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quarta-feira, 21 junho 2023 09:15

Sou uma prostituta em fim de carreira

AlexandreChauqueNova

Não me canso de escutar a extraordinária música de Wazimbo (Nwahulwana), é como se tivesse sido composta em função de mim, mas já é tarde demais para entendê-la. Mesmo que eu quisesse voltar atrás, o sinal está fechado para mim e agora só me resta ruminar as feridas que andei a plantar na vida inteira, sou uma escória. O pior é que nunca juntei nada na perespectiva de que a estiagem é infalível, então passo estes últimos dias da vida ouvindo de longe a gargalhada das hienas.

 

A princípio - influenciada por outras mulheres - a escolha que fiz parecia luzidia, voltava para casa de madrugada e colocava comida à mesa, e isso dava-me a sensação de que a vida é bela. Envolvia-me com três/quatro homens por noite e eu aguentava, era jovem. Mas não passou muito tempo, percebi que tinha-me metido no escuro e o caminho de volta não se vislumbrava. Aliás, nem sequer cheguei a pensar em voltar ao princípio, o dinheiro era mais forte que a dor, e eu o tinha todos os dias.

 

Porém a minha beleza enganou-me durante todo este tempo, toda a vida. Os homens encantavam-se com o meu corpo, com a minha candura, e nunca dei em conta que afinal estava caminhando nas trevas onde no fim serei recebido pelos mabecos que irão devorar-me viva. Como agora, que os últimos sabujos disputam o meu coração que ainda bate, mas o corpo já não serve para as orgias infinitas em noites indescritíveis. Tudo aquilo era um escárnio, os homens abusavam-me.

 

E hoje estou aqui. Magoada, não pelo passado de violência, mas pelas lembranças do meu comportamento, da minha incapacidade de escutar os sinais que recebia ainda em casa quando minha mãe me perguntava, “vais para onde assim esta noite, minha filha!” Eram palavras de súplica. Minha mãe ia até a varanda e pedia, “minha filha, volta para casa, é noite!” Mas eu já não a escutava, estava determinada a sentir as esporas do diabo e embrenhava-me no néon.

 

Agora estou aqui despedaçada. Sentada num dos bancos do anfiteatro da imaginação, ouvindo a minha mãe cantando os versos que me ressurgem em cada pensamento: “vais para onde assim esta noite, minha filha”! “Minha filha, volta para casa, é noite”! Mas já é tarde demais para voltar. Tarde demais para seguir Nwahulwana, profundamente interpretada por Wazimbo.

 

Fumo desesperadamente sem parar em lugares imundos onde se bebe aguardente caseira partilhada no mesmo copo, que vai girando em bocas exalando hálito horrível. Não tenho como recusar esta imundície, não tenho dinheiro. A minha pele está flácida, perdeu a graça, ninguém a aprecia a não ser estes jovens frustrados que depois da pinga encostam-me num canto qualquer e ejaculam toda a merda dentro de mim., porra!

 

Quando desperto estou molhada de ignomínia. Cuspo a minha saliva espessa para o chão com desdém e raiva, mas depois do banho vou para lá de novo, com fome, pronta a ser achincalhada a troco de um petisco e do mesmo copo nunca lavado. É assim a minha vida, depois de tudo o que fiz em desobediência à minha mãe, “minha filha, volta para casa, é noite!”

terça-feira, 20 junho 2023 07:05

Sobre a reforma compulsiva

MoisesMabundaNova3333

Depois de um prolongado sono, este ano, ou mais precisamente, de há uns três, quatro meses, acordamos e logo queremos mandar à reforma obrigatoriamente cerca de 19 mil funcionários e agentes do nosso aparelho do Estado! O que consta, bem, bem, nem, é que no processo de migração dos 400 mil funcionários e agentes do Estado para a nova plataforma electrónica de gestão de recursos humanos, descobriu-se que esses cerca de 19 mil têm 60 ou mais anos de idade e por lei devem ir à aposentação! A notícia não especifica quantos  funcionários exactamente irão à aposentação compulsiva por sector. Aqui e ali, vamos ouvindo que, entre os tais, há duzentos professores doutores da UEM, “muitos” médicos especialistas, quase todos os diplomatas (sobretudo embaixadores) nos Negócios Estrangeiros e… uns tantos magistrados!

