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segunda-feira, 04 maio 2020 06:39

A Itália do período “Rossi-Roma” em Maputo

As notícias que nos chegam da Itália e relativas a pandemia do novo coronavírus, a COVID-19, remexem a minha memória, sobretudo, a que retenho da presença da Itália em Moçambique, concretamente em Maputo. Falo do período que apelido de “Rossi-Roma”,  meros marcos e não necessariamente o ponto de partida e o de chegada. O Rossi, Paolo Rossi, foi um jogador da selecção italiana no Mundial de Espanha de 1982 e que levara a sua equipe à conquista do torneio. E Roma, a capital italiana, que fora, em 1992, a cidade anfitriã do Acordo Geral de Paz, mediado pela Itália e assinado pelo Governo moçambicano e a RENAMO. É deste período que me embala a memória  abaixo.

 

Em 82, a Itália - a boa e a má - entrara na casa dos maputenses através da televisão. Em rigor, entrara nos bairros, pois, na altura, a TVE (anterior TVM) era vista ao ar livre nos Círculos dos bairros. E o Paolo Rossi foi um dos responsáveis pela entrada. Dele, fora um bom jogador e grande goleador - o lado bom - ele era um condenado da justiça italiana por conta do seu envolvimento com a máfia - o lado mau - na manipulação de resultados do campeonato italiano. Aliás, um arranjo jurídico oficial tornara possível a redução da sua pena e daí a sua participação no mundial. E assim, menos ou mais, a Itália se apresentou ao país e que o filme “O Padrinho” tratou de aprofundar o resto da apresentação.

 

Neste diapasão – de boa e má coisa – e entre as várias nacionalidades de cooperantes, os italianos marcavam a diferença na proximidade social, no bom gosto (vestuário e gastronomia) e na “pilhagem” dos recursos femininos nacionais cujos escândalos, à mistura, fizeram manchete social, destacando “o caso dos 33 andares” e de outros, sobretudo, na época da presença militar italiana no quadro da missão da ONUMOZ (1992-1994/5), então liderada por um simpático italiano. Deles, e como professores, também retenho a quebra do “cinzentismo” das regras ao se apresentarem de calças “Jeans”, camisa fora das calças, rabo-de-cavalo e de brinco de ouro na orelha. A outra lembrança é a das farras (festas) nas suas residências cujos “apetrechos de desenvolvimento” atraiam a cobiça de assaltantes.

 

Da Itália também a lembrança de grandes obras. E delas o ruído irritante de máquinas da empresa SIETTE durante a instalação de cabos telefónicos em Maputo. Desse trabalho, as estradas ficaram tão esburacadas que os maputenses passaram a referir que a sigla SIETTE significava “Somos Italianos Esburacamos Todo o Tipo de Estradas”. Outras obras, para citar algumas, foram as das barragens dos Pequenos libombos e de Corumana, registando que os italianos foram  vítimas - na fase de construção - do conflito armado que assolara o país nesse tempo. Um outro tipo de obras foram as do campo social e desportivo, destacando o apoio multifacetado, institucional e individual, em tempos difíceis do país.

 

Hoje, em tempos difíceis de um mundo abraços com a pandemia da COVID-19, a Itália – tão devastada pela pandemia – ainda se faz presente na vida dos maputenses através de uma das formas de prevenção da COVID-19: lavar as mãos. Aliás, a Itália estará sempre presente enquanto a água que jorra nas torneiras dos maputenses for a proveniente da Barragem dos Pequenos Libombos e de Corumana, um legado do período “Rossi-Roma”. E quem sabe se entre os que partiram da COVID-19 na Itália não esteja um dos que torna(ra)m possível os maputenses lavarem as mãos e assim repelirem a COVID-19. Esta é a Itália solidária que a conheci no período “Rossi-Roma”. À ela, Itália: il mio abbraccio fraterno!

