É recorrente e, desta vez, não muda: quando se chega ao fim de um consulado, a palavra de ordem ser “O Candidato”. Aqui, o Candidato na verdade ainda nem sequer é candidato; está-se a falar do Candidato a Candidato do Partido Frelimo. As outras formações políticas têm a sua maneira de chegar ao Candidato, mas nesta nesta missiva o sujeito é o Candidato do Partido Frelimo.
Se o Dia da Vitória é 7 de Setembro de 1974, então para mim somos independentes desde 1974. O Dia 25 de Junho de 1975 é apenas a data da proclamação da Independência Nacional, então o Partido Frelimo governa Moçambique há 50 anos!
Pela característica específica da nossa jovem Nação, o Partido Frelimo instrui o governo como deve governar, passe o pleonasmo, e isso sempre foi assim. É sabido que um Primeiro Secretário do Partido tem mais poder do que um Governador da Província e, claramente, sempre será impossível ter-se um Presidente do Partido que não seja Presidente da República, pelo menos em governos do Partido Frelimo.
Isto às vezes me faz confusão, de um lado por eu ser apenas um membro júnior do Partido Frelimo, mas de outro lado, talvez porque eu não tenha tido uma educação política, per si. É que, numa democracia, quando vamos às eleições, embora os empates sejam coisas que acontecem, normalmente há uma vitória e uma derrota. Simples como isso.
A minha confusão costuma surgir quando, neste debate da sucessão, mais do que se olhar para o perfil do futuro candidato à Presidência da República, as pessoas estão preocupadas com o candidato a candidato. Eu não concordo. Eu penso que o que estamos à procura é de uma pessoa que não só nos garanta uma vitória no pleito que se avizinha, mas também garanta a sua reeleição, e isso ultrapassa a vontade de menos de 20 pessoas e em menos de três meses.
O racional acima é a antítese de todo este processo. Parece haver garantias que para ser Presidente deste Moçambique é só garantir que dos outros candidatos você seja “O Candidato”.
Estas assunpções é que nos fazem ter Beira e Quelimane nas mãos da oposição, o que para mim não é necessariamente um problema, afinal, a finalidade da democracia é exactamente garantir a alternância, havendo. Estas cidades deveriam ser estudadas para se perceber primeiro porque passaram para lá e, segundo, porque já não estão a passar para cá?
Pode parecer um clichê, mas é nas derrotas que devemos fazer uma introspecção sob pena de termos surpresas que, até o mais intelectual dos intelectuais não disponha de uma explicação racional. O certo é que não há vitórias garantidas antes do embate, se a história recente valer de alguma coisa; pelo menos vejamos a questão da Rússia e Ucrânia.
É preciso pensar que a Frelimo não governará eternamente Moçambique e não interessa o quão membros ardentes sejamos, o trinômio Partido-Governo-Estado um dia pode ser dissolvido. E o que vai acontecer?!
A minha pergunta acima é retórica e não precisa ser liminarmente respondida, mas podemos divagar em torno disso.
Estamos a pouco menos de oito meses das eleições e tudo o que foi veiculado até agora é boato. O Partido Frelimo não tem candidatos nem candidatos a candidatos.
Já foi instruído que “…Não é você querer, é preciso que nós queiramos, para você se querer”; portanto, se seguirmos à risca, mesmo os candidatos a candidatos devem ser queridos por um círculo pequeno de pessoas, para que um outro número de pessoas, um pouco maior que o primeiro, chancele o candidato.
A pergunta que não se quer calar: “Se este grupo errar na escolha?”.
Eu até acredito que os meus chefes na Comissão Política têm olho de lince quando se trata destas coisas de ver aquela pessoa que nos vai guiar para as eleições, mas e o Comité Central?
O segundo órgão é extremamente importante e extenso, e cada pessoa com suas aspirações! Infelizmente, às vezes, estas aspirações são pessoais e não necessariamente voltadas para o povo. O que acontecerá no dia em que o Comité Central escolher um candidato que não consiga renovar o mandato ou, na pior das hipóteses, nem consiga um mandato?!
É aqui onde trago a parábola das três refeições: “Até muitos as têm, mas apenas um pequeno grupo de pessoas neste Moçambique é que tem carboidratos, vitaminas, lípidos, água, proteínas e minerais na mesa, portanto uma refeição balanceada.”
Tem-se visto no Parlamento a votação efusiva por uma peça de legislação para depois descobrirmos que afinal não devia ter sido aquilo e Ematum é um exemplo concreto: temos pessoas no Língamo, mas o voto dos deputados do nosso partido foi para a prossecução daquela empreitada. Então ficamos como?
O que acontece é que os melhores filhos do Partido Frelimo definitivamente não estão naquele parlamento, salvo poucas excepções. O grosso que está ali são camaradas que não têm ocupação e a única coisa que se encontrou foi um assento no parlamento para, pelo menos, garantir uma refeição condigna no fim do dia, mas que de legislação pouco ou nada entendem, de economia nem se fala, e a lista é extensa. Mas, estão ali no Parlamento e, aparentemente, me representam enquanto membro e cidadão! É que foram nomeados e depois eleitos pelos pares na base e chancelados no topo e, até renovam, então o processo foi democrático!