 

Quando é que, como país, vamos ter um sistema nacional de estatística profissional, sério, moderno e à altura da “Sociedade de Informação” que vivemos. Não consigo perceber como é que é difícil termos estes dados - ou está

 

-se a ocultar deliberadamente -, quando estamos a falar que 400 mil funcionários foram integrados na nova plataforma electrónica de gestão dos recursos humanos, na sequência da nova tabela salarial única. A estatística é o método científico fundamental para a compreensão racional de qualquer empreitada, assunto ou situação. Sem ela, dificilmente se percebe o que se pretende.

 

De toda a forma, é com estes dados pobres com que temos de viver e formarmos as nossas percepções. O primeiro sapo que não aceita ser engolido é: porque será que só no processo de migração para a nova plataforma electrónica de gestão dos recursos humanos é que se descobriu que há 19 mil funcionários em idade de reforma? Antes disso não se sabia? Como? Não deveria ser o processo de o funcionário ir à reforma um processo normal em que, anualmente, ou de tempo a tempo, alguém aqui e ali vai à reforma ou porque atingiu a idade limite, ou o tempo de serviço? Tenho a impressão que se tivéssemos feito isso, não estaríamos a ser acordados com 19 mil que têm que ser aposentados obrigatoriamente dentro de 15 dias; ou serem barrados dos serviços! Quem não cumpriu a sua parte e porquê? Não cumpriu a sua parte e hoje empurrou o país para uma situação desastrosa destas! Em regiões sérias, haveria responsabilização!

 

Não estou a imaginar o que é mandar para casa de uma só vez 19 mil funcionários e agentes de Estado, entre os quais professores doutores, médicos especialistas, diplomatas, magistrados, docentes, enfermeiros e muito mais! Ao fazer isso, o nosso Estado estará a autofragilizar-se, a autocondenar-se a um paupérrimo desempenho no ranking das nações. Não tenhamos dúvidas. Estamos a dizer que o rácio médico-população é dos mais baixos do mundo… a estatística de 2021 dizia que temos 2500 médicos para 30 milhões de habitantes, o que perfaz o rácio um médico para 12 mil pessoas! E nós estamos a mandar médicos para casa! Há ainda muita falta de enfermeiros e outro pessoal hospitalar nas unidades sanitárias… e nós queremos mandar justamente aquelas pessoas para casa! Anualmente, há défice de professores em todas as províncias e em todos os níveis do nosso ensino, primário, secundário, médio, incluindo nas universidades! E nós vamos mandar docentes para casa! O que pretendemos mesmo?

 

A outra questão: afinal formamos para quê? Para mandar à reforma? É que para termos um especialista, seja médico ou não, um cientista de verdade, um magistrado de categoria suprema, um diplomata de categoria, precisamos de bom tempo; só se chega à tal posição já numa idade adulta. E nós já estamos a mandar reformar todas essas pessoas. Não engulo o rato ou ratinho de que há “professores doutores cujo desempenho é muito baixo e é desses que o sistema pretende livrar-se”! Se os há, os culpados são os gestores/o sistema no seu todo que não estabelecem indicadores de desempenho razoáveis para essa categoria, exigir o seu rigoroso cumprimento e sancionar no caso de inalcançabilidade! Assim, poderia separar-se o trigo do joio.

 

O outro rato que não entra é a ideia de que mandando para casa 19 mil funcionários, vai viabilizar-se a TSU. Vai-se sim sobrecarregar o sistema de pagamento de pensões e condená-lo à falência técnica… já não bastam os falaciosos milhares guerrilheiros da Renamo? O que vai viabilizar a tabela salarial única é a produtividade do país no seu todo, um sistema de cobrança de impostos eficaz e incorrupto, uma gestão incorrupta da coisa pública, uma governação racional, não esbanjadora, nem esbulhadora e um combate sério à corrupção. Enquanto a cobrança de taxas e impostos tiver dois pesos, duas medidas, tipo aquele empresário que importa carrões sem pagar um centavo; duplicação de instituições, tipo dois governadores e governos provinciais, ministérios a mais, esbanjamento e roubalheira do erário público, governação erante danosa e corrupção na sua melhor, tipo 500 milhões para em quatro meses se estabelecer um novo sistema de gestão municipal… não sairemos nunca da situação de solavancos no pagamento das remunerações aos funcionários e agentes do Estado.

 

Dá a ideia de que alguém nos está a sabotar. Não conhecendo esse alguém, registo aqui que estamos-nos a sabotar a nós mesmo!

 

ME Mabunda

marcelo mosse

Graças a Frelimo e a Samora Machel… a definição clara de quem era o inimigo durante a luta de libertação: o colonialismo português e não o cidadão branco.

