“Persiste, infelizmente, a prática de actos preparatórios, mormente, o recrutamento e coordenação da logística dos raptos dentro dos estabelecimentos penitenciários, pelo que, em articulação com a Direcção do SERNAP [Serviço Nacional Penitenciário], temos estado a reforçar a nossa actuação no sentido de fiscalização e responsabilização dos autores”.
Este é o retrato da indústria dos raptos, partilhado ontem pela Procuradora-Geral da República, Beatriz Buchili, durante a apresentação, na Assembleia da República, do seu penúltimo Informe Anual.
Falando a partir do pódio da Assembleia da República, Buchili voltou a render-se à indústria dos raptos, tendo reiterado que as cadeias continuam a ser locais de preparação e coordenação logística deste tipo de crime, que continua a fazer vítimas em todo o país, com destaque para as cidades de Maputo e Matola.
“A título de exemplo, numa das operações de fiscalização, foram encontrados 12 telemóveis na posse de arguidos envolvidos nos crimes de rapto, em algumas celas das unidades penitenciárias, cuja conduta mereceu devido tratamento em sede de processo próprio”, afirmou.
Segundo Buchili, o crime de raptos tem estado a sofisticar-se, tornando mais complexa a sua investigação, pois “os seus agentes actuam dentro e fora do país”, usando meios tecnológicos de comunicação sofisticados, “o que torna difícil a localização imediata dos seus autores, bem como o rastreio dos pagamentos de resgate”.
Outra sofisticação, disse a Procuradora-Geral da República, prende-se com a mudança dos locais de cativeiros e dos meios e formas de pagamento do valor de resgate. Buchili conta que a prática anterior apontava para a localização dos cativeiros em bairros suburbanos, mas actualmente localizam-se em zonas nobres das cidades, “cujos pagamentos são feitos em valores avultados e em numerário ou com recurso a moeda criptográfica”.
Em termos de desempenho processual, Beatriz Buchili afirma que o Ministério Público registou, em 2022, 15 processos-crime, sendo 11 com 41 arguidos em prisão preventiva, um com três arguidos em liberdade e três contra desconhecidos, comparativamente a 14 processos-crimes do ano anterior, o que representa um aumento de um processo, correspondente a 7,1%.
“Findaram 19 processos, tendo recaído despacho de acusação em 11 e de arquivamento em 8”, refere o documento.
Refira-se que os estabelecimentos penitenciários não têm sido apontados apenas como centros de preparação e coordenação dos raptos, mas também como laboratórios de casos de burla, através de mensagens de SMS e da rede social facebook. (Carta)