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quarta-feira, 17 novembro 2021 10:59

Evidências da má distribuição da riqueza na construção da justiça social em Moçambique

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Moçambique é caracterizado, pela respectiva Constituição da República, como um Estado de Direito e de justiça social, baseado no respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, conforme se depreende dos artigos 1 e 3 da mesma lei mãe. Outrossim, as alíneas c) e e) do artigo 11 da Constituição da República, respectivamente, consagram como parte dos objectivos fundamentais do Estado moçambicano: “a edificação de uma sociedade de justiça social e a criação do bem-estar material, espiritual e de qualidade de vida dos cidadãos.” “A defesa e a promoção dos direitos humanos e da igualdade dos cidadãos perante a lei.”

 

Curiosamente, há anos que no ordenamento jurídico moçambicano foi instituída a figura de Vice-Ministros, os quais para além de não serem, constitucionalmente, membros do Governo, não tomam decisões por competências próprias senão por delegação dos seus Ministros e em casos raros, atendendo que a principal função dos Vice-Ministros é a de substituir os Ministros em caso de situações de impedimentos destes. Trata-se de uma espécie de suplentes dos Ministros nos vários Ministérios em que tal figura foi concebida. “O Ministério é dirigido por um Ministro, que pode ser coadjuvado por um ou mais Vice-Ministros.” Assim determina o n.º 3 do artigo 43 da Lei n.º 7/2012, de 8 de Fevereiro (Lei de Base da Organização e Funcionamento da Administração Pública).

 

O Governo da República de Moçambique é o Conselho de Ministros, o qual é composto pelo Presidente da República que a ele preside, pelo Primeiro-Ministro e pelos Ministros. É o que dispõe o artigo 199 e o n.º 1 do artigo 200 da Constituição da República. Daqui resulta inequívoco que os Vice-Ministros não integram a composição dos membros do governo e apenas participam em reuniões do Conselho de Ministros na qualidade de convidados, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 200 da Constituição.

 

No entanto, em virtude desse cargo de Vice-Ministro que é meramente cosmético, estes beneficiam de uma remuneração significativa aproximada a dos Ministros, incluindo subsídios e/ou regalias e alguma equipa de trabalho de assessoria ou assistência. Em bom rigor, os Vice-Ministros não têm uma função pública que justifique a remuneração que auferem, até porque sequer deviam existir, na medida em que quase que nada fazem para a prossecução do interesse público no contexto da governação ou Administração Pública. Importa aqui referir que o autor do presente artigo não conseguiu, rigorosamente, apurar o valor actual da remuneração dos Ministros e Vice-Ministros e respectivas regalias e/ou subsídios devido à deficiente disponibilização do interesse público no País.

 

De acordo com o n.º 1 do artigo 96 da Constituição da República: “A Política económica do Estado é dirigida à construção das bases fundamentais do desenvolvimento, à melhoria das condições de vida do povo, ao reforço da soberania do Estado e à consolidação da unidade nacional, através da participação dos cidadãos, bem como da utilização eficiente dos recursos humanos e materiais.” Na mesma sequência, determina o n.º 2 do mesmo artigo constitucional que: “Sem prejuízo do desenvolvimento equilibrado, o Estado garante a distribuição da riqueza nacional, reconhecendo e valorizando o papel das zonas produtoras.”

 

Ora, os Vice-Ministros constituem, pois, cargos cosméticos, senão parasitas, de inaceitável elevado custo nas contas do Estado, o que contraria a promoção da justiça social e realização dos direitos humanos, representando mais uma evidência de má distribuição da riqueza entre os cidadãos e o cada vez mais empobrecimento dos pobres que com muito sacrifício pagam impostos para, de entre outras coisas, sustentar os salários e regalias dos Vice-Ministros. 

 

  1. Notas conclusivas

 

Nos termos em que foi concebida e aprovada a função do Vice-Ministro, mais do que promover um Estado despesista e consumista para uma certa classe elitista, promove a discriminação, a desigualdade e injustiça social entre os cidadãos, principalmente entre os funcionários e/ou servidores públicos, com tarefas bastante significativas, quando comparados com os Vice-Ministros.

 

Portanto, os custos suportados pelo Estado com os cargos dos Vice-Ministros contribuem anualmente para a denegação da materialização do direito ao desenvolvimento dos cidadãos no que à distribuição da riqueza para o bem-estar das populações diz respeito, uma vez que parte significativa dos fundos públicos que deviam ser canalizados para a satisfação do interesse público com impacto directo na melhoria das condições de vida dos cidadãos são alocados para alimentar cargos irrelevantes para os objectivos da Administração Pública, conforme é o caso dos Vice-Ministros, cuja eliminação se mostra urgente.

 

Por: João Nhampossa

 

Human Rights Lawyer

 

Advogado e Defensor dos Direitos Humanos

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