Ernesto Golize nasceu em Maputo, numa família equilibrada, com um pai locutor e uma mãe comerciante. Ernesto era um rapaz alegre e amigo dos livros. Logo cedo evidenciou-se no seio dos amigos e familiares como uma esperança intelectual da tradicionalista família Golize com raízes na histórica província de Gaza, lá nas bandas de Manjacaze. Com 12 irmãos de diferentes mães, Golize começou a correr logo cedo atrás do money. Com diferentes habilidades, seguiu os passos do pai, tendo sido estagiário na Rádio Moçambique, após uma formação média na Escola de Jornalismo.
Com boas habilidades na escrita e na locução, liderava ovelhas na sua congregação religiosa – tudo corria devidamente. Através de um tio que era Chefe nacional dos Recursos Humanos no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), Ernesto Golize conseguiu um emprego no Gabinete de Comunicação Social naquela instituição estatal.
A vida corria a mil maravilhas, viagens de trabalho para aqui e para acolá. Conheceu vários países do mundo – avião era seu transporte diário. Passou as noites nos melhores hotéis possíveis. Mesmo casado, o jovem Ernesto tinha as melhores gatas que quisesse – era um mulherengo e boêmio assumido. Há quem dizia que o dinheiro lhe havia mudado a cabeça.
Em pouco tempo foi promovido no departamento, passou a ser adjunto-chefe. Com as capacidades que tinha, conseguiu admitir ao ensino superior no curso do Direito, onde viria a estudar três semestres e depois trocou para jornalismo pós-laboral que não chegou a terminar, já que passava a vida em constantes viagens. A vida do homem mudou, abandonou o quartinho de 1.500 meticais no bairro Benfica para um apartamento no terceiro andar no bairro do Jardim – afinal tudo corria a mil maravilhas.
A ambição subiu, aparição de novos actores políticos na arena política moçambicana foi vista por Ernesto como uma oportunidade de fazer nome. Levou as habilidades aprendidas nas várias formações investidas pelo Estado moçambicano, através do INSS, para assessoria política no aludido partido. O homem queria ser deputado com a idade que tinha – 27 anos! O jovem foi correndo, atacando fortemente o partido no poder – Frelimo. Ganhou espaço em colunas de jornais, rádios e grandes programas televisivos. Já era estrela.
Na busca constante pelo dinheiro e acerto de projectos que nunca saíram da mente para o papel e de lá à execução – Ernesto Golize mesmo com salário que ganhava no INSS e os vários subsídios de viagens que levavam dias e meses, decidiu contrair empréstimos bancários em dois bancos – comprou uma baita viatura – as shuggas aumentaram. A terapia sexual era feita em qualquer canto, desde que houvesse escuridão.
Ernesto Golize era o que tinha a voz mais alta na família, afinal era quem tinha pujança financeira. Quando pensava que tudo estava sob controlo, repentinamente tudo viria a mudar depois de receber uma visita ilustre de um irmão – quando o acompanhava à casa, bateu, mesmo com razão, num fulano na zona da Junta. O que Ernesto não sabia é que o homem era pai de oito filhos e tinha três mulheres, e apenas ele trabalhava e alimentava as mesmas. No atropelamento, a viatura teve um problema e quando levada ao mecânico explodiu dias depois.
Com medo das autoridades e de ir parar no tribunal, numa fase em que concorria a deputado e aguardava uma promoção no serviço e no partido, Ernesto Golize decidiu fazer um acordo com o fulano que havia atropelado – chegaram a um acordo – ele assumiria todas as despesas do homem, enquanto este recuperava em casa e não apresentaria nenhuma queixa. O que Golize não sabia é que o homem tinha oito filhos e três mulheres e cada uma, em sua casa, e dos filhos, cinco estudavam.
Com os empréstimos no banco, um apartamento luxuoso para pagar, mensalidades escolares suas e de dois irmãos, para além das ajudas constantes às despesas da casa da mãe solteira, o homem tinha que assumir por seis meses todas as despesas da casa do fulano atropelado por ele. Os dias foram passando, as despesas crescendo e a vida caminhando para o buraco.
