A participação pública está consagrada na Constituição da República de Moçambique (CRM), nos principais instrumentos internacionais de direitos humanos de que Moçambique é parte e, ainda, de forma dispersa em diversa legislação relevante que regula a funcionamento da Administração Pública na sua relação com os particulares. Contudo, a sociedade moçambicana ainda se debate profundamente com obstáculos sérios ao acesso a informação e falta de abertura das autoridades para a participação pública no processo de tomada de decisão.
Moçambique é um Estado de Direito Democrático baseado no respeito e na garantia dos direitos humanos e liberdades fundamentais, tendo em conta a participação do cidadão no processo de tomada de decisão à luz da natureza democrática da estrutura funcional do Estado. Aliás, os objectivos fundamentais do Estado consagrados no artigo 11 da CRM só podem ser melhor e efectivamente alcançados de forma sustentáveis mediante o respeito pela participação pública e correspondente disponibilização de informação de interesse público.
Nesse sentido, a elaboração de políticas públicas e o processo de produção legislativa, sobretudo daquelas matérias que impactam directamente sobre os direitos humanos e/ou as condições de vida dos cidadãos, deve ter por base a participação pública que seja transparente, abrangente, sem discriminação e com a maior disponibilização de informação sobre a matéria em questão.
Há muito que a sociedade reclama profundamente de fraca ou deficiente participação pública nos processos de tomada de decisão, seja para a adopção de políticas públicas, seja no âmbito da produção legislativa. A sociedade civil tem alertado sobre os problemáticos processos de consultas públicas, a falta de conhecimento da estratégia de comunicação entre os decisores e os cidadãos e falta de informação sobre os reais fundamentos que ditam a elaboração e aprovação de uma determinada política pública ou legislação.
Alguns exemplos curiosos mais recentes sobre a problemática da participação pública e deficiente acesso à informação são os seguintes:
É, pois, axiomático que a participação pública é um elemento chave da boa governação e que todos os cidadãos têm direito a participação e acesso à informação relativamente aos processos de tomada de decisão que afectam as suas vidas. Daí a necessidade urgente de um regime jurídico específico sobre a participação pública que estabeleça de forma clara os critérios de transparência, de acesso à informação, das formas de participação pública e importância das contribuições oferecidas, bem como os prazos para o efeito. Um regime jurídico de participação pública que seja claro relativamente ao papel e responsabilidade dos consultores contratados para o efeito de reforma ou elaboração de determinada política pública ou legislação a ser aprovada pela Assembleia da República ou pelo Conselho de Ministros dependendo na natureza ou tipo de actos normativos (Leis, Decreto-leis, Decreto, etc).
A participação pública tem a vantagem de melhorar a capacidade e credibilidade do Estado, na medida em que são criadas as condições para os cidadãos poderem expressar suas opiniões e realizar suas demandas, reduzindo os problemas de acesso à informação e de deficiências na prestação dos serviços públicos, bem como na prestação de contas.
Portanto, o Estado deve trazer a voz do povo na definição de políticas públicas e na produção legislativa, abrindo caminhos para os cidadãos e grupos da sociedade civil darem a sua a sua opinião e incentivar uma participação mais ampla no processo de tomada de decisão e na alocação de bens e serviços, de tal sorte que os projectos e programas de desenvolvimento terão maior e melhor sustentabilidade.
Por: João Nhampossa
Human Rights Lawyer
Advogado e Defensor dos Direitos Humanos
A educação passa intrinsecamente pela observação de aspectos básicos que contribuem para a mudança de mentalidade e crescimento saudável de uma criança. Em uma sociedade que se requer mudanças urgentes, investir em técnicas de estudo basilar é fundamental.
A criação de técnicas de estudo especiais para a educação pré-escolar e o ensino geral no modelo técnico profissional padronizado com técnicas de inovação impulsiona novos campos de saberes. Por exemplo (agricultura, mecânica, electrotecnia, canalização, eletricidade, corte e costura, carpintaria, aquacultura) entre outras. Porque o objectivo da educação passa por novos campos de conhecimento e saberes.
Este modelo de ensino pode gerar ramos de prosperidade a qualquer jovem moçambicano sem dependência do Estado como fonte de renda ou empregabilidade. Porque o Estado é maior empregador e tem enfrentado a problemática de falta de mão-de-obra de qualidade, urge formatar o modelo de ensino básico e geral. Porém, investir em áreas técnicas ajuda a projectar a economia e gerar mudanças positivas no comportamento da sociedade.
