O título é uma ligeira adaptação de um trecho de uma música doce do cantor brasileiro Djavan e vem a propósito do que se acompanha na imprensa sobre uma (suposta) guerra entre organizações da sociedade civil pelos lugares que a cabem na Comissão Nacional de Eleições (CNE). Pelo histórico é uma rixa periódica, normalmente, salvo erro, de cinco em cinco anos. Agora a curiosidade é a de saber sobre o que tanto de doce tem a CNE? A curiosidade ainda adensa quanto a razão da guerra e se ela existe por que não evitá-la?
A dita guerra foi acirrada por uma decisão da Assembleia da República que marcara o tempo oficial de 15 dias de entrega de candidaturas para os cargos em pauta. Uma parte da sociedade civil quer que se avance para a entrega e uma outra não concorda e quer que se adie e, ainda, que antes haja um debate público sobre as regras, pois, e o tempo testemunha, o actual modus-operandi não passa de um exercício que só alimenta cada vez mais a desconfiança e a fertilidade da cooptação. De resto, em conta-corrente, é muito estranho que se faça tanto alarido para ser parte de um órgão que a mesma sociedade civil, e não só, rotula-o de parcial, manipulável e ao serviço de um determinado partido.
Neste contexto, que saídas? A renúncia geral definitiva pode ser uma boa e pacifica saída. E que as partes desavindas proponham como alternativa um concurso público aberto a candidatos singulares, desde que reúnam os requisitos e a altura da competência e idoneidade exigidas. Aliás, havendo alguma guerra a ser feita que seja dirigida para a definição dos requisitos dos candidatos a título singular e do respectivo processo de selecção. Não seria esta uma simpática saída? Sobretudo, e apenas, quanto ao preenchimento dos lugares da sociedade civil.
Infelizmente (e para qualquer mudança), o tempo dos 15 dias já se esgota. O mesmo com o tempo deste texto, e com a sensação de que teria sido melhor gasto a ouvir Djavan. E para quem leu até aqui, certamente que também pergunta: Afinal o que será que Deus pôs ali (na CNE)? Djavan até que vai mais longe quando a dado momento canta: “Por que será que Deus pôs ali.”
É líquida a ideia de que a implantação de (grandes) projectos de exploração de recursos naturais e parte deles esgotáveis, fora os seus entretantos, gera benefícios para as comunidades locais. E uma vez que a terra dos rongas acolhe a capital do país - igualmente um grande projecto - há quem pergunte pelos benefícios locais disso, sobretudo, e como qualquer projecto, a capital também tem o seu tempo (indeterminado) de duração. Foi assim pelo mundo, incluindo o caso da Ilha de Moçambique, a antiga capital de Moçambique, que em 1898 foi preterida a favor de Lourenço Marques, actual Maputo. Tal possibilidade, a de um dia Maputo deixar de ser a capital, e no quadro do debate sobre a sustentabilidade da exploração dos recursos naturais, leva à reflexão sobre a sustentabilidade da exploração da terra dos rongas como a capital do país, atendendo, e a história prova, que o recurso terra-capital é também esgotável.
E depois que o recurso terra-capital esgotar do que se sustentará Maputo? Não será uma nova Ilha de Moçambique que mal consegue preservar o património erguido por ser a capital, um estatuto que lhe fora retirado, e que se saiba, sem nenhuma indemnização e de nenhuma alocação orçamental anual por ter sido a capital. Provavelmente haja quem não tema a mudança e ache que a cidade das acácias sobreviverá assim como a cidade brasileira do Rio de Janeiro que, em 1960, perdeu o estatuto de capital para Brasília e nem por isso perdeu o seu fulgor. Mas, segundo alguns escritos que não vêm ao acaso, a perca do estatuto de capital do Brasil é apontada como a responsável da crise crónica em que o Rio vê-se mergulhado até hoje, incluindo a da auto-estima do carioca (o ronga do Rio de Janeiro), nunca recuperado desde que a cidade maravilhosa perdeu o estatuto de capital.