 

E depois da Independência, a narrativa firme e a disseminação, para efeitos de socialização primária e sedimentação de uma cidadania moçambicana através da secundarização das pertenças raciais: negros, brancos, mulatos, indianos foram tratados em pé de igualdade.

 

Moçambique continua uma sociedade de convivência inter-racial.

 

Diferentemente da África do Sul. Morreu o apartheid e emergiu um racismo anti-branco e sequelas profundas da anterior política de segregação racial.

 

Se há racismo em Moçambique, ele não é necessariamente de convívio social, muito menos decorre de política governamental. É um racismo que germina nalgum sector laboral privado, negativamente discriminatório contra os jovens negros, o que é de combater.

Guilherme Tamele

Na minha terra há duas classes sociais, a plebe - o povo, e os aristocratas - os burgueses vampiros. A primeira é composta por míseros mortais que vivem expectantes na utopia de um futuro melhor prometido pelos neocolonialistas, que é a segunda classe; Essa segunda classe é composta por imortais encantadores dos distraídos, que se valem da sua épica história de bravura que excomungara o colono do nosso solo pátrio, pérola do Índico, autrora, província ultra-marina. Pecou a elite libertadora, quando deixou a sua bravura, prevaricar a tal ponto de não ser brava suficiente, para expulsar o colono com o respectivo colonialismo, como já foi referido pelo Kubaliwa. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades e as coisas, e essa bravura, não resistiu a coerência deste adágio, ao se transformar, de bravura patriótica em Neocolonialismo.

 

Desde que Kubaliwa se foi, anda uma lufa-lufa aqui que não se entende, inesgotáveis rumores, um deles é de que ele se foi, mais deixou os tomates, porque entendera que a sua missão não tinha chegado ao fim  ainda. Algumas línguas dizem que o Nuvunga se apoderou desses tomates, mas cá entre nós, isso não passa de calúnia e difamação dos seus detratores, pois dentre o povo, ninguém consegue ser ameaça maior, ou seja, calcanhar de aquilis para os vampiros que ele. Prova bastante de que os que ele tem são funcionais e lhe conferem arcabouço suficiente, para enfrentar um Sistema encorporado numa governação criminosa. A ser verdade que Nuvunga tenha se apoderado dos tomates, seria por mera ostentação e vaidade. Outras línguas, e não poucas, dizem que os tomates andam ai espalhados entre os jovens, daí esse prenúncio de movimentos primaveris revolucionários, essa irreverência no confroto ao Establishment político por parte deles. Por incrível que possa parecer, há quem diga que viu os tomates com as manas Mambire e Quitéra, pode uma coisa dessas? Ahhh..porque sem tomates ninguém teria a ousadia que elas tem. Mas cá por mim, se elas precisassem de tomates comprariam no supermercado.

 

O outro rumor é de que o advogado do Sistema, EV, quando tomou conhecimento do fatídico sucedido com o Herói do Povo, o que foi parido de novo e nomeado Edson Mandela, o filho da mãe para os políticos,  correu até a casa enlutada, como que para dar as condolências, ludibriou os presentes agoniados entre choros e prantos, e de forma subtil arrancou-os na mesma subtileza com que a Dalila arrancou os cabelos de Sansão, pois neles estava a força que o tornava diferenciado entre os homens. Em posse dos mesmos, foi barganha-los, por uma garrafa de Dom Barril. Ganha azo esta narrativa, por ele ser sobejamente conhecido como fã confesso do vinho.

 

Seja quem for que tenha se apoderado desses místicos tomates, não muito valor agregará seja sociedade civil, assim como a classe política, mais do que agregaria Ossufo Momade, se tivessem caído nas suas mãos. Uma prova inequívoca, de que  o líder da segunda força política, carece desses tomates, é o facto de que desde que começou o seu consulado na perdiz, os Vampiros estão mais sanguinolentos, e vivem sugando o sangue do povo como nunca antes, e nada lhes acontece, até as eleições Distritais que foi um combinado legislado, não mais se vão cumprir, e tudo acontece sob um olhar impávido e sereno do leniente chefe, que muito pouco de lider têm, e de toda cúpula de uma pséudo-oposição, factor inflamatório dos abusos do regime, que mesmo ouvindo o brado de clamor do povo pelas vias de acesso, eis que lhe oferece Portagens.

