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quarta-feira, 05 maio 2021 08:39

Ossufo Momade pode estar equivocado

Falar sobre Ossufo Momade é falar de uma personalidade cuja uma das definições é: "Conselheiro do próprio Presidente da República de Moçambique". Quer dizer, ele tem linha verde e canais para dar o seu fio de pensamento, na mesma mesa e no momento em que quiser. E caso o Presidente Nyusi esteja ausente, há personalidades que lhe podem ouvir e colocar na bicha de espera, essa consideração. 
 
 
Há dias, vi a primeira publicação sobre ele, a fazer acreditar que, o Estado Moçambicano merece receber, acolher e colocar no terreno, tropas estrangeiras. E na mesma publicação, ele deu exemplos de há anos onde Moçambique acolheu Tanzanianos, Zimbabweanos, Sul Africanos, Russos, para combater contra a Renamo. – Pois é, até aqui, tudo (aparentemente) correcto.
 
 
Numa outra publicação, de um outro órgão de Comunicação Social, disse-se aquilo e acresceu-se que, "Caso os [rangers] da Renamo fossem (urgentemente) atrelados na Polícia e militarismo, o problema de Cabo Delgado teria já, um outro alento".
 
 
Acredito que vários outros jornais, tiveram algum acréscimo e quando estes discursos são traduzidos para jornais lidos em outras línguas, cobrem "à la une".
 
 
Quero eu deixar claro que, ao longo dos 40 meses de guerra, já entrei e sai das mesmas terras, mais de 40 vezes o que quer dizer que, teoricamente, entro e saio, uma vez por mês. E já cheguei (acompanhado de um caçador furtivo local) de dormir no outro leito de um dos rios, aonde eles dormiam, assistindo tudo e como eles convivem, ignorando insectos, repteis e apenas com um terço, câmera Canon 650D com baterias de reserva e duas diferentes lentes, geolocalizador, tudo nas mãos e ostentando a patência de Jornalista-raso. Ora, este não foi o meu único orgulho e que, o que já fiz, documento e conservo a 7 chaves.
 
 
Meu caro;
 
 
Há quem profetizou à partir da Nigéria que, a guerra contra tamarinhos, vai levar 12 anos. E faz todo o sentido quando uma centena dos capturados, são devolvidos as matas, por um Tribunal que disse Moçambique não ter em carteira, lei anti-Terrorista. Portanto, todos fizeram o retorno legal.
 
 
Aquela guerra é outra e muito estranha. Acreditaria em 50% dessa asserção dada a conhecer a imprensa, caso me dissesse, aonde eles estão ao longo deste mês de Ramadane! Para aonde e como foram se restaurar e curar as feridas? – Só isso! 
 
 
Para se vencer aquela guerra, precisa-se usar sim, o sexto sentido. Não é só guerra corporal ou com o recurso a instrumentos contundentes. Não são tidos em conta, números dos que digladiam. Há coisas que (pessoalmente) colhi e não me sentiria orgulhoso, publicar em textos jornalísticos e aparecerem "gajos" que possam fazer copy-paste ou reformularem minhas frases e colocarem em publicações chamadas "pesquisas". – E isso já aconteceu, sempre que assinamos Pinnacle News.
 
 
O único Distrito que já conseguiu repelir aqueles tamarinhos, continuam a ser os desprezíveis de Mueda. E eles, usam o sexto sentido, para o efeito. Eles têm noções de "freemason" com o recurso a raízes de árvores e plantas locais que são diferentes das de grutas de Sofala ou Manica.
 
 
Hoje em dia, conseguiram treinar crianças, estas que soubemos de que, por caráter, são impiedosas se formos a acreditar na própria história de Moçambique e questionar, que idade tinha Chipande, quando aceitou ir ser treinado e com que idade, comandou e mandou executar o primeiro tiro? – Só para exemplificar e estarmos acordados que, aqueles não são apenas pescadores, atletas de futebol 11 recreativo, garimpeiros ilegais entre outros, são uma "mix-lanea" de pessoas, caracteres, intenções e futuro incerto. Já se escreveu e comparou-se eles, dos outros que actuam no ardor. Mas, a coisa não é bem assim, meu caro líder! Eles, ao longo do tempo, usaram primeiro e apenas, facões. Depois, facões, arcos e flechas. Em seguida, facões, arcos e flechas e armas de fogo obtidas em algumas unidades. E hoje, sabe o que usam? – Chegam a clarear o ambiente, quando querem atacar nas noites. Existe pelo menos uma pistola de tiro ambientador com clarão em ambiente nocturno avermelhado, por alguns minutos e só este objeto, nem a Renamo e nem as Forças de Defesa, usaram-nas, nas guerras passadas. Portanto, precisariam de várias reciclagens práticas e teóricas, muito antes de assumir o comando.
 
