Corria um dos anos da segunda metade da década noventa do séc. XX. O Professor Severino Ngoenha - com ar de um futuro preocupante - irrompe o anfiteatro com um jornal na mão. Era um dos semanários da praça. Ele vinha da UEM pela Julius Nyerere. No trajecto passou pela embaixada da China (em construção) e pela então agência do Banco Fomento, actual BCI (em remodelação). No caminho ainda cruzou com as sonoras sirenes de comitivas dos órgãos de soberania.
O jornal, a imponente embaixada da China (em construção), a agência do banco português (em remodelação) e as barulhentas sirenes dos órgãos de soberania foram motivos para o início de mais uma palestra. Na verdade uma viagem ao temp(l)o do conhecimento.
Depois de certificar a presença de todos os passageiros o Professor, na verdade o Piloto, projecta o jornal para a secretária de forma a deixar o título visível aos olhos de todos. Em seguida pergunta aos passageiros - ávidos de conhecimentos – se tinham lido. A resposta foi um harmónico Não! Depois pergunta - e para reflexão - se os passageiros notaram algo de interesse nas construções da embaixada chinesa e do banco português. Idem: Não! E por fim, pergunta se tinham ouvido as sirenes do poder. Ibidem: Não!
Óptimo. Nada melhor que decolar ciente que todos estão na mesma classe (económica) da aeronave. Penso que assim cogitou o Professor-piloto. Em diante a turma embarcou para séculos anteriores - com escalas técnicas no séc. XV, XVIII e XIX - e, na volta, uma passagem - em voo rasante - pelo século XX, na altura, aterrando tempos depois no séc. XXI. Foram quase duas horas de uma alucinante viagem ao passado, presente e futuro. Depois da praxe habitual de despedida, o piloto deixa a sala de desembarque sob o olhar vertiginoso dos seus passageiros. Estes, depois de recuperados, tentam juntar as pontas que cada um foi segurando ao longo da viajem antecipada ao séc. XXI.
Para começar, as pontas sobre os motivos da viagem: um título do Jornal (arrisco o “Demos”) que dizia: “Parece Sina: Os portugueses de 500 em 500 anos descobrem Moçambique”. Isto porque na altura começava a registar a entrada massiva de portugueses (e para alguns o regresso). E, historicamente, onde chegam portugueses, outras nacionalidades - tal hienas - se abeiram para colmatarem as fragilidades caninas dos lusos.
O segundo motivo foi a observação feita pelo Professor-piloto sobre as duas obras. Na primeira obra (chinesa) anotou que viu chineses no chão a ordenarem aos moçambicanos que estavam nos andaimes. O mesmo na segunda obra (portuguesa). O terceiro motivo – sobre as sonoras sirenes do poder – a sinalização das benesses do poder. Os passageiros complementaram com outros exemplos de outros sectores, em particular estratégicos, e de outras situações, que não diferenciava ou assim tendia.
E para reflectir, as pontas sobre o destino da viagem: A necessidade do país definir e operacionalizar o que pretende ser nos próximos tempos dentro do quadro e desafios da globalização, onde, por um lado, estão os globalizadores, e por outro, os globalizados. E, para concluir, as pontas sobre as lições e aprendizagem da viagem: Na verdade - entendo agora - quando o Professor-piloto largou os seus passageiros no séc. XXI queria que eles soubessem, se nada fosse feito, a realidade do país duas décadas depois, partindo da data da palestra/viagem.
Hoje, duas décadas depois, quem passe pelas obras que pululam em Maputo e pelo país fora - e pegando como referencial a China e Portugal - vê chineses e portugueses no chão (base) a direccionarem o que deve ser feito e, nos andaimes (topo), outros chineses e portugueses a executarem as orientações. Os demais – com responsabilidades na edificação do país – estavam distraídos – a todos os níveis - na discussão sobre os direitos da poluição sonora.
Foi esta uma parte da realidade encontrada pelos passageiros da viagem antecipada ao séc. XXI: A economia e as finanças tomadas por alienígenas e os indígenas aos empurrões à caça do que ainda sobrava (e também dependente) - o controle do barulhento “tacho político”.
E sempre que o espaço do “tacho político” escasseia – porque, entre outros, a fila é cada vez enorme - alargam-no, ampliando a e(x)terna dependência de alienígenas.