 

Para essa crueldade, criaram a fraudulenta REVIMO, que para nada serve, se não para agravar a carestias de vida aqui no país de Pandza, e Novunga, no pleno exercício da sua cidadania, faz mais oposição ao regime do que toda oposição junta, sem querer descurar o trabalho assinalável que tem sido desenvolvido pelo Mondlane, o Venâncio, que é deveras um político cientista, que em cada intervenção sua, alarma a mamã Bias e reduz a insignificância a gang da camaradagem.

 

Me admira a ousadia dos vampiros, capturaram a pérola do indico, mudaram a ordem natural do estado do direito, multiplicaram os viventes de Gaza, criaram os postos de Recenseamentos nos domicílios dos Camaradas em exclusivo para Camaradas, levantaram um pseudo-sacerdote na comissão, tal como fará o anti-cristo, para lhe branquear as trambiquices. Assim o poder não mais Emanará do Povo, e no dia do voto, o povo irá as urnas por mera formalidade, pois, para se perpetuarem no poder, bastar-lhes-á a “Benção do sacerdote”, o voto dos camaradas, e do povo parido matematicamente em Gaza.

 

É esperançoso ver um povo sonâmbulo, dar sinais de estar desperto, pois aquele que descobriu as mentiras da verdade, disseminou a sua descoberta, e o povo anémico não mais ingenuamente se oferecerá por sustento aos vampiros. A Coisa é tão sinistra que até as mamanas que viviam expectantes da época eleitoral, para venderem a alma por uma capulana estampanda com o rosto do sanguinolento Drácula, ousam a olha-lo, olho no olho e dize-lo com toda contundência “¹A ntiro wa wena e matximba”.

 

Essa coisa de estado de direito democrático, tornou-se numa utopia, a semelhança das ideologias Marxistas Leninista, que infelizmente de algum modo, sempre fundamentaram a condução do nosso estado, muito por conta da génese do partido do governo do dia. São desculpáveis os nossos lideres por isso, ninguém tinha esperimentado algo melhor ou diferente, para puder entender que essas teorias esquerdistas filosóficas da escola de Frankfurt, só tem involucro apetecível, e nada de proveitoso capaz de potenciar o desenvolvimento social, político, económico efectivo de uma nação.

 

Do que vivi nesta vida, já mais esperaria ver, nem no meu mais terrível pesadelo, o júbilo e os aplausos efusivos dos “subalternos” camaradas, quando o chefe máximo, foi anunciar na casa do povo, o não pagamento do 13º. Como que um vampiro diante de um barril de sangue, assim foi a celebração dos avermelhados representantes do povo, arregimentados pelo povo, mas que vivem prestando vassalagem ao executivo, mesmo quando este anuncia uma desgraça para o povo. Nunca fez tanto sentido o dito pelo Kubaliwa "...Não querem saber de ti, não querem saber de ti, vampiros, os vampiros...!"

 

Disse mais, que ele era da geração dos que primeiro perdiam a vida e só depois a esperança. Deveras é preciso muita esperança para não desfalecer num lugar onde a ditadura do voto é que rege o legislativo, onde os tentáculos do executivo alcançam e subjugam o judiciário, tornando-o num baluarte dos seus intentos maquiavélicos.

 

Portanto, não sendo de Noronha, mas lhe fazendo a vez, digo não a África, mas a terra do Pandza, Surge et Ámbula!

sexta-feira, 16 junho 2023 11:17

África, Acorda!!!

Helio Guiliche

Minha Mãe África

Cresço nos teus doces braços

Eu sou criança africana

Não apenas porque nasci em África

Tampouco porque vivo em África

Não pela minha ascendência

E muito menos pela minha descendência

 

Eu sou criança africana

Porque estou imbuída da cosmovisão ontológica

Vivo seus valores

Vivo seus sabores

Vivo seus oderes

Vivo seus aromas

Vivo seus sentidos

 

Ohhh mãe África

Ohhh mãe grande, misteriosa, mística e valorosa

És um mistério para uns

És misticismo para outros  

E és valorosa para os seus, porque na maternidade

Transmites vida, esperança e liberdade

 

És o berço da humanidade

És sabia e coerente

Por conseguinte és fraternidade

E a sua história não mente

Ainda que por vezes te deixaste violar pelo chicote colonial

Te permitiste ocupar e dominar ao sabor da pólvora

Por agendas de guerras, exploração e pilhagem

 

Ainda que tudo isso te tenha acontecido

Não deixaste sua essência desaparecer

 

Depois da longa noite escura

A longa noite da escravidão e desumanização

Não permitiste que aos seus filhos faltasse identidade

Não deixaste que fosse violada a sua dignidade

 