 

PS: Numa recente visita à cidade de ChóKwè (Gaza) e à conversa numa esplanada, um Cota (mais velho) local contara-me que o presidente Samora Machel manifestara, na altura/anos 80, alguma preocupação com a presença de sul-africanos (em referência aos refugiados do ANC) porque estavam a ensinar o povo moçambicano a fazer candonga (contrabando). Perguntei-o sobre o que os italianos terão ensinado aos moçambicanos. O Cota, depois de passar um olhar de esguelha pelos arredores, respondeu de que os italianos ensinaram aos moçambicanos a fórmula de um país ficar anos sem um Governo em exercício. E quem terá ensinado o pagamento de comissões (os famosos 10%)? “Conto, um outro dia” foi a pronta resposta e final do Cota. Infelizmente, nunca mais eu tive notícias dele.

quinta-feira, 30 abril 2020 09:10

A última demão

Sempre que o visse passar em frente a minha casa, lembrava-me Noa. Levava nas mãos o martelo, o formão, o escopro, o serrote...... e a determinação de construir um barco e pô-lo a boiar. Descia nas manhãs, à doca, e de lá só regressava ao princípio da noite, pelo mesmo caminho, com os mesmos materiais de trabalho, com a mesma verve, e com a mesma ansiedade de ver a nau das suas mãos navegando entre as cidades de Inhambane e Maxixe, transportando passageiros insondáveis.

 

Eu nunca acreditei naquela saga. Ou seja, jamais um homem sozinho poderá construir uma embarcação das dimensões que ele pretendia, a não ser que este desafio seja assumido por um personagem de ficção, o que não é o caso, a menos que eu estivesse alucinado. Aliás, o único ser que ergueu uma arca inteira sem ajuda de ninguém, é Noa. Porque ele tinha Deus como o Próprio Armador. E este indivíduo que passa sempre por aqui, em frente a minha casa, parece caminhar no escuro. Deve ter armadores invisíveis que se apossaram dele para o atormentar.

 

Foram anos a fio de trabalho, e a medida que o tempo passava, o meu pessimismo parecia que ia sendo desmentido. Aparentemente! Porque o barco compunha-se, gradualmente, para arrepio de todos. Como é que uma pessoa sozinha, sem ajuda de ninguém, é capaz de protagonizar tamanha proeza! E logo lembrei-me de um homem que, olhando para arca de Noa pronta para a navegação, ridicularizou-a e disse assim, isto não vai a lugar nenhum. E Deus esbofeteou-lhe na boca.

 

Eu também estou a ser vergastado, não pela Mão de Deus, mas pelos meus próprios pensamentos. Este armador solitário está a avançar, rindo-se silenciosamente de todos aqueles que lhe diziam, você não vai fazer nada sozinho. E ainda lhe diziam mais, isto não é uma almadia!

 

Mas essas palavras todas, eram o granizo que caía por sobre a plataforma de betão, desfazia-se em pequenos grãos, e a casa continuava firme, ela própria construída  em cima das pedras, onde moram as águias. Mesmo assim, eu continuava com as minhas dúvidas. Oscilava entre a possibilidade de tudo aquilo vir a ser real, e o cepticismo. Era como se eu estivesse numa sala de cinema, vendo Marlon Brando, no filme Apocalipse Now, de Francis Coppola.

 

Todavia, e para que tudo se materializasse, eis que o homem passa num dia desses - em substituição do martelo e do escopro e do formão -  com duas enormes latas de tinta e diz-me assim, hoje vou dar a última demão (última pincelada de tinta). Fiquei estarrecido.

 

“A arca do Noa” está pronta! A notícia corre devastadora em toda a cidade, e ninguém queria acreditar no que ouvia. E segundo se dizia por aqui, ele construíu o barco sozinho, e é bonito. Meu Deus!

