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sexta-feira, 02 julho 2021 09:32

A carta que eu não queria escrever-te!

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Não sei se voltarei! Mas tenho que seguir em frente. A pátria precisa de mim e, também, de ti. Da minha força e inteligência, do teu amor e esperança. Até onde sei, ninguém estava preparado para entrar naquelas matas sangrentas a fim de defender a bandeira – principalmente nesta altura em que os ventos da bonança pareciam estar a bater a nossa janela do quarto.

 

Nasci em Namarrói, na Província da Zambézia. O meu nome é Alfredo Hotakala, porém, nas fileiras sou conhecido por General Hotakala, apesar da minha patente ser a de Capitão. Tanto faz! Para mim, o mais importante é o trabalho que fazemos e não as insígnias que carregamos nos nossos ombros.

 

Eu tenho 30 anos de idade, e sou formado pelo famoso Exército Vermelho, na República Federal da Rússia, cidade de Volgogrado, nas especialidades de Inteligência Militar, Fuzileiro Naval e Aeroespaciais, onde fui condecorado com a medalha Júkov, pelas habilidades demonstradas durante a formação, bem como as missões em que participei com distinção.

 

Tristemente, hoje voltei à casa e encontrei parte dela em chamas. Vi amigos com os quais ingressei no mesmo ano nas fileiras mortos desumanamente, e outros cujos corpos nunca mais foram achados.

 

Além disso, vi filhos bravos que esperavam ter a patente mais alta do Exército. Queriam servir à pátria em mais missões, ver os seus filhos a crescer e formar-se. Trabalhar e fazer amor com as suas doces e belas esposas! No entanto, quis o destino que Cabo Delgado se tornasse num cemitério –um autêntico inferno na terra.

 

Jasmin, meu amor, espero que esta carta te encontre preparada e segura. Que o brilho e a cor dos teus olhos não escureçam com a quantidade de lágrimas e tristeza que a mesma irá criar em ti. Não chore por mim! Nós vamos vencer este inimigo.

 

Amor, escrevo-te esta singela carta, não como despedida, mas como símbolo da minha eterna heroicidade e amor à terra que nos viu nascer. Caso eu tombe em combate e vocês não recebam os meus restos mortais, coloque uma coroa e velas naquela minha foto de coroação na Crimeia, que está no centro da nossa sala de estar. E a cada data do meu aniversário, meu amor, acenda uma vela e leia esta carta para os meus filhos – e faça-lhes perceber que os homens sábios sempre foram corajosos e abnegados! Que eles entendam que o meu amor por Moçambique foi jurado com sangue e entrega total, sem reservas.

 

Eu bem sei que um dia estaremos em paz e perceberão o valor do nosso sangue derramado. Aprenderão a história dos grandes homens que tombaram em defesa da nossa soberania e da unicidade dos nossos umbigos que tão cedo caíram e desapareceram nas areias e águas do rio Maputo ao Rovuma.

 

Amor, esta é a carta que eu não queria escrever-te, mas tive de o fazer!

  

Em homenagem aos grandes homens que tombaram em defesa da pátria…

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