 
Na guerra de Cabo Delgado, nenhum tropa vai a linha de fogo, sem primeiro, comunicar a vários dos seus superiores hierárquicos. E esse superior hierárquico, tem sempre mais um outro superior hierárquico. Motivos pelos quais, os tamarinhos chegam até as aldeias, antes de haver resposta. São raras as vezes que se vai caçar aqueles homens. E eles já o sabem! Quero dizer, na Renamo, cada homem era autônomo. Cada "ranger" actuava por conta própria. Não vou acreditar que os "rangers" iriam se misturar para esperar algum apito. E caso o fizerem é indisciplina e merece punição. 
 
 
Bom, como a ideia é sim, dar conselho ao Presidente da República, aos Moçambicanos de que, este é o melhor caminho para a vitória na guerra eminente, quereria fazer-lhe um desafio no qual, peço que concorde comigo:
 
 
1 – Peça que os "rangers" actuem e controlem único Distrito desta Província, com exceção de Palma. Palma é ainda, ovo de ouro e pé responsabilidade do Estado.
 
 
2 – Na mesa de debates, peça a Sua Excelencia Sr. Presidente para entregar cada um dos outros Distritos, à um daqueles voluntários que (ainda) quer "ajudar" Moçambique. Portanto, evacuam os actuais e redefinem-se os posicionamentos, depois de um convívio de 15 dias, em reconhecimentos e testemunhos.
 
 
São apenas duas regras e vamos esperar pela chegada do inimigo sem rosto. Aliás, opino que os "Rangers" se posicionem em Mocimboa da Praia. Levem convosco, caso tenham a luz verde, assim que duvido vos reescrever, tradutores de (kimwani, kiswahil, emakwe, emakhua, kiarab, Chimakonde), caçadores furtivos e a mim mesmo, me entrego de bandeja, por um Mocimboa da Praia o qual vi e ainda sonho. Vamos todos, usar a nossa farda e não aquela que já se confunde. Posso vos identificar pelo menos uma dezena de gente que já escapou das principais bases de treinamento e que bem conhecem as matas dos tamarinhos. – Já documentei seus depoimentos, até em curtos vídeos. Faça isso caso não, alguém abaixo de si, vai declarar que, não há condições para que se faça campanha, nas próximas eleições, neste ponto de Moçambique. Aliás, neste Abril de 2021 que vos escrevo, não vejo graça e nem vontade de haver eleições livres, justas e transparentes e quem sai a perder será sim, a sua pessoa e seus / nossos seguidores.
 
 
Antes de partirmos (já que me sinto auto-convidado), me consultem, duas maneiras de como entrar seguramente em Mocimboa, via terrestre. Outras duas maneiras pela via aérea, outras duas maneiras de entrar e penetrar pela via marítima e planos subsequentes. E caso conseguirmos, seremos os primeiros a reduzir o número dos que iriam atacar aqui e acola. Eles possuem centenas de telefones digitais obtidos de suas vítimas e são sim, rastreáveis, desde então. E vão nos doar toda a ferramenta que precisarmos para avançar! – Sabia!?
 
 
General: Guerra não é como futebol 11 onde, o perdedor, vai ter uma outra chance, num outro campo, assim que sarar lesões. – E isto, não seria um civil a lhe escrever!
 
 
Mãos a obra e Co'licença!
terça-feira, 04 maio 2021 07:56

Quando o inimigo dorme ao nosso lado!