 

Prapara-se o champanhe para a vistoria e consequente aprovação das autoridades marítimas. O dito cujo está confiante como o Noa, que se avulta na proa, desdenhando o dilúvio que vai engolir casas e árvores e montes e montanhas. E o dilúvio é a boca das pessoas. Da minha, também. Pois, o que mata, não é aquilo que entra pela boca, mas o que sai através dela.

 

Agora só nos resta esperar por aquilo que vai acontecer com o testemunho das gaivotas e dos flamingos e de outros pássaros marinhos, e do próprio mar que estará calmo, dando-nos a sensação de paz. Há uma expectativa envergonhada por tudo o que falamos sem medida, diante do silêncio do homem que construía aquilo que ele pensava ser a própria vida. Um sonho que entretanto foi destruído pelos vistoriadores que não tiveram meias palavras, “este barco tem que ser desconstruído e recomeçado, tem erros graves”.

 

Raios! O que aconteceu é que a embarcação voltou para a doca, de onde nunca mais saíu. Aliás, foi sendo retirada aos pedaços, para produção de lenha.

quarta-feira, 29 abril 2020 07:24

O teorema de Petersburgo

 

Moçambique acaba de lançar oficialmente, nesta terça-feira, 28 de abril de 2020, mais uma descoberta científica na área das ciências sociais e humanas. O teorema de Petersburgo (em homenagem ao cientista) é um contributo 'suis generis' que irá acabar com o desemprego no mundo num futuro muito breve. Até, muito provavelmente, assim que estamos a dar esta notícia o desemprego já acabou, e essa notícia já não é boa nova e já perdeu interesse. 

 

Enquanto que o teorema de Pitágoras diz que "em qualquer triângulo retângulo, o quadrado do comprimento da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos comprimentos dos catetos", o teorema de Peter (como também é conhecido) defende que "o emprego é igual à soma de quaisquer rendimentos acima do salário mínimo, independentemente da sua proveniência". 

 

O princípio desta fórmula é de qualquer cidadão, onde quer que esteja, que tenha recebido num mês, no seu Eme-Pesa ou noutra plataforma, transferências monetárias num valor acima do salário mínimo nacional, então, já pode-se considerar um cidadão empregado. Isto quer dizer: aquele cidadão que transferir 4 mil meticais para a sua esposa ou amante para fazer rancho ou ir ao salão, então, automaticamente, essa cidadã é empregada a partir desse instante. Explicando melhor: aquele que, no intervalo de 30 dias, receber malta 4 mil e poucos, numa única tranche ou parcelada, já tem emprego, segundo esse teorema. 

 

O teorema de Burgo (na gíria académica, em homenagem à nova burguesia nacional) está a levantar várias reações. A primeira reação vem do juri do Prêmio Nobel que reuniu de emergência a noite e decidiu por unanimidade que, com essa descoberta, o cientista moçambicano Peter Esburgo vai ganhar todos os prêmios nóbeis possíveis (da literatura, da química, da física, da matemática, da filosofia, da geografia, do desenho, do empreendedorismo, do inglês, do francês, da agropecuária, da história, da educação física, da paz, da bebedeira, da mentira, do fuck-you, da cara-de-pau, etecetera, etecetera) nos próximos 5 anos. 

 

A NASA reuniu também de emergência e anunciou que vai fechar os escritórios por vergonha da sua equipa de cientista diplomados e renomados que nunca pensou em desenvolver uma fórmula importantíssima como esta. Quem vai fechar as portas também são as universidades de Harvard e Oxford por terem descoberto que depois disso não há mais nada por descobrir. O Vaticano decretou jejum de um ano e já anunciou o regressou de Cristo para os próximos dias. A Ametramo acaba de anunciar que a partir de amanhã vai começar a chover de baixo para cima. Enquanto isso, Dalai Lama, o líder espiritual do budismo tibetano, desmaiou. 