Curiosamente, nos dias que correm, parte das razões que ditaram a mudança da capital da Ilha para a então Lourenço Marques – alguns apontam as de ordem económica/financeira (minas sul-africanas) e de soberania (receio da tomada do estratégico porto de Lourenço Marques) face a interesses ingleses, colonizadores da África do Sul - estão novamente à superfície (cofre à norte e soberania ameaçada também à norte) e não me admira que se comece a futurar uma nova mudança. Aliás, este debate não é novo, e por existir uma experiência amarga de uma vítima entre nós o seu desfecho merece um tratamento constitucional no sentido de assegurar direitos vitalícios para a cidade que perca o estatuto de capital. Certamente um assunto para ser ponderado no devido tempo, mas que não deixa de ser um bom ponto de reflexão por ocasião da passagem de mais um aniversário da cidade de Maputo (10 de Novembro). Parabéns cidade das acácias pelos seus 133 anos e também, por arrasto, embora não saiba o dia e mês, pelos 122 anos com o estatuto de capital.
Berlim, 12 de Junho de 1987. Nesta data e em plena Guerra-Fria, Ronald Reagan (1911-2004), então presidente norte-americano, fez um discurso histórico diante do portão de Brandemburgo, um símbolo na delimitação entre a Berlim oriental (socialista/comunista) e a Berlim ocidental (capitalista). Neste discurso, Ronald Reagan, dirigindo-se ao então líder da então União Soviética, Mikhail Gorbatchev, disse: “Secretário Geral Gorbachev, se você busca a paz, se você busca a prosperidade para a União Soviética e a Europa Oriental, se você busca a liberalização, venha aqui para este portão. Sr. Gorbachev, abra este portão. Sr. Gorbachev, derrube este muro!”
Matola, 09 de Novembro de 2020. Trinta e um anos depois da queda do muro de Berlim e na data consta que Ronald Reagan ressuscitara pela terras matolenses. Quem o viu conta que Reagan, diante da vedação da nova sede municipal, proferiu um discurso dirigido ao actual edil da Matola. No final disse: “Sr. edil da Matola, se você busca a prosperidade para a Matola, se você busca a democracia participativa e apregoa a presidência sem paredes, a vedação da nova sede municipal é uma oportunidade ímpar para o demonstrar. Sr. Edil da Matola, esta vedação não faz nenhum sentido. Sr. edil da Matola, remove esta vedação!”
O discurso de Ronald Reagan de Junho de 87 é apontado como um dos principais catalisadores para a queda do muro de Berlim o que veio a ocorrer dois anos mais tarde. Espero que o discurso de 09 de Novembro não leve tanto tempo a produzir resultados. E pelo o que me consta, para fechar, o edifício da nova sede municipal da Matola é, entre pares, o primeiro vedado a nível nacional. Nem a sede do Município de Maputo, a capital do país, está vedado. E aqui o munícipe e o turismo agradecem.
PS: O actual aparato de obras no novo edifício do Município da Matola é um indicador de que está para breve a inauguração. Provavelmente, e pela proximidade da efeméride, será no dia 05 de Fevereiro de 2021, a data de celebração de mais um aniversário da Matola. Até lá é possível remover a vedação e alocá-la para escolas com problemas de segurança e que certamente existam na Matola. Assim, na data de inauguração, inaugurasse-a também a vedação de escolas abrangidas. Também, e até lá, até que se podia fazer algumas alterações nos acessos e circulação pedonal em benefício de uma mobilidade mais segura. Mas isto é um outro texto.
Na área metropolitana do Grande Maputo quem assim responde está a comunicar que não vem ou que não tem hora para chegar, mas sempre tarde. O certo é de que não se encontra na portagem, o posto de cobrança pelo uso da estrada localizado na divisória entre as cidades de Maputo e Matola. Pensei nisto quando vi um trecho de uma entrevista do actual edil de Maputo a propósito dos 133 anos da cidade capital que foram celebrados no passado dia 10 de Novembro. Na entrevista, entre outras promessas, a de que em 2021 ter-se-á novidades do metro de superfície. Não é a primeira vez que ouço deste edil tal promessa. No seu primeiro consulado (2004-2008) prometera-o para o (suposto) mandato seguinte, mas tal, o mandato, fora barrado pelo seu partido, preterindo-o a favor da candidatura do anterior edil de Maputo que nos seus dois mandatos, reiterou copiosas vezes a promessa. E como um bom filho, a promessa está de regresso à casa.
