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BCI
segunda-feira, 06 abril 2020 07:09

Um PQG realista ou… balelas?

Ao ouvir esta quinta-feira, no adaptado espaço do CCJC, o Primeiro-Ministro Carlos Agostinho fez desfiar todo aquele “rosário” de intenções do governo, tecnicamente designado de Plano Quinquenal, fiquei com a clara sensação de que estávamos perante um mais do mesmo.

 

Uma réplica do que tem vindo a acontecer nos últimos anos: desde a forma como o texto foi redigido, até aos “rituais” típicos das diversas bancadas no acto da sua apreciação/aprovação, a nível das diferentes comissões de trabalho: enquanto os partidos da oposição esgrimem os seus argumentos para reprovar o documento, a Frelimo saúda e aprova-o incondicionalmente, mesmo admitindo a necessidade de se mudar a grafia num ou outro ponto, ou uma vírgula aqui e acolá, num exercício que é claramente só “para o inglês ver”…

 

Na verdade, praticamente nada mudou entre este PQG e aquele que nos foi apresentado em 2015, no primeiro mandato de Filipe Nyusi.

 

Ou seja, a forma como o PQG é elaborado mais parece uma extensão daqueles manifestos eleitorais que nos são “vendidos” em pleno período de campanha, plenos de “iremos fazer isto, iremos fazer aquilo, iremos fazer aqueloutro”, sem, no entanto, se especificar como se operacionalizam todas essas boas intenções. Mais do que isso, em momento algum se refere ao que o governo deveria ou gostaria de fazer, mas que não poderá ser realizado, por esta ou aquela razões objectivas.

 

Só para dar dois exemplos: quando o governo escarrapacha no PQG que irá construir 3.355 salas de aula para o ensino primário. Como consegue determinar com tanta exactidão esse número? E quando o PM garante, na sua alocução, que o governo irá aumentar em grande escala o emprego para jovens, é no mínimo risível. Como? Quando? Por que razão não o fez nos últimos cinco anos?

 

E como se não bastasse, na apresentação do documento, o PM ainda tem a ousadia de reconhecer que estes feitos “somente serão alcançados com paz duradoura, consolidação da democracia, boa governança, unidade e coesão nacional e fortalecimento da cooperação internacional”. Ora, quem nos garante que nos próximos cinco anos esses gaps serão superados?

 

Enfim, são questões como estas que nos deixam sempre com uma pulga atrás da orelha…

 

O (modelo de) Plano Quinquenal do Governo, da forma como nos tem sido apresentado, mais parece um daqueles planos estratégicos que nos são impostos por entidades estrangeiras sem terem a mínima noção – ou pelo menos a plena certeza – das reais capacidade de o país os poder pôr em prática, sendo que só na execução dos planos operacionais se verifica que afinal tudo não passava de uma quimera.

 

Porém, nesses casos até tem alguma lógica que os “engulamos”, uma vez que essas estratégias vêm quase sempre acompanhadas dos respectivos orçamentos, para além de planos de monitoria minimamente aceitáveis.

 

Já no caso do PQG, estamos perante uma carta de intenções que deverá ser realizada maioritariamente a partir do dinheiro dos contribuintes, daí a razão da desconfiança de grande parte das pessoas, quanto à sua exequibilidade. E também do voto contra dos partidos da oposição com assento parlamentar.

 

Este ano não podia ter começado da pior maneira para Moçambique e, sobretudo, para o governo recém (re)empossado: primeiro a guerra no norte que tende a recrudescer, depois os ataques nas estradas do centro, já para não falar nesta maldita pandemia do Covid-19, que para o nosso caso ainda vai no início. Além disso, não se pode descurar as catástrofes naturais acontecidas no ano passado, cujas feridas ainda abalam grande parte das populações do centro e norte.

 

Ou seja, mesmo admitindo que tudo vá correr “normalmente” num futuro a médio prazo, realisticamente falando, o governo não terá cinco anos para pôr em prática com tudo aquilo que colocou naquele papel e diz propor-se fazer: terá bem menos.

 

O que vale é que, com a maioria parlamentar que possui, este governo terá sempre a certeza de que as suas propostas, sejam elas quais forem, passarão, sempre que submetidas à Assembleia da República. É a tal ditadura do voto, resultante das (sempre suspeitas) vitórias retumbantes e maiorias absolutas, que em nada contribuem para a edificação de uma verdadeira democracia, dado o espírito acrítico e a “dependência ideológica” dos nossos deputados. E neste último aspecto incluo também os membros das outras bancadas…

 

A meu ver, antes de embandeirar em arco, todo o seu leque de “iremos fazer isto, iremos fazer aquilo”, deveria ter havido um trabalho profundo junto dos diversos sectores (Ministérios e afins) para se ter a certeza de que efectivamente existem condições objectivas para se levar a cabo todas as intenções. E isso passa por apresentar argumentos inabaláveis.

 

Algo mais consistente e convincente, de tal modo que não ouçamos – como aconteceu no relatório de uma das Comissões – a oposição a dizer que “isto não é um PQG, são balelas!” (HL)

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