Não se cansa de dizer que destruíram a beleza da Maxixe. Repete isso, sempre que procura o mar, a partir do antigo Hotel Golfinho Azul, e não o vê. O próprio Hotel perdeu o sentido da sua existência, por isso fechou e está a cair por si mesmo, implodindo no silêncio da dor. O que dói é que ninguém se importa com a derrocada desse símbolo tão importante, agora transformado. Em mamarracho.
O Hotel Golfinho Azul tem uma esplanada que se escancarava para a baía, deleitando não só os que nela desfrutavam da vida, mas os transeutes anónimos, aos quais bastava a espectacularidade do lugar, que entrava em harmonia com o miradouro, do outro lado da estrada. É essa memória forte que fere a poesia de Khudzi Nhassengo, mulher incapaz de reunir os pedaços espalhados na raiva de conviver com a anarquia. Com a incultura.
Ocuparam o miradouro, privatizaram-no, construindo um restaurante que leva o nome de “Stop”. Khudzi Nhassengo insurgiu-se contra esta acção, considerando-a uma violação ao nosso direito colectivo de estar ali, a contemplar a arrebatante paisagem que inclui o arquipélago de Mucucune e a Ilha de Inhambane. Gritou, implorando que não cometessem tamanha agressão ao meio ambiente, sobretudo à alma das pessoas. Ninguém lhe deu ouvidos.
O Hotel Golfinho Azul só se tornaria essencial com o miradouro. Sem isso, perderia os pulmões. Sem os pulmões, deixaria de respeirar, e sem respirar, morreria, como agora que morreu, sobrando apenas o esqueleto que vai sendo corroído pelo tempo. E o restaurante “Stop” só serve a elite, que goza num lugar que é nosso. Que pertence a toda cidade.
Maxixe era um lindo poema virado para o mar. Havia duas esplanadas que conviviam em consonância: de um lado a “Pousada da Maxixe”, do doutro lado o Hotel Golfinho Azul. E, como o belo atrai o belo, então baía e esses dois empreendimentos hoteleiros, cantavam a mesma música. Da beleza.
Khudzi Nhassengo recorda-se dessa espectacular imagem gravada na memória e no coração, e fica triste. Muito triste ao concluir que todos nós fomos desperezados. Ignoraram-nos como aos vermes. Fecharam a parte frontal da Maxixe e ergueram construções em toda a dimensão da fachada por onde passam os viajantes, sem poderem sequer sentir a aragem do mar e apreciar a natureza que trouxe de volta os flamingos.
Feriram a poesia de Khudzi Nhassengo com estúpidos edifícios, como no tempo em que as mulheres eram dolorosamente tatuadas no rosto, matando a janela inteira do corpo, e o poeta já dizia: o rosto é um pouco a janela da alma. E Maxixe perdeu essa alma. Para sempre!