Eram 16 horas do dia 24 de Março, numa quarta-feira do ano de 2021 quando homens fortemente armados e equipados atacaram a terra do gás e do petróleo – Palma. Um local que até a data do ataque estava amplamente guarnecido e militarizado. Mas não foi o que se viu naquele dia! A vila estava escancarada. Desprotegida e vulgarizada. Os que viveram o cenário contam como é conhecer o inferno. Ver as palavras contidas nos amuletos sagrados na prática ou sentir-se um morto ressuscitado no dia do julgamento final - mas estavam vivos – vivenciando o horror em directo!   

 

No dia 24 de Março, todos rezavam para ter asas para voar. Poderes sobrenaturais para combater ou desaparecer. O cenário era de tristeza. Os terroristas pegaram as pessoas de surpresa, numa hora que ninguém imaginava e fardados de uma forma idêntica às Forças de Defesa e Segurança, mas com lenços vermelhos e pretos amarrados na cabeça.

 

Os abutres gritavam Allahu Akbar (Deus é o  maior)hoje é hoje (…) os que não tiveram sorte foram decapitados, esfolados, esquartejados, esnobados, profanados ou queimados. Entretanto, alguns conseguiram vencer o terror correndo e nadando durante dias em busca de segurança e salvação – alguns não aguentaram,  morreram tentando!

 

Todos haviam sido surpreendidos! As pessoas corriam de um lado para outro e com várias perguntas sem resposta – como conseguiram entrar até aqui? Quem são eles? Porquê estão a fazer isso? Para a surpresa de todos, parte dos terroristas eram jovens locais. Que dias antes dedicavam-se aos serviços de moto-táxis, corte de cabelo, vendedores ambulantes cuja maioria eram provenientes de Mocímboa da Praia e nas suas discussões diziam que queriam que os terroristas entrassem em Palma para igualarem!

 

As cobras que entraram dias antes como lagartijas ou animais de estimação (como lobos em pele de cordeiro) pessoas famintas e que perderam tudo, afinal não passavam de inimigos camuflados e que chegaram meses antes como deslocados internos e foram acolhidos pelos populares que lhes deram água, comida, roupa, introduziram-lhe no interior das suas residências e deram-lhes uma esteira e cobertores para dormir – ou seja, abriram-lhes as portas e trataram-lhes como familiares, mas no dia do ataque pareciam que estavam possuídos ou acabavam de cair acidentalmente no nosso planeta.

 

O espanto é que a maior parte deles não gostavam de trabalhar e parte deles era normal negarem trabalhar nas empresas locais por alegarem que o salário era pouco e preferiam passar o tempo a jogarem futebol, dama ou cartas.

 

Os tipos já estavam infiltrados nas comunidades! Atacaram a próspera vila de Palma por dentro, porque dormiam, conviviam e comiam com a população e os militares, aguardando o dia do ataque chegar. Escolheram as pessoas que iriam matar e as infraestruturas que deveriam ser incendiadas. Alteraram a realidade plena de um povo abençoado e condenado por nascer e viver numa terra inundada pelos preciosos recursos – "gás e petróleo"…Esta é uma das faces da guerra em Cabo Delgado, onde quase sempre o inimigo dorme ao nosso lado!

segunda-feira, 03 maio 2021 09:21

Juma Aiuba reloaded*: A nação joga batota

Quando me disseram que o Ministério da Educação ia anular o exame da disciplina de Física da décima classe realizado há dias, me fiz a seguinte pergunta: Quem tem moral para anular o que quer que seja por suspeita de fraude aqui nesta pátria? Desde quando a fraude é proibida nessas bandas? Aliás, quem tem moral bastante para proibir tal acto? Onde está essa pessoa? Quem é esse aventureiro que quer se posicionar na contra-mão? 

 

Anular uma prova por causa de uma fraudezinha?! Por causa de uma ilegalidadezita?! Por causa de uma batotazinha?! Por causa de uma mini-roubalheira?! Txêêê!!! Desde quando? 

 

Quem pode querer fazer isso só pode ser um gajo que acaba de chegar da lua. Um gajo que não tem "feici-buqui" nem vê nossas notícias mundanas e não tem uma só janela virada para o mundo. Um "zamwamwa". Matreco. 