 

O teorema de Petersburgo é mesmo uma "granda" inovação. Só em Moçambique, na fase experimental, esta fórmula conseguiu criar mais de 48 mil empregos em apenas 100 dias. E era só teste! A ONU enviou para Moçambique uma equipa de alto nível de especialistas em encriptação de fórmulas matemáticas para que o teorema não seja roubado. Einstein ressuscitou e vem junto... não aguentou... dizem que disse "essa não perco por nada!", arrumou o caixão, saiu da tumba e embarcou.

 

Aguardamos ansiosamente a reação do Sindicato de Marandzas e Gigolos de Moçambique que convocou uma conferência de imprensa para hoje.

 

- Co'licença!

terça-feira, 28 abril 2020 07:51

O anjo da guarda de Nyusi

No que diz respeito a falta de foco, o balanço dos 100 dias de governação do presidente Filipe Nyusi não bate, nem de longe, a conferência de imprensa de Ossufo Momade e, muito menos, a aparição de Paulo Vahanle no jardim Parque. O balanço de Nyusi tinha tudo para ser motivo de conversa, mas foi superado pelo discurso oco, falido, despreparado e arrogante de Ossufo Momade e pela incompetência e falta de criatividade de Paulo Vahanle. 
 
 
Se o balanço de Nyusi é um manancial de desejos, então, o que falar daquela conferência de imprensa convocada por Ossufo Momade. Repito: é inaceitável que aqueles quadros da RENAMO (que eu tenho tanto respeito e admiração) deixem que o seu presidente convide jornalistas para não dizer nada. Como é que meu professor Eduardo Namburete - exímio comunicólogo - permite que Ossufo Momade se transforme num palhaço de circo diante de jornalistas?! Por que é que a RENAMO não se prepara melhor (trazendo assunto, problema, proposta de solução, objetivos, resultados esperados, passos seguintes, etecetera)?! Por que é que a RENAMO não traz assuntos mais bem estudados, elaborados, desenvolvidos?! Por que é que não deixam um Manteigas ou um Venâncio falar?! Pessoas com retórica! Pessoas que têm a capacidade de iniciar uma ideia, desenvolvê-la e concluí-la sem se embrulharem tanto! Pessoas que quando falam chamam atenção!
 
 
Se o balanço de Nyusi é uma desgraça, então, o que falar de Paulo Vahanle, que não sabia que têm crianças brincando desprotegidas no jardim Parque, que fica há 100 metros do seu gabinete?! Um gajo que viu pela tê-vê que no jardim Parque há crianças que brincam desgovernadas, desprotegidas e correndo riscos sérios de saúde, carregou a sua equipa ao local e simplesmente fez ginástica ainda mais desprotegida com os petizes e foi-se embora! Um gajo que até hoje, quase um mês de Estado de Emergência, não sabe que a aglomeração de crianças num espaço daqueles devia ser proibida! Um gajo que não sabe se vai encerrar ou não o jardim infantil neste tempo de distanciamento social! Esse nível de incompetência devia ser considerado feitiçaria. Vahanle devia ser processado por prática deliberada de bruxaria pública. Não é normal!
 
 
Paulo Vahanle até hoje ainda não desenvolveu uma ação sequer digna desse nome no âmbito de mitigação dos impactos da Covid-19. Não consegue pedir baldes com torneiras nos Somalianos e ir fazer entrega num centro de saúde num desses bairros periféricos e mostrar isso na imprensa. Se não sabe gerir, faça, ao menos, política! Por falar em política, tenho de reconhecer a atitude do Secretário de Estado, Mety Gondola, que não quis assumir protagonismo em relação ao assunto do jardim Parque. Gondola aprendeu com o erro. Apercebeu-se que Vahanle acorda e ganha protagonismo quando ele (o Gondola) tenta intervir. Depois do assunto da ponteca, Vahanle voltou a dormir e só acordou agora com notícia da Esse-Tê-Vê sobre crianças desprotegidas no jardim ao lado do seu gabinete.
 
