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Carta da Semana

Carta da Semana

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 Ao segundo segundo dia de paralisação geral, manifestações e confrontos entre populares e as unidades de Intervenção Rápida (UIR) e de protecção da Polícia da República de Moçambique - Maputo, Matola e outras cidades capitais do país sofreram um apagão no serviço de internet móvel. O apagão ocorreu ao princípio da tarde de ontem, sexta-feira (25), e prevaleceu para além das primeiras horas de hoje, sábado, no fecho desta edição. O serviço foi restabelecido ao nascer de um tímido sol desta esta manhã. Subitamente. Tal qual foi desligado, por ordem política.

 

A internet foi "desligada" por volta das 12 horas de sexta-feira. Na ausência de uma explicação oficial, ''Carta'' foi à procura das  razões por detrás do sucedido. Especula-se que o desligamento visa evitar a viralização dos vídeos das manifestações e bloquear a mobilização via Whatsapp e Facebook para a escalada de desobediência civil em protesto aos resultados que dão vitória absoluta à Frelimo e Daniel Chapo nas eleições de 9 de Outubro.

 

Duas razões técnicas furadas

 

Fontes do sector avançaram três narrativas explicativas do que realmente aconteceu. Duas se sustentam em razões técnicas, bastante especulativas por sinal. E uma, a verdadeira afinal, é de ordem política.

 

Fonte ligada à Tmcel alegou que o tráfego intenso de dados, ao longo dos últimos dias, congestionou a rede de internet nas três operadoras de telefonia móvel do país, Tmcel, Vodacom e Movitel, resultando em queda por sobrecarga do serviço. Tese lacónica.

 

Outra fonte por nós ouvida apresentou-nos uma razão, no mínimo, peregrina. Explicou-nos que o apagão na internet móvel pode ter origem na desintegração do satélite Intelsat 33e na sua órbita órbita em torno da Terra, afectando o serviço de satélites em todo o mundo.

 

Concebido pela Boeing e denominado Intelsat 33e ou IS-33e, o satélite perdeu energia a 19 de outubro devido a uma “anomalia”, afectando utilizadores em toda a Europa, África Central, Médio Oriente, Ásia e Austrália.

 

Na segunda-feira, dia 21, a Intelsat comunicou que a anomalia divulgada a 19 de outubro resultou na perda total do satélite Intelsat 33e, que só tinha oito anos em órbita geostacionária.

 

Tal coincidiu com o primeiro dia da paralisação geral convocada pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane em Moçambique, em protesto contra resultados eleitorais que considera fraudulentos e agravado pelo assassinato de seu advogado e do mandatário do PODEMOS.

 

O IS-33e era um satélite de comunicações geoestacionário. Estes satélites são amplamente utilizados para serviços de telefonia, internet e comunicação móvel e para a transmissão de sinais de televisão e rádio.

 

Voz de comando político

 

Uma investigação básica permitiu-nos fazer a crítica desta razão técnica e apurar que se trata de uma teoria furada. Os serviços de internet móvel no país são sustentados por cabos submarinos de fibra óptica do grupo Seacom, da  East African Submarine Cable System (Eassy) e da 2Africa. O único serviço público de internet via satélite no país é da Starlink de Elon Musk, e está a funcionar com alta fiabilidade.

 

A terceira explicação para o desligamento da internet móvel é política. Foi, precisamente, uma ordem política de alto nível que provocou o apagão à internet móvel. Seguiu-se escrupulosamente, dizem as nossas fontes, o protocolo de comando vertical estabelecido para estes casos: o Serviço de Inteligência e Segurança do Estado (SISE) enviou um Memo com instruções claras ao Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique (INCM) - Autoridade Reguladora dos Sectores Postal e de Telecomunicações, de mandar desligar; e o INCM instrui às operadoras, que de imediato cortaram o serviço.

 

Uma fonte em uma das operadoras confirmou que, taxativamente, as companhias de telefonia celular desligaram a netmóvel, cumprindo uma voz de comando. O que confirma a tese de mão política.

 

A mesma fonte adiantou que o serviço seria restabelecido a qualquer momento. Sem qualquer aviso prévio. Quando as autoridades estiverem seguras de que os focos de confrontação urbana nas principais urbes do país se extinguiram. E foi o que ocorreu, nas primeiras horas do amanhecer de hoje.

 

Bloqueio de internet como estratégia política

 

Nos últimos dias, o candidato presidencial Venâncio Mondlane tem feito mobilizações à paralisação geral via transmissões ao vivo na internet, ignorando e superando as audiências de canais de televisão ao atingir a centena de milhares de visualizações, com réplicas nas redes sociais e em canais do YouTube.