PS (i): Quando a China decidiu construir no país a sua imponente embaixada foi um sinal claro que no séc. XXI Moçambique seria uma infinita prioridade. Quem passe pela Av. Marginal não lhe passa despercebido a imponente embaixada dos gingos (americanos) em construção. A História ensina – e exemplo local não falta - que quem constrói uma embaixada daquela dimensão é um sinal que por estes lados tão já não removerá o pé.
PS (ii): Perante estes e outros factos tão evidentes o país não se movimenta para arredar o pé do pedal de travão. Não se explica que se continue a desperdiçar o tempo a discutir a terminologia da paz que se segue e as condições para a ocupação de cargos. Desde os cargos do topo à base – dos mais sonoros e com carga apetitosa aos de menor sonoridade e apetência – e todos vitais na distribuição de benesses. E, infelizmente – para agravar – tais benesses são provenientes e no limite dos que fazem o business (e estes de certeza que não são os lobistas /prostitutos de negócio referidos pelo Presidente da República na recente visita à Portugal).
Chegam-nos notícias segundo as quais, nos próximos 25 anos, nenhum presidente daqui da zona concederá uma entrevista à Ere-Dê-Pê e à Ere-Tê-Pê da Tuga. Tudo por causa de duas senhoras das estações televisiva e radiofónica da Tugalândia que tentaram engasgar o presidente durante uma entrevista na semana passada. Esta decisão foi tornada pública pelo capitão da seleção nacional dos bajuladores, vulgo Gê-40, nas redes sociais.
Na Tuga, a notícia foi recebida como um autêntico tsunami. Informações em nosso poder dão conta que os tugueses estão em pânico geral. A bandeira está à meia-haste. É luto nacional. É uma catástrofe de grandes proporções. Tuga não pode (sobre)viver social, política e economicamente se os seus repórteres não tiverem acesso aos estadistas daqui da zona. Isso é catastrófico! Se se concretizar, Tuga corre risco de ser banido da União Europeia e das Nações Unidas e poderá estar isolado do resto do mundo.
Não entrevistar um presidente daqui da zona durante um ano já é trágico demais, imagina então durante 25 anos! É calamitoso, funesto, cataclísmico, desastroso, sinistro e outros tantos adjectivos pessimamente dramáticos que a humanidade já inventou. Não é por acaso que analistas entrevistados pelo nosso repórter falam do "fim da Tugalandia!". Alguns cidadãos já estão a fugir da Tuga para países vizinhos. Não entrevistar um presidente daqui da zona é a pior sanção que uma empresa jornalística do mundo pode ser imposta. É como se um asteróide tivesse caído sobre o teto da redação.
Os efeitos desta medida estão a criar um caos sem precedentes em toda a Europa e no mundo. A queda do presidente Marcelo é eminente. O exército está a caminho de Belém para o esperado golpe. O vinho do Porto caiu na bolsa de valores. A FIFA vai retirar todas as Bolas de Ouro de Cristiano Ronaldo. O Secretário-Geral das Nações Unidas, Guterres, vai se demitir. Todos os livros que o jornalista da Ere-Tê-Pê, Dos Santos, vendeu serão devolvidos e os clientes serão ressarcidos. O Vaticano vai "des-santificar" as aparições da Nossa Senhora de Fátima. O Sumo Pontífice considera que a pena é bastante severa para um país como aquele que depende inteiramente daqui da zona em todos aspectos. Tocova terá enviado uma carta ao presidente pedindo que ele reconsiderasse a decisão. Hoje haverá uma vigília de orações em latim na Basílica de São Pedro, com os dois Papas vivos e a respectiva Cúria Romana orando por Tuga. Nos próximos dias o povo tuguês vai marchar contra esta medida catastrófica. A imprensa mundial só fala disso. Praticamente, é o fim do mundo.
Espera-se que as duas jornalistas que matrecaram o presidente sejam julgadas e condenadas à prisão perpétua. Aquelas são perguntas!?! Imagina se o prensidente tivesse morrido por "asfixia-argumentativa"!? Mesmo repetindo "ene-vezes" que era presidente da zona não o pouparam. Cada abuso tem seu preço.
