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terça-feira, 16 julho 2019 04:47

Filipe Nyusi mostra aos gestores do Banco de Moçambique a relevância da GAPI – Análise

No fim-de-semana, o Presidente Filipe Nyusi teve um daqueles assomos de pragmatismo, mostrando como ele enxerga mais longe que toda a corte de gestores do Banco de Moçambique quando se trata de abraçar e proteger instituições nacionais que realmente contam para a batalha de desenvolvimento do país. “A Gapi está a investir no desenvolvimento do País”, disse ele.

 

Nyusi saudou o contributo da Gapi ao visitar uma feira económica realizada em Lichinga, cujo mote era o lançamento da campanha de comercialização agrícola, inaugurada há uma semana, em Manica, onde a Gapi, em parceria com o Instituto de Cereais de Moçambique (ICM), deram mãos à operacionalização do Fundo Rotativo de Comercialização Agrícola.

 

 

Ao visitar o pavilhão da Gapi em Lichinga, Nyusi interagiu com agricultores e comerciantes rurais provenientes dos distritos do Niassa. Eles foram a Lichinga expor sua produção e serviços. Ao Presidente Nyusi, os expositores disseram que a Gapi não apenas financiava suas actividades. “A Gapi ensina como criar a empresa e a fazer bom controlo dos dinheiros e do negócio para não falharmos”, rematou um deles.

 

Era o testemunho brutal sobre o papel de uma instituição financeira de desenvolvimento, que participava numa feira com empresários locais de “pé descalço”, um terreno onde raramente se encontraria um Standard Bank ou qualquer outro dos “big five” do sector financeiro.

 

O abraço quente do Presidente à Gapi segue-se ao ataque feroz que a instituição sofreu do Banco de Moçambique, fazendo tremer os alicerces de uma entidade relevante para a dinamização do tecido produtivo local (numa altura em que “diversificação da economia” virou moda no discurso oficial). Há duas semanas, o Banco de Moçambique retirou as licenças a dois gestores seniores da Gapi, António Souto (que há mais de 30 anos carrega no dorso o desiderato de uma instituição financeira virada para o desenvolvimento) e Anabela Mucavele.

 

O BM alegou que a Gapi tinha as contas no vermelho, mas isso estava desmentido por uma auditoria recente da Deloitte. Aliás, a Gapi obteve, também recentemente, um rating A+ numa avaliação continental de Instituições financeiras de desenvolvimento africanas. Com a indicação de Rogério Zandamela, há cerca de três anos, para a liderança do banco central, a supervisão tem sido cerrada a todos. O BM tem vindo a impor ao rigor extremo normas provenientes dos acordos de Basileia 2 e 3.

 

O grande problema para a Gapi é a ausência de um quadro legal que supervisione o trabalho de instrumentos financeiros de apoio ao desenvolvimento, vigorando a ideia de que o sistema financeiro são apenas bancos comerciais e instituições aceitantes de depósitos do público, no quadro de uma Lei das  Crédito e Sociedades Financeiras restritivas.

 

Mesmo assim, a Gapi tem obtido um tremendo sucesso na mobilização de financiamento e na dinamização do sector produtivo local. No caso de Niassa, segundo explicações dos gerentes locais da Gapi, programas em curso estão a ser implementados com contribuições financeiras de instituições como o Fundo Internacional para o Desenvolvimento da Agricultura (FIDA), a Agência Dinamarquesa para a Cooperação (DANIDA), Banco Árabe para o Desenvolvimento Económico de África (BADEA) e do próprio Governo, particularmente do MIC, MITADER/DNPDR,  MASA e do Tesouro Nacional. Em quase todos os programas que implementa, a Gapi comparticipa mobilizando fundos dos seus próprios accionistas privados.

 

Nos últimos dois anos e meio, as equipes da Gapi trabalhando em vários distritos do Niassa organizaram mais de 120 acções de formação beneficiando cerca de 3 mil participantes entre agricultores, comerciantes rurais e jovens técnicos recém-formados. No mesmo período, as linhas de financiamento disponibilizaram créditos a cerca de 90 empresas locais num montante total na ordem dos 85 milhões de Meticais.

 

O elogio do Presidente Nyusi aos trabalhos da Gapi foi pertinente  sobretudo pela possibilidade de o mesmo poder gerar um debate na sociedade e no Governo sobre o que é que queremos fazer com a Gapi. Se não precisamos de um sistema de apoio ao desenvolvimento do sector produtivo, numa abordagem séria e profissional para promover capitalistas, ou seja, uma classe média local com raízes em pequenos negócios geradores de emprego e riqueza local. Ou se vamos continuar a ter uma economia dependente de "lobistas e lavadores", sem verdadeiros capitalistas, como há dias disse Luísa Diogo.

 

O elogio do Presidente foi também um recado para os gestores do regulador, que apenas se apegam estritamente a legalismos e normas duvidosamente aplicáveis à realidade de uma economia predominantemente informal e sem infra-estruturas nem tecido empresarial. Os resultados estão à vista: o sistema bancário está cada vez mais impossibilitado de financiar Pequenas e Médias Empresas em sectores estratégicos. Por outro lado, nos últimos três anos, centenas de Pequenas e Médias Empresas encerraram por falta de acesso a capital e muitos milhares de postos de trabalho estão a ser perdidos...alimentando cada vez mais o sector informal e a crescente vaga de descontentamento social.

 

Agora, a grande questão que fica é: será que o Governo tem capacidade para entender este desafio e agir? E será que o Presidente Nyusi irá para além do elogio de Niassa? (Marcelo Mosse)

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