vislumbra-se uma luz no fundo do túnel para vítimas do terrorismo

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Uma luz no fundo do túnel começa a brilhar para mais de duas dezenas de mulheres e jovens que se encontram em diversos bairros da cidade de Pemba, capital provincial de Cabo Delgado, depois de terem saído das suas zonas de origem devido aos ataques terroristas, que assolam aquela província do norte do país, desde Outubro de 2017.

 

Desde princípios de Março último que um total de 25 mulheres, com idades compreendidas entre 20 e 40 anos, estão sendo formadas como empregadas domésticas, numa iniciativa que visa reduzir o nível de vulnerabilidade deste grupo social, cuja situação sócio-económica se tornou catastrófica, desde que os insurgentes invadiram as suas aldeias.

 

Lídia Tembo é uma das beneficiárias do projecto desenvolvido pela Fundação MASC (Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil) em parceria com o Sindicato Nacional de Empregadas Domésticas. Quis o destino que a rapariga de 20 anos de idade, natural da cidade de Pemba, capital provincial de Cabo Delgado, testemunhasse o terror causado pelos insurgentes.

 

Conta que, em 2018, ela, a cunhada e o irmão mudaram-se para o distrito de Muidumbe – um dos mais afectados pelos ataques terroristas – em virtude do irmão, professor, ter sido transferido para aquele distrito. Narra, no entanto, que a sua “estadia” naquele distrito durou pouco mais de 18 meses, pois, em princípios de 2020, a aldeia em que residiam foi atacada pelos terroristas.

 

À “Carta”, a jovem disse que no dia do ataque terrorista estava com a cunhada, sendo que o irmão se encontrava no serviço. À semelhança de todas as vítimas, Lídia e a cunhada fugiram para o mato, onde permaneceram durante 13 dias. Nesse período, revela, um boato espalhou-se no local do esconderijo, alegando que o corpo do irmão havia sido localizado. Porém, não passava de fake news. O irmão estava vivo, porém, ferido.

 

Após longos dias de calvário, Lídia e a família conseguiram chegar à cidade de Pemba, estando a residir, até ao momento, em casa da mãe. Entretanto, apesar de ter regressado às origens, a vida não lhe sorria como em Muidumbe, onde o pai da sua filha de quatro anos também estudava e dava alguma assistência à pequena. Aliás, devido à insurgência, perdeu os rastros do pai da sua primogénita, embora ouça que o mesmo ainda está vivo.

 

Assim, de modo a sustentar sua filha e ajudar nas despesas de casa, Lídia aderiu à formação promovida pela Fundação MASC, tendo aprendido a fazer correctamente a limpeza, a lavar e engomar roupa, assim como a cozinhar. Afirma ter sido uma formação oportuna, pois, a mesma deu-lhe uma oportunidade de emprego, estando, neste momento, a trabalhar na DAI Global, LLC, uma empresa privada norte-americana.

 

“O emprego mudou a minha vida porque tenho mais responsabilidades para com a minha filha e também a minha família”, sublinha a fonte.

 

Oportunidades de emprego podem manter várias famílias em Pemba, mesmo que a normalidade regresse nas zonas afectadas pelo terrorismo

 

Quem também viu sua vida mudar, desde que os insurgentes atacaram e destruíram sua terra natal, é Rabia Wazir Aly, de 37 anos de idade, que está em Pemba em busca de abrigo, segurança e condições de sobrevivência.

 

Rabia é natural da ilha de Rimba, uma das pequenas ilhas que formam o paradisíaco Arquipélago das Quirimbas. Conta que saiu daquela ilha em Outubro de 2020, após um ataque terrorista, protagonizado pelos insurgentes logo pela manhã. Narra que ela, seus cinco filhos, a irmã, o cunhado e os sobrinhos conseguiram escapar, tendo se refugiado numa outra ilha, antes de serem transportados de barco até à cidade de Pemba, um percurso que durou quase 24 horas.

 

Neste momento, reside numa casa arrendada, no bairro de Chibuabuara. As despesas de renda e de alimentação são pagas pelo irmão mais velho, que reside na vila-sede do distrito de Montepuez, também na província de Cabo Delgado.

