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quinta-feira, 16 dezembro 2021 07:13

As mangas (e mágoas) de Dezembro

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O mês de Dezembro lembra-me a época das mangas em plenas férias escolares. Lembra-me o deixar anoitecer para “tirar sem permissão” as mangas do quintal da inexpugnável, à luz do dia, casa do Senhor Ibrahimo. Eram mangas formosas que se cochichava serem descendentes de Homoíne (Inhambane), talvez por força da origem do dono do mangal. 

 

Certas vezes o Senhor Ibrahimo montava emboscadas que se mostraram improdutivas por conta da acção de um companheiro de armas, por sinal seu rebento, que antecipadamente alertava da presença dissimulada do pai.

 

Tem graça que não tenho memória do sabor das mangas (de Dezembro) do quintal do Senhor Ibrahimo. Na verdade, o sabor nem estava nas mangas, mas sim nos esforços empreendidos para tê-las como companheiras em mais uma noite de papo no muro da esquina, que a malta da zona apelidara de “Muro da Vergonha”.

 

Não faço ideia quem terá sido o compositor da denominação deste mítico muro, mas seguramente uma justa homenagem, cujos históricos frequentadores ainda devem-na uma homenagem. O muro até amparara alguns compatriotas de regresso da Alemanha do Leste quando da queda do seu homónimo em Berlim e de outros, sacudidos pela mão dura do Apartheid.

 

Numas dessas memoráveis noites de mangas – as de (suposta) ascendência em terras de Homoíne - um transeunte, que se aproximara curioso da camaradagem do grupo, pedira, no final da sua longa intervenção, que os seus companheiros ocasionais gravassem para a memória que “As fartas mangas de Dezembro não preenchem os meses de mágoas”.

 

Estas lembranças, e para fechar, vêm desinteressadamente a propósito do discurso sobre o Estado da Nação, a ser hoje proferido pelo mais alto magistrado do Estado moçambicano. Ou seja: que o discurso sobre o Estado da Nação não seja apenas uma farta manga de Dezembro.

 

E dito à moda da malta da zona, na esquina dos tempos do “Muro da Vergonha”: mais do que o sabor das mangas do quintal do Senhor Ibrahimo, interessava, e sabe melhor, a magia do sabor pela forma como as mangas foram conquistadas.

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