 

Cidadãos comuns e repórteres têm divulgado ao vivo as manifestações e confrontos entre protestantes e a UIR e a polícia de protecção, com bloqueio de estradas de acesso a e dentro das principais cidades. Esses vídeos circulam por plataformas como o WhatsApp, alarmando o mundo e inflamando novas franjas de protestos pelo país.

 

O bloqueio de internet como estratégia política pretende conter esta onda. O conceito de bloqueio da internet (internet shutdown, em inglês) foi desenvolvido em 2016 por um conjunto de pessoas interessadas, entre formuladores de políticas públicas, activistas, sociedade civil, técnicos. Fizeram-no durante a RightsCon, uma conferência pelos direitos humanos na internet realizada em Bruxelas (Bélgica).

 

O fenómeno é caracterizado pela interrupção voluntária da internet e meios de comunicação eletrónicos para uma população específica ou um território, tornando-os inacessíveis ou inoperantes. Pode ser marcado, também, pela suspensão de redes sociais e, geralmente, tem a intenção de controlar o fluxo de informações, ao limitar a capacidade das pessoas de se organizarem e se expressarem, seja ''online'' ou ''offline''.

 

Em geral, as narrativas oficiais justificam-no com a prevenção da partilha de ''fake news'', desinformação e discursos de ódio, segurança nacional. Todavia, esses argumentos mascaram as verdadeiras motivações que, na maioria das vezes, têm cunho político e repressor, em situações de instabilidade política e desordem pública. (Carta da Semana)

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Os suspeitos do costume voltaram a dominar as eleições gerais em Moçambique. Em primeiro lugar, a abstenção,  a beirar os 60 por cento; em segundo, a tinta indelével da fraude, qualificada pelo Director do Centro de Integridade Pública (CIP) e presidente do consórcio nacional de observação eleitoral ''Mais Integridade'' como magia que ocorre da noite para o dia; e, resultado final, a Frelimo e seu candidato presidencial Daniel Chapo são os virtuais vencedores, com maioria qualificada que lhes confere poder executivo e parlamentar absoluto na legislatura 2025 - 2029.

 

O repórter e redactor da ''Carta de Moçambique'', Abílio Maolela, compulsou os editais de apuramento intermédio das 11 províncias do país (incluindo Maputo-Cidade). Bravado, o coordenador da edição diária da ''Carta'' aplicou uma visão de túnel sobre o substantivo feminino abstenção, esse (não) ser intocável pela mão humana; imanipulável pela inteligência artificial; insípido ao palato humano todavia demolidor como um soco do ''smoking'' Joe Frazier, no estômago de um sonhador e pacato cidadão; e invisível a olho nu mas capturável pela ''lupa'' de uma máquina calculadora.

 

Nao foi um agradável passeio no parque da aritmética e estatística, pois os dados que Maolela apurou derrubam todas as narrativas optimistas e sonhos  de uma votação massiva.

 

As sétimas eleições gerais (presidenciais e legislativas) e quartas das assembleias provinciais (incluindo dos governadores), realizadas na quarta-feira, 9 de Outubro, foram ensombradas pelo elevado índice de abstenção. Mais uma vez!

 

Mai de mais de nove milhões e 500 mil (9.549.879) eleitores não foram às urnas escolher o novo Presidente da República. Tal se traduz numa maioria de 56,74% do total de cidadãos eleitores inscritos em todo o território nacional, acima de dezasseis milhões e oitocentas mil pessoas (16.829.847).

 

Vale lembrar que os órgãos eleitorais recensearam, para estas eleições, um total de 17.163.686 eleitores, 333.839 deles inscritos no estrangeiro.

 

O vento sopra do Norte

 

Na província de Maputo, os editais do apuramento provincial denunciam que mais de dois milhões de eleitores (2.338.886) não foram votar. O maior círculo eleitoral do país recenseou um total de 3 milhões e 200 mil eleitores (3.265.572). Ou seja, 71,59% destes gazetaram às urnas, tornando-se na maior taxa de abstenção destas eleições gerais e das assembleias provinciais.

 

Os eleitores da Zambézia, o segundo maior círculo eleitoral do país, aliaram-se aos de Nampula, influenciando a negaão geral ao voto. Quase dois milhões de eleitores (exactamente 1.906.550) não foram votar, o que representa uma taxa de abstenção de 66,59%, em relação ao total de inscritos. Na segunda província mais populosa de Moçambique, os órgãos eleitorais haviam recenseado quase três milhões (2.862.978) de eleitores.

