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terça-feira, 22 outubro 2019 07:44

Chifunde... outra vez... agora mais do que nunca

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Eu morava no bairro Canongola, nos arredores da cidade de Tete, e tenho o orgulho de ter assistido ao lançamento da primeira pedra para a construção da Ponte “Base Kassuende”, em 2010, na fase crucial da governação de um presidente audaz, que entretanto poderá ter sido traído pela rede de emelhar da ganância. Guebuza era a águia que percebeu na sua inteligência, que o coração da cidade de Tete não podia continuar a ser flagelado por camiões pesados, na sua passagem incessante para Zâmbia e Malawi. Por isso decidiu erguer a “Base Kassuende”, com  o fim de  desviar  os mastodontes que também contribuiam para a destruição  da ponte Samora Machel, que  une as duas margens  do grande Zambeze, abraçando a urbe e o bairro Matundo, para gáudio dos tetentes.

 

Eu estava lá, naquele torrão, praticamente nas mãos do Daniel da Costa, o escritor  exaltado  por Fernando Leite Couto, como sendo um dos maiores cronistas do nosso país, ao lado do Fernando Manuel. Couto disse de forma descomplexada, clara,  obedecendo a honestidade intelectual, que  Da Costa detém o domínio da língua portuguesa, e ferramentas literárias que fazem dele um cronista invejável. Na verdade eu tenho inveja dele. Inveja do tipo “quem me dera ser como este manyúngwe de um raio”! Ou como Fernando Manuel. Aliás, estes dois, são as minhas principais velas na dissipação da escuridão.

 

Foi uma estadia efémera, que me permitiu, mesmo assim, conhecer boas pessoas. Melhores do que eu. De entre elas a Chifunde, mulher  delicada, de cuja amizade sou indigno. Chifunde é uma almofada de sumaúma, capaz de proporcionar repouso aos errantes mais exaustos e inúteis, como eu. Sem exigir nada em troca, senão fazer votos de que depois de recobrar as energias, a etapa a seguir seja livre de escolhos.

 

E porque a vida é inesperada, Chifunde também é inesperada.  Ligou para o meu celular na manhã de ontem, nove anos depois de nos termos despedido com um “vai com Deus, meu amigo”. E ainda me lembro do profundo abraço que me fez acreditar, mais uma vez, de que a vida é bela.

 

- Sabes quem fala?

 

- Desculpa, não estou a ver quem é!

 

- Esta voz não te lembra nada?

 

Na verdade a voz lembra-me alguma coisa. Pelo sotaque pressuponho que a mulher que fala do outro  lado seja de Tete. Mas quem será? O Daniel da Costa já me tinha dito que o mais importante não é tu teres muitos contactos na tua agenda, mas estares registado em agendas de muitas pessoas. E eu consto na agenda desta criatura cuja voz me empolga. Ainda por cima nas primeiras horas horas da manhã, quando estou a preparar-me para  a caminhada de manutenção das longarinas.

 

- Podes falar mais um pouco?

 

- Estou triste, amigo, por não te lembrares desta voz que gostavas de ouvir. Dizias que, quando eu falava,  parecia o kwatchena (amanhecer)!

 

- Chifunde, meu amor!

 

- Quando é que vens me visitar, meu bem?

 

- Tu guardaste o meu número durante este tempo todo?

 

Era uma pergunta estúpida que eu fazia. Impensada. Que até podia ferir o coração da Chifunde. Mas ela, sóbria,  mostrou-me, uma vez mais, que na verdade não percebo determinadas dimensões.

 

- Eu gosto muito de ti, meu saudoso amigo. Cada palavra de tudo o que me dizias, era um grão de ouro, que  juntei e guardo para sempre no meu coração.

 

- Chifunde!

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