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terça-feira, 03 maio 2022 07:38

O "endeusamento" da PGR - quem pagou a factura da festança?

Escrito por

NovaOmardino

 

"Os cães ladram e a caravana passa"

 

Na última semana do mês de Abril do ano de 2022, na Pérola do Índico, as atenções estiveram voltadas para a Assembleia da República (AR), a dita casa do povo e, para alguns, a escolinha do barulho ou dos que comem só por aplaudir! Afinal, não era por menos – uma figura ilustre estaria lá por dois dias, apresentando seu informe anual, sobre o estado da justiça no país.

 

O informe estava robusto em termos de tamanho e organização, mas minúsculo de acções para quem chora por um país livre do crime organizado! Na AR, a Procuradora falou de diversos tópicos organizados em oito capítulos, entre eles: organização interna, controlo da legalidade e direitos humanos, criminalidade, prevenção e combate à corrupção, recuperação de activos, desempenho processual, cooperação jurídica e judiciária internacional e conclusões e perspectivas.

 

Portanto, no meio daquela tonalidade de voz e engates linguísticos, seguidos de desculpas, o exercício perdeu interesse quando a PGR demonstrou que, de facto, aquele exercício é mais para agradar os políticos, em concreto o partido no poder – Frelimo, que o povo que diz representar! Por mais um ano, o importante foi trazer números que nada dizem e nem existem certezas de que sejam realísticos mesmo. Até os valores monetários gastos no processo sobre Manuel Chang e que temos o direito de saber a todo o custo, uma vez que como povo somos o Estado e contribuímos para ele, a PGR não se dignou a abordar!

 

A ideia era mostrar trabalho lendo aquelas 199 páginas. A ideia não era informar o povo o que era feito naquele emblemático edifício! Coadjuvada ou animada com as palmas que eram feitas de frase em frase pela bancada do partido Frelimo, a PGR sentiu, como quem diz, que o importante são estes moçambicanos que estão satisfeitos com o meu trabalho, mesmo que alguns estivessem a fingir, pois, quando chegar a vez de alguém, irá dizer também que não confia na PGR. A ideia é esperar a sua vez e, enquanto não chega, que se lixem os outros!

 

O caricato foi no momento das perguntas e respostas. Enquanto de um lado, um grupo elogiava e cantava hosanas para ela, doutro lado, o outro desdenhava e nunca chegava a dar mérito ao que dizia. Era como se fossem "cães tinhosos de hoje" ou moçambicanos de quinta categoria – porque não filhos e enteados – tanto é que não conseguiu dizer aos moçambicanos qual foi o partido que levou a denúncia do calote para o seu Gabinete, como se isso ainda constituísse segredo do Estado!

 

Enquanto cidadão e jornalista, atento aos fenómenos sociais e políticos que acontecem no país, eu esperava que a PGR exibisse um vídeo das casas, carros, bens e dinheiro apreendido, de quem são e onde estão. Esperava que revelasse quais são os magistrados, polícias, advogados, agentes da polícia que colaboraram com o crime organizado, para não ser mais uma especulação que ouvimos todos os dias nos “chapas” e em parangonas noticiosas. Esperava que a PGR dissesse que já tinha elementos suficientes sobre o desaparecimento do Jornalista Ibrahimo Mbaruco. Que já sabia como os terroristas recebem dinheiro e quem são os colaboradores nas cidades e negócios.

 

Esperava que a PGR revelasse que já havia detido os chinocas que estão a destruir as dunas em Gaza. Os nacionais e estrangeiros que estão a poluir os rios na província de Manica e os seus cúmplices instalados no governo em troca de 10 quilogramas de ouro mensais. Esperava que, para além de Manuel Chang, a PGR também lutasse e mediatizasse a transferência de moçambicanos detidos por diferentes crimes no estrangeiro e que também, durante anos, o fizeram por aqui, porque eles também são moçambicanos, para que não transpareça que se está a lutar por Chang por ser da elite, à qual V.Excias pertencem!

 

Esperava, incluindo os demais moçambicanos, que a PGR nos informasse acerca do paradeiro dos filhos de Mariano Nhongo, pois, embora o pai fosse quem era, os filhos não podem e nem devem pagar pelo mal que ele fazia! Esperava que a PGR revelasse as principais rotas de entrada e saída de drogas pesadas no país, ou seja, quem permite, quanto ganha por fazer aquilo e onde estava o seu património. Esperava que a PGR explicasse aos moçambicanos porque esta festança de UGEA’s em tudo que é canto!

