Quando faltam menos de 30 dias para a realização das VI Eleições Autárquicas, a terem lugar em 65 municípios do país, o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade”, constituído por sete organizações da sociedade civil, publicou o seu relatório de observação do recenseamento eleitoral, decorrido entre os dias 20 de Abril e 03 de Junho do ano corrente, no qual reitera que o processo foi marcado por algumas irregularidades e ilícitos eleitorais.
De acordo com o documento publicado na passada terça-feira, a natureza, duração, extensão e localização de alguns ilícitos eleitorais apontam para um esforço “organizado e premeditado de influenciar indevidamente o processo de recenseamento e os seus resultados”.
Em causa, lembre-se, está o uso de listas ilegais de prioridades para inscrição dos eleitores; a inscrição de eleitores e impressão de cartões de eleitor fora dos postos de recenseamento e das horas normais de funcionamento; o funcionamento de postos em locais ilegais; armazenamento de equipamento e material em residências privadas; transporte de cidadãos de fora das áreas municipais para se recensear dentro das áreas municipais; e a conspiração para cometer ilícitos eleitorais, como é o famoso caso do Grupo de WhatsApp, criado na cidade da Beira.
Para os observadores, é preciso reforçar os mecanismos de fiscalização e controle da actuação das brigadas e imprimir maior celeridade de intervenção perante denúncias de ilícitos e irregularidades.
Segundo o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade”, o recenseamento eleitoral deste ano foi menos transparente que o de 2018, em que o STAE (Secretariado Técnico da Administração Eleitoral) publicou e disseminou, de forma ampla e sistemática, dados preliminares semanais. No caso de 2023, os dados preliminares foram partilhados em intervalos irregulares, de forma ad hoc, restrita e desagregados apenas por género e província.
“Os dados cumulativos preliminares dos 45 dias do recenseamento, compilados a 4 de Junho pelo STAE, incluem a desagregação até ao nível municipal, mas sem desagregação por género a este nível. Estes dados também não foram amplamente publicados”, defende a plataforma, indicando, detalhadamente, que 21 distritos (cerca de 1/3 das unidades geográficas cobertas pelo recenseamento) superaram as suas previsões (em mais de 100%), excepto os distritos das províncias de Sofala e Inhambane.
“Já os números desagregados por município mostram que 40 dos 65 municípios (61,5% dos municípios) superaram as suas previsões em graus variados (de 100,3% a 196,4%). Estes 40 municípios estão em todas as províncias. O total de pessoas inscritas acima das previsões nesses 40 municípios é de cerca de 257.000”, revela a fonte.
“Cerca de 60 mil estão em seis municípios da Zambézia; cerca de 53 mil em seis municípios de Cabo Delgado; quase 33 mil em cinco municípios de Gaza; outros 25 mil em três municípios da província de Maputo; mais de 20 mil em cinco municípios de Nampula e outros 20 mil em três municípios de Inhambane; e um pouco mais de 18 mil em quatro municípios de Tete”, detalha.
A análise acrescenta ainda que, em 25 municípios de todas as províncias, o recenseamento ficou abaixo do previsto, num total de 709 mil pessoas. “Mais de 153 mil estão em três municípios da província de Maputo; 134 mil em três municípios de Nampula; quase 94 mil na cidade de Maputo; 93 mil em três municípios do Niassa; 81 mil em quatro municípios de Sofala; 77 mil na cidade de Tete; e 36 mil em dois municípios de Manica”.
O Relatório de Observação do Recenseamento Eleitoral, refira-se, baseia-se na apreciação do quadro legal que rege o processo, a sua metodologia, tecnologia e na observação directa das operações de recenseamento eleitoral durante 45 dias, em 27 municípios. A observação foi realizada por 68 observadores, que testemunharam cerca de 62 mil actos de inscrição de cidadãos nos cadernos de eleitores, através de 4.200 visitas efectuadas a 918 postos de recenseamento.
CNE ignorou algumas recomendações do fabricante dos equipamentos de recenseamento
O documento revela ainda que parte dos problemas verificados nos equipamentos (falhas na impressão dos cartões de eleitor e dificuldades para captação de fotografias dos idosos) tinha sido detectada durante a fase-piloto do recenseamento, que decorreu de 01 a 20 de Fevereiro do ano corrente, em nove distritos das províncias de Maputo, Manica e Nampula. Mas não foram corrigidos.
“O relatório da CNE [Comissão Nacional de Eleições] sobre o recenseamento-piloto já tinha indicado que a sujidade dos canais das impressoras tinha levado à interrupção da impressão dos cartões de eleitor naquele período e, por isso, alertara para a necessidade de haver kits de limpeza das impressoras em quantidade suficiente, para garantir que as impressoras fossem limpas ao fim de cada 400 impressões, conforme é recomendado pelo fabricante do equipamento”, revela o documento.
“A falta de observância deste procedimento de limpeza a cada 400 impressões talvez tenha sido uma das causas destas interrupções, que fizeram com que 11% dos cidadãos inscritos durante as visitas dos observadores não recebessem os seus cartões no dia da inscrição”, diz o Consórcio.
“Embora a esmagadora maioria das visitas efectuadas pelos observadores (99,9%) tenha encontrado os postos de recenseamento abertos, cerca de 20% das visitas encontraram postos com equipamento avariado ou com falta de material. Mais de metade destes casos (56%) deveu-se à avaria da impressora dos cartões de eleitor”, sublinha.
Refira-se que o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” foi constituído em 2022, com objectivo de contribuir para a transparência e integridade do ciclo eleitoral 2023-2024, avaliando, de forma objectiva e isenta, o seu desenrolar, produzindo informação e análise públicas e credíveis sobre as várias fases do processo. (Carta)