Ainda que a mesma identidade seja hoje questionada, vilipendiada e insultada

A sua dignidade, generosidade e grandeza estão aqui

Para mostrar e ensinar ao mundo que não se negoceia a cultura, os valores e muito menos a humanidade

 

Humanidade, respeito, verdade, compaixão, honestidade, harmonia, equilíbrio, justiça e alteridade

São algumas das qualidades e atributos que a ti pertencem

Ainda que te julguem mais pela emoção em detrimento da razão, és genuína, valente e verdadeira

 

Mãe África

Acorda e brilha para si

Acorda e valoriza-te

Acorda e recupere o seu lugar outrora usurpado e arrancado

Recupere seu lugar primordial no cento da humanidade

Mostre seu poder e sua luz a toda criança africana.

 

Feliz 16 de Junho

 

Hélio Guiliche

quinta-feira, 15 junho 2023 10:37

A bebida do diabo veio para matar

AlexandreChauqueNova

O jovem trazia moedas na mão esquerda, dirigiu-se a uma banca que vende géneros alimentícios  e pediu parcos produtos que pagou imediatamente, entregando o dinheiro com a mesma mão esquerda, num inadmissível gesto na juventude da minha geração, era má aducação. O homem que estava do outro lado do balcão é idoso, provavelmente da idade do avô deste rapaz, por isso merecedor, logo a partida, de respeito. Chocou-me a situação, então decidi intervir.

 

Chamei o miúdo que olhou para mim com desdém. Saudei-o e ele simplesmente não respondeu, logo percebi que devia ter cuidado, estava diante de um desconhecido e que agora de perto mostra ser possuidor de um potencial agressivo. Mesmo assim não desisti do propósito que me levou a chamá-lo. Repreendi-o dizendo que não ficava bem entregar seja o que for a alguém com a amão esquerda, sobretudo quando a pessoa que vai receber é mais velha que nós.

 

O jovem virou-me as costas com desprezo e prosseguiu a sua caminhada sem me dizer uma única palavra, e eu caí de cangalha no espírito, não por ele ter-me ignorado, mas por estar mais do que claro que temos aqui uma criatura que estará a crescer mal formada como pessoa, e como ele, existem  intermináveis  legiões assim no nosso país, que poderão, por serem pólvora latente, queimar o futuro inteiro. O rastilho está aceso.

 

Mas eu precisava de aliviar a minha dor, foi assim que dirigi-me ao proprietário da banca que, ao contar-lhe o sucedido, disse aquilo que não me surpreendeu. “você tem que ter cuidado com esta rapaziada, eles andam drogados e frustrados. Se não respeitam os seus próprios pais, como é que vão respeitar às outras pessoas?”

 

A cannabis sativa e outras drogas desconhecidas andam em todo o lado. Quanto mais as autoridades tentam combater os seus consumidores, mais elas – as drogasressurgem. Até porque podemos não estar perante um problema criminial em si, mas um problema social, os jovens estão sem rumo, estão a  degenerar, vê-se isso pelo seu comportamento, pela sua tendência a serem agressivos e pior do que isso, abstenidos, já não se importam com nada.

 

Depois de desabafar com o homem da banca, procurei ali mesmo na Mafurreira, uma barraca onde podesse beber cerveja e esquecer aquilo. Mas o que aconteceu foi encontrar outra situação ainda mais dolorosa. Degradante. Ou seja, quatro jovens bebiam “Soldado”, uma bebida extremamente agressiva que o nosso governo tolera e deixa que prolifere no mercado, destruindo uma geração inteira de adolescentes e jovens que no lugar de estar ali a consumir esse veneno, devia estar em lugares mais saudáveis como a escola, por exemplo.

 

Saudei-os, porém  estes, diferentemente do primeiro que pelo menos parou e olhou para mim, nem sequer reagiram. Continuaram na conversa alimentada por palavras obscenas e  gestos obscenos também. Estavam visivelmente “tocados” pelo efeito do “Soldado” com os rostos envelhecidos, desidractados. E eu não podia continuar ali assistindo a um grupo que está-se matando devagar sem que ninguém possa fazer nada para travar a derrocada. Nem eles próprios, por isso fui-me embora. Não podia fazer nada. Não podia dizer nada, sob o risco de ser agredido, ou com palavras ou com as mãos ou ainda com aquela garrafinha adorada pela juventude, não porque é boa coisa, mas porque é relactivamente barata e sobe à xabeça muito rapidamente. E vicia. Mas é bebida do dia.

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