Mais um ciclone atravessa o nosso país, afectando, directamente, as províncias do centro, em particular, Sofala, Manica e Zambézia. Ainda nem sequer nos refizemos das anteriores tempestades de 2019, como foram os casos do Idai e Kenneth e, mais recentemente, do ciclone Chalane, e teremos de lidar com os efeitos nefastos do Eloise. Estes são momentos perturbadores, preocupantes, duros e, até, demasiado violentos. Precisamos de força, coragem e muita fé para enfrentar estas crises e manter acesa a chama da esperança. Temos de continuar fortes e resilientes, e saber erguer a cabeça, em todos os momentos.
O sumiço de cerca de uma centena de contentores de madeira no Porto de Pemba é uma demonstração de crime organizado para a nossa qualificação para os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Com esta última performance do Porto de Pemba garantimos o nosso lugar na modalidade desportiva de Crime Organizado, na categoria de Cara-de-Pau.
Somos bons nesta modalidade olímpica. E o povo também tem ajudado bastante com textos de indignação. Cada vez que um cidadão escreve um post do tipo 'é possível 82 contentores de madeira desaparecerem do porto sem que alguém tenha notado?' são mais pontos para Moçambique. A nossa indignação ajuda muito. Tem de parecer que estamos muito surpreendidos. O Comité Olímpico Internacional está a ver tudo. Por isso, temos de continuar a fingir que estamos admirados.
Nunca deixamos os nossos créditos em mãos alheias nesta modalidade. E não será desta vez. Tudo, menos perder a nossa cara-de-pau num certame internacional! Não podemos permitir! A nossa bandeira tem de estar ali, no píncaro do mastro mais comprido. Por isso, nas próximas revelações de corrupção temos de melhorar as nossas emoções!
De resto, a cada dia, o governo tem estado a trabalhar seriamente para melhorar o nosso crime organizado. O que vejo é que falta um pouco de criatividade da nossa parte como adeptos. Vê-se que estamos a publicar mesmas coisas e não estamos a caprichar nos comentários. Ora, em muitos posts é possível notar que a indignação não é autêntica. Vê-se que a pessoa só escreveu para estar na onda. Outra cena também preocupante é a falta de organização. O ideal seria uns escreverem 'como é possível sumirem contentores apreendidos?' e outros dizerem 'este país é uma merda!'. Ou uns dizerem 'país do pandza' e outros responderem com 'onde está a porta deste país, quero descer!', etecetera. Ou seja, as indignações devem estar sincronizadas umas às outras. Os insultos ao governo devem ser poéticos. Não pode insultar o governo como se estivesse na paragem de chapa. Isso pode baixar a nossa pontuação.
Um apelo importante que faço ao governo é no sentido de divulgar o calendário das próximas descobertas de corrupção para que o povo veja em directo na SuperSportMaxímo. Isso iria nos ajudar a opinião pública a ficar indignada em tempo real.
Agora, minhas irmãs e meus irmãos, se formos desqualificados precocemente a culpa não será do governo nem da Pê-Gê-Ere. Que fique claro! Estes estão muito engajados em manter a cara de Moçambique cada vez mais de pau possível. Se formos eliminados, a responsabilidade será inteiramente vossa - vocês que não se indignam nas redes sociais. A vossa indiferença tem nos prejudicado muito. Até nem parecem moçambicanos. Se não estão satisfeitos com a qualidade da nossa equipa olímpica de crime organizado, então, que se mudem para Guiné! É que o objectivo desta seleção é fazer desaparecer Moçambique do Mapa Mundo e, nessa altura, todos seremos chamados a nos surpreendermos massivamente. Quando esse dia chegar, temos de sair às ruas do 'feici' aos prantos tipo não sabíamos. Temos de fingir surpresa. São as regras do jogo.
Pois é! Faça a sua parte! Contribua com a sua lamentação patriótica e ajude o governo a melhorar a nossa sem-vergonha! Não precisa ser de verdade... aqui quase nada é de verdade.