 

A PGR teve seu espaço para brilhar aos olhos dos cidadãos isentos e apoiantes de uma justiça justa, o que não se verificou, porque o que se demonstrou, durante os dois dias, é que o objectivo era agradar quem a nomeou e o partido maioritário! O importante era apresentar estatísticas, enquanto os filhos de moçambicanos trabalhadores são raptados e ninguém sabe de nada!

 

E tudo viria a ficar claro quando os vídeos e fotos da festança começaram a circular pelas redes sociais. Que, afinal, a PGR tinha ido a um campo de combate, ou seja, pelos vídeos, os colaboradores da PGR aparentavam ser familiares de um soldado que havia sido dado como morto, mas que num belo dia aparece na porta de casa!

 

Mas não, era uma representante da legalidade, que deveria combater a “hosanização” do Estado, o que propicia conduta indesejada na gestão e desvio de comportamento daqueles que devem agir de forma insuspeita e imaculada. Em algum momento, aparentava ser uma festa surpresa, em homenagem a mais uma data natalícia da PGR, mas logo, veio a mente que não precisava ser naqueles moldes e o discurso da festança acabou denunciando que, de facto, em causa estava mesmo o informe!

 

Rapidamente, as imagens “viralizaram” nas redes sociais. Diversas perguntas foram levantadas sobre os fundos da festança e se a luxuosidade que se verificou no evento havia sido contribuição dos funcionários da PGR ou saído dos cofres do Estado? Independentemente da resposta dada a esta questão, acaba manchada a cor branca da camisa ou pano que cobre a Procuradoria-Geral da República e os seus funcionários, num país sério. Talvez um dia nos venham clarificar, como em pleno dia laboral, deixasse processos e de controlo da legalidade para a realização de uma festança ao estilo da Roma antiga.  

 

A mente continuou a parir questões. Principalmente, porque estamos no país onde a idoneidade dos que lideram e que são liderados está em cheque, ou seja, todos têm teto de vidro e basta uma pedra para que tudo se quebre. Não existem imunes à corrupção e, num contexto em que o exemplo deve vir de cima, o que se assiste são hosanas a quem não merece, pelo menos em público! Mas não basta, horas depois arrancava um banquete hollywoodiano, com direito à música ao vivo e bolaço recheado – a real causa do evento ninguém sabe. Será que era uma festa de despedida da boss? Ou estão a seguir um calendário do ano não convencional e estavam em pleno final do ano? – Ninguém sabe, pelo menos aqui fora!  

 

O suspense vai continuar, enquanto não houver uma explicação pública do caso e apresentação da factura do evento. Donde foram retirados os fundos para a realização daquela festança? E porque não usar o mesmo aparato cinematográfico para reportar aos moçambicanos sobre as apreensões de activos ilícitos, no estilo Lussati, na República de Angola? Talvez aí teríamos certeza de que a nossa PGR, de facto, está a trabalhar mesmo!

 

(In) felizmente estamos na Pérola do Índico, onde mesmo que tragas críticas positivas e que visam reforçar a nossa jovem democracia, os criticados acabam deduzindo que estão a ser combatidos e levam tudo no estilo do ditado popular de origem árabe: enquanto "os cães ladram, a caravana passa." Enquanto patriota, espero que a nossa PGR venha ao público e diga quem pagou a factura da festança? Precisamos de saber. Também poderiam, através do Gabinete de Comunicação e Imagem, produzir um documentário informativo demonstrando as apreensões dos bens e patrimónios anunciados na AR – se os mesmos são nossos, precisamos de saber! Caso haja dificuldade, pode convocar a imprensa e apresentar estes patrimónios ilícitos apreendidos e avaliados a 1.4 mil milhões de meticais!

 

Temos de passar a exibir estas coisas, daí quem sabe, através do timbre das mansões, os cidadãos de bem não passem a denunciar casas suspeitas e que estejam escondidas em certos locais, já que as pessoas quando lambem muita mola alheia, acabam criando suas marcas e assinaturas! Não basta dizer, devem provar. E esta situação aplica-se aos outros casos. Porque não se deve esconder, o que se diz ser do povo!  

 

PS: Este artigo de opinião foi escrito dentro daquilo que os números 1 a 6 do Artigo 48, da Constituição da República de Moçambique (CRM) preconizam – Liberdades de expressão e informação.

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