O sindicato dos bajus diz que aquilo foi tentativa de assassinato em "Três-Dê", associação criminosa para delinquir e formação de quadrilha. Um crime fosforicamente premeditado. Tentaram "killar" o presidente daqui da zona com recurso a perguntas. Um golpe de estado em conluio com o Matias e o seu chefe Veloso. Mais tarde, esses dois poderão responder em sede de tribunal daqui da zona por criação de interrogatórios ilícitos, branqueamento de questinários e tráfico de perguntas perigosas para o exterior.
Sem querer ser apriorístico - mas já sendo - o Gê-40 deve estar a pensar seriamente em criar a sua própria Ere-Tê-Pê, onde o entrevistado será recebido com leques de pluma de ganso criado em cativeiro, paninhos de linho quentes e perfumados, massagem tailandesa, sauna a vapor e ainda com direito de ser o próprio convidado a fazer as perguntas e a responder sozinho. O estudio também terá à disposição um Historiador para estudar se as perguntas já foram feitas na antiguidade ou durante a luta de libertação nacional, um Fisico para estudar a velocidade, a potência e a intensidade de cada pergunta, e um papagaio, não se sabe para quê.
Portanto, que fique bem claro, aqueles lá podem sumir do mapa, se os seus jornalistas não entrevistarem o presidente daqui da nossa zona. Presidente desta zona não é um "qualquer".
Mais desenvolvimentos com o nosso repórter posicionado num lugar chamado zona, atrás do Fundo-do-Poço, nos próximos serviços noticiosos.
- Co'licença!
- Sobre as dívidas ocultas:
FILIPE NYUSI: Olha, os moçambicanos querem saber o esclarecimento como foi feita a divida e quem é o responsável. O governo de Moçambique está mais interessado do que vocês, e eu sou o presidente do governo de Moçambique, e obrigado.
JORNALISTA: Mas, o senhor presidente...
FILIPE NYUSI: Quer dizer que sou o presidente do governo interessado.
JORNALISTA: Mas, o senhor presidente também fez parte do governo que contraiu as dívidas...
FILIPE NYUSI: Se é isso é tanta gente que fez parte. O meu povo fez parte do povo governado pelo governo que contraiu as dívidas.
JORNALISTA: As três empresas que contraíram estas dívidas estavam sob a sua tutela?
FILIPE NYUSI: Um... Um ministério da defesa não é dono de empresas... Não tutela... Não sei para que é que força e forja de informações que podem confundir a atenção das pessoas... Não sei...
JORNALISTA: Não estamos a forjar informações, estamos a fazer perguntas...
FILIPE NYUSI: Não pode, não pode... As pessoas já sabem... Essas vossas perguntas são especulativas.
JORNALISTA: Não são especulativas! São perguntas que os moçambicanos querem respostas...
FILIPE NYUSI: Que moçambicanos?! Estou a dizer que esse meu discurso... Que moçambicanos?! A pergunta foi feita por um jornal Canal cujo dono vive aqui em Portugal... Sei... Estou a dizer isso porque sei... É um amigo até meu... Para dizer que eu sou presidente da República de Moçambique e como presidente da República de Moçambique tenho mais interesse em saber como o dinheiro foi gasto e qual é a responsabilidade. Eu sou o presidente acabou a resposta está ali... Agora, vai procurar outras coisas se é isto se é aquilo... Não sei o quê... Vai forjar para você ouvir aquilo ou para atingir... Não precisa de atingir. A justiça é feita por juízes.
JORNALISTA: Estamos a referir que não estamos a forjar, estamos apenas a perguntar, senhor presidente, gostaríamos de saber e os moçambicanos gostariam de saber se, enquanto ministro da defesa, assinou algum contrato dessas três empresas.
FILIPE NYUSI: Olha, estamos a dizer o seguinte: as empresas quando são criadas em Moçambique são privadas, neste caso são ou... podem entrar com o Estado, mas, ou etecetera, etecetera, mas privada tem uma gestão autónoma... Tá bom, obrigado! Mas o ministro... Eu como ministro nunca assinei nenhum cheque na minha vida. Nunca! A clareza como as coisas funcionam e muita gente sabe e não é diferente de Moçambique."
- Sobre Manuel Chang:
FILIPE NYUSI: O partido conhece os seus estatutos.