Alguém já pensou num modelo em que os parlamentares são distribuídos pelos distritos deste país e serem eleitos lá mesmo no distrito?! É que em vez da manta do Partido estes deputados só chegariam ao Parlamento se convencessem os seus constituintes que na verdade podem ali estar, pois defendem os seus interesses. Com a manta do Partido, as pessoas simplesmente corrompem o sistema para estarem numa boa posição na lista do Partido e depois é aquilo que temos visto.
O próximo Candidato do Partido Frelimo e futuro Presidente da República precisa, para além de muitas outras coisas, olhar para:
1 - Raptos
Este fenómeno já dilacerou a sociedade e, quando começou, foram exactamente membros seniores do Partido Frelimo que, em canal aberto, disseram que era um processo normal numa economia em franco desenvolvimento. Disseram que era um acerto de contas entre monhês, um termo não corrente e até certo ponto pejorativo para com os nossos irmãos de origem asiática, especificamente no subcontinente. O certo é que estamos há mais de 10 anos nesta ladainha, muitas movimentações na polícia a nível de topo e até na máquina securitária, mas os raptos não têm rosto, acontecem quase que semanalmente, milhões de dólares estão a ser pagos e famílias destruídas. Moçambicanos e estrangeiros abandonaram o país, o investimento estrangeiro retraiu e não há negócios.
2 - Cabo Delgado
Enquanto os especialistas se digladiam na imprensa sobre a definição do fenómeno que está a acontecer em Cabo Delgado, no terreno, população civil e Forças de Defesa e Segurança estão a perder a vida diariamente por causa de algo que primeiro se chamou de garimpeiros ilegais, depois bandidos, mais tarde insurgentes e, finalmente, terroristas. Nos escritórios, estamos à procura de definição. O certo é que enquanto estas definições não se traduzirem em acções concretas no terreno, aqueles 60 biliões que sempre se falaram em investimento na área de hidrocarbonetos vão-se esfumar, para não falar em ouro, grafite e rubis! O certo é que, desde Outubro de 2017 para cá, mais de 100 pessoas perderam a vida, milhares de irmãos deslocados e muitos investimentos paralisados.
3 - Economia
É muito comum falar-se do potencial de Moçambique. Myanmar também tem potencial, só que eles investem na produção de heroína. Moçambique tem uma costa de 2,800 quilómetros; a Somália também tem costa. Para que serve essa tal costa se o turista é extorquido quando chega (migração e polícia), quando está na estrada (migração, polícia, polícia de trânsito), quando sai (polícia e alfândegas)? Moçambique “já não é bom terra”, diz qualquer turista que por aqui tenha passado nos últimos anos. Por que vou comprar castanhas ali no Feima para depois ser stressado nos aeroportos porque “deveria trazer um documento do ministério do Turismo”? São coisas simples que matam uma economia e chutam à irrelevância o Ministério de Turismo e Cultura, instituição que já deveria ter sido extinta há muito tempo.
4- Agricultura
A nossa constituição diz claramente que a agricultura é a base do desenvolvimento. Era, possivelmente nos tempos dos libertadores; esse dogma não serve e não precisa de um doutoramento em economia, simplesmente olha-se para a estrutura do nosso PIB e fica claro como água da Praia do WIMBI. Sim, não se come carvão e nem se bebe gás liquefeito, mas talvez seja altura de se retirar esse slogan, agricultura é incipiente. A comercial não avança e a de subsistência, como o nome diz, é mesmo de subsistência.
Nada contra a agricultura, mas talvez o próximo que reveja não só o slogan, mas também que entenda que, como base de desenvolvimento, a agricultura já foi ultrapassada. Ensinemos as melhores práticas aos nossos camponeses, tiremo-los de camponeses e os façamos de pequenos e médios agricultores, mas agricultura ser a base de desenvolvimento neste Moçambique do século XXI é heresia, é falácia; na verdade, é conversa para boi dormir. Enquanto o mundo está a avançar para a Quarta Revolução Industrial, mais do que agricultura já é altura de começarmos a implementar e não falar, da industrialização!
5 - Educação
Não há investimento que não tenha retorno na educação. O líder que não quer ver isso definitivamente quer um povo analfabeto. Temos um déficit de mais de 30,000 salas de aula neste país, o que quer dizer que crianças estão a estudar em condições precárias e, na pior das hipóteses, até debaixo das árvores.
Pode parecer um insólito, mas a província de Maputo é que lidera esta posição de maior número de crianças sem salas de aulas. Cada governo que entra não só troca o Ministro, mas também o nome do ministério, e isto não é sintomático apenas naquele ministério, penso que os ministérios da Defesa Nacional e do Interior devem ser os únicos que ainda mantêm os seus nomes.
A educação é a base de desenvolvimento, mas ao fim de 50 anos temos um pouco menos de 1000 doutores e as universidades vão nascendo tipo cogumelos. No fim, temos gente que faz Direito ou Economia para ir trabalhar para o Estado e garantir a reforma. Escolas técnicas não temos e, como consequência, ninguém sabe sujar as mãos desde o primeiro dia que entra no mercado de trabalho.
Eu estudei com “A Lila pula, o Tito ata o pato” e se há alguma coisa que deveria ser adicionada naqueles livros é mesmo adição. O que temos visto é matar uma literatura inteira a ser aplicada na primária ou secundária, colocar o Estado do Zimbabwe a se delimitar a norte com o Mar Vermelho e o Golfo de Aden é o ponto mais alto