Uma sociedade bem-educada e bem treinada, contribui significativamente na defesa dos interesses da nação. A falta de objectividade educacional na nossa Pérola do Índico e mudanças curriculares sem pé nem cabeça torna os formandos em instrumentos quantitativos/ estatísticos para os políticos do que a qualidade que se pretende para que possam empreender mudanças significativas nas suas comunidades e na sociedade em geral. Formação adequada e virada para o desenvolvimento estimula a economia e o progresso científico de qualquer nação.
Entretanto, a falta de uma razão motivacional cria diversas incongruências sociais e contribui para uma nova vaga de conflitos, guerras de sabotagem económica e política como a que está instalada no norte do país a mando de uma mão alheia.
Por esta e outras razões somos economicamente medíocres, pela incapacidade de saber fazer e o espírito do consumismo. À implementação do PES 2020-2029 através de uma contribuição para o fundo comum de vários parceiros bilaterais de Moçambique, devia ser revista no meu pensar, para uma reforma adequada aos dias actuais.
A necessidade de buscar bons exemplos em países vizinhos como a África do Sul sobre o seu estágio de desenvolvimento educacional e o contributo na empregabilidade do sector privado que é maior empregador em relação ao Estado com base na qualidade de mão-de-obra, é um ganho derivado essencialmente da metodologia de ensino que os mesmos adotaram.
A História dita que foi devido a necessidade de conceber leis para regularização e o funcionamento do sistema educativo que nasceu o Sistema Nacional de Educação (SNE) que pode ser interpretado através das leis 4/83 e 6/93 de 1983-1992 e outra para reforma, em 1992 até ao contexto actual. A mesma que tem sofrido melhorias não sustentáveis por não ser adequada à realidade local e actual.
Um exemplo disso, verifica-se na Província da Zambézia, que tem um vasto território, com solos férteis e recursos minerais abundantes, mas a falta de uma objectividade educacional gera constante frustrações no alcance de metas sectoriais para o crescimento e expansão das infraestruturas económicas, muita das quais são inviáveis e construídas sem qualidade e sustentabilidade. Porém a incapacidade de avaliação da mesma é resultado do pressuposto do ensino que ontem e hoje foram implementados.
Supostamente está deterioração do ensino trás a nu as fragilidades na construção de obras de grandes engenharias, em uma altura que se fala da construção do afamado Porto de Águas Profundas de Macuse, iniciativa louvável, mas, que enfrenta vários problemas na sua implementação e deixa também um vasto questionamento em caso da real implementação.
Deste modo urge perguntar: continuaremos a trazer mão de obra de "fora" para responder aos nossos problemas ou mudaremos a situação vigente? De referir que a importação da mão-de-obra continuará a ser alternativa a outras paragens tendo em conta a escassez de técnicos especializados, como Pedreiros, Ferreiros, Maquinistas, entre outros conforme emana a Lei número 18, de 28 de Dezembro de 2018.
O SNE é constituído pelos seguintes subsistemas: a) Subsistema de Educação Pré-Escolar; b) Subsistema de Educação Geral; c) Subsistema de Educação de Adultos; d) Subsistema de Educação Profissional; e) Subsistema de Educação e Formação de Professores; f) Subsistema de Ensino Superior. Deste modo, torna-se necessário a revisão e padronização dos subsistemas para melhor adequação ao contexto local.
Em relação ao ponto anteriormente apresentado, penso que o que está em causa não é a revisão do dispositivo legal, mais sim a implementação efectiva da lei mencionada que passa por condições apropriadas para que o estudante possa ter oportunidade de praticar as actividades a fim de saber fazer e através do conhecimento adquirido possa empreender e contribuir para o desenvolvimento da sua comunidade e do país.
“Ninguém comete erro maior do que não fazer nada porque só pode fazer pouco”.
(Edmundo Burke, 1729-1797, Escritor e Político Anglo-irlandês)
Nós, os números:
Somos apenas 10 irmãos
Do mais novo “0” ao mano “9”.
Soltos, representamos senão lúgubre unidade
E se restringe, deveras, nossa quantidade!
Todavia, unidos
Somos a complicação de muitas mentes!
Jovens, adultos e velhos
Com ou sem casaco, trémulos
Reclamam o poder e a influência
Da nossa estratégica associação!
Ademais, reconhecemos que as letras
Engenhosamente grafadas ou manuscritas
Unidas, geram a temida Matemática
Mas nós construímos a sua essência
E isso as letras designam ciência!
