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segunda-feira, 01 abril 2019 05:35

Na estação de malas vazias

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Nasceu nos meados da década de oitenta quando a utopia da juventude parecia inabalável. Acabava de morrer o paradigma do povo, Samora Machel, seguido por quase todos, não propriamente - se calhar - por aquilo que ele fazia, mas pela capacidade de contagiar através dos seus discursos caudalosos. Samora era, por assim dizer,  um grande actor projectado em palanques imensos que estravasavam para as ruas e mercados e todos os cantos, por isso não havia como não lhe seguir as peugadas. Ele vibrava de tal forma que parecia imortal, por debaixo da risada, porém, daqueles que o fariam sucumbir sem piedade.

 

Layitha foi dado à luz quando Samora estava no auge, mas pouco tempo depois a aurora de todos nós foi encoberta. Apagou-se o engajamento. O entusiasmo. Aquele que nos dava motivos para acordar sucumbiu aos algozes.  E até hoje, depois dessa tragédia nacional,  a impressão que subjaz é a de que ninguém tem a certeza do destino que nos espera. O pior ainda é que, mesmo sabendo das dúvidas que mais parecem a certeza de que vamos para lado nenhum, mostramo-nos incapazes de inventar um novo futuro.

 

Layitha está num terreno dividido. De um lado brilha o néon que esconde toda a desgraça daqueles que não têm nada. Cintilam as luzes que escamoteam a podridão como os túmulos caiados que pisam os ossos dos mortos. Do outro lado estende-se o sonho trémulo de uma vida que na verdade nunca brilhou para os moçambicanos. E é neste apeadeiro que o homem espera com as malas vazias, pelo comboio que nunca mais chega.

 

 

A última máquina de ferro que passou por aqui era Samora que a conduzia, e Layitha não viu esse comboio. Puxava uma interminável fila de carruagens abarrotadas com o povo gritando, A luta continua! Cabiam todos lá dentro. Ninguém ficava de fora, mas o que veio a acontecer depois é que o maquinista, ao longo da viagem, foi sequestrado e morto e a locomotiva deixada à deriva até ficar sem o combustível que era o próprio Samora.

 

Hipócritas! Esta é a palavra recorrente de Layitha que continua à espera do comboio anunciado. Do novo comboio que tarda. Mas é preciso acreditar. Ter paciência. O comboio há-de vir. Não importa, como dizia o poeta, que seja longa a noite, a verdade é que há-de amanhecer!

 

O que faz Layitha acreditar na invenção de um novo futuro no meio desta desesperança colectiva, são os laivos de luta aqui e acolá. A luta sem pólvora empreendida pelas mentes iluminadas que sobrevivem no fio da navalha. Outras mentes porém foram decapitadas. Não importa, diz o homem no apeadeiro, depois de tudo isto renasceremos das cinzas.

Sir Motors

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