 

Mo brada, fraude é o que está a dar. Moda "dele" desses dias é só roubar. Te roubam e ainda, com um pouco de azar, te mandam chamboquear. Te batotam e logo te cercam com blindados. Trocam teu voto tu aí mesmo a ver. Teu voto baza pela janela e desaparece escoltado no escuro. Até parece que fraude é não fazer batota. Ser bom não é bom. 

 

Com esse empreendedorismo em voga por aqui, não tarda que uma universidade abra um curso de Fraudologia. Nos próximos tempos vamos começar a ter gajos formados em Fraudologia Obsessiva Aplicada. Fraudólogos. Batoteiros. 

 

Na verdade, cada um de nós já vivenciou uma fraude neste ano. Ou participou ou testemunhou. Somos todos uns batoteiros passivos. Não há nem moral nem tomate para condenar. Jogamos batota. Somos uma fraude. Somos um faroeste à parte. 

 

- Co'licença!

 

Publicado em 14-12-2018

 

*Desde a primeira edição de Carta, em 22 de Novembro de 2018, o cronista Juma Aiuba impregnava nestas páginas o doce sabor da sua escrita. Sua morte abrupta foi um tremendo golpe. Para tentar manter sua voz viva, Carta decidiu reeditar semanalmente uma das suas crónicas. Seu perfume permanecerá vivo!

 

Este espaço é oferecido pela:  

   

No entanto, seu conteúdo não vincula a empresa.

 

Sir Motors

sexta-feira, 30 abril 2021 06:38

O fio da memória das nossas vozes

Assinalam-se os primeiros seis meses da epopeica páscoa de João Baptista de Sousa; o nosso João de Sousa. O lançamento, mais virtual do que físico, do seu livro “Os meus tempos de rádio”, crônicas e outros escritos, serviu de mote para aglutinar seleccionados amigos, familiares e colegas; admiradores. Um memorial digno e à altura de quem vive nas alturas, próximo das estrelas, cuidando dos seus, vigiando as aporias de um país que se constrói com remendos e roturas, seguindo as mudanças políticas e sociais, culturais, as democracias e, sobretudo, as transformações desportivas.

 

Estaríamos, em absoluto, equivocados se considerássemos que a sua voz se apagou, para sempre, com o seu desligamento físico dos nossos olhos. Essa voz, como o fio da memória, permanecerá viva e acutilante, remexendo nossas consciências, apelando ao rigor e excelência, revisitando o palco da solidariedade, da união e fraternidade entre os irmãos e patriotas e, sobretudo, fazendo com que as ondas hertzianas sirvam para educar uma nação e um povo.

 

Não sou contemporâneo, porém, convivi, intensamente, com os seus ensinamentos, com sua voz, cidadania e seu nacionalismo. Sim, ele era esse homem de múltiplas capacidades e revelações. Gostaríamos de ter lançado o seu livro na Universidade Pedagógica de Maputo. Era esse seu desejo. Nós indagamos sobre as razões, mas, o mais sensato seria pensar que ele entendia que a educação era a primeira e a última batalha para edificar esta sociedade e país. Ele acreditava na educação de forma devota.

 

Todos nós, salvaguardadas as devidas proporções, tivemos, em João de Sousa, um ídolo, um farol, um companheiro  e um irmão mais velho. Ele pareceu ser, sempre, essa chama que iluminava todos os caminhos; a voz que alimentou gerações. Revisitar, hoje, estes contos dos milhares de contos que foram a sua vida e seus escritos, tem um simbolismo que vai muito para além de lançamento de seu livro, deveria ser encarado como a reconfiguração dessa imagem que desaparece, da voz que perdurará em diferentes plataformas, enfim, da admiração que ele granjeou junto de todos quanto o conheceram.

 

Em 2005, o Ministério do Turismo organizou um concurso infanto-juvenil sobre os parques nacionais. Os jovens concorreram, apresentando redacções e fotografias. Claúdio, filho primogénito de João de Sousa, participou e foi um dos seleccionados para visitar o Kruger Park, como parte da premiação. João de Sousa, pai babado, acompanhou este concurso e revelou seus dotes de ambientalista, ecologista feito pela vida e desnudou todo o amor que o ligava a natureza, mesmo que nunca o tivéssemos conhecido nesses pergaminhos.

