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quarta-feira, 09 outubro 2019 14:23

Criar uma Comissão de Inquérito para se auto-investigar...

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O assassinato bárbaro do activista social Anastâcio Matavel pelas mãos de membros do Grupo de Oprações Especiais confirmou a existência dos famigerados esquadrões da morte no seio das próprias Forças de Defesa e Segurança.

 

Vai daí que a hierarquia policial decidiu criar uma Comissão de Inquérito para apurar a verdade dos factos. À partida, parece ser essa uma medida louvável mas seria tamanha ingenuidade da minha parte chegar a essa conclusão.

 

A criação dessa Comissão do Inquérito parece-me problemática. Acho ser crucial questionar a sua composição: todos os integrantes dela são membros da Polícia da República de Moçambique. A pergunta que não cala é como é que a Polícia se pode auto-investigar, sobretudo, porque membros da corporação praticaram um crime hediondo.

 

Neste sentido, parece-me que uma saída seria ou de se constituír uma Comissão de Inquérito mista ou um Comissão de Inquérito independente. A PRM não tem credibilidade para ser árbitra onde já é jogadora. Até porque há muito que ela é sistematicamente acusada de abrigar esquadrões de morte no seu seio, sem que houvesse uma resposta célere e transparente para abordar as acusações. Se desta vez ela decidiu agir, é provavelmente porque foi apanhada com a mão na botija.

 

Sendo assim, como é que ela pode ser objectiva, ou melhor, como é que a Polícia pensa que poderá convencer a sociedade moçambicana de que o inquérito será conduzido de forma objectiva? É que se ela já foi acusada de abrigar esquadrões de morte e nunca se pronunciou sobre isso, ou se fê-lo, foi para desmentir as alegações, vai ser difícil convencer os moçambicanos de que fará uma investigação rigorosa e pormenorizada.

 

A razão disso é que não parece que os assassinos estivessem a agir fora de uma sub-cultura de abuso de autoridade, corrupção e impunidade. Esta não é uma percepção da realidade, mas aparentemente é a própria realidade no seio da Polícia. É verdade que não se pode acusar toda a polícia de corrupta e criminosa, mas os corruptos e criminosos dentro dela têm tanta influência sobre como a sociedade a vê, que a inferência é de que ela é corrupta e criminosa.

 

Sendo que, para a corporação afastar qualquer suspeita de que o inquérito resultará num encobrimento e impunidade para os mandantes do crime, seja necessário ou adiconarem-se juizes e criminologistas ou criar-se uma totalmente independente da corporação.

 

A termos uma opção enquanto sociedade, a segunda seria melhor para garantir independência visto que não haveria uma ligação hierárquica entre os investigadores e a Polícia; seria adequada porque teria o potenticial de juntar todas as evidências para determinar quem mais esteve envolvido e quais foram as motivações e sugerir recomendações; também seria transparente porque os procedimentos e a tomada de decisões seriam conhecidas; entre outros. Crucialmente, essa Comissão de Inquérito independente devia ter o poder legal de forçar a corporação a cooperar com a investigação.

 

Este seria um primeiro passo para se expurgar as maçãs podres da corporação – o ideal é que tal Comissão fosse percurssora de uma instituição independente para investigar os abusos e cultura de impunidade no seio da Polícia. A PRM já teve tempo mais do que o suficiente para se reformar e já é altura de se lhe dar uma ajudinha nesse sentido: precisamos de um organismo independente similar ao Provedor de Justiça, mas com dentes para morder, de modo a que monitorar as actividades da nossa Polícia.

 

A longo termo, a medida seria benéfica para a própria corporação porque melhoraria os padrões de desempenho dos agentes, levaria a Polícia a agir com maior transparência e accountability. Afinal, a nação quer ver uma PRM mais protectora dos direitos humanos dos cidadãos, mais próxima ao povo, e mais firme e implacável no combate ao crime.

 

Só uma Polícia que é responsabilizada, respeita e protege os direitos humanos será capaz de construir boas relações com as comunidades, e posicionar-se melhor na prevenção e combate ao crime. Sendo que, os esquadrões de morte não caberiam nessa Polícia.

Sir Motors

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