Está cada vez mais evidente e cristalino que o crime organizado já se encontra enraizado no sector da justiça, tendo o Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) como a principal face de uma rede que envolve magistrados, juízes e advogados.
Ontem, a Procuradoria-Geral da República denunciou o envolvimento de 10 funcionários da justiça em actos de corrupção, na província de Maputo. Trata-se de um procurador, um juiz e oito agentes do SERNIC e da Polícia de Protecção, que são acusados de prática dos crimes de associação criminosa, abuso de cargo ou função e de falta de promoção de procedimento criminal.
Em causa, diz o Ministério Público, está o facto de os 10 elementos, que foram constituídos arguidos, terem ocultado provas criminais contra um cidadão tanzaniano, acusado de tráfico de drogas, por forma a tirar vantagens financeiras.
De acordo com o Ministério Público, o caso ocorreu em Junho de 2021, quando agentes do SERNIC e da Polícia de Protecção (ramo da Polícia da República de Moçambique) detiveram um cidadão de nacionalidade tanzaniana, suspeito de tráfico de drogas do norte do país para a capital do país.
“Em acção concertada, entre eles, ocultaram a existência da droga na residência do suspeito, assim como ignoraram a realização de diligências pertinentes para a descoberta da verdade material, tendo precipitadamente promovido a sua soltura, que foi anuída pelo juiz de instrução, sob alegação de não haver indícios da prática de crimes relacionados com o tráfico e outras actividades ilícitas”, refere o documento.
No entanto, o comunicado do Ministério Público não esclarece quanto dinheiro os indivíduos receberam do cidadão tanzaniano por este serviço e muito menos revela se estes estão ou não detidos.
Refira-se que este não é o primeiro caso de funcionários da justiça acusados de ocultar provas de crimes de tráfico de drogas ou que usaram a sua qualidade para tirar vantagens financeiras dos criminosos.
Lembre-se que, em Fevereiro de 2022, o Ministério Público acusou agentes da PRM e do SERNIC, afectos às direcções da cidade e província de Maputo, junto às Brigadas de Rapto e Criminalidade Organizada, de terem raptado uma cidadã moçambicana que, curiosamente, se dedicava ao tráfico e venda de drogas.
Na ocasião, a PGR sublinhou que os indivíduos (cujas identidades não revelou) estavam numa missão criminosa. “Pretendiam apoderar-se de bens, drogas e valores monetários na posse da cidadã, uma vez que a mesma se dedica ao tráfico e venda de drogas, tendo-a ameaçado e agredido fisicamente, com recurso a armas de fogo do tipo Makarov e AKM”.
Já em Abril do mesmo ano, durante a apresentação do seu Informe, a Procuradora-Geral da República, Beatriz Buchili, defendeu que o combate ao crime de raptos encontrava barreiras, devido ao envolvimento de agentes do SERNIC, da PRM, advogados e magistrados.
“O envolvimento de alguns membros de corporações ou sectores ligados ao tratamento desta matéria, tais como SERNIC, PRM, advogados e até magistrados, bem como de outros actores do judiciário, cria fragilidades na investigação e instrução dos respectivos processos, além de perigar a segurança daqueles servidores públicos que estão comprometidos com o combate ao crime”, disse a fonte, mas sem revelar o número de advogados e magistrados envolvidos. (A.M.)