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quarta-feira, 24 julho 2019 07:20

Acesso à energia em Moçambique: “Comunidades rurais continuam as mais excluídas”, defendem pesquisadores

Passam-se sensivelmente 44 anos, desde que Moçambique proclamou a sua independência nacional, entretanto, os cidadãos residentes na zona rural continuam a ser os que menos se beneficiam da energia eléctrica produzida no país, embora constituam a maior parte da população moçambicana.

 

Jennifer Garvey, representante da Speed+project, um programa da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), disse, esta terça-feira, durante um Workshop público, organizado pela Kaleidoscopio, que em Moçambique apenas 15 por cento da população rural tem acesso à energia eléctrica contra 30 por cento da população residente na zona urbana.

 

 

O evento, que visava discutir a Nova Política de Energia em África, suas perspectivas a partir de Moçambique, juntou Governo, pesquisadores, Organizações Não-Governamentais e sector empresarial.

 

Segundo Jennifer Garvey, não basta rever políticas ou leis para garantir maior acesso à energia eléctrica, mas é importante adoptar novos sistemas, acessíveis e baratos, como painéis solares que rondam de 100 a 200 USD, em detrimento de postos de electrificação que podem custar 20 milhões de USD para electrificar mais de 1 milhão de Km. “Penso que esta pode ser a solução de curto e médio prazo para as zonas rurais”, disse Garvey.

 

A representante da Speed+ project explicou que, desde 1997, aquando da elaboração da actual Lei de Energia, não se assistiam mudanças significativas no sector, facto que levou mais de 10 anos, com a Electricidade de Moçambique (EDM) como único actor no sector de distribuição da energia. Entretanto, a partir de 2005/6, começaram mudanças significativas no sector, concretamente com a entrada de empresas pertencentes à rede “clientelista” da Frelimo, que prestavam serviços à EDM.

 

Garvey entende ainda que, nos últimos anos, tem havido mudanças significativas, entre as quais a Lei da Parceria Público-Privada (PPP) que, aos poucos, está a trazer mudanças no sector, não sendo apenas o Governo o único detentor, mas também alguns privados. Espera também que no próximo ano comecem a implementar o projecto de acesso à energia, através da nova Lei de Energia.

 

Entretanto, a pesquisadora mostrou-se céptica quanto à melhoria do custo e qualidade da energia fornecida, mas espera que a mesma possa retirar as actuais barreiras e permitir a entrada de novos intervenientes no sector.

 

Por sua vez, Taciana Lopes, da Waza, uma organização que tem feito estudos no sector da energia, disse estar em questão a capacidade de negociação do governo, sobretudo, a colaboração intrainstitucional, facto que tem dificultado vários projectos. Taciana considera que certos sectores do país ainda funcionam como se de um Estado Socialista se tratasse e na Lei moçambicana há vários obstáculos em comparação com a de outros países, que tem um sistema mais simplificado no acesso à energia.

 

Já o representante da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), Florival Mucave, realçou o facto de o sistema regulatório moçambicano apresentar vários obstáculos, um dos quais a falta de capacitação do sector público que, diante de propostas de investimentos, leva quatro a cinco anos para decidir, principalmente, no sector energético em que, na sua óptica, existem muitas limitações de conhecimento.

 

Para tal, Florival Mucave propõe que haja treinamento e transferência de competências, sublinhando que “não existe um país com recursos energéticos que não tenha uma Lei do Conteúdo Local”. Mucave explica que o problema da Lei do Conteúdo Local não está no facto de os moçambicanos serem accionistas das empresas que irão explorar os hidrocarbonetos, mas sim para o benefício dos moçambicanos, enquanto legítimos donos dos recursos a serem explorados.

 

O pesquisador do Centro de Integridade Pública (CIP), Borges Nhamire, destaca o contraste existente entre a capacidade de produção do país e o acesso à mesma energia. Nhamire afirma que o país produz energia suficiente para cada cidadão, mas apenas 25 por cento da energia produzida pela Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) fica no país e os restantes 75 por cento são vendidos para os outros países.

 

O jornalista destaca ainda que a electrificação rural foi a grande bandeira discursiva do governo nos últimos anos, mas esta só se concretizou a nível das vilas e sedes distritais, pois, “nas zonas rurais, verdadeiramente ditas, nada se viu e as pessoas continuam a viver situações difíceis”.

 

Contudo, os pesquisadores entendem que, apesar de África ser, actualmente, o centro da energia e a nova fronteira energética, as desigualdades são acentuadas e “há um sentimento generalizado por parte do cidadão de que os recursos energéticos descobertos não são para nós, devido à falta de informação e transparência”, conforme defendeu Euclides Gonçalves, pesquisador do Kaleidoscopio. (Omardine Omar)

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