JORNALISTA: E os restantes arguidos deste processo também terão algum processo porque... os que pertencem a FRELIMO terão alguma investigação do próprio partido?
FILIPE NYUSI: Mas seria bom que eu deixasse... Porquê vocês querem levar esse problema para a FRELIMO? E não deixam que seja um problema criminal? Conhecem todos que estão lá que são da FRELIMO, ou são da RENAMO ou são do Eme-Dê-Eme? Porquê vamos misturar crime com política? Até há uma orientação do vosso lado?... Nesse sentido?
JORNALISTA: O arguido mais conhecido é ex-ministro das Finanças.
FILIPE NYUSI: Então fez essa pergunta, respondi. Há estatutos da FRELIMO são respeitados pela FRELIMO e a FRELIMO tem seus estatutos... Há-de usar.
O tio Gulamo já me tinha falado de debates apriorísticos, mas entrevista, nunca.
- Co'licença!
Em Lisboa, o PR Filipe Nyusi admitiu que existem “lobistas” dentro no nosso espectro político-económico e que isso era normal (“profissional”) pois nem todos os empresários conseguem fazer tudo. Alguns não conseguem tratar determinados expedientes (uma carta de condução ou uma licença) e vai daí surgir o “lobista” que, com o seu talento, consegue fazer andar a engrenagem.
Eis o Presidente Nyusi noutra enroscada conceitual!
Ele admite que existem “lobistas”. Certo! Mas falha redondamente quando tenta descrever o perfil do “lobista”, confundindo-o com um simples tarefeiro. Pois aqui é que está o problema. O tarefeiro é um prestador de serviços. E isso é legal. Em Moçambique, há centenas de pequenas empresas criadas para prestar os serviços que o PR atribui ao “lobista”. Por exemplo, o tratamento de vistos ou a renovação do BI e do DIRE. Na actual crise dos BIs e passaportes, a que ninguém consegue pôr cobro, são dezenas de tarefeiros que nos contactam todos os dias pedindo-nos para investigar o que é que se passa.
Estes não são “lobistas”, senhor Presidente. Estes são faxineiros que procuram ganhar a vida na tramitação de documentos dentro dos procedimentos normais da administração pública.
Já o “lobista” é uma figura mais sofisticada (e quase sinistra) e que procura ganhos astronómicos através do tráfico de influências e isso ainda não está legislado em Moçambique. Teófilo Nhangumele é o protótipo de um “lobista” por excelência. Conseguiu convencer todo um Estado a comprar um projecto legítimo de segurança costeira. Traficando influências, ele ganhou o seu quinhão.
O nosso “lobista”, senhor Presidente, usa colarinho branco. Geralmente é filho de dirigente ou membro do SISE. Nos tempos de Armando Guebuza na Ponta Vermelha, eram tantos os “lobistas” que cobravam 10 mil USD para facilitarem encontros entre investidores estrangeiros e o dito-cujo. Eram os “lobistas” sangue-sugas. Sentavam-se no Polana com a missão de estabelecer pontes entre quem vinha de fora à procura de uma oportunidade e o poder político local, num contexto, pois, de ambiente de negócios demasiado dependente das traficâncias de influências ao mais alto nível.
E houve quem conseguiu se endinheirar nesse desiderato. Durante o guebuzismo, nossos “lobistas” até chegaram a ir ao Brasil tentar vender negócios à Vale em nome do guebuzismo mesmo que Guebuza não soubesse disso. Hoje, uns são seus ministros senhor Presidente!
O “lobista” em Moçambique não é uma figura normal para o ambiente de negócios. Porque ele interfere no procurement público. Nosso “lobista” paga suborno para conseguir ganhar um concurso e isso não é saudável. O que se passa com os BIs e passaportes decorre mesmo disso. Ao invés de uma adjudicação transparente, o processo decisório na contratação do novo provedor foi de acordo com a voz do “lobista”. E é o que se vê.
Mas o que fazer? O “lobista” usa a Frelimo para conseguir vingar. Aliás, nos últimos anos eles perceberam que ter a Frelimo no bolso era uma carta-branca para o sucesso. Por isso, em processos eleitorais internos na Frelimo, haverá sempre “lobistas” a investirem rios de dinheiro na compra da consciência dos militantes. E depois investem também fortemente nas campanhas eleitorais. A sua anterior campanha, caro Presidente, foi prova disso: havia uma grande competição entre “lobistas” para pagarem as suas despesas de campanha. E houve rios de dinheiro gastos nessa empreitada.