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Por alto acompanhei as eleições presidenciais em Portugal, sobretudo os resultados e as reacções à volta. Delas, e não é só destas eleições, retenho, e como um exemplo entre vários, que ganhar não significa apenas ficar em primeiro lugar e de que ser votado por larga franja da sociedade pode não ser uma boa coisa. Abaixo, e tomando o resultado das eleições portuguesas do passado Domingo, sobretudo o do candidato apoiado pelo partido Chega, recentemente criado, seguem algumas notas.
Ganhar não significa apenas ficar em primeiro lugar. O candidato apoiado pelo partido Chega, dito da extrema-direita, o ainda líder do partido (ainda porque demitiu-se por ter falhado a meta) ficou em terceiro lugar e a meta era a de ficar em segundo lugar, deixando para trás a candidata do partido PS que acabou ficando em segundo lugar. E mesmo assim, o líder do Chega cantarolou vitória por ter amealhado meio milhão de votos e por ter ainda mais votos que o conjunto dos ditos partidos da esquerda radical (Bloco de Esquerda e o PCP). Ademais e se estas fossem eleições legislativas, o Chega teria conseguido mais de uma dúzia de deputados contra um (que por coincidência é o próprio líder) da actual legislatura.
Ser votado por larga franja da sociedade pode não ser uma boa coisa. Isto porque o extraordinário resultado conseguido pelo candidato do partido Chega, e que posiciona este partido como a terceira força política portuguesa (e em ano e meio de existência), está a gerar uma onda de preocupação no status quo da sociedade portuguesa, sobretudo da classe política. As razões da preocupação prendem-se com o facto do partido Chega (e do seu líder em particular) ser considerado, entre outros epítetos, de fascista, racista e xenófobo. Não sei se isto significa que dos portugueses que foram às urnas meio milhão sejam fascistas, racistas e xenófobos. Pelo grosso da reacção crítica não o são, apenas estão zangados ou contra o curso actual do sistema/regime.
Dito isto e cá para os meus botões: tendo em mente que comparo com a Pérola do Índico, os meus botões não me ajudaram a chegar a nenhum resultado. Aliás, o resultado foi a conclusão de que este tipo de debate continua refém do próprio resultado das eleições, nomeadamente se foram livres, justas e transparentes.
Não é para gerar polémica! Vivemos um período muito conturbado causado pelo triunfo momentâneo de um vírus mutante, que conseguiu juntar 3 em 1: a agressividade (virulência) do HIV, a transmissibilidade do vírus da gripe comum e o factor novidade, que implica que ninguém tenha ainda desenvolvido imunidade natural ao mesmo. Um cocktail mortífero para uma doença transmitida por um organismo tão pandémico como o SarsCoV-2.
Se nós ajuntarmos o quarto factor, o da comunicação prolífica devida à omnipresença das redes sociais, como fruto de um milagroso desenvolvimento em exponencial das TIC´s, teremos a componente social importante para poder gerar a catástrofe. De facto, a existência de uma miríade de plataformas digitais, a internet rápida e o fabrico em série de smartphones faz com que qualquer pessoa, em qualquer momento e lugar, possa se tornar num “jornalista”, num fazedor de opinião. Aqui surge o primeiro grande desafio: todos dispomos de meios potentes de jornalismo, mas não das ferramentas éticas para exercer essa nobre profissão.
Assistimos muito recentemente, ao abuso ad nauseam da plataforma Twitter, para destituir ministros e conselheiros, emanar ordens presidenciais e discursos profanos e incitar ao assalto a símbolos democráticos, numa importante e próspera nação ocidental, o que prova que o risco de abuso das redes sociais pode até vir de pessoas que, à partida, deveriam ter o tal kit ético.