 
Okey! Dizia, é-me difícil falar do balanço feito pelo presidente Filipe Nyusi sem inserí-lo dentro do próprio contexto. Política é competição, e acontece que Nyusi e seu partido não estão a ver adversários que os pressionem a fazer mais e melhor. A nossa oposição não pressiona e, muito menos, impressiona! Momade se comporta como o anjo da guarda de Nyusi. Ontem era o dia de Nyusi, não fosse o anjo Momade que decidiu roubar toda a cena convocando inoportunamente uma conferência de imprensa mal parida. Arrisco em dizer que Nyusi tem mais "medo" de Azagaia do que de toda a oposição junta. 
 
 
- Co'licença!

O recente bate-boca em torno do “saque” ao erário público para remunerar os custos da dignidade do estatuto do deputado (não necessariamente da pessoa beneficiária – um outro assunto) é recorrente. Para os do contra é “um valor altíssimo” e para os favoráveis é “um valor baixíssimo”. Os do contra não concordam que se pague tanto por dormidas no parlamento. Os favoráveis consideram que os ministros (que também dormem quando vão ao parlamento) recebem muito mais e ninguém toca no assunto. Por onde ficamos?

 

A partida é pacífico que se remunere dormidas em serviço de Estado (e na hora de expediente)  desde que não se exagere na remuneração cujo  cálculo – ao que parece - é inspirado no das  Ajudas de Custo em viagens de trabalho: quanto mais dormidas/diárias fora , maior é o bolo do per diem (valor por dia). Agora, se a dormida remunerada é barulhenta (a dos deputados)  ou silenciosa (a dos ministros)  depende da  manta que é usada. Nas sessões do  Parlamento a manta (mais para lençol) é transparente e nas sessões do Conselho de Ministros ela  é bem espessa, um autêntico edredom.

 

Dito isto – sobre quem dorme e recebe mais -  talvez o foco do argumento da corrente dos favoráveis, onde pontificam deputados em exercício e fora dele, passasse por defender uma lei que obrigasse que as sessões do Conselho de Ministros fossem públicas a par das do Parlamento. Se assim for, temo que a corrente dos favoráveis tenha razão e uma das evidências são as elegantes dormidas dos membros do Conselho de Ministros  nas idas ao Parlamento.  Uma outra evidência é a do mobiliário. Baste que repare nos confortáveis assentos da nova sala do Conselho de Ministro que até fazem inveja aos da Business Class das melhores companhias aéreas.  E quem já viajou nessa categoria que testemunhe a qualidade da soneca proporcionada.  Aliás, os próprios  ministros podem certificar a veracidade.

 

Para a corrente do contra, lembrar que a dormida parlamentar pode também significar um sinal de trabalho árduo. Pois, entendo, que quando o deputado chega às plenárias é o culminar de uma longa caminhada de trabalho nas comissões, visitas ao terreno e ao estrangeiro, trabalhos em grupo,  elaboração de relatórios/discursos, entre outros afazeres.  O mesmo para a dormida governamental. Contudo, também é válido que a dormida pode significar desorganização/falta de planificação. Que o digam os estudantes (e os docentes que confirmem)  que fazem um  trabalho de investigação de dois meses no dia anterior ao da sessão de entrega.  

 

Enfim. É a democracia da Pérola do Índico no seu melhor. Avisos não faltaram e por aqui ficamos com   um (aviso) deles, e prévio,  dado, na altura da introdução do multipartidarismo (anos 90), por Joaquim Chissano, então Presidente de Moçambique. O aviso  de Chissano-  direccionado ao Ocidente (salvo erro à Margaret Thatcher, a Ex-Chefe do Governo do Reino Unido)  – alertava para o facto da democracia ser um sistema extremamente oneroso. E desde então, nunca vi -  só para fechar -  um aviso a ser  levado  tão à letra e dolosamente quanto este. E isto é extremamente penoso. 

segunda-feira, 27 abril 2020 08:45

Os 100 dias de "governação" dos insurgentes

"Que balanço faz dos 100 dias da governação de Nyusi?". Se fizermos essa pergunta, hoje, a um refugiado de Muatide, Chitunda, Naunde, Namacande, Meangaleua, Ntchinga, Quitarejo, Chicuaia-Velha, Lukwamba, Litingina e outras já destruídas aldeias de Nangade, Muidumbe, Mocímboa, Macomia, Ibo, e etecetera, claramente que a resposta será uma pergunta: "quem é Nyusi?".
 
