O último “draft” da Lei do Conteúdo Nacional, datado de Setembro de 2018 e guardado a sete chaves num cacifo do Ministério de Economia e Finanças (MEF), considera como bens com conteúdo nacional “os produzidos com um percentual não inferior a 10% de incorporação de factores de produção nacional”. A proposta define como serviços com conteúdo nacional os que são realizados por pessoas singulares e/ou colectivas nacionais estabelecidas sob as leis moçambicanas e que operam em território nacional.
Em suma, “conteúdo nacional” é definido como sendo “a porção dos factores de produção nacionais aplicados na produção de um determinado bem ou prestação de serviço, ou participação dos moçambicanos na estrutura accionista dos empreendimentos”. Sobre essa “participação dos moçambicanos”, a mesma proposta refere que “trata-se da subscrição até 15% no capital social dos empreendimentos, através de sociedades comerciais a serem criadas entre empresas estrangeiras e pessoas singulares ou colectivas privadas moçambicanas”.
Para garantir o “conteúdo nacional”, os processos de procurement das empresas abrangidas pela proposta de lei serão rígidos. “Todo o fornecimento de bens e serviços será efectuado por via de concurso (...). Excepcionalmente, será aceite ajuste directo apenas para o fornecimento de bens e serviços que exijam ou requeiram o uso de tecnologia, patentes, mão-de-obra especializada e outros requisitos especiais devidamente comprovados, que não estejam disponíveis em território nacional”.
A avaliação do “conteúdo nacional” terá primazia na aferição das propostas de fornecimento de bens ou serviços, ou seja, cada proposta é avaliada, primeiro, em relação à sua capacidade de resposta aos requisitos de conteúdo nacional e, em seguida, aos outros critérios de avaliação”. Para além de outros requisitos exigidos pelos empreendimentos contratantes, as propostas devem conter a seguinte informação: a origem do bem ou serviço a ser adquirido, acompanhado do certificado emitido pela entidade competente nos termos da presente Lei; o número de moçambicanos e estrangeiros que o fornecedor proponente emprega em Moçambique e o número mínimo de cidadãos moçambicanos que o fornecedor proponente irá empregar.
Plano de Conteúdo Nacional
O “draft” da proposta traz o conceito de Plano de Conteúdo Nacional, um arranjo obrigatório para todos os empreendimentos que operam em território nacional, os quais deverão elaborar, anualmente, um Plano (de Conteúdo Nacional) com a especificação das acções e estratégias a serem desenvolvidas no ano seguinte”.
Para além desse plano de periodicidade anual, segundo a cláusula seguinte, os empreendimentos contratantes devem conceber e adoptar um Plano de Longo Prazo concebido para um período de 5 anos. O Plano de Conteúdo Nacional é obrigado a conter os seguintes elementos: previsão de bens e serviços a contratar, recrutamento de mão-de-obra local; formação, capacitação, transferência de conhecimentos e competências para os trabalhadores moçambicanos e acções/programas de capacitação e desenvolvimento de fornecedores locais.
Entidade de fiscalização
A fiscalização das normas de Conteúdo Nacional previstas na proposta de Lei será da competência de uma instituição a ser criada pelo Conselho de Ministros. A mesma instituição terá a responsabilidade de divulgar oportunidades de fornecimento de bens e serviços de Conteúdo Nacional, acompanhar a implementação das políticas [de conteúdo nacional], incluindo as sectoriais, fiscalizar o cumprimento das normas relativas ao fornecimento de bens e serviços [de conteúdo nacional], etc. A entidade terá igualmente a tarefa de elaborar um relatório de Balanço Anual sobre o grau de implementação [do conteúdo nacional] pelos diferentes empreendimentos. Assim, caberia à mesma instituição atestar o percentual [de conteúdo nacional], em conformidade com os critérios e procedimentos a regulamentar pelo Conselho de Ministros.
Proposta na gaveta
Apesar do documento estar quase pronto, o Governo não se mostra com vontade de aprová-lo. A Lei de Conteúdo Nacional está em debate há mais de 11 anos, embora na fundamentação da proposta sua relevância é destacada pelo facto de “a economia moçambicana registar, nos últimos anos, um crescimento acelerado, com destaque para a indústria extractiva, devido a novas descobertas e ao incremento da exploração de recursos naturais”. Na mesma fundamentação, o Governo diz que “a lei é vista como necessária para fomentar a utilização de bens e serviços produzidos internamente, com incorporação de factores de produção nacionais, designadamente capital, matérias-primas e mão-de-obra”, acrescentando que o presente preceituado visa “estabelecer normas a observar no fornecimento de bens e serviços produzidos ou prestados pelo empresariado nacional ou com a sua participação a empreendimentos que operam em território nacional, como forma de promover o seu desenvolvimento”. (Carta)