O anúncio formal de um dos maiores investimentos de sempre em Moçambique está agendado para terça-feira pelo consórcio de exploração de gás natural liderado pela petrolífera norte-americana Anadarko. O plano de desenvolvimento da Área 1 da Bacia do Rovuma, em Cabo Delgado, a província mais a norte de Moçambique, está avaliado em 25 mil milhões de dólares - o dobro do Produto Interno Bruto (PIB) do país, ou seja, a riqueza que o país produz a cada ano.
A cerimónia de decisão final de investimento está marcada para terça-feira e esta é só metade da prosperidade prometida, porque um plano de dimensão semelhante já foi aprovado pelo Governo para outro consórcio, que vai explorar a Área 4, na mesma bacia, e cujo anúncio final pode acontecer até final do ano.
Os projetos de gás natural devem entrar em produção dentro de aproximadamente cinco anos e colocar a economia do país a crescer mais de 10% ao ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI) e outras entidades.
Para lá chegar, a Área 1 vai investir 25 mil milhões de dólares que vão ser utilizados para furar o fundo do mar, sugar o gás natural através de 40 quilómetros de tubagens para uma nova fábrica em que vai transformado em líquido, na península de Afungi, distrito de Palma.
Ao lado desta fábrica vai ser construído um cais para navios cargueiros especiais poderem ser atestados com gás natural liquefeito (GNL), que vai ser vendido sobretudo para mercados asiáticos (China, Japão, Índia, Tailândia e Indonésia), mas também europeus, através da Eletricidade de França, Shell ou a britânica Cêntrica.
Haverá ainda uma parcela mais pequena que vai ficar no país e que será canalizada para produção de eletricidade, transformação em combustíveis líquidos e adubos, em Moçambique.
Tudo deve estar pronto lá para 2024: o plano da Área 1 prevê inicialmente duas linhas de liquefação de gás com capacidade total de produção de 12,88 milhões de toneladas por ano (medição para a qual se usa a sigla mtpa), sendo que o empreendimento pode crescer até oito linhas.
A ambição justifica-se com o tamanho da descoberta feita desde 2010 na Área 1 e que ascende a 75 "triliões de pés cúbicos" (tcf, sigla inglesa) de depósitos de gás, enterrados debaixo do mar - um número gigante: 75 seguido de doze zeros, sendo que na vizinha Área 4 o valor chegará a 85 tcf.
Dito de outra forma, se houvesse uma lotaria de gás natural, Moçambique tinha ficado com a sorte grande e a terminação.
A Anadarko considera as jazidas da sua Área 1 equivalentes ao dobro do gás e petróleo que há para explorar na área britânica do Mar do Norte e classifica a bacia do Rovuma como a próxima grande zona de exploração de hidrocarbonetos do mundo.
Além da Anadarko, que lidera o consórcio com 26,5%, o grupo que explora a Área 1 é constituído pela japonesa Mitsui (20%) e a petrolífera estatal moçambicana ENH (15%), cabendo participações menores à a indiana ONGC (10%) e à sua participada Beas (10%), à Bharat Petro Resources (10%), e à tailandesa PTTEP (8,5%).
A Anadarko deve ceder a liderança do consórcio à francesa Total até final do ano, depois de ser comprada (processo ainda em curso) por outra petrolífera dos EUA, a Occidental, que por sua vez celebrou um acordo para venda dos ativos em África.
O consórcio da Área 1 avança desde há ano e meio com diversas obras de preparação em Cabo Delgado.
Os trabalhos incluem uma nova aldeia onde vão ser realojadas comunidades que vivem no local de implantação da fábrica, novas estradas e uma pista de aviação para servir a futura cidade do gás de Palma, destinada a centenas de novos trabalhadores que vão operar o megaprojeto.
Os trabalhos de engenharia e construção envolvem dezenas de empresas, algumas das quais portuguesas, e todas têm estado sob pressão devido aos ataques armados de grupos criminosos em Cabo Delgado.
Um motorista moçambicano ao serviço da firma lusa Gabriel Couto foi assassinado em fevereiro no primeiro ataque a atingir trabalhadores do empreendimento - e após o qual já houve feridos noutros incidentes.
A petrolífera Anadarko tem referido que, apesar de haver funcionários atingidos, não há sinais de que os agressores visem o investimento, garantindo ao mesmo tempo que as medidas de segurança estão a acompanhar o evoluir das ameaças. (Lusa)