Igualmente, nós, as letras:
Somos senão vinte e seis membros
De classes de cinco e vinte e uma
E a nossa influência é sem preço
Basta olhar para as palavras e frases
Expressões, folhetos, livros e compêndios
Somos a chama de grandes revoluções!
Soltas, desde a novata “a” a sonora “z”
Limitam-se nossa influência e nosso poder
Encolhem-se e estacionam-se as mais nobres mentes
Perdem-se a cor e o brilho das coisas
E quase sobre nada se pode escrever!
Entretanto, quando unidas:
Nascem pensamentos e sonhos
Despertam-se revolucionárias ideias,
Aureoladas e extraordinárias conquistas!
Além disso,
Erguem-se enormes livrarias
Clássicas e modernas bibliotecas
E a chama por um mundo melhor
Encontra em nós o seu embrião!
Bem que os homens
Que nos pensaram e deram vida
Poderiam algo de nós aprender
Pois se isolado cada um permanecer
Sua influência será de menor alcance!
Entretanto, os homens
Longe das nossas expectativas
Buscando auto-reconhecimento e vanglória
Aprenderam, com invejável destreza, a unir-nos
E esquecendo-se de si próprios e da sociedade que criaram
Hodierno, vivem resmungando socorro!
E nós, números e letras
Minúsculas ou maiúsculas
Em algarismo ou por extenso
Unânimes, somos o fósforo da revolução!
Quando morreu, a 30 de Junho de 1959, aos 37 anos, vítima de um cancro fulminante, Reinaldo Ferreira era, nas assertivas palavras de Eugénio Lisboa, “rigorosamente desconhecido na Metrópole” e “profundamente admirado por um número reduzido de amigos ou simples conhecidos”, em Moçambique, onde, acrescentava, “os seus poemas circulavam há muito de mão em mão, aqui e acolá publicados em jornais ou revistas, republicados, modificados, retomados, com aquela admiração e veneração sempre vivas que só as coisas realmente belas costumam motivar”.
Reinaldo Ferreira permanece, à distância de seis décadas, omisso, desconhecido, deslembrado, esquecido, não obstante a obra de grande quilate que então legatou, reunida e publicada, por um grupo de amigos, no ano ulterior ao seu óbito, sob a chancela da Imprensa Nacional e com o título “Poemas”. O Poeta projectava um livro a que daria o nome de “Um voo cego a nada”, belíssimo verso do poema “Eu, Rosie, eu se falasse, eu dir-te-ia”. Cito os primeiros versos: “Eu, Rosie, eu se falasse, eu dir-te-ia/ Que partout, everywhere, em toda a parte, / A vida égale, idêntica, the same, / É sempre um esforço inútil, / Um voo cego a nada.”
“Poemas” acabará por incluir 4 livros, designadamente: Livro I) “Um voo cego a nada”, Livro II) “Poemas Infernais”, Livro III) “Poemas do Natal e da Paixão de Cristo” e Livro IV) “Dispersos”. José Régio, à época uma sumidade nas letras portugusesas, dedicou-lhe um extenso estudo e uma admiração indisfarçável. O mesmo aconteceria com António José Saraiva e Óscar Lopes, autores da incontornável “História da Literatura Portuguesa”. Todos estes gabam-lhe a rara qualidade da sua poética e elevam-no, inclusive, à estatura de um Fernando Pessoa. No entanto, esta sua breve glória póstuma seria aviltada pelo tempo.
No belo e pungente “Reino Submarino” (1962), segundo livro de Rui Knopfli, que se estreara como poeta justamente no ano da morte de Reinaldo Ferreira, em 1959, com o provocatório “O País dos Outros”, cabe uma elegia ao Poeta: “O que na vida repartiu seu poema/ por alados guardanapos de papel, / o criador de sonhos logo perdidos/ na berma dos caminhos, / o mago que pressentia o segredo/ da beleza perene”.
Reinaldo Ferreira é autor de alguns dos mais belos poemas da língua portuguesa. Figura mítica da vetusta capital moçambicana, sobretudo nos cafés e dos circuitos da boémia nocturna, como haveria de testemunhar Guilherme de Melo, seu amigo e autor de um texto redigido para uma edição de “Poemas”, edição da Vega, em 1998, que sucedeu à da Imprensa Nacional de Moçambique (1960) e da Portugália, em Lisboa, em 1962, esta, por sua vez, com o texto de Eugénio Lisboa e um estudo de José Régio. A edição da Vega não inclui o texto de Lisboa, mas traz o texto do autor de “Poemas de Deus e do Diabo”.
