Está em chamas e tomada de militares e atiradores de elite, desde a manhã desta quinta-feira, a cidade de Maputo, o maior e mais importante centro urbano de Moçambique. Tal como estava agendado, milhares de manifestantes deslocaram-se na manhã de hoje ao centro da capital moçambicana, no âmbito da realização da “grande marcha”, convocada pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, em protesto aos resultados eleitorais de 09 de Outubro.
Empunhando dísticos e a bandeira nacional e entoando cânticos de apoio ao “candidato do povo”, incluindo o hino nacional, os manifestantes ocuparam as Avenidas Vladimir Lenine, Joaquim Chissano, Julius Nyerere, Acordos de Lusaka e de Moçambique, num cenário jamais visto no país. Todas ruas e avenidas da capital ficaram cortadas para o trânsito que, aliás, já se mostrava tímido logo de manhã.
Logo cedo, refira-se, as Forças Armadas de Defesa de Moçambique posicionaram militares do ramo do Exército nas ruas, avenidas e praças da capital, devidamente armados e equipados com coletes à prova de bala. Igualmente, a Polícia da República de Moçambique colocou dezenas de blindados e agentes da Unidade de Intervenção Rápida (Polícia antimotim), Unidade Canina e do Grupo de Operações Especiais (atiradores de elite) nas principais entradas da Cidade de Maputo para impedir a entrada dos manifestantes na capital do país.
Mas, debalde! Milhares de manifestantes irromperam pelas principais avenidas da capital do país, com destaque para a Avenida Eduardo Mondlane, uma das maiores e principais da Cidade de Maputo. Nesta via, os manifestantes, desarmados e indefesos, caminhavam lentamente em direcção ao Hospital Central de Maputo, até que um contingente militar impediu a sua passagem a menos de 3 Km da Presidência da República, assim como do Palácio da Ponta Vermelha, a residência oficial do Chefe de Estado.
Neste ponto de paragem, a interação entre os militares e manifestantes era cordial. Porém, o cenário mudou com a chegada da Polícia antimotim que, como sempre, começou a lançar gás lacrimogénio e a disparar balas verdadeiras contra os manifestantes. Da dispersão dos manifestantes, começaram os tumultos, caracterizados por queima de pneus e colocação de barricadas em plena Eduardo Mondlane.
Cenário idêntico verificou-se nas Avenidas Joaquim Chissano, Acordos de Lusaka e Vladimir Lenine, onde a Polícia antimotim voltou a ser protagonista das cenas de guerra, lançando gás lacrimogénio e disparando balas de borracha contra os manifestantes. Aliás, logo cedo, a Unidade de Intervenção Rápida foi lançar gás lacrimogénio nas residências no bairro Luís Cabral, o que causou repulsa aos moradores, que saíram em massa para pedir explicações.
À margem das manifestações populares, um grupo de supostos manifestantes, residente no histórico bairro da Mafalala, ao longo da Avenida Acordos de Lusaka, invadiu um centro comercial e vandalizou uma loja de venda de eletrodomésticos e mobiliários, de onde retirou, entre vários bens, televisores, geleiras, congeladores e colchões. O mesmo cenário ocorreu num contentor frigorífico, no bairro de Luís Cabral, onde populares levaram caixas de carne de frango.
Até ao momento, não há dados oficiais sobre o número de detidos das manifestações de hoje, mas vídeos amadores mostram dezenas de feridos por balas verdadeiras, de borracha e por cartuchos de gás lacrimogénio, o principal parto servido pela Polícia aos civis desde o dia 21 de Outubro.
Lembre-se que hoje é o oitavo e último dia das manifestações convocadas por Venâncio Mondlane, naquela que designou como sendo a terceira fase da paralisação da actividade económica no país.
Desde o início das manifestações, a 21 de Outubro último, o país já esteve paralisado 11 dias, com o registo de pelo menos 16 mortos, em 108 baleados pela Polícia, de acordo com os dados da Associação Médica de Moçambique. (Carta)