“Eu falo de povo para povo porque eu sou povo e tu és povo, usamos a mesma linguagem. Quando falas eu te oiço, quando eu falo tu me ouves, partilhamos as mesmas dores”. Estes são os primeiros versos da 15ª faixa musical do primeiro álbum de AZAGAIA (intitulado Babalaze), na qual o rapper convoca o povo moçambicano a uma “Marcha” em protesto às péssimas condições de vida.
Dezasseis (16) anos depois do lançamento deste apelo, o povo respondeu à convocatória, não para marchar em protesto à miséria e penúria que continuam a caracterizar a sua vida, mas para se despedir do seu “herói” que, com as suas músicas, abordou de forma incisiva as dores sentidas pelos moçambicanos.
Milhares de moçambicanos, entre fãs, admiradores e activistas sociais “abarrotaram” a Praça da Independência, na cidade de Maputo, para prestar a sua última homenagem a Edson da Luz, nome de registo do artista AZAGAIA, que perdeu a vida na passada quinta-feira, 09 de Março, na sua residência no Município da Matola.
Nem a chuva que caiu nas primeiras horas do dia em algumas partes da cidade e província de Maputo impediu que as pessoas marcassem presença no evento, que decorreu no Paços do Conselho Municipal da Cidade de Maputo e que contou com a presença da Ministra da Cultura e Turismo, Edelvina Materula.
Afonso Matusse é um dos fãs de AZAGAIA que “fintou” a chuva para se despedir do seu ídolo. Saiu do bairro Muhalaze, no Município da Matola, para prestar a sua última homenagem ao “MANO AZAGAIA”, na baixa da cidade de Maputo.
Matusse descreve AZAGAIA como uma estrela da sua vida, pelo que parqueou o seu camião, que lhe dá sustento, para se curvar perante o seu “guia”. “Eu estava na escuridão e de repente acendeu-me uma estrela e comecei a segui-la”, afirmou Matusse, garantindo que a educação deixada pelo rapper permanecerá consigo e sua família.
Maria Das Neves (nome fictício de uma fã e seguidora de AZAGAIA) diz ter conhecido e convivido com o rapper, nas Escolas Primária do II Grau da Maxaquene e Secundária Estrela Vermelha.
No momento está desempregada, mas Das Neves diz encontrar conforto nas letras do rapper, o seu maior ídolo. “Conheci Azagaia antes de ser famoso. Era um homem humilde, sonhador, que sempre quis o melhor para o seu país. A minha admiração por ele aumentou, quando começou a cantar. Sou admiradora das suas letras”, conta.
A par de Afonso Matusse e Maria Das Neves, milhares de anónimos se juntaram ao “último adeus” de Edson da Luz, tendo acompanhado a cerimónia através de duas telas gigantes instaladas na Praça da Independência. Alguns dos seus fãs tiveram a oportunidade de velar a sua urna, momentos antes do início da cerimónia, assim como depois do término do evento.
Devido à avalanche que se verificava na Praça da Independência, os agentes da Polícia de Trânsito, Protecção e Municipal tiveram de se mobilizar para garantir ordem e tranquilidade no local. A Polícia de Trânsito, por exemplo, teve de bloquear algumas vias para permitir a movimentação de pessoas.
Instituições públicas e privadas “paralisadas”
De um momento de consternação, os fãs e admiradores de AZAGAIA tornaram a manhã de terça-feira numa ocasião de festa e exaltação à figura do rapper. “Povo no Poder”, “Cão de Raça”, “Música de Intervenção Rápida” e “Declaração de Paz” são algumas das músicas do artista entoadas pelo público durante o seu velório, cânticos que eram intercalados por aplausos.
Aliás, não só foi no exterior do Paços do Conselho Municipal da Cidade de Maputo (onde se encontrava a multidão) que se ouviram aplausos e gritos repetidos de “Povo no Poder”, mas também no interior do edifício, onde decorria a cerimónia.
Quem não se pôde deslocar à Praça da Independência, não teve motivos de queixa, pois, a cerimónia teve transmissão em directo em quatro canais de televisão privada, incluindo o cortejo fúnebre até ao Cemitério de Michafutene, no distrito de Marracuene, província de Maputo.
Porém, nem todos precisaram deslocar-se à Praça da Independência para testemunhar mais um momento histórico de Moçambique. Do telhado e dos diferentes gabinetes de trabalho do Tribunal Administrativo, funcionários daquela instituição de soberania acompanharam a cerimónia.
O Conselho Municipal da Cidade de Maputo esteve literalmente paralisado durante a manhã de ontem. A Vereadora de Saúde e Acção Social, no Conselho Municipal da Cidade de Maputo, Alice Abreu, chamou para si a responsabilidade de controlar o acesso ao Paços do Município, ordenando o uso da máscara de protecção contra Covid-19, como condição para aceder ao local do velório, apesar do seu uso já não ser obrigatório em cerimónias fúnebres.
Ruas abarrotadas no trajecto ao cemitério
Os moçambicanos não só se mobilizaram para prestar a sua última homenagem ao rapper no Paços do Município, como também ao longo do trajecto seguido pelo cortejo fúnebre do cantor.
Da baixa da Cidade de Maputo até ao Cemitério de Michafutene, milhares de cidadãos ocuparam passeios e bermas das avenidas 25 de Setembro, OUA e de Moçambique (EN1) para mostrar a sua admiração pelo “MANO AZAGAIA”.
Aliás, a mobilização popular que se verificou ao longo da via acabou atrasando a cerimónia fúnebre, que estava marcada para às 14:00 horas, mas acabou acontecendo um pouco depois das 15:00 horas.
Este é o retrato resumido dos bastidores das cerimónias fúnebres do rapper AZAGAIA, falecido no passado dia 09 de Março. Edson da Luz, de 38 anos de idade, deixa viúva e duas filhas. (Abílio Maolela)