Do investimento feito no partido tudo correu mal, acabou por ficar como suplente. Os seis meses de pagamento das despesas do homem atropelado acabaram se tornando em nove, onde tudo que faltava era imediatamente solicitado, até quando as crianças quisessem um rebuçado. O homem não aguentou, caiu doente, teve que parar de trabalhar por um longo período e, para além disso, teve que voltar para a casa da mãe com a família. Com o salário repartido para os bancos, a família do homem atropelado e as despesas de casa – sem trabalhar e com a falta das viagens que realizava, Ernesto Golize teve que encontrar outra forma de estar – dever todo o mundo que lhe aparecia pela frente!
Tendo adoecido por três meses, Golize perdeu a forma elegante que tinha – a barriguinha da felicidade se foi – os fatos lindos já não lhe cabiam – pareciam roupas de Museveni. O homem mudou de congregação. De tanto dever agiotas e amigos havia caminhos pelos quais não passava. Os agiotas, cansados de serem aldrabados, já o procuravam no local de trabalho – onde chegavam a pegá-lo pelas golas. O homem estava ferrado!
Procurou curandeiros, maziones e profetas. Teve vários banhos tradicionais. Mas nada resolvia. Ernesto Golize vivia um autêntico pesadelo. Estranhamente, a família tentava pensar que tudo estava sob controlo. O homem era resistente. Entretanto, num certo dia, alegadamente, o irmão mais novo foi parar numa boleia errada – os ocupantes transportavam quilos de cocaína e foram detidos pelas autoridades que lhes exigiam para a soltura por cabeça 50 mil meticais.
Ernesto Golize, como irmão mais velho, quis estar por frente do problema e saiu atrás do dinheiro, mas estava difícil – eis que apresentou o problema a um colega que prontamente emprestou-lhe parte do dinheiro, mas faltava-lhe alguns mil. Sem alternativas, teve que recorrer ao património do serviço, que foi penhorar aos agiotas.
Sucede que o colega teve problemas em casa e já queria o dinheiro de volta. Ernesto Golize levou a parte do empréstimo no agiota e reembolsou. Horas depois era solicitado no serviço, porque a máquina fotográfica estava a ser precisada para constar no inventário local que estava a ser exigido pelo Conselho de Direcção. O homem estava tramado! Sem alternativas, foi implorar para os agiotas, mas estes não cederam – os colegas do serviço, comunicaram-no que, caso não trouxesse o bem, o caso seria levado ao SERNIC – coitado do Ernesto Golize!
Horas passaram, os pés tremiam. Não parava de transpirar –devido à situação tenebrosa que o Ernesto vivia, a esposa havia o abandonado – com pena do mesmo, emprestou-lhe o valor, mas quando chegou lá, a instituição já havia recuperado a máquina fotográfica através da inteligência local que havia rastreado o bem.
Cansados com a conduta do jovem, Ernesto sofreu um processo disciplinar que culminou em expulsão. Mas mesmo com este fim, o vício pelo dinheiro alheio e fácil havia se aculturado no homem.
Com bons amigos que tinha, como Abel Nhancale e Abdul Remane. Ernesto Golize foi recebendo apoio dos seus companheiros. Nhancale, um jovem que acabava de terminar o ensino superior, na área de jornalismo e que já vinha perdendo dinheiro com as tramoias de Golize, conseguiu um emprego numa Organização Não-Governamental (ONG) como oficial de comunicação. Mas dadas as limitações profissionais que tinha, recorria a Golize para o apoiar em troca de uma verba mensal estimada em 10 mil meticais. No entanto, Ernesto roubava o companheiro, tendo extraviado um laptop, telemóvel, discos externos e bens não quantificáveis.
Já Abdul Remane era um amigo batalhador que passou por diferentes pesadelos da vida, mas que havia conseguido colocar os pés no chão, vivendo uma vida familiar e profissional em constante ascensão. A amizade deles era de constante ajuda – haviam se conhecido em tempos de militância política. Abdul Remane pretendia tirar da lama Ernesto Golize. Convidou-o para um projecto. Combinaram os valores mensais. Remane disponibilizou-lhe um laptop como material de trabalho. Entretanto, em vez de usar o mesmo para o trabalho, Golize vendeu o material.
As burlas de Golize são tantas que teve que se afastar da vida pública e do activismo social nas redes sociais, para além de ter trocado os contactos telefónicos. Ernesto Golize ainda continua num sono profundo – vivendo o pesadelo!