A influência e abrangência deste meio de comunicação rápida são muito grandes. Quando comecei a me interessar com política a sério, na década 70 do século passado, entendi que sempre que houvesse golpes de estado na África e América Latina, as prioridades eram a ocupação do palácio presidencial, do edifício da rádio e do estado maior general do exército. Aqui, via-se claramente que o “quarto poder”, era mais forte que o segundo e o terceiro (legislativo e judicial). A rádio aparecia como a melhor forma de chegar às pessoas, de lançar o discurso, influenciar o pensamento. Nos tempos da Internet 5G (nós em Moçambique ainda nos contentamos com 3G ou 3,5G por enquanto), é muito natural que os governos em tempos de crise, desliguem a Intenet para dificultar a comunicação entre as pessoas. Vimos isso em África, mas também na Europa e na Ásia.
O segundo desafio vem de outro tipo de abusadores das redes: pessoas que de forma deliberada, sentam-se e inventam os famosos “memes”. Estes, são pequeníssimos textos (chamemos-lhe textículos), alguns deles com um conteúdo humorístico muito apurado, mas infelizmente, quase sempre todos estão direccionados para expressar aquela repulsa social que existe ente grupos (ou para com grupos) e que de alguma maneira acabam reflectindo os problemas sociais em ebulição. São memes homofóbicos, contra as marhandzas, contra os Xingondos, os Makuas, os manhembanas, os machanganas e por aí, trazendo ao de cima aquilo que talvez devesse merecer lugar de prioridade nos nossos programas sociais.
O problema da comunicação rápida do tipo mensagem de WhatsApp é o efeito psicológico de “não pensar muito, não se bater a cabeça” que ela gera. Na verdade, a mensagem curta, com resposta rápida e muitas vezes lacónica do estilo “gosto”, actua no nosso cérebro com injecções abundantes de dopamina, própria para as acções de motivação/recompensa, igual ao cão que deve ser dado um biscoito cada vez que acerta no gesto num treino.
E isto, para além de estimular o prazer, vicia.
Assim, podem estar viciados de postar memes os que diariamente abusam das redes sociais, aproveitam-se da situação de calamidade pública em que nos encontramos no país e passam o tempo todo a enviar mensagens de perigos diversos, de incertezas científicas justificadas sobre a pandemia, de problemas técnicos com a(s) vacina(s) a serem desenvolvidas em diversos laboratórios no mundo e de supostas mortes de personalidades públicas.
De repente, em pouco menos de um ano, habituais analfabetos técnicos e desléxicos titubeantes, têm um amplo domínio da microbiologia, da virologia, da saúde pública, do sequenciamento genético dos vírus e mutações, da farmacologia dos testes de vacinas e da estatística demográfica e multivariada. Este é o grande desafio das redes sociais neste momento da pandemia. Diariamente somos fustigados com GigaBytes de informação digitalizada, circulando de um grupo para o outro das redes e misturando a notícia, o alarmismo, o sensacionalismo e a morte.
Tenho dúvidas que esta mistura ajude-nos a combater o vírus. Mantenhamo-nos vigilantes contra esta doença da CoviD-19 que está sendo transformada, também, em doença do pânico.
Rogério José Uthui, 25 de Janeiro de 2021.
Corre na televisão um vídeo promocional da Fundação Chipande, dando seu ombro de caridade aos refugiados da chamada insurgência.
Boa parte da filmagem foi feita em Metuge, com Chipande se gabando da sua alma caridosa. Antes é feita uma revelação que convocaria à psicanálise. Um membro do clã Chipande diz que eles só despertaram para a realidade cruel do terrorismo quando o fenómeno atingiu a família em Mueda. Foi aí que, finalmente, se aperceberam duma tragédia que andava em cena desde há cerca de 3 anos, com relatos nos “media”, apesar da censura do Governo. É uma questão de “mindset”. Um tipo de mentalidade egocêntrica, fixa. A crença imutável de que o mundo gira à sua volta. E só despertamos para um problema quando ele nos bate à porta. É assim como o Governo está a reagir. Agora que a Covid 19 penetrou nos lares dos camaradas (depois das suas festanças esbanjadoras do fim do ano) e o sistema de saúde mais o sector privado mostraram sua falibilidade é que o Governo já está a mandar vir camas com ventiladores e Nyusi foi bater uma cavaqueira com os médicos. Não fosse isso, estaria tudo na mesma, os pobres morrendo no seu anonimato e a mola dos doadores (a nossa também, aquela do orçamento rectificativo) sendo compartilhada nas trevas da corrupção. Se os terroristas não tivessem atacado Mueda, Chipande não teria sentido a dor. No caso do Governo, falta estudar a razão porque optou por não investir, guardando o dinheiro na gaveta e uns ratos roendo tudo. E os médicos morrendo sem proteção. This is Mozambique!
