A onda de condenação e repulsa às controversas declarações proferidas pelo professor Julião Cumbane continuam. Depois do Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), agora é a vez da Federação de Jornalistas de Língua Portuguesa (FJLP), do “cinzento” Sindicato Nacional de Jornalistas de Moçambique (SNJ) e o MISA-Moçambique emitirem o seu posicionamento em relação ao assunto.
Em nota, datada de 14 de Fevereiro último, as duas agremiações falam de uma “ameaça de extrema gravidade”. Para além de condenar as manifestações de incitação à violência contra os jornalistas, exigem a tomada de posição por parte das autoridades moçambicanas em relação ao posicionamento do também Presidente do Conselho de Administração da Empresa Nacional de Parques de Ciência e Tecnologia.
Julião Cumbane, conhecido pela sua devoção à causa do “lambebotismo”, através da sua conta do Facebook, exige que o Estado Maior da Forças Armadas de Defesa de Moçambique, o Comando Geral da Polícia da República de Moçambique e o Serviço de Informação e Segurança do Estado conjuguem “inteligência e acções enérgicas - mesmo extrajudiciais, contra notícias miserabilistas que desmoralizam as Forças de Defesa e Segurança, que combatem os ataques por procuração nas regiões centro e norte do país”.
“A FJLP e o SNJ condenam mais essa manifestação de incitação à violência contra a imprensa e, por consequência, ao Estado Democrático de Direito, porque prega a violação dos direitos fundamentais. Por isso, rogam a imediata manifestação da autoridade competente de defesa dos direitos constitucionais em Moçambique para sua posição em contraposição à opinião do cidadão-servidor público expressa em texto aberto e de chamamento à violência de Estado, divulgado na rede social Facebook”, lê-se no comunicado conjunto das duas agremiações, assinado por Alcimir António do Carmo.
Adiante, a Federação de Jornalistas de Língua Portuguesa diz que tem estado a acompanhar com elevada preocupação a repressão de que tem sido alvo os jornalistas no país. Aliás, prossegue, tal preocupação já foi manifestada, via oficiosa, ao Presidente da República, onde na essência defendem a “necessidade de garantir que jornalistas de todos os veículos de comunicação/imprensa locais e internacionais possam desenvolver o seu trabalho necessário e fundamental à garantia de acesso à informação dos cidadãos locais e internacionais e a consolidação da democracia em Moçambique”.
A tentativa de sequestro de que foi alvo o editor do Canal de Moçambique, Matias Guente, no passado dia 31 de Dezembro, as detenções de Amade Abubacar, Germano Daniel Adriano e Estácio Valoi são alguns exemplos de violência contra os jornalistas citados pela FJLP.
Perante o quadro, a FJLP apela “às autoridades em Moçambique que garantam, sem restrições, e em todo o seu território, o acesso à informação, os direitos à liberdade de imprensa e de expressão, e que esses sejam respeitados para que os jornalistas nacionais e estrangeiros possam exercer as suas prerrogativas profissionais em liberdade e segurança, sem intimidações, perseguições ou ataques”.
“Clara e crassa ameaça à liberdade de imprensa e de expressão”, MISA
Já o Instituto para a Comunicação Social da África Austral, capítulo de Moçambique, fala de uma situação “de clara e crassa ameaça à liberdade de imprensa e de expressão, destinadas, sobretudo, a jornalistas e órgãos de comunicação social que, nos termos da Constituição da República de Moçambique (CRM), da Lei de Imprensa e demais diplomas legais e/ou instrumentos de Direito Internacional de que Moçambique é parte, se interessam pela documentação jornalística da sobredita insurgência”.
No seu comunicado de imprensa, também divulgado na última sexta-feira, 14 de Fevereiro, o MISA-Moçambique defende que “não pode ser aceitável num Estado de Direito Democrático” o pronunciamento feito pelo também PCA da Empresa Nacional de Parques de Ciências e Tecnologias (ENPCT), porém, sublinhou: “infelizmente, já se registaram, desde que os actos de insurgência se acham activos em Cabo Delgado, situações de actuação ilegal contra Jornalistas e pesquisadores de direitos humanos perpetradas pelas próprias FDS, como foram os casos, por exemplo, das detenções dos jornalistas Amade Abubacar e Estácio Valoi, bem assim do pesquisador David Matsinhe”.
A instituição lembra, no comunicado, que Moçambique é um Estado de Direito Democrático; onde a liberdade de imprensa e de expressão, enquanto direitos fundamentais na República de Moçambique, “não se encontram condicionadas por conta das insurgências activas em Cabo Delgado ou dos actos atribuídos à auto-proclamada ‘Junta Militar da Renamo’ em Sofala e Manica”; que é o dever do Estado Moçambicano proteger os direitos dos cidadãos, em geral, e dos jornalistas, em particular, mesmo em situações de guerra; e que as liberdades de imprensa e de expressão “apenas podem ser limitadas, se se estiver a observar o estado de sítio ou estado de emergência, o que não é, presentemente, o caso”.
Por isso, o MISA-Moçambique exige ao Ministério Público para que cuide de demandar a observância da Constituição da República e das leis por parte do Prof. Julião João Cumbane, com o que se efectivará, ainda, a educação jurídica da sociedade.
Apela ao Presidente da República, enquanto Chefe do Governo, para que cuide de garantir que todos os servidores públicos, sobretudo os que exerçam cargo de direcção, chefia e confiança, cuidem de observar, em todas as suas actuações públicas, a Constituição e as leis, conforme preconizado no Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado. Apela ainda a Filipe Nyusi para que, conforme o juramento por si prestado no acto da sua investidura, garanta que a liberdade de imprensa, enquanto direito fundamental e pilar da democracia, não seja objecto de cerceamento ilegal.
Segundo o MISA-Moçambique, o Conselho Superior da Comunicação Social (CSCS), enquanto órgão constitucional a quem compete assegurar a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão, não se manter “em silêncio em face de situações similares à ameaça do Prof. Julião João Cumbane, condenando-as e exercendo o seu papel de guardião da salvaguarda destes direitos fundamentais, em Moçambique”. (Carta)