Em Lisboa, ao mencionar o facto de termos “lobistas”, o Presidente fez muito bem. Pelo menos agora muitos vão poder falar do assunto e é provável que se abra um debate na sociedade. Porque há muita gente que vive do “lobby” mas a actividade não é claramente legal. Alguns trazem negócios e ganham o seu “sucess fee” mas será que pagam impostos? Outros trazem negócios, como o Mateus Zimba, ganham as suas “comissões” e acabam nas malhas da corrupção, mesmo que o Estado não tenha sido lesado. Precisamos mesmo de um debate aberto sobre o que é isso de “lobby” em Moçambique e como é que a actividade pode ser legalizada a bem da transparência nos negócios. Mas nada de confundir “lobistas” com tarefeiros!
Em tempos li num texto - sobre a amizade – que um certo amigo disse ao outro que sempre que puder: abrace, telefone e convide. Abrace porque o abraço é a democracia do afecto. Telefone porque telefonar – nem que seja para dizer que está vivo – demonstra quanto a sua existência pode ser importante para os outros. Convide, porque convidar é o exercício da partilha. E partilhar não é o mesmo que dividir. É fazer dono de uma coisa vários.
Ainda o texto e citando um trecho: “Se eu tivesse ouvido esse amigo, talvez hoje pudéssemos sair, tomar uns copos, falar sobre coisas e a vida. Mas a verdade é que nesse momento ele deve estar em algum lugar do planeta a dizer o que pensa a alguém que mereça a sua companhia muito mais do que eu. Não sei se o perdi: Mas será que um dia voltarei a encontrá-lo?”
E se eu tivesse seguido à risca estes ensinamentos talvez não tivesse necessidade de contar o que abaixo e em breves linhas partilho. E faça-o na esperança de que cada um assuma a sua quota-parte de responsabilidades no que lhe disser respeito.
“Em África cada velho que morre, é uma biblioteca que arde!”. Este é um ditado notável e célebre do historiador africano, Hampâté Bâ, que ficou historicamente lavrado e lacrado de forma indelével. Imagine um dia amanhecer com o Arquivo Histórico de Moçambique em cinzas. Ou suponha que furtem o seu laptop que até então guardava todo o seu arquivo audiovisual entre outra e diversa informação relevante, incluindo a sua tese de doutoramento por submeter na noite do dia em que o larápio achou por bem e dolo que o laptop – por arrasto o conteúdo - não lhe pertencia.
O que lhe veio a cabeça é mais ou menos o meu caso por estes dias depois que o ditado de Hampâté Bâ bateu - no último sábado - uma porta muito próxima que é também minha. E numa semana bati mais vezes a porta da “Biblioteca” ardida - do que em décadas. No quintal, à sombra do limoeiro, logo à entrada, tenho tido dias - na mente - de intensas saudades do acervo oral – que sempre esteve disponível – e de que não me dei tempo para a devida consulta. Infelizmente, não estou sozinho.
Hoje reconheço que se eu tivesse escutado Hampâté Bâ teria visitado mais vezes a “Biblioteca” que se foi e com papel e caneta. E teria muito mais para partilhar, tornado as vastas prateleiras do seu acervo em património democrático de todos.
Infelizmente, por mais que cada um tenha ou compre mais tempo, não existirá tempo nenhum para a partilha do que ficou por absorver das “bibliotecas” africanas por conta de afazeres que se revestem - a partida - de importantíssimos e inadiáveis, deixando – a posterior - que a despedida seja de lamentação e não de celebração.
Contudo, acredito que reste uma réstia de consciência suficiente e perturbante e que a partir deste momento cada um - observando as devidas as excepções - possa iniciar e manter, a prazo infinito, um roteiro de visitas às respectivas “Bibliotecas”. A fórmula é simples: Abrace, telefone e convide sempre!
Não adie, ligue agora! Evite que o seu telefone toque primeiro e de outro lado da linha, uma voz trémula, fale que a “Biblioteca” – que teimas em visitar - ardeu. E no final da chamada, a voz tremente e já aos prantos, ainda revele: Na noite passada (a “Biblioteca”) perguntou por ti várias vezes.
