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quarta-feira, 02 outubro 2024 15:10

Vítimas de Monocefalia?

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“O Debate dentro da Frelimo sobre a separação das funções entre a figura do Chefe do Estado e do Presidente da Frelimo não deve ser visto como visando o actual candidato da Frelimo à Ponta Vermelha. Deve entender-se como forma de estruturação da sociedade para melhor servir os interesses do Povo, até porque esse debate remonta a 2010. Infelizmente, nessa altura, como disse o próprio Dr. Óscar Monteiro, não esteve “atento” e as coisas chegaram ao que estamos hoje. Vale recordar que antes tarde do que nunca, ou a Monocefalia terá produzido vítimas!”

 

AB

 

“1. Condição do que tem duas cabeças, do que é bicéfalo: DICEFALIA

  1. Existência de dois líderes que dirigem simultaneamente a mesma estrutura ou organização; liderança bipartida.”

 

"Bicefalia", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2024, https://dicionario.priberam.org/bicefalia.

 

“Eu penso que bicefalismo nem sempre é a melhor coisa do mundo. A unidade de direcção elimina as contradições de direcção. E assim sempre foi. Mas isso é melhor explicado por quem propõe (Filipe Chimoio Paúnde). Nós tivemos até há bem pouco tempo o camarada presidente Joaquim Chissano, que saiu da liderança do partido, e o camarada Armando Guebuza ficou presidente do partido e já era presidente da República. Posso crer que muitas vezes essa preocupação conta com muitas outras preocupações que não têm nada a ver com o camarada Guebuza”.

 

In Canal de Moçambique, Sérgio Vieira, 02/09/2012

 

“O Partido Frelimo tem estado a reboque dos Presidentes da República e dos acidentes da sua governação, em detrimento do seu papel insubstituível de defensor das causas nobres, da igualdade dos homens e mulheres e, sobretudo, de defensor dos mais pobres, das largas massas, para usar uma palavra abandonada senão proscrita. Sim, precisamos de empresariado nacional, de organizadores de processos produtivos, a industrialização é uma exigência que não está a ser levada suficientemente a sério. Eles devem ter a consideração social que corresponde ao seu papel patriótico e a remuneração justa da sua criatividade, imaginação e iniciativa. Mas os Partidos como o nosso, o Partido de Mondlane, Samora e Marcelino existem para reequilibrar a sociedade e defender os mais fracos”.

 

In o País, de 30 de Set. 2024

 

Caso para se dizer: mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. A questão trazida, em carta, pelo Jurista e Político Óscar Monteiro não é de hoje, vem a ser debatida desde 2010, por vários actores da sociedade, no entanto, muitos intelectuais dentro da Frelimo defenderam o princípio de “não Bicefalismo” e, segundo estes, não era a melhor forma de dirigir. Hoje, o Jurista Óscar Monteiro diz de forma taxativa que “não esteve atento”, que estranho!

 

Pessoalmente, já defendi este princípio, aquando, salvo erro, do X Congresso do Partido Frelimo. A reacção, na altura, foi muito boa e a reflexão foi publicada na Rubrica “Olho Aberto” do Correio da Manhã, jornal electrónico sob direcção de Refinaldo Chilengue. Mas porque as pessoas que tomam decisão viam-se numa situação de ter que aceitar uma ideia estruturante de grande impacto, vinda de outras pessoas, decidiram encontrar várias formas de dizer “NÃO” e a situação prevaleceu. Hoje, decorridos 14 anos depois de se levantar a questão, já é assunto para se debater.

 

Eu recordo-me que, na altura, defendia que a Frelimo tinha muitos jovens preparados para a Governação Moderna do Estado, mas que não eram detentores de capital político para dirigirem o Partido e, para que o partido não caísse numa situação de semiabandono e sem clareza nas suas funções, dever-se-ia ter um Presidente da República que fosse da época moderna e um Presidente do partido que tivesse um capital político para dirigir a Frelimo.

 

A questão nem se punha em termos de utilidade deste em relação ao partido ou outras questões que hoje se colocam. Se calhar, a velha guarda pensasse que não chegaria a vez de ser rendida, sendo que a experiência mostra que o partido Frelimo, de facto e de direito, está a reboque dos Presidentes. O que é pior, na minha opinião, é que todas as organizações sociais, à excepção da OJM, dependem da família Presidencial. Só hoje é que os grandes pensadores da Frelimo se apercebem disto? Se sim, é caso para dizer que andaram bastante distraídos e por muito tempo.

 

Por exemplo, a OMM - Organização da Mulher Moçambicana é, automaticamente e por inerência de casamento, dirigida pela esposa do Presidente da Frelimo. Isto faz sentido, nos dias que correm? Penso que não, não faz nenhum sentido, até porque, hoje em dia e no gozo das liberdades, nem sempre as mulheres alinham com o pensamento político do marido, contudo, se assumes o cargo de Presidente, a mulher se torna Presidente da OMM e vai dirigir mulheres que militam na organização há anos. Não será isto desmotivador?

 

Oportunidade do debate devido às eleições

 

Numa reflexão, com o título “Frelimo: Daniel Chapo mais próximo do povo”, voltei a este debate, não porque o candidato da Frelimo se chama Daniel Francisco Chapo, mas porque, na minha opinião, o Chefe do Estado estaria ocupado com os assuntos do Estado que jurou servir através da Constituição da República, enquanto o partido continuaria a prosseguir seus objectivos e focando-se na defesa e promoção do bem social e económico da população. No fim do dia, tanto as acções do Chefe do Estado como as do partido iriam concorrer e sem conflituar para o bem do cidadão moçambicano.

 

Hoje, o Chefe do Estado e o Presidente da Frelimo, por serem a mesma pessoa física, muita pouca importância se dá àquilo que é a preocupação da população. Mesmo em casos evidentes e de clamor por intervenção, nem o partido e nem o estado conseguem enxergar. Devo dizer que estas reflexões, pelo menos do meu lado, não visam o próximo Presidente da República, mas sim a regulação da nossa sociedade através duma Governação moderna e de separação de funções. Se calhar, Daniel Francisco Chapo pudesse ser diferente para melhor neste caso, mas quando se pretende organizar a sociedade, não se deve olhar para a cara de quem vai dirigir, mas no que é melhor para a sociedade.

 

A intervenção do Dr. Óscar Monteiro, por aquilo que é e foi, na estruturação do Estado Moçambicano, desde a sua existência, peca por ser tardia e sobretudo porque o tema em debate não é de hoje. Quando diz que “não estava atento” pode levantar outros debates desnecessários e suscetíveis de nos desviar do essencial. Entretanto, devo agradecer ao Dr. Óscar Monteiro pela reflexão, ainda que seja tardia. Provavelmente, tenha saboreado os efeitos maléficos de monocefalíssimos!

 

Adelino Buque

Sir Motors

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