 

Hoje, me recordo daqueles diálogos sobre Quiterajo e Mucojo, lá em Mocímboa da Praia. Aos alunos de duas escolas, foi solicitado que fotografassem os animais que mais prejudicavam, e os que mais ajudavam a comunidade. Eles foram unânimes. Elefante era o que mais ajudava. Foi um aprendizado para todos nós e, igualmente, uma rotura ao discurso do conflito homem-animal.

 

Mais logo, regressarei às histórias de música e vou escutar Steve Wonder, Fany Mpfumo, Hortêncio Langa, João Cabaço, Zeca Alage dos Ghorwane e Pedro Langa, músicos de sua eleição, dos quais fez, tantas vezes, referência. Os céus ganharam uma voz de ouro e ele deve estar encantando o paraíso com seu talento. João de Sousa deixa ficar um abraço de saudade à minha querida amiga e irmã Afra Ndeve e que o espírito dela nos empolgue para outras vitórias de que tanto carecemos.

quinta-feira, 29 abril 2021 10:22

Maputo: a síntese da nossa degradação

Estive em Maputo  entre os dias 25 e 27 deste mês de Abril, contra a minha vontade. A capital do meu país já não me seduz, nem quero mais sentir o cheiro que ela expele em toda a dimensão das avenidas e ruas, e dos prédios degradados. Fui porque era inevitável, o assunto requeria a minha pessoa em presença. É verdade que já fiz parte em tempos, do ram-ram desta grande metrópole, levando uma vida intensa que incluia bares noturnos onde ia ouvir música livre, com muito fumo à mistura e outras coisas que me levavam ao paraíso do céu. Mas hoje perdi a estrutura do anarquista que eu era, por isso todo este bulício, todo este cheiro de mijo alagando as acácias e as vedações e os becos dos subúrbios, as intermináveis buzinadelas, tudo isso repele-me.

 

Saí de Inhambane no domingo, dia 25 de Abril, transportado num autocarro da empresa ETRAGO, que podia considerar-se confortável, não fosse o inoportuno televisor colocado lá dentro e que nos é forçado a assistir, “querendo como não”. Mesmo que eu quisesse fechar os olhos para conciliar o sono e desligar-me deste castigo, seria impossível por causa do som que incomoda. A música que toca não faz parte da minha formação, pior os vídeos que vão sendo mostrados, não têm mais do que a exibição gratuita do corpo feminino. É isso que somos obrigados a assistir ao longo de uma longa viagem de quinhentos quilómetros.

 

Maputo não tem nada a oferecer-me, a não ser a frustração dos jovens completamente destruidos pelo álcool e pelo fumo, o desespero das mulheres sentadas na berma das ruas vendendo tudo. Dói-me sobremaneira o tratamento a que somos submetidos nos “chapas”, nos my love. Os prédios que Samora Machel nos deu estão a ruir um a um, e ninguém sabe o que será o nosso dia de amanhã, perante gritante incapacidade.

 

Ainda fui a tempo de ver, à entrada da cidade de Maputo, na zona de Marracuene, a nova fábrica da 2M. Lembrei-me ter visto, por via da televisão, o ilustre Tomaz Salomão na inauguração da mesma, fazendo um discurso de pompa, enaltecendo os empregos que irão para a juventude, e o milho das nossas machambas que será empregue na fabricação da cerveja. Mas o que eu não confirmo é se a 2M que se bebe em Moçambique é de boa qualidade ou não. Isso eu não confirmo nem desminto, por isso não me empolguei tanto com a intervenção dessa fugura que é membro da Comissão Política da Frelimo. A menos que volte e nos diga que a cerveja que ele mesmo propala na publicidade, é de boa qualidade.

 

Mas Maputo pode ser a síntese de que todo o nosso país está a ser abalroado no alto mar, em todas as vertentes. Eu desdenho Maputo, uma cidade que tem na mesma moeda um lado falso, e outro lado real. O lado falso é da Av, Julius Nyerere para lá, onde se arrotam fígados. O lado real fica mais para cá, onde a podridão nunca vai se esconder. É aqui onde vou me hospedar entre os dias 25 e 27 de Abril, convivendo com todo o fedor dos guetos sem futuro.