Será desta o metro? Se eu fosse um dos assessores do actual edil, um guru e referência de exemplar gestor público, recomendá-lo-ia alguma prudência, a par da experiência anterior, a menos que não esteja interessado num segundo mandato, esperando assim despachar tudo num único, incluindo o metro de superfície. Aliás, na entrevista o edil deixa bem claro de que não é o tipo de político que promete e não cumpre. Contudo, e perante mais uma promessa do metro vir à superfície, um meu próximo e grande observador dos processos de governação do país, perguntaria: “Sobrinho! Esse tal de metro o que vem mesmo fazer? Complementar o caos?”. Para o meu saudoso tio a melhoria da mobilidade não parte do vazio e de que o primeiro passo seria o de acabar com o caos instalado, incluindo o das ideias. E quanto a este tipo de caos, temo que as ideias estejam também “a passar portagem”.
Por acaso, e a propósito de qualidade, salta-me à memória um treinador americano de basquetebol do Benfica de Portugal que em tempos, perante a falta de talentos, dissera de que antes da qualidade o objectivo era a quantidade. E assim o clube saiu às ruas de Lisboa a procura de potenciais jogadores tomando a altura como um critério-chave. Aposto que se o mesmo raciocínio fosse aplicado na melhoria da qualidade da mobilidade na área metropolitana do Grande Maputo o metro não só viria à superfície como complementaria a qualidade existente. Ou seja: que antes de pensarmos em trazer o melhor, começássemos pelo que se devia ser feito em prol da qualidade do que temos disponível (infra-estruturas, meios, políticas e serviços). É bem provável, e para fechar, que seja por aqui a razão da resposta dada pelo “Metro de Superfície” quando perguntado se ainda vinha (à Maputo).
Decorrente do frenesim das eleições americanas, e porque disputadíssimas, a media internacional, e não só, tratou de concluir que a América estava profundamente dividida. E no caso, o estar dividido, dito como se fosse um assunto da mais alta gravidade. Confesso que até fiquei com dúvidas em relação a democracia como um bom modelo de governação, pois não cola que uma eleição com a maior participação de sempre e disputadas até ao período de compensação fosse dada como um problema de “saúde pública”. O contrário – que um dos concorrentes ganhasse com uma larga maioria – é que seria o saudável? Talvez sim, porque, supostamente, significasse que a América saísse mais unida.
Afinal, em democracia, e porque divide, os altos níveis competitivos entre concorrentes não é saudável e deve ser combatido. E eu convencido de que os resultados das eleições americanas estavam a demonstrar a vitalidade da sua democracia, e quiçá a da democracia pelo mundo fora. Puro engano. E ainda mais, sendo a América a democracia mais consolidada do mundo e com o actual inquilino da Casa Branca aos berros, chego a triste conclusão de que em democracia o equilíbrio não é salutar e que o melhor é que uma das partes ganhe e quanto possível de forma retumbante.
Neste contexto, diante do equilíbrio entre os candidatos e na sequência a ideia de que tal (uma América competitiva) não é saudável, pois divide, e de que a união só com uma maioria retumbante, dei por mim a pensar no processo eleitoral moçambicano que fora na mesma diapasão é mais maduro. Aliás, uma escassa vitória eleitoral entraria em choque com a constituição, particularmente com um dos objectivos fundamentais do Estado moçambicano que é a consolidação da unidade nacional.
Em síntese, para fechar, o equilíbrio eleitoral não é bem-vindo (em Moçambique e pelos vistos nem na América) e que uma vitória retumbante é um imperativo nacional de união e tal decorre, na Pérola do Índico, de um comando constitucional. Neste aspecto, os Estado Unidos da América deviam colher a experiência moçambicana para que em próximas eleições não brinquem em serviço.