 

Para não depender apenas do irmão, Rabia Aly juntou-se às outras mulheres e aceitou apreender como lavar e engomar certo tipo de roupa, assim como apreender a cozinhar. Descreve a formação como a melhor coisa que lhe aconteceu em Pemba, pois, com ela, sente-se em condições de poder trabalhar e se sustentar.

 

Aliás, Rabia Aly garante que, caso consiga trabalho, é provável que não regresse às suas origens, pois, sente-se segura em Pemba, faltando apenas condições de sobrevivência.

 

Fátima Tambo-Suali é outra jovem-mãe que está na terceira maior baía do mundo em busca de abrigo, segurança e oportunidades de sobrevivência. Ela é natural da vila-sede do distrito de Mocímboa Praia e conta que saiu daquele ponto do país em Agosto de 2020, após a tomada daquele ponto estratégico pelos terroristas.

 

Ainda chocada com o que viu, a jovem de 21 anos de idade não consegue, até agora, exteriorizar tudo que testemunhou na sua terra natal, apenas conta que, após a sua saída de Mocímboa da Praia, teve de passar um mês em casa de um familiar na vila-sede do distrito de Mueda, antes de chegar à cidade de Pemba, onde também reside em casa de um familiar no bairro de Natite.

 

Conta que chegou àquela formação, através do Secretário daquele bairro da cidade de Pemba, que a informou haver um curso para empregadas domésticas. Tal como as outras, Fátima diz ter sido uma formação proveitosa, pois apreendeu a fazer trabalhos de casa com profissionalismo.

 

Embora ainda não esteja empregada, a mesma refere estar pronta para o mercado de trabalho. Entretanto, questionada se está preparada para regressar a Mocímboa da Praia, caso o Governo anuncie haver condições de segurança e habitabilidade naquele ponto do país, Fátima disse não estar na sua mente, neste momento, apesar de estar feliz por saber que as tropas ruandesas recuperaram a sua terra natal.

 

“Estou feliz, mas ainda não acredito no que aconteceu. Não pensava que pudesse viver em Pemba durante um ano. O que vi em Mocímboa não me dá vontade de voltar tão já. Talvez depois de três ou quatro anos”, disse a fonte.

 

Cursos de corte e costura também na agenda

 

“Carta” conversou com a representante da Fundação MASC, na província de Cabo Delgado, Géssica Manjate, tendo dito que a iniciativa surgiu no âmbito das actividades que a organização vem desenvolvendo em todas as províncias em que está implantada e que a mesma visa reduzir o nível de vulnerabilidade das vítimas do terrorismo. Sublinhar, aliás, que há beneficiárias que narram episódios de humilhação por parte dos seus “novos” vizinhos, quando estas pedem ajuda.

 

Manjate conta que, no princípio, a sua organização desenvolvia trabalhos de cidadania (sobretudo no combate às uniões prematuras) junto dos deslocados, porém, sentiu a necessidade de implementar projectos que pudessem prover algum rendimento às vítimas do terrorismo. Foi nessa óptica que se juntou ao Sindicato Nacional de Empregadas Domésticas para desenvolver uma formação de 15 dias para 25 jovens e mulheres.

 

Segundo Manjate, das 25 beneficiárias, cinco já estão a trabalhar, sendo que, neste momento, decorrem actividades de monitoria, assim como de divulgação do trabalho realizado pela organização em prol daquele grupo. Explicou que os termos de referência do curso foram desenhados pelo Sindicato, incluindo o salário mínimo que deve ser pago às beneficiárias.

 

Porém, a fonte garante que a Fundação MASC irá também promover cursos de corte e costura, de modo a tornar aquelas mulheres empreendedoras, tendo em conta as dificuldades que se verificam no acesso ao mercado de trabalho. Assegura já ter sido identificado o parceiro, sendo que, neste momento, decorre o estudo de viabilidade.

 

Refira-se que mais de 800 mil pessoas se encontram deslocadas, devido aos ataques terroristas, sendo que na sua maioria são provenientes dos distritos de Mocímboa da Praia, Macomia, Muidumbe, Quissanga e Palma. Grande parte das famílias continua a passar necessidades, dependendo de pessoas de boa-vontade e de pequenos negócios para se alimentar. (A. Maolela)

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