Reinaldo Ferreira era também conhecido por ser autor de canções como “Uma casa portuguesa”, “Kanimambo”, “Piripiri” ou “Magaíça”, entre tantas outras, umas compostas originalmente e outras que resultavam de poemas seus que foram, entretanto, profusamente musicados. O Poeta dedicou-se abundantemente à arte dramática e foi responsável pelo programa “Teatro em sua casa”, do antigo Rádio Clube de Moçambique, parente distante de “Cena Aberta”, que, muitos anos depois, teria o concurso de figuras como Leite de Vasconcelos ou Né Afonso na subsequente Rádio Moçambique.
Hoje, no entanto, este imenso Poeta está “rigorosamente” esquecido. Fortuitamente citado, jamais celebrado pelos seus porvindouros, proscrito da glória que cobre tantos poetas efémeros, objecto de descaso quer em Moçambique ou mesmo em Portugal, os seus versos, quase todos aqui produzidos, permanecem no território do oblívio. Dir-se-ia que estamos perante um daqueles casos que não se sabe a que pátria literária pertence. Nasceu em Barcelona, cumpriu a adolescência no Porto para onde fora aos 4 anos e chegaria a Moçambique aos 19 anos e aqui viveria metade da sua vida, produziria a sua breve e fulgurante obra poética e dramática e aqui teria sepultura. Reinaldo Ferreira ficou, assim, prisioneiro do seu infortunado e paradoxal destino.
Breves efemérides da sua vida curtíssima em Moçambique: chega ao país em finais de 1941 e em 1942 termina o liceu. Ingressa, posteriormente, nos serviços de Administração Civil. Entre 1947 e 1949 publica, esporadicamente, poemas em páginas literárias. “Uma casa portuguesa” estreia em 1950 e torna-se um êxito de imediato. Dois anos depois, em 1952, passa a responsável da secção de teatro do antigo Rádio Clube. Em meados da década de 50 encontra-se a trabalhar nos “Poemas Infernais”. Em 1958 são-lhe detectados os primeiros sintomas da doença. No mesmo ano trabalha na colectânea “Um voo cego a nada”. Vai a Lisboa de férias e retorna a Moçambique em Janeiro de 1959. Em Março de deste infausto ano a doença agrava-se e segue para Joanesburgo em desesperada busca de cura. Em Maio já não há esperanças, regressa a Moçambique. No dia 30 de Junho desse ano morre de cancro no pulmão.
A sua campa é rasa e nela estão inscritos a bronze estes versos: “Mínimo sou, / Mas quando ao Nada empresto/ A minha elementar realidade, / O Nada é só o resto.” Descobri-a no acaso de uma romaria familiar ao Cemitério de Lhanguene e me deixei surpreender pela singela tumba. Não me sobressaltou o abandono. Os poetas costumam ter essa fortuna: o desabrigo, a solidão e a negligência do futuro.
Reinaldo Ferreira é, não obstante, um grande Poeta. Não entro na discussão da sua nacionalidade literária. Aliás, estão os seus poemas coligidos na antologia de poesia moçambicana “Nunca Mais é Sábado”. Um país que se preze reivindica-o. “Receita para fazer um herói” é o primeiro poema dessa escolha. Cito-o aqui na íntegra: “Tome-se um homem / Feito de nada, como nós, / E em tamanho natural. / Embeba-se-lhe a carne, / Lentamente, / Duma certeza aguda, irracional, / Intensa como o ódio ou como a fome. / Depois, perto do fim, / Agite-se um pendão / E toque-se um clarim. // Serve-se morto”. Belíssimo.
Maputo tem, felizmente, uma rua com seu nome, uma pequena rua cul-de-sac, que entronca na Emília Daússe, muito perto da Salvador Allende. Fui ontem procurá-la e lá estava recolhida na sua pacata obscuridade. O Poeta não está degredado da nossa toponímia. Ainda alimentei a esperança de o ver celebrado hoje nos lustros que perfazem, por estes dias, a relacção entre Moçambique e Portugal. Debalde.
Celebro-o aqui, nestas breves palavras, no dia em que passam, justamente, 100 anos sobre a data do seu nascimento, ocorrido a 20 de Março de 1922, em Barcelona. Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira, de seu nome, filho do celebérrimo Repórter X, pseudónimo do conhecido jornalista Reinaldo Ferreira, de quem herdou o nome. Leio-o esta noite e sempre com assombro e não deixo de vituperar esta cultura de esquecimento que é o apanágio dos nossos dias.