Nos últimos meses um dos pratos fortes da media é a corrida eleitoral para a presidência americana. Hoje, 3 de Novembro, é o dia decisivo. Fora as candidaturas o que me chama atenção é a “ausência” do homólogo americano do nosso presidente da Comissão Nacional de Eleições (CNE), o Cheikh Abdul Carimo. Daí a pergunta se alguém o terá visto ou, e é possível, que tal figura nem exista na América.
Faço a pergunta porque não estou habituado a ver eleições em que os organizadores não são os principais protagonistas ou mesmo em que os candidatos sejam os principais protagonistas. Por cá, a Pérola do índico, a CNE/STAE é o centro das eleições. Esta é mais famosa do que os candidatos e de longe dos respectivos manifestos eleitorais. Por cá o debate político não é entre os candidatos, mas sim no seio da CNE/STAE. E como se não bastasse, posso estar enganado, a nossa CNE/STAE dá a sensação de funcionar como se fosse o Colégio Eleitoral para os americanos que é quem, na verdade, elege o presidente da nação mais poderosa do mundo.
Em síntese, e para terminar (hoje tenho pouco tempo por força das eleições americanas) passo a concluir, e a propósito do título do texto, que o homólogo americano da nossa CNE/STAE é o Colégio Eleitoral e este, pelo que eu saiba, não anda desparecido. Isto, pelo menos, até ao anúncio dos resultados da eleição americana, pois, em caso de derrota de Trump (candidato republicano), é bem possível que o homólogo americano do Cheikh Abdul Carimo ( ou figura similar) venha a terreiro e passe a ser a figura principal. Afinal de contas, e mesmo a fechar, a Pérola do Índico também consegue interferir nas eleições da nação mais poderosa do mundo. Aliás, há poucos dias, tal não deixou dúvidas quando uma comitiva de Biden (candidato democrata) foi impedida de fazer campanha no Estado de Texas, uma espécie de província de Gaza para os republicanos.
“Porque carga de águas a paz é a excepção e não a regra (em Moçambique e no mundo)?”. Perguntei a um amigo, no quadro do mês da celebração do dia da paz (04 de Outubro) cuja trajectória nacional (ontem, hoje e amanhã) passei-a, em revista, num texto anterior (O Dossier da Paz).). “Porque a paz éum assuntode amantes”. Assim,e prontamente,respondeu o citado amigo, concluindo, em seguida, e com ares de sabichão: “Que falar de amantes é falar de Casa2, uma matéria, que fora complexa, é igualmentedo foro da excepção”. E para completar a resposta, caso ainda persistissem dúvidas, o amigo ainda sugeriuque eu consultasse a Carta das Nações Unidas, a sua fonte.
Dei-me tempo para uma leitura rápida da Carta. Voltei à conversa e perante os parcos resultados da minha pesquisa,o meu amigo reiterou a complexidade do assunto,o que me valeu um perdão, e um TPC: ler o número 1 do artigo 4”.Assim procedi. “A admissão como membro das Nações Unidas fica aberta a todos os Estados amantes da paz…”. Ainda decorria a leitura e de repente umbrusco e sonoro ”Para ai mesmo”seguido deumapausada e objectiva chamada de atenção: “Viste bem: amantes da paz e não cônjuges da paz”. Na sequência, e em jeito de xeque-mate, ele conclui com a seguinte pergunta: “Como é que a guerra não prevalecerá se até asNações Unidas consagram osamantes, em detrimento dos cônjuges ou casados, como os fautores da paz?”
E a propósito: Moçambique apresentou, recentemente, a sua candidatura a membro não-permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Aliás, este assunto, o de ser membro não-permanente, e nos termos da lógica do supracitado amigo, também éda esfera da “Casa 2”, uma vez que a Carta das Nações Unidas, e quanto ao órgão em pauta, categoriza osseus membros, e mais uma vez em detrimento dos cônjuges (nível 1) em (amantes) permanentes (nível 2) e em (amantes) não permanentes (nível 3).