 

Na martirizada província de Cabo Delgado, os órgãos eleitorais reportaram a ausência, nas urnas, de 925.570 pessoas, correspondentes a 65,79%, de um total de 1.403.554 eleitores recenseados para o escrutínio de 9 de Outubro.

 

No Niassa, 585.070 eleitores (67,08%) decidiram ficar em casa, de um conjunto de 872.186 recenseados para votar. Enquanto em Inhambane a abstenção foi de 56,80%, com 569.504 eleitores a optarem por outras actividades que ir escolher o novo Chefe de Estado. Nesta província foram recenseados 1.002.723 eleitores.

 

Gazetas até no ''Frelimistão''

 

Na província de Manica, de um total de 1.128.189 inscritos, 557.625 eleitores (49,43%) escolheram não foram votar. Na província de Gaza, considerada “bastião” da Frelimo, ficaram em casa 595.922 eleitores (49,73%), de um total de 1.198.262 eleitores.

 

Gaza tem sido uma das províncias que a narrativa jornalística cognominou de ''Frelimistão'', por se registar (a)normalmente votação acima dos 90% em favor do partido da cor vermelha, números largamente contestados pela oposição e pela sociedade civil, que consideram ser fabricação dos órgãos eleitorais para beneficiar o partido no poder.

 

A província de Tete é também parte do Frelimistão''. Desta vez,  633.982 eleitores (40,72%) não se deslocaram às Assembleias de Voto, de um total de 1.556.938 eleitores recenseados. Reduto tradicional da oposição mas que a onda vermelha tem erodido nos pleitos eleitorais recentes, em Sofala 622.556 eleitores (48,14%) também decidiram ficar em casa, de um universo de 1.293.158 recenseados.

 

A excepção chamada Maputo

 

As taxas mais baixas de abstenção das eleições de quarta-feira, de acordo com os editais de apuramento provincial, registam-se na província e Cidade de Maputo. Na Cidade de Maputo, a taxa de abstenção fixou-se em 37% e, na província de Maputo em 35,92%. Na capital do país, estavam inscritos 676.757 eleitores, e apenas 250.366 eleitores não foram votar. Na província de Maputo, os órgãos eleitorais recensearam 1.569.530 pessoas, mas somente 563.848 não foram votar.

 

Depois de se fatigar nos editais de apuramento intermédio destas eleições, Abílio Maolela foi aos arquivos mais frescos da história eleitoral de Moçambique. Estes reavivaram-lhe à memória que a taxa de abstenção foi de 48,6% em 2019, nas sextas eleições presidenciais e legislativas e terceiras das assembleias provinciais (as primeiras que elegeram os governadores das províncias). Naquele ano, apurou, estavam inscritos 13.162.291 eleitores, mas somente 6.766.416 foram votar.

 

Apesar de  não termos tido acesso aos editais do apuramento na diáspora, os seus números e estatísticas são insignificantes para mudar esta esmagadora verdade: o fantasmagórico ''partido da abstenção'' mantém sua hegemonia.

 

Um ''pornográfico'' relatório preliminar

 

Em Relatório Preliminar sobre a votação, divulgado na quarta-feira, o Consórcio Eleitoral Mais Integridade conta uma história digna de um filme de terror, caraterizado por actos de roubo, inutilização e compra de votos de candidatos e partidos da oposição (PODEMOS, Renamo e MDM) a favor da Frelimo e seu candidato Daniel Francisco Chapo, tendo como protagonistas os Membros das Mesas de Votos.

 

Segundo o “Mais Integridade”, na noite eleitoral de 09 de Outubro de 2024, para além dos  já conhecidos e famosos casos de enchimento de urnas, houve também anulamento de votos pelos Presidentes das Mesas, sendo que os casos mais significativos registaram-se nas províncias de Sofala, Zambézia, Nampula e Tete.

 

Por exemplo, na EPC Josina Machel, no distrito de Marromeu, província de Sofala, a delegada do PODEMOS encontrou mais de sete votos em branco e mais de quatro votos do candidato Venâncio Mondlane, que tinham sido qualificados a favor do candidato do partido Frelimo, Daniel Chapo.

 

Na EPC 10 de Maio, no mesmo distrito, o “Mais Integridade” afirma que um dos presidentes de Mesa usou, de forma sistemática, tinta de carimbo para anular os votos a favor candidato Venâncio Mondlane, enquanto na EPC de Mazi Ntunga, um dos presidentes da Mesa agrediu fisicamente o secretário e um dos escrutinadores por reclamarem o facto de o presidente estar a anular os votos a favor dos partidos da oposição.