Saravá “Bibliotecas” Africanas!
PS (i): Na passada segunda-feira, disse a adeus a uma “Biblioteca” da família e de amigos, em particular os do Bairro 25 de Junho (Chopal). Na despedia do Tio Dias (a biblioteca que partiu) – um homem de elevada cultura de cidadania - lembrei-me de um dia, em 2013/14, ele ter questionado a prioridade governamental em instalar uma linha o Metro de superfície como uma das soluções na ligação entre os municípios de Maputo e Matola. Com certa perplexidade perguntou a quem lhe ouvia – um deles era eu - se no Metro i) as Mamanas entrariam com a trouxa dos seus negócios, ii) se o Jovem entraria com o saco de cimento e a chapa de zinco, e iii) se os sacos das compras do mercado teriam espaço. Estes são apenas alguns dos exemplos. E como prioridade, no lugar do Metro, ele recomendou que se investisse num transporte misto de passageiros e carga. E pelo que me consta, cinco/seis anos depois, este tipo de transporte foi equacionado como prioridade pela recente criada Agência Metropolitana de Transportes de Maputo e já existem passos concretos dados. Para mim, concretizado o projecto do transporte misto, este será o “Tio Dias”, seja qual for o nome oficial ou informal. Saravá, Tio Dias!
A Cê-Ene-É já fez a sua parte e os resultados estão aí para quem quer ver. O recenseamento eleitoral foi consentâneo com os estatutos do nosso partido. Em alguns círculos eleitorais até os mortos recensearam, noutros, nem os ainda-viventes foram abrangidos. Em Cabo Delgado parece que os insurgentes trabalharam como agentes de mobilização. O processo foi calculado rumo a vitória retumbante, esmagadora, asfixiante e qualquerizante.
O sheik fez a sua parte, mas, agora que os outros já começaram a eleger os seus cabeças-de-lista, estamos a notar que não basta. Os esforços do sheik Abdul não são suficientes. É arriscado. Vai que os mortos decidam não nos votar!
Então vamos às eliminatórias antecipadas. Já há uma ideia aqui: eliminar os candidatos que não falam todas as línguas da província a que concorrem a governador. A ideia seria, por exemplo, invalidar a candidatura de Mano Mané - que concorre a governador da Zambézia - por este falar somente a língua Echuwabo, de tantas que são faladas na província. Do tipo, o candidato da Zambézia deve ter proficiência em Elomwe, Emakwa, Chi-cena, etecetera; o de Tete, em Chi-nyungwe, Chi-senga, Chi-nyanja, Chi-shona, etecetera; e por aí em diante. A lei pode ser abrangente àqueles que não sabem dançar as danças da província. O proponente chamou isso de "localismo linguístico e cultural". Procurando bem na constituição, na lei eleitoral, na lei de terras, na lei do trabalho, ou mesmo na lei da família, podemos encontrar algo que fundamente esse termo.
Para o caso de Muchanga, podíamos alegar, por exemplo, que ele não pode concorrer porque tem medo de blindados das forças de defesa e segurança. Do tipo, um indivíduo que tem medo de ser guarnecido e escoltado por blindados e tanques de guerra não pode ser governador. Gajos que sofrem de "securityfobia" são impedidos de concorrer por lei. E íamos alicerçar isso numa lei qualquer por aí... Lei é o que não falta neste país.
Mais adiante podíamos eliminar os cabeças-de-lista que não fizeram o ensino primário na província ou aqueles cujos sogros não são originários da província a que o genro ou nora concorre ou coisas do género.
Estamos a colher mais contribuições. Há que ajudar o sheik nesta empreitada. É que, normalmente, quem ajudava o sheik era o presidente do Cê-Cê, aquele que acabou abandonando o projecto depois que foi buscar a sua consciência no "car-wash" onde estava em lavagem e lubrificação há mais de meia-década. Era uma grande dupla. Por isso, estamos a colher ideias para ajudarmos os magistrados do Cê-Cê a removerem os obstáculos antecipadamente, como o antigo juiz-presidente sabiamente fazia com exímia mestria.
Que venham mais ideias!
- Co'licença!