Maputo, Domingo, 20 de Março de 2022
Se todos nós percebemos bem, um “porta-voz” da oitava secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo (TJCM), ao impedir a cobertura noticiosa em directo do julgamento do caso “Helena Taipo”, a decorrer na Katembe, em Maputo, evocou alto e bom tom que, cito de memória, os réus gozam da presunção de inocência; e por isso as sessões de discussão, produção de provas e julgamento não podiam ser transmitidas pela comunicação social.
Tão somente isso: se as sessões estivessem a ser transmitidas em directo, estar-se-ia a violar o sacrossanto direito de “presunção de inocência dos réus”!, na óptica do diligente oficial.
Quid juris? - como eles próprios, os juristas, costumam redarguir! De quê é que estamos a falar de facto e de júri? Não passa um único segundo depois que vimos ao vivo tudo o que se passava na “tenda das revelações”, diariamente, hora a hora, minuto a minuto e segundo a segundo! Durante seis longos meses - de 23 de Agosto de 2021 a 10 de Março de 2022. Em Dezembro, praticamente só se trabalhou dez dias! Aliás, o tal julgamento ainda não terminou… falta a leitura do veredicto final.
Vimos ali na “tenda das revelações” tudo o que havia para ver na vida. Tristezas, não tristezas, choros, agonias, desesperos, aflições… tudo! Vimos todos os modelos de cabelo de Ângela Leão, os vestes e calçados de outro mundo do Ndambi, os chapéus do ACR, os fatos de Moda de Sidónio, as sonecas do Nhangumele, Mutola e quase todos os outros. Vimos todos isto.
E vimos porquê? Justamente porque o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo permitiu que víssemos! Permitiu que o julgamento fosse transmitido em directo pela comunicação social. O mesmo Tribunal Judicial da Cidade de Maputo que, na voz daquele cidadão, nos veio, segunda-feira, dizer que a transmissão viola o princípio de “presunção de inocência”! Quid júris?
Significa isto, então, que o TJCM, ele próprio, estava a violar este princípio quando permitiu que se transmitisse em directo o julgamento? Estava a violar o princípio da presunção de inocência quando permitiu a transmissão do julgamento do caso Carlos Cardoso e do BCM? Onde está a consistência? Então todos os réus envolvidos em todos os casos cujos julgamentos foram transmitidos em directo podem… pedir justiça e ressarcimento ao… TRIBUNAL JUDICIAL DA CIDADE DE MAPUTO… pela violação do seu direito de presunção de inocência? Podem?
Sabemos e compreendemos que os juízes são soberanos. Mas sabemos e compreendemos também que os juízes agem em estreita obediência à lei. Agora, digam-nos: qual é esta lei que muda de cor tipo camaleão… numa situação, permite transmissão em directo e noutras situações não permite? Qual é essa lei? Havendo-a, que todos os juízes a observem!… Ou cada juiz tem a sua lei e a vai exibindo e usando à medida das suas conveniências?…
Mas, deixando a matéria de direito de lado e indo à matéria dos autos: olhando para o objecto dos dois julgamentos, o da “tenda das revelações” e o da “Helena Taipo”, bem, bem, bem… qual é o que não merecia transmissão em directo? Não é aquele em que informações sensíveis do Estado foram expostas mundialmente? O armamento que se pretendia adquirir, como, a finalidade, etc., etc…. Não era este julgamento que devia ter sido “escondido”? Não o foi.
Agora, um caso em que os réus são acusados de se terem apoderado de dinheiro dos mineiros… o que é que há de segredo de Estado que é preciso preservar, esconder? A figura de uma ex ministra? Convenhamos!
Por último. Há um equívoco muito grande para com a essência da comunicação social. O trabalho da comunicação social é levar ao conhecimento dos membros da sociedade os actos que ocorrem nessa mesma sociedade. A comunicação social não realiza altos, não acusa ninguém, procura tão somente reportar o que acontece na sociedade. Quem realiza actos são os actores sociais, quem acusa são os ofendidos e o Ministério Público. Reportar isto é violar o princípio de presunção de inocência de alguém? Reportar a sessão de julgamento é violar o princípio de presunção de inocência de alguém?
Ademais. Quando alguém é nomeado ministro e a comunicação social reporta e transmite a sua tomada de posse, aí está tudo bem! Não há violação de nada… Só quando reporta a sessão de discussão, produção de provas e de julgamento é que já está a violar a presunção de inocência? Todo o acto praticado por uma figura pública é de interesse público!
Ou então, não seja figura pública!
