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terça-feira, 03 dezembro 2019 07:35

Joacine Katar Moreira e Helena Taipo - O deslumbramento suburbano

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2019 foi um ano em que a política no feminino trouxe surpresas ao mundo, em português. Duas mulheres que, aparentemente não têm nada a ver, que nunca se cruzaram e não partilham dos mesmos ideais políticos, nem dos mesmos valores na conduta política destacaram-se pela negativa.  

 

Joacine Katar Moreira, guineense, radicada em Portugal e Helena Taipo, a mediática Ministra do Trabalho que interrompeu o seu percurso político, abruptamente, como Embaixadora de Moçambique em Angola, foram notícia pelas piores razões.

 

A primeira, a residir na Europa, e ainda na casa dos 30, ficou conhecida por se assumir como uma mulher “diferente”. É ridículo dizer isto nos dias de hoje, mas foi este o cartão de visita que Joacine apresentou quando transitou de ativista feminista e anti-racista para candidata a deputada do partido Livre, que se posiciona à esquerda europeísta e ecologista.  

 

Num país em que os brandos costumes racistas e os tiques colonialistas ainda estão muito presentes quando um negro ou uma negra “ousa” ser mais que uma diarista, funcionário de shopping ou ultrapassar a barreira do sector terciário, Joacine apresentou mais uma carta ao baralho rumo às eleições – a sua gaguez.

 

A partir daí passou a ser uma espécie de most wanted. Tudo o que era jornal digital, impresso, programa de tv generalista, de informação, cor-de-rosa, amarelo e azul descobriu a pólvora, aliás a futura deputada.

 

Os politicamente corretos, mais conhecidos em Portugal como a “Esquerda Caviar”, uma espécie de Louis XIII da Rémy Martin do conhaque, já que é muito novo rico beber champanhe, apoiaram-na com unhas e dentes. E quem discordasse ou se opusesse a esta candidatura era racista ou intolerante. Como a nossa realidade. Ou és do partido do poder ou estás contra. Foi eleita em Lisboa, como cabeça de lista do partido Livre, e nas freguesias mais endinheiradas da capital.

 

Todo este processo foi mediático, com uma identidade própria que fazia transparecer uma posição global alinhada ao partido. A senhora deputada soube usufruir do palco que lhe foi dado. Da piada que lhe achavam, como dizem na Tuga, tal como nós vibrávamos com as ações da Ministra do Trabalho.

 

Cada vez que a Dra. Helena Taipo encerrava uma empresa de um estrangeiro, considerada ilegal, ou eram denunciados maus tratos a nacionais era aplicada a “quase” a lei de 20/24 para a empresa sair do país. Todos a considerávamos a Super Ministra e ficávamos à espera de assistir mais notícias na televisão sobre as suas emboscadas e as denúncias que chegavam ao Ministério do Trabalho, quase em tempo real. Tornando-se assim a dirigente mais televisiva da governação Guebuza.  

 

Mas há sempre os bastidores destas jogadas políticas. Se por um lado, em Portugal, a deputada Joacine não entendeu que em política ser camarada é um juramento, em Moçambique a camaradagem levou Helena Taipo para trás das grades.

 

Em jornalismo também usamos este termo que vai muito para além de uma palavra.

 

Os camaradas não se separam. Apoiam-se. Não revelam pormenores de bastidores, Protegem-se. E Joacine, talvez pela inexperiência que teima em não assumir, já que acha que uma ativista sabe fazer política e não entende que a Sociedade Civil influencia nas políticas públicas – posição completamente diferente, mas igualmente importante - deixou-se deslumbrar pela sua subida de posto. À semelhança de Helena Taipo revela ter sede de poder e prepotência nas suas ações. Quase que se sente intocável. Um tique de muitos políticos ou aspirantes a serem-no.  

 

À primeira crise pública “denunciou” a comemoração da subvenção que o seu partido ia receber antes de “Ela” própria ser eleita. Passo a redundância. Tal como Taipo se deslumbrou pelo excesso de poder, à deputada bastou-lhe o barulho das luzes e os convites para entrevistas em programas de TV que, se não fosse candidata, teria de ligar 100 vezes para que a produção dos mesmos programas em que  participou a recebessem, em nome da associação que dirigia. Mas ficou-se aos 45 minutos do primeiro tempo. Isto é, bastou um mês e poucos dias de Assembleia da República para lhe estalar o verniz.

 

Foram quase 45 dias de redes sociais, love and hate com a imprensa e opinião pública – porque parece que ninguém pode contrariar a deputada - pois é racista, invejoso ou preconceituoso -  nenhuma ação política palpável que impacte a vida ativa dos portugueses e dos seus patrícios -  tipo uau, nós Africanos estamos orgulhosos da Mana - , uma abstenção sobre um voto de condenação à agressão israelita a Gaza e uma falha crassa no atraso da entrega da proposta da Lei da Nacionalidade, em Portugal.

 

Para muitos de nós, aqui na Pérola do Índico, o erro de Katar Moreira pode influenciar na vida ativa dos nossos familiares. Tudo bem que há outros partidos a avançar com a mesma proposta de lei e se o Governo for inteligente aprova e arruma já o assunto. Mas era parte da Bandeira da Identidade! Afinal?

 

Já Helena, está presa e com presunção de inocência, até ser julgada.

 

O que desejo para ambas é que reflitam sobre o percurso que pretendem fazer, a partir de agora. Percebam que ser ministra, deputada, embaixadora, presidente é servir um interesse comum e não individual. Que se é eleito por um grupo de pessoas que acredita naquilo que “prometemos”. Aqui em Moçambique estamos mal, lá ainda se pode exigir. E que neste mundo em que nós, Mulheres, ainda temos que lutar por um lugar de fala, não venham estragar tudo em nosso nome se afinal o que conta são os vossos interesses pessoais.

 

Khanimambo.

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