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segunda-feira, 02 novembro 2020 07:38

Legado de Carlos Cardoso: as sementes da irreverência

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Neste Novembro que iniciou ontem, passarão 20 anos após o brutal assassinato que tirou a vida ao maior jornalista moçambicano, Carlos Cardoso. Sua assassinada partida violentou nosso imaginário colectivo. CC era um farol contra a corrupção e a delapidação do bem público, como ele gostava de dizer. Um porta-estandarte da integridade. Seus algozes, foram, por decisão judicial, julgados e condenados. Menos mal!

 

Mas abater Cardoso fez o favor a toda uma classe política e empresária entulhada na improbidade e ameaçada pelas investigações do jornalista. Em Novembro de 2000, Carlos Cardoso tinha em seus rabiscos um conjunto de temas sob escrutínio, envolvendo a grande corrupção, centrada nas fraudes bancárias e do tesouro, na expropriação do solo urbano, no tráfico de drogas e de influências, na lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito.  

 

Seu assassinato teve um efeito imediato perverso. O jornalismo de investigação tinha sido directamente visado. O medo se instalou nas redacções. Houve quem baixou a caneta. Cardoso formara muitos jornalistas, desde os anos 80, na AIM, mas nem todos fizeram germinar em si as sementes da investigação. Com seu assassinato, houve quase que um acanhamento geral. Poucos jornais, como os da Mediacoop, davam alguns ares da sua graça. A corrupção e o crime organizados andavam de vento em popa. Temia-se que com o seu assassinado, tudo o que ele plantara tinha morrido. Mas ele deixara afinal um grande legado.

 

O grande legado de Carlos Cardoso foram as sementes da irreverência que ele lançou. Não foram pessoas em concreto. Foram modos de ser e de estar, o direito à indignação, o abraço à investigação, a críticas aos poderes públicos. Cardoso mostrou que a democracia não se compadece com a censura.

 

Uma organização que bem abraçou o legado de Carlos Cardoso foi o CIP. Ao agarrar a luta contra a corrupção e a defesa da transparência, o CIP retoma de certa a agenda e as lutas de CC, agora com outras metodologias em complementaridade com o jornalismo investigativo, e outros referenciais teóricos.

 

Esta organização foi uma reencarnação dos ideais de CC. E berço do activismo conro em prol da integridade, defesa do bem publico. Ao ser replicado por outras organizações, o âmbito temático do CIP acaba espalhando as raízes da irreverência, cultivadas por Carlos Cardoso.

 

O legado de Carlos Cardoso está vivo e recomenda-se: a sociedade civil de Moçambique, incluindo o jornalismo está vibrante, activa e vigilante.        E cada vez sendo replicadas por novas organizações, surgindo como cogumelos que lutam contra a improbidade.

 

Vinte anos depois da sua partida, e- gratificante constatar que a obra de Carlos Cardoso transcendeu a efemeridade de uma notícia ou reportagem estampada num jornal. E é isso que os moçambicanos deveriam estar a celebrar neste Novembro: celebrar a obra profunda de CC. É isso que estamos a fazer aqui na “Carta”, jornal lançado justamente a 22 de Novembro, o dia trágico do jornalismo moçambicanos.(Marcelo Mosse)

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