 

“Na EPC Nhamiasse (Morrumbala-Zambézia), para além dos MMV terem votado mais de uma vez, durante a contagem nem sempre marcavam no quadro negro os votos atribuídos ao PODEMOS e à Renamo. Na EP1 Napote, (Gilé - Zambézia), votos considerados nulos foram transformados em votos a favor do partido Frelimo”, narra o Relatório.

 

Na EPC de Tacuane (Lugela-Zambézia), antes do início da contagem, no tempo dedicado ao descanso, o presidente da Mesa foi encontrado a abrir a urna e acrescentar boletins de voto pré-marcados; e na EPC de Marrupa-Sede (Marrupa-Niassa), a contagem foi paralisada durante largos minutos pelo facto de um dos escrutinadores ter sido encontrado com mais de dois dedos pintados com tinha de carimbo, que usava para invalidar os boletins de voto favoráveis ao PODEMOS.

 

Um dos casos mais gritantes narrados pelo Consórcio “Mais Integridade” ocorreu na EPC de Chamissava, no Distrito Municipal de KaTembe, na Cidade de Maputo, onde, dos 230 votos que o PODEMOS tinha obtido na eleição legislativa e marcados no quadro negro, apenas um foi registado no edital oficial publicado pela Mesa.

 

''Magia'' da noite (eleitoral) para o dia (seguinte)

 

Tal qual a noite é escura e o dia é claro, as eleiões gerais em Moçambique geraram um fenómeno: há a noite eleitoral e há o dia seguinte, com(o) realidades completamente distintas. Em conferência de imprensa concedida na quarta-feira, o Director do Centro de Integridade Pública, uma das organizações da sociedade civil integrantes do consórcio, assumiu ser inexplicável o que aconteceu na noite do dia 9 de Outubro.

 

“Temos magia, em Moçambique, porque aquilo que a gente viu a ser contado e aquilo que os editais diziam, no dia seguinte, eram coisas totalmente diferentes. Perante esse cenário, é muito difícil o consórcio vir aqui dizer que nós fizemos contagem, baseada nos editais porque a maior parte tem resultados martelados”, defendeu Edson Cortez.

 

“Mais uma vez, como país, realizamos eleições fraudulentas, que não reflectem aquilo que foi a vontade dos eleitores. Em certas urnas, havia mais gente que só ia votar para as eleições presidenciais e se esquecia do boletim de voto para as eleições legislativas. Isso mostra enchimento de urnas”, sublinhou, apelando à Procuradoria-Geral da República a olhar para os vários ilícitos eleitorais, no lugar de se preocupar apenas com um candidato.

 

Segundo a plataforma, que contou com 1.900 observadores, distribuídos por mais de 1.500 locais de votação nos 161 distritos do país, cobrindo um total de 3.106 Mesas, a noite eleitoral foi marcada também por falta de iluminação, assim como por cortes sistemáticos de energia eléctrica.

 

Por exemplo, as Escolas Secundárias de Pebane (Zambézia); a EPC de Chanica (Mandimba-Niassa); a EPC de Thungo (Lago-Niassa); a Escola Básica 16 de Junho (Mecula); a Escola Secundária de Entre-lagos, (Mecanhelas,); e a EPC de Mucujua (Monapo) tinham problemas de iluminação, enquanto a EPC de Chinga (Murrupula) registava cortes frequentes de energia. “As lanternas disponibilizadas pelo STAE não ofereciam iluminação suficiente para operações de qualificação de votos, o que originou novas interrupções devido a discordâncias na qualificação dos votos”, sublinha.

 

O espectro da maioria absoluta

 

Os resultados oficiais indicam uma vitória por maioria absoluta de Daniel Chapo e da Frelimo, com mais de 60% dos votos. O PODEMOS alega que sua contagem paralela aponta para uma vitória do partido e do seu candidato Venâncio Mondlane com mais de 53% dos votos.

 

As últimas projeções veiculadas veiculadas por canais de televisão e viralizadas pelas redes sociais indicam um futuro parlamento, de 250 deputados, em que a Frelimo obtém maioria qualificada de 192 deputados.  O PODEMOS, catapultado pela popularidade de Venâncio Mondlane, emerge como oposição oficial parlamentar, com 32 deputados; a RENAMO sofre uma hecatombe histórica passando, pela primeira vez em 30 anos de democracia multipartidária, a ser terceira bancada parlamentar, com 21 deputados; e o MDM não consegue número suficiente de parlamentares para formar bancada, com apenas três membros. Os outros dois parlamentares sao da diáspora, eleitos nos círculos eleitorais da África e de Europa e resto do mundo. Os resultados finais só serão conhecidos na próxima quinta-feira, dia 24 de Outubro. (Carta da Semana)