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BCI
terça-feira, 24 agosto 2021 06:01

O julgamento da consolação

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O julgamento do caso das “dívidas ocultas”, que começou ontem em Maputo, é o segundo de oito capítulos onde se tentará destapar o véu de uma novela trambiqueira que envolveu ganância, enriquecimento ilícito e depauperação de um povo. Uma quadrilha de políticos, governantes, lobistas de meia tijela e funcionários da secreta em conluio com magnatas e vendedores de barcos do eixo Beirute/Paris (apadrinhados por François Holland, que nunca foi tido nem achado), mais a banca suíça (o Credit Suisse com seus banqueiros) e a russa (o VTB), lucrou num processo de endividamento fraudulento, tramando a utopia dos moçambicanos e o sonho de credores que compraram gato por lebre.

 

 

A súcia da dívida oculta está agora toda ela desavinda. Isso explica a profusão dos capítulos judiciais. O primeiro foi o balde de água fria de Brooklyn, em pleno inverno nova-iorquino. Agora segue-se em tenda de gala erigida em recinto prisional de máxima segurança, numa perfeita simbologia com o crime de sangue. Depois seguir-se-ão mais 6 despiques de verbo violento e faca afiada em Londres.

 

Cada um atira a cada outro. Há lutas e sub-lutas. Batalhas campais entre Estados e bancos e banqueiros e fornecedores (vice-versa) e sub-lutas intra-Estado com políticos do vermelhão local se digladiando. Os EUA contra Boustani e outros. O Estado moçambicano contra Teófilo Nhangumele e outros, na curiosa colocação do Tribunal Supremo. Nyusi versus Guebuza, onde tamanho ódio visceral anteveria um “bang-bang” mas não há ainda indícios de rupturas de sangue lamacento dentro da Frelimo.

 

Em Londres, Guebuza tem um aliado forte (a Privinvest), disposto a tudo, incluindo métodos de pura chicana política. Nyusi tem como seu porta-estandarte a PGR, advogado Estado,comedido em sua linguagem.

 

Na semana passada, a Privinvest arrasou Nyusi. Mas a defesa do Estado foi “polite”. De tal forma que que a procissão vai no adro. Em Moçambique, julga-se o guebuzismo em toda a sua extensão. E ainda há espaço para a arrogância desmedida de António do Rosário, com seu cabeçudo ar de inimputável. E Ndambi, brilhando em seus olhos o medo e a surpresa de estar a ser julgado na BO, sob a anuência do todo-poderoso papá.

 

Desse barco guebusista encalhado, Nyusi saltou fora devido à sua circunstância presidencial mas ele não descasa. É um desertor por conveniência. Sua mão avarenta também mergulhou fundo na odiosa gamela da partilha, embora as evidências mostrem que comeu menos – apesar dos gritos do Duncan Mathews em Londres. (...)

 

Para além deste despique, Londres é, pois, o centro das batalhas. Nova Iorque já era. Bousatani foi ilibado e isso criou jurisprudência favorável para Manual Chang. Tal como Anibalzinho, que regressou com ares triunfais nas vésperas do julgamento do caso do assassinato do jornalista Carlos Cardoso, Manuel Chang regressa, dentro de dias, com uma aura vitoriosa – contra os gringos – consciente do seu papel valioso dado que ele tem a chave para a clarificação de uma coisa que comprovaria a podridão do regime guebuzista: que ele agiu em nome do Chefe.

 

O julgamento de Maputo ainda vai no começo. Em Londres teremos Moçambique contra a Privinvest; Moçambique contra o Credit Suisse; o Credit Suisse contra a Privinvest; os credores contra o Credit Suisse; Outros Credores e VTB contra Moçambique; Privinvest contra Moçambique e Nyusi. 

 

A responsabilização criminal do caso em Moçambique era essencial e urgente para quebrar o ciclo da impunidade (e recuperar alguns activos) embora os maiores danos já tenham sido consumados (a crise vigente) e a confiança entre o Governo e os doadores minados (definitivamente o modelo do Apoio ao Orçamento perdeu espaço e dificilmente regressará). Espremendo as coisas, o julgamento das “dívidas ocultas” não passa de um acto de consolação. O dano do calote é irreparável a breve trecho. Moçambique precisa de uma nova geração no poder, descomprometida, credível, para travar este desvario atroz para onde a ganância e a corrupção nos tem empurrado: nossa morte colectiva como nação. 

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