 

Maputo não tem futuro!

quarta-feira, 28 abril 2021 09:44

A cosa nostra da Pérola do Índico

Era mais um dia alegre e de muita adrenalina juvenil no conhecido bairro de Laulane, na cidade de Maputo. Tantas gajas, muitas guitarradas desfilando. Belos rostos  de moçoilas endiabradas. Tarde quente. Jovens tomando cervejas e fumando charutos, maconha e snifando coca. Crianças correndo de um lado para outro. As mamanas suportando a poeira nas paragens com a corrida de Fórmula 1 dos chapeiros enquanto vendiam legumes.

 

Os passageiros estavam tão aflitos em chegar à praia da Costa do Sol; naquele dia o sol era intenso, embora fosse uma segunda-feira, da 3ª semana do mês de Fevereiro do ano de 2020, as meretrizes do Laulane e Hulene estavam semi-nuas.

 

Naquele dia, uma alma era parida à força. Um jovem contabilista de profissão e consultor de uma empresa em ascensão na capital do país, deixava o mundo dos vivos, num crime que chocou a comunidade de Laulane e os amigos do finado que horas antes da morte haviam trocado copos com ele. O crime ocorreu no modo siciliano – típico da cosa nostra.

 

Em vida, a vítima respondia pelo nome de Stélio Filipe Budula. Um jovem promissor, mas com amizades super-estranhas. Alguns deles metidos em negócios sinuosos e protegidos pela bófia. Os contornos da sanha assassina de Stélio parecia uma cena cinematográfica nos moldes sicilianos. Mas não, era em Maputo, Moçambique – a terra das oportunidades da Pérola do Índico.

 

Tudo terá acontecido quando um amigo que seguia com ele na viatura disse que a mesma não tinha combustível, tendo parado num local quando era meia-noite. No dia Stélio levava 4 mil meticais no bolso, mas mesmo assim, a cabala havia sido feita; repentinamente chegou uma viatura da polícia com agentes fortemente armados que lhe pediram a documentação. O jovem apresentou os documentos.

 

Na ocasião, mandaram Stélio Budula seguir em frente, donde viriam a ser cercado na zona da Igreja Maposse, onde foi apertado o pescoço por dois homens e disseram que lhe queriam matar. Dadas as suas habilidades, uma vez que tinha treinamento de artes marciais, começou a lutar com os assaltantes que na ocasião disseram-lhe que vinham para acabar com ele. Stélio Budula gritou e lutou pela vida, até que se desfez dos dois agressores, tendo estes ficado com seu telemóvel, valores monetários e uma pasta com laptop que continha informações do sector laboral.

 

No referido dia Stélio Budula teve que recorrer à casa do pai, sediada a escassos metros do local da agressão em Hulene. No dia seguinte, o telemóvel não foi desligado e sempre que a família ligava, os criminosos diziam para que ele fosse buscar o telemóvel na Casa Branca, Matola. O telemóvel permaneceu ligado todo dia. Um mês depois, num domingo, um amigo do finado veio tirar-lhe de casa com o objectivo de fazerem um trabalho, tendo regressado no período da noite; à calada da noite o jovem Stélio saiu e regressou no dia seguinte com o comportamento totalmente alterado.

 

No dia 17 de Fevereiro, Stélio Filipe Budula foi perseguido por agentes da polícia e violentado com uma AKM e depois desapareceu; os telemóveis do mesmo estavam desligados até que a família começou a procurar-lhe, tendo encontrado o seu corpo na morgue do Hospital Geral de Mavalane. Não havia nenhum registo até que a família teve que recorrer a subornos para que tivesse acesso ao livro onde constava o nome da pessoa que o levou àquele local.

 

Foi disponibilizado o corpo. Que estava todo esfolado, com sinais de ter sido torturado, com os braços quebrados, sem dentes e o grupo fez de tudo para que na autópsia viesse que o jovem tinha sido atropelado, uma versão que não era verdadeira.  No dia da morte estava com alucinações. Os passarinhos dizem que o homem teria feito uma alta consultoria empresarial para uma das famílias envolvida no calote mediático. Donde terá facturado uma boa massa e descoberto várias malandrices que não deveria ser do seu conhecimento!