Está com medo como nunca. Ele já atingiu a última linha para o abismo onde lhe esperam as verrumas de aço, onde seu corpo será espetado como carne a ser servida aos convivas do inferno. Mariano Nhongo é um pêndulo sem confiança, como sempre foi depois da morte de Afonso Dlakama, nunca teve certeza de nada. Agora caminha completamente no escuro com o tacto a fugir-lhe, está atordoado. Se fosse um ndawu puro seria este o momento para optar pelo suicídio, mas não é ndawu, mesmo assim é a única alternativa que lhe sobra. Entre dar o derradeiro salto rumo ao vazio da noite onde reinam as hienas com as suas sinistras gargalhadas, e levantar os braços da rendição sem a certeza de que será recebido com amor, o general acha melhor entregar sua carne aos abutres.
Nos últimos dias anda em estado permanente de embriaguês mas sem perder a lucidez. Quanto mais ébrio, mais esclarecido. Perdeu o apetite e a vontade de continuar uma luta que lhe levou a verter sangue dos seus próprios irmãos. É esse sangue que agora jorra em catadupa sobre a sua cabeça, cobrindo-lhe os olhos que já não vêem nada. Não dorme, nem de dia nem de noite, o álcool e a cannabis que fuma sem parar, não produzem mais o efeito desejado, Nhongo pretendia com esses estimulantes ganhar coragem e manter o seu estatuto de general, mas tudo isso esfumou-se, ficou um esqueleto em fim de carreira.
Os subalternos deixaram de cumprir as ordens do ora temido homem tido como cicerone de Dlakama, aliás Nhongo esvaiu-se, não dá mais ordens, mesmo que as desse ninguém as cumpriria porque todos os seus sequazes andam bêbados também, como ele. Outros fugiram e entregaram-se, porém há muitos outros que manifestam no fundo essa vontade, mas têm medo de voltar, como o próprio comandante, que deixou de ir ao rio tomar banho, anda desmazelado.
Quando o general ainda acreditava na sua paranóia, ia ao rio livremente e os crodilos fugiam, assim como capitulavam os militares das FADM ao saber da presença desse tigre perigoso num determinado teatro das operações. Mariano Nhongo tinha nos amuletos dos curandeiros mais afoitos de Machanga, a sua fortaleza inabalável, chegou de facto a estremecer os fundamentos da Frelimo. Nhongo era a fúria da cordilheira de Gorongosa, mas hoje todo aquele baluarte está em derrocada, o homem do momento está a despedaçar-se. Em fiapos.
Em toda a sua vida da guerra mais cruel do século passado na África, Mariano Nhongo nunca tinha encarado uma hiena, animal abominável, porém muito feroz quando se junta aos outros bichos da mesma estirpe e partem em matilha para o ataque. Hoje são esses bichos desdenháveis que guarnecem a cubata sombria do general que não pára de beber e fumar cannabis em vão. As hienas riem-se de Nhongo e nas noites mordem-lhes as costelas nos pesadelos de não acabar.
O troar dos canhões que se ouvia ao longe, agora ribomba perto, anunciando a última hora de um relógio que funciona com sangue. Estes são os últimos dias, na verdade, de um grande lagarto que deixou de se mover ou que se move em direcção ao cadalfalso. Mariano Nhongo vive as últimas alucinações.
*Texto imaginário