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segunda-feira, 22 fevereiro 2021 10:10

A telenovela da expulsão de Tom Bowker

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“We do not care how, just kick him out of the country…”, que numa tradução directa equivale a "não nos interessa como, apenas expulsem-no do País...!", foi o processo que tirou, aos rastos, o jornalista Tom do País. Segue o processo em forma de telenovela, pois só assim se pode relatar esse acontecimento que contou com diversos actores e cenários.

 

“We do not care how, just kick him out of the country…” foi assim que o Concílio de Maputo, composto por anciãos e sábios do País, determinou e seduziu as belas instituições governamentais a apressar um expediente nebuloso contra um escriba estrangeiro que já tinha raízes no solo nacional; ele incomodava as elites nos corredores diplomáticos, nas salas dos mercados e na corda dos investimentos. O desconforto surgiu, pois o homem e o órgão de comunicação social que representava mostravam uma cara de um Moçambique que pouco se conhecia.

 

- O problema é a língua que ele utiliza, incomoda-nos e a traz-nos prejuízos avultados; os outros até são mais agressivos e assertivos, mas escrevem em Português; uma língua que não é predominante em nossos negócios e nem os nossos principais parceiros de cooperação usam-na. Esses que nos abatem com o Português são pouco lidos lá fora. Esse estrangeiro com o seu Inglês nunca nos dá um minuto de sossego: Cabo Delgado aqui, Cabo Delgado acolá, Cabo Delgado isso e aquilo. Até tem um projecto, Cabo Ligado, que dizem estar a receber uns dólares mensalmente. Resolvam-nos isso, já!

 

- Mas chefe, o homem tem tudo organizado; o DIRE em dia e outros documentos legais segundo a nossa Lei.

 

- Não nos interessa, arranjem uma maneira e mandem-lhe embora deste País, nós é que libertamos e dirigimos isso. Ele não pode atrapalhar os nossos negócios.

 

- Excia, os jornalistas, activistas e organizações internacionais vão atirar-se para cima de nós e vão colocar-nos no lugar de um regime autoritário que constantemente ataca a liberdade de imprensa; isto vai linchar ainda mais a imagem do País em tudo que é relatório sobre democracia, liberdades ou direitos humanos.

 

– Isto sabemos… Estes sempre falam e o que acontece nunca chega ao público, apenas nós do Concílio é que ficamos com a informação.

 

- Vocês sabem como nós contornamos todos os escândalos neste País? Isto é de menos, pah! Estes todos vão falar nisso dois ou três dias e depois vai ser mais um caso como os outros. Não se preocupem com isso. Apenas expulsem-no. Porque já temos Savanas, Canais, Cartas, Magazines, CDD's, CIP's e outros que constantemente expõem-nos; agora vem esse estrangeiro, faz parceria com organizações da África do Sul e dos Estados Unidos de América e começa a expor todos os dias o nosso País? Guerra em Cabo Delgado, guerra em Cabo Delgado; como se o País todo estivesse em guerra, isso não podemos tolerar, “kick him out of the country...!"

 

- Chefe! Os impostos que a empresa paga e os trabalhadores de nacionalidade moçambicana que colaboram na empresa dele, como ficarão?

 

- Amigo! Tantas perguntas para quê? Nós já decidimos e vocês só têm de executar…

 

– Mas chefe…, o problema são os relatórios de organizações que vão manchar o País.

 

– Senhor! Já te disse que isto não nos interessa! Tu sabes, quantos moçambicanos já foram injustiçados para que certas coisas neste País caminhassem? Não te preocupes com eles, vão se virar. Resolvam este expediente.

 

- Desculpa Excia, mas não podemos fazer de outra forma? Como assim? Dar um susto nele ou na família dele para ver se muda! Ou mesmo acusar-lhe de um crime qualquer para ver se fica intimidado, como fizemos com os outros. Como o que aconteceu ao Amade Abubacar, Germano Adriano, Matias de Jesus, Fernando Veloso ou Omardine Omar… ou mesmo chefe, podemos levar o tipo para um "passeio turístico" pela cidade durante um dia inteiro ou mesmo no Chiango, conhecer um pouco, o "sabor do nosso bastão" ou até visitar a casa dele como fizemos a Nuvunga, Cortez, Mimbire e outros. São apenas ideias, Excia! "Em nome da nossa boa reputação".

 

- Amigo! Para os que foram nascidos aqui optamos por essas vias. São nossos assuntos internos e estamos a monitorá-los da nossa maneira. Em relação a este expediente, nós já mandamos vários avisos para este homem. Nossos homens da secreta foram para lá, aconselharam o homem e alguns colaboradores dele confiados que não estávamos a gostar, mas se quiseram fazer de irreverentes. Sentiam-se intocáveis porque a embaixada do seu País ia defendê-los, o MISA ou as organizações internacionais.

 

- Vamos vasculhar o homem, aquilo que encontraremos de mau, iremos usar imediatamente.

 

– Não precisa, jovem! Já temos o expediente todo, chamem-no e digam-no que não estamos a achar o registo da sua empresa, pelo que teremos que lhe retirar a acreditação de correspondente.

 

– Mas Excia, em relação a este aspecto sabe que a nossa Lei não fala de registo de websites ou blogs?

 

- Amigo, isso não nos interessa, eles não se dizem um órgão de comunicação social? Então, actuam o homem; se conseguirem podem expulsá-lo ainda hoje.

 

- Está bem Excia! Ordem dada, ordem cumprida…

 

Minutos depois

 

- Tom, bom dia, tudo bem? 

 

- Estou bem. A que devo a honra de receber a chamada da ilustríssima?

 

- Temos um assunto muito sério a tratar. Venha amanhã ao nosso escritório às 08 horas.

 

Dia seguinte

 

- Tom, não estamos a achar o registo da tua empresa aqui em Moçambique e nem no website aparece esta informação, pelo que teremos de te retirar o Cartão de Jornalista que te atribuímos.

 

–  Como? Tudo está em dia. Para além disso, no meu país de origem os órgãos de comunicação social não precisam destes todos elementos para funcionarem.

 

- Lá não é como aqui, já decidimos! Esperamos que nos facultes, agora, o cartão e tens dias para abandonar o País; dirija-se à Migração que eles querem falar consigo.

 

E o jornalista foi aos serviços de migração da cidade de Maputo sem nenhum documento. E chegado lá:

 

- O senhor é o tal do Tom de que tanto se fala…! Humm! Deves abandonar o País.

 

– Mas que mal fiz? O que há afinal?

 

- São ordens superiores e nós estamos apenas a executá-las.

 

- Vou recorrer porque esta é uma decisão ilegal e sem nenhum fundamento

 

– Senhor, o Concílio já decidiu e se insistires em ficar e desafiar-nos vamos mandar oficiais para a tua casa e serás arrastado como um ilegal. E terás um bónus: 10 anos sem pisar este País.

Sir Motors

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