ME Mabunda
Nos últimos anos, virou moda políticos e organizações não-governamentais apontarem o ano de 2030 como o prazo para que as nossas vidas estejam “super nice”! Se ligas a televisão, só ouves que no ano de 2030 seremos isso e aquilo, se pegas os jornais, todos apontam 2030 como o ano de grandes avanços. Os grandes planos das organizações humanitárias estão todos virados para o ano de 2030 – daí o meu desejo para que este ano chegue logo, para vermos se os políticos terão razão – se o meu povo deixará de sofrer de fome!
Às vezes fico imaginando que se o ano 2030 chegar, finalmente, o povo moçambicano estará num patamar de potência. Que ombrearemos com as grandes nações em questões económicas, onde teremos estradas sem buracos, 98% dos jovens trabalhando, as nossas universidades produzindo ciência e não um exército de desempregados e doutores sem conhecimento. A nossa agricultura, essa, será uma das 10 melhores do mundo, se confiarmos cegamente naquilo que nos é dito!
– De tanto ser referenciado, até parece que existem alguns que já viveram neste ano e regressaram para nos contar o que lá viram. Alguns dirão que são meras projecções, mas quando analiso os discursos e planos tudo se parece com a promessa do antigo ministro da Indústria e Comércio, Ragendra de Sousa, que jurou e prometeu entregar a sua cabeça de bandeja para os homens de Búzi, na Província de Sofala, mas saiu do governo sem pelo menos levar um investidor para ver o tal empreendimento!
- Conhecendo as pessoas que nos governam, quando os políticos atiram tudo para o ano de 2030, recordo-me da obra do grande pensador inglês Thomas Moore, no seu clássico livro “a utopia”, onde apresenta uma cidade igualitária e com várias condições pretendidas e almejadas por todos. Por aqui, o ano de 2030 vira uma nova meta e mais promessas, uma vez que os tipos actuais até lá já estarão a curtir à francesa nas Bahamas ou alguns estarão a cumprir suas penas pela mola que mamaram apontando que tudo se materializará no ano de 2030.
Se tudo for materializado até 2030, não teremos crianças sentadas no chão para estudar. Homens adultos a violarem sexualmente menores ou unirem-se prematuramente com elas. Não teremos governos corruptos. Não haverá perseguição aos jornalistas. A indústria dos raptos já terá sido derrotada. O valor das portagens será outro, ou seja, mais baixo. As pessoas não irão perder a vida nas filas dos hospitais. O transporte público será o melhor, até lá quem sabe teremos um metro de superfície e o nível de sinistralidade rodoviária já terá reduzido – seremos a nova Singapura de África!
Portanto, para que isso aconteça será necessário que haja uma mudança de atitude. É importante que a ciência esteja ao serviço do desenvolvimento. É crucial que haja governantes amantes do povo e da verdade! É importante que o nosso sentido de justiça social seja verdadeiro. Que o amor à pátria seja intenso. Porque sem isso, em nada nos valerão grandes planos com metas ambiciosas e sensacionalistas quando no fundo somos Docentes livres em endividar o país para projectos que mesmo o mentor da ideia não acredita!
Seria bom que o ano de 2030 fosse logo amanhã, para vermos esta singapurização de Moçambique e porque não de África, onde segundo as projecções poderemos viver em Chicualacuala e trabalhar em Palma, fazendo as viagens diárias sem nenhum sobressalto. Afinal, teremos tudo a funcionar em pleno, a mola do petróleo e gás de Afungi já estará a transbordar. Os rubis de Montepuez e Mavago a renderem. Os diamantes de Gaza e Tete idem. Os locais turísticos de Maputo, Inhambane, Sofala, Zambézia, Nampula, Niassa e Cabo Delgado a meterem muito dinheiro!
Não haverá dificuldades, até a desnutrição infantil já terá sido esquecida! Só que não nos esqueçamos que faltam oito anos (2022 – 2030) e se em mais de quatro décadas apenas só soubemos investir em novas táticas e técnicas de desinvestimento – está aí uma desculpa para que as coisas continuem como estão ou mesmo pior, porque tudo está planificado para o ano de 2030, em que os anjos virão mijar nesta terra para que tudo esteja na máxima perfeição. Não vejo a hora de chegar no ano de 2030, quero ver uma coisa, aí – um país com um novo rosto – que pode ser um igual a de um camponês de lá das bandas de Pebane, na Zambézia, ou de um farmeiro bóer dos tempos das vacas gordas no Zimbabwe!!!