 
Não entendam mal essas pessoas! É que governar é fazer a agenda do país. Governar é dar as cartas... ficar com o trunfo... e ainda ter uma carta na manga. Governar é estar na vanguarda dos acontecimentos... é prever e antecipar-se. Governar é comunicar com os governados... é dizer o que está a fazer e o que vai fazer. Governar é dar a cara... mesmo que seja cara de bunda ou cara-de-pau. Governar é controlar... é tomar as rédeas, é tomar o remo do barco. Governar é saber onde vai... e ir. Governar é guiar. Governar é ser protagonista. Governar é dominar. Governar é criar confiança. 
 
 
Governar é PODER. E o Poder se tem ou por carisma (respeito) ou por força (medo). Nesses últimos 100 dias assistiu-se a um Poder instituído paulatinamente à força pelos insurgentes a ponto de serem aplaudidos e os soldados governamentais insultados pela população. Os insurgentes embaralharam as cartas e distribuíram-nas. Infelizmente, nesses 100 dias, o país andou a reboque desses energúnenos. Eles fizeram a agenda do país dentro e além fronteiras. Fizeram a nossa diplomacia. Não se sabe como não mandaram o seu representante à Breton Woods para negociar a nossa dívida. 
 
 
Na verdade, estamos a viver uma inércia de partilha de poder, que vem do quinquênio passado, entre o governo legalmente instituído e outros "governos sombra" que foram se impondo dentro dos circunstancialismos das circunstâncias. Temos a "governação" dos gatunos de estimação e do Efe-Eme-I que remonta desde a desocultação das dívidas ocultas cujo domínio é visível até os dias de hoje. Depois juntou-se a "governação" paralela do Nhongo e dos insurgentes cujo exercício iniciou nos meados do mandato passado e foi-se perpetuando e agudizando até hoje. 
 
 
De resto, podemos assumir que nos últimos anos, temos visto uma governação intermitente de Filipe Nyusi, com algumas acções esporádicas e pontuais. Mas, na prática, os primeiros 100 dias de governação, a contar da tomada de posse de Filipe Nyusi, a 15 de Janeiro, vimos apenas um Nyusi nomeador e empossador. As suas ações de governação dignas do nome foram marcadas por nomeações e empossamentos. O resto foram assobios para os ombros em relação aos problemas mais candentes do país, principalmente, aos ataques de Cabo Delgado. 
 
 
Nesse período, Nyusi nomeou e empossou toda a gente, tanto que nomeou e empossou pessoas que não conhecem os seus termos de referência. Uns estão a lutar para inaugurar pontecas, outros estão a dançar nos estádios, e ainda a quem está a empossar administradores de grupos de WhatsApp. Até nomeou e empossou a senhora que fica com as chaves do escritório da sua esposa. Provavelmente, mandar fechar escolas e barracas tenha sido o píncaro da sua governação desses primeiros três meses do calendário gregoriano.
 
 
Enfim, a César o que é dele. O primeiro trimestre foi dos insurgentes, hoje, terroristas. Foram eles que fizeram a pauta do país. Isso não é conspiração, nem vanglorização dos terroristas e, muito menos, celebração da violência ou, então, ejaculação com as mortes... é simplesmente o que se viu até agora. É o que se sente. Mas, o mandato ainda é uma criança! Avante, camarada Presidente! A nossa confiança em ti ainda não esgotou! Ainda temos muita esperança!
 
 
- Co'licença!