De toda a maneira, e brincadeiras de lado, é tempo de as Nações Unidas deixarem de ser a “Casa 2”(níveis 2 e 3) do mundo sob o risco de passarem para o nível 4, vulgo “Marandza”(alta intensidade e curta duração), e com consequências catastróficas parao sistemainternacional, sobretudo o de ordem financeiro. O alerta é vermelho (risco muito alto), agravado com a combinação explosiva dos tempos de pandemia da Covid-19 com a aproximação da época balnear e da quadra festiva, prevendo-se assim a ocorrência de avultados danos materiais, e até mesmo humanos tal o grau de severidade.
O dia 05 de Outubro de 2017 marca o início da insurgência terrorista no norte de Cabo Delgado e Mocímboa da Praia, o ponto de partida dos ataques, lembra-me o sismo (7.5 na escala de Richer) que abalou a Pérola do Índico, em particular as regiões centro (local do epicentro) e sul no ano de 2006. A lembrança, na verdade a semelhança, está no espanto. O espanto em ter ficado a saber da vulnerabilidade de Moçambique para acolher tal fenómeno e do facto de Mocímboa da Praia ser afinal uma região estratégica cujo porto é “um dos mais estratégicos” do país e quiçá da costa oriental da África subsahariana. Até 2006 não era notícia (ou de domínio público) que o sismo fosse um fenómeno que estivesse sorrateiramente alojado entre nós e, por estes tempos, que um outro tipo de sismo – o terrorista – tivesse que eclodir para vir à superfície a dimensão estratégia (económica e de segurança) de Mocímboa da Praia.
Levei o assunto à mesa do papo, entre amigos, neste final de semana a propósito da passagem dos três anos de insurgência terrorista. O grosso da opinião apontava como responsável desta ignorância geográfica a existência de problemas de comunicação do executivo ou mesmo a falta dela sobre assuntos basilares do país. Aliás, a falta de uma estratégia de comunicação governamental é um défice que o Jornalista Tomás Viera Mário tem repetidamente apontado nas suas intervenções públicas. No entanto, voltando ao debate, uma outra opinião foi a de que a falta de comunicação ou de informação de assuntos como a vulnerabilidade do país à ocorrência de sismos ou sobre a dimensão estratégica de Mocímboa da Praia, para citar como exemplos, não é o problema. Para esta corrente o problema é de base e é educacional (escolar e cívica). Mais adiante, o consenso de que a combinação do tal défice educacional com o de comunicação governamental constitui um potencial atentado à segurança do Estado. Porventura seja por aqui uma das trincheiras de combate.
Uma outra lembrança de semelhança são as fugas da população. No sismo de 2006, ocorrido à noite, assistimos, na cidade de Maputo por exemplo, ao corre-corre súbito dos munícipes, sobretudo o dos residentes em prédios altos. Em Mocímboa da Praia o corre-corre diário da respectiva população, deixando para trás os habituais locais de residência. Desta semelhança, um detalhe: no sismo de 2006, o grosso dos “deslocados/desalojados” dos prédios da cidade de Maputo trajava camisetes (feitos pijamas) de seminários/workshops com dizeres/palavras de ordem sobre o combate a pobreza ou de promoção do desenvolvimento. E do grosso dos deslocados/desalojados de Mocímboa da Praia, a imagem de uma Nação que (de facto) dorme com os problemas do povo.
Infelizmente as semelhanças não se estendem ao regresso à casa. No sismo de 2006, os “deslocados/desalojados” regressaram aos seus apartamentos depois de algumas horas. Para os deslocados/desalojados da Mocímboa da Praia, a noite ainda vai longa e por enquanto e de Agostinho Neto (1922-1979), poeta e 1º presidente de Angola independente, a esperança do sonho “Havemos de voltar”: “ (À Mocímboa) Havemos de Voltar/ Às casas, às nossas lavras/às praias, aos campos/havemos de voltar”. E mais adiante: “Aos nossos rios, nossos lagos/às montanhas, às florestas/havemos de voltar”. Que assim seja e o mais breve possível.
Faz algum tempo que eu contei a saga sobre a “Revolta dos Beneficiários” cujo epicentro é a “Lista dos Participantes”, vulgo de presenças, e que circula nos seminários para o seu preenchimento e assinatura. Foi graças à assinatura desta lista que os beneficiários de potenciais apoios de projectos ou programas de combate à pobreza e/ou de promoção do desenvolvimento chegaram a uma lista geral de cidadãos, entre nacionais e estrangeiros, a serem punidos com a pena máxima, uma sentença decorrente da alegação de que os beneficiários, o potencial grupo alvo de tais projectos, foram usados no lugar de apoiados. Daí a “Revolta dos Beneficiários”.
Com a Covid-19 e por força da proibição de aglomerações e do fecho de fronteiras , a“ Lista dos Participantes” foi uma das principais vítimas e também uma salvadora da Covid-19. A sua ausência impactou negativamente na economia, sobretudo na indústria hoteleira e de transportes, e ainda evitou contactos de alto risco, atendendo que os seminários, pelo menos os ditos bem sucedidos, constituem um cocktail de participantes provenientes de diversos locais a nível nacional assim como internacional.
Para a História, fora o bom do lado salvador, creio que será pelo lado das vítimas que a História lembrará a “Lista dos Participantes” em tempos da Covid-19. Numa outra perspectiva, e a fechar, a ausência da “Lista dos Participantes” reduziu a possibilidade de alguns ( os mais assíduos) ocuparam os lugares cimeiros de cidadãos a abater ou, no mínimo, a constarem na lista da “Revolta dos Beneficiários”.
PS: Na retoma dos seminários é possível que os dados a preencher da “Lista dos Participantes”, nomeadamente o nome, organização, função, proveniência, contactos bem como a respectiva assinatura ou rubrica, sejam acompanhados por outros sobre a Covid-19, tais como: “Positivo ou Negativo”, “Positivo Activo ou Recuperado”, “Sintomático ou Assintomático”, “Quarentena Domiciliar ou Hospitalar” e por ai adiante.
Quando alguém chega à uma residência e nesta, à partida, não se vislumbram sinais de alguma alma viva é normal que se pergunte “Alguém em casa?”. Depois de algum tempo, e perante o silêncio, é ainda normal que o visitante entre pela casa dentro. Diante do cenário de abandono e sem que ninguém interpele, o visitante, nos dias que se seguem, paulatinamente apodera de um e outro pertence até ao dia, e por força do silêncio, em que decide definitivamente assentar arraial como o todo poderoso.
O intróito foi a propósito de uma conversa de Chapa esta manhã. Um dos passageiros reclamava pelo destino de um país entregue aos antónimos dos nacionais. O tal passageiro, para fundamentar o seu protesto, contava que os seus gastos diários, incluindo os de construção, eram invariavelmente feitos em “vários países”. Disse ainda, em tom jocoso, de que os únicos locais em que os mesmos (gastos) eram intramuros a Covid-19 tratou de fechá-los. Insistido por outros passageiros para que revelasse os tais locais o passageio pronunciou bem alto “Barraca” e bem baixinho “Escondidinho”. Um outro passageiro, e com ares de um universitário em defeso forçado pela Covid-19, teorizou a tirada, denominando tais locais de “conclaves de soberania”, incorporando nestes o Chapa. Segundo ele, os ditos “conclaves de soberania” ainda não foram tomados pelos antónimos dos nacionais, um entendimento posto em causa por outros passageiros e até com recurso à exemplos concretos.
O debate foi prosseguindo à media do para e arranca do Chapa. Embora com uma enorme vontade de continuar a participar (em silêncio), tive que descer numa paragem junto à uma instituição pública que, por coincidência, era o meu destino. Já no interior e depois de uma hora ainda aguardava ser atendido. Infelizmente não era o único e até por mais tempo. Enquanto esperava veio-me à mente o episódio do “Alguém em Casa?”. Pelos vistos pouco ou nada mudou desde a penetração dos povos Bantu, passando pela dos árabes, a dos europeus e mais recentemente a de outras latitudes e a da própria renovação, em outras vestes, das primeiras penetrações. É a sina da hospitalidade da Pérola do Índico. E como diz um meu primo: “I'm telling you”.