Layitha está num terreno dividido. De um lado brilha o néon que esconde toda a desgraça daqueles que não têm nada. Cintilam as luzes que escamoteam a podridão como os túmulos caiados que pisam os ossos dos mortos. Do outro lado estende-se o sonho trémulo de uma vida que na verdade nunca brilhou para os moçambicanos. E é neste apeadeiro que o homem espera com as malas vazias, pelo comboio que nunca mais chega.
A última máquina de ferro que passou por aqui era Samora que a conduzia, e Layitha não viu esse comboio. Puxava uma interminável fila de carruagens abarrotadas com o povo gritando, A luta continua! Cabiam todos lá dentro. Ninguém ficava de fora, mas o que veio a acontecer depois é que o maquinista, ao longo da viagem, foi sequestrado e morto e a locomotiva deixada à deriva até ficar sem o combustível que era o próprio Samora.
Hipócritas! Esta é a palavra recorrente de Layitha que continua à espera do comboio anunciado. Do novo comboio que tarda. Mas é preciso acreditar. Ter paciência. O comboio há-de vir. Não importa, como dizia o poeta, que seja longa a noite, a verdade é que há-de amanhecer!
O que faz Layitha acreditar na invenção de um novo futuro no meio desta desesperança colectiva, são os laivos de luta aqui e acolá. A luta sem pólvora empreendida pelas mentes iluminadas que sobrevivem no fio da navalha. Outras mentes porém foram decapitadas. Não importa, diz o homem no apeadeiro, depois de tudo isto renasceremos das cinzas.