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segunda-feira, 17 dezembro 2018 03:07

Samir Patel: o raptor da Beira

Na quarta-feira passada, a Beira dormiu aliviada. Samir Patel tinha sido preso, depois de apontado como mentor do rapto da filha do maulana Zayn, da Ponta Gea. A menina foi devolvida ao convívio familiar no passado domingo, 9 de Dezembro. Tinha estado no cativeiro 8 dias inteiros, num lugar não revelado pela Polícia. Eventualmente, os raptores terão desistido de cobrar um resgate quando se aperceberam que Zayn não possuía o dinheiro que eles imaginavam. Não se conhecem detalhes sobre como a menina escapou do cativeiro.

 

“Foi um alvo errado”, disse uma fonte policial na Beira. Com Samir, foram detidos outros três suspeitos, dois dos quais identificados por Tamires e Alfredo. O rapto da filha de Zayn na Beira, pela gang de Samir Patel, foi relacionado com um outro rapto, em Maputo, de uma figura sonante da comunidade muçulmana em Moçambique: o conhecido empresário Yacoob Lunat, que se encontra no cativeiro a 39 dias. Lunat tem cerca de 80 anos e não goza de boa saúde. Desde que ele foi raptado, as autoridades policiais têm-se remetido no silêncio. Há duas semanas que o Comando Geral da Polícia não presta informação à comunicação social.

 

Quando a filha de Zayn foi raptada, em determinados círculos da comunidade em Moçambique se especulou que o crime terá sido orquestrado para pressionar a família Lunat em Maputo a pagar o resgate exigido para a libertação de Yacoob. A relação de Yacoob com a menina raptada na Beira é de parentesco. A menina é bisneta de Yacoo Lunat. É designadamente neta do conhecido clérigo muçulmano, Nazir Lunat (filho de Yacoob), maulana na Mesquita da avenida Eduardo Mondlane em Maputo. A filha de Nazir casou na Beira com Zayn, filho de um falecido empresário e carola do futebol Beirense, Faruk Badat, que já foi Presidente do antigo Palmeiras da Beira.  

 

O facto de Lunat permanecer no cativeiro até hoje está a desgastar a família, que prefere que o caso tenha o mínimo de publicidade possível para, alegadamente, proteger o cativo. A prisão de Samir na Beira tinha sido vista no seio da corporação como um bom passo para se chegar aos raptores de Yacoob. Há quem insista, no entanto, que os dois casos não tem relação, mas o rapto de avô e neta num curto espaço de tempo foi uma coincidência estranha.  

 

A prisão de Samir Patel foi, entretanto, celebrada com champanhe em muitos círculos empresariais da Beira. Ele era um reincidente no crime. No ano passado, fora detido em conexão com o mesmo tipo de crime, posteriormente liberto mediante pagamento de caução no caso de ameaça de sequestro de cidadão português. Samir é descrito como um “criminoso por tendência”. Vivia uma vida cheia de extravagância. Diz-se dele que nunca trabalhou mas ostentava um estilo de vida de luxo. Trocava de carros como de roupa e gostava de fios e anéis de ouro, e de companhia feminina. Sua personalidade era problemática.

 

Teve uma infância “banhada de ouro”. Seu pai, o “velho Patel”, foi um importante fornecedor do Ministério do Interior, quando este era dirigido pelo falecido Coronel na Reserva Manuel António. O pai tinha um contrato de gestão do antigo Supermercado da PRM, no Maquinino. Samir era o filho mais “mimado” da família Patel, privilégio adquirido por ser o caçula entre os homens. Salimo era o mais velho, depois seguiam-se Mussa, Enusso e Dadho. Todos eles tiveram um percurso errático. Cresceram sempre com relacionamentos dentro da Polícia. O pai Patel era conhecido como um gentleman. Fazia-se apresentar sempre a rigor, sapatos “bica” e fato completo, um tique profundamente janota. Não faltava um lenço no bolso superior do casaco, ou as vezes uma lapela e um pente com que aparava constantemente o cabelo. Era um fumador inveterado.

 

Mas era um homem respeitado na cidade e a sua relação com a Polícia dava-lhe ainda mais respeito, tanto que era considerado o “patrão” dos membros da PRM na cidade da Beira. É ele que garantia o abastecimento de produtos para o sustento dos membros da PRM e respetivas famílias. Na altura havia o sistema de vale e o pagamento era feito por desconto direto no salário mensal dos agentes da PRM. Essa facilidade fazia com que o supermercado ficasse sempre lotado. Vezes sem conta, os agentes policiais levantavam um determinado produto a certo preço e revendiam a preço superior, uma alternativa para terem dinheiro para outras necessidades.

 

Último entre quatro irmãos, Samir é também o sobrevivente, a par de Dadho. Enusse perdeu a vida em circunstâncias pouco conhecidas nos anos 90. Salimo, que se mudara para Quelimane, morreu há três anos. Mussa também acabou tendo uma morte estranha em 2017.  Uma fonte disse que ele foi assassinado no mundo do crime. Dadho andou durante muito tempo fora da Beira mas quando regressou vinha doente.

 

Samir entrou no mundo dos raptos recentemente mas já teve antes um caso de violação sexual de uma rapariga, no chamado prédio da TVM, na Beira. O pai da menina, que estava ligado a uma importante empresa de segurança privada, foi impotente para levar Samir à justiça, dado a proteção de que ele gozava junto das autoridades policiais. O senhor acabou por desistir do caso e tirou a filha da Beira. Samir envolvia-se frequentemente em altercações nas ruas da Beira. Mas suas conexões na Polícia falavam mais alto. Mais recentemente, suas ligações a raptos ficaram notadas mas ele sempre gozou de impunidade. Agora, preso, muitos na Beira esperam que haja fortes evidências para se sustentar um caso-crime contra ele. Sua prisão foi despoletada pela denúncia de um comparsa. A Polícia também terá encontrado rastos de ligações telefónicas entre ele e a autores materiais do rapto da menima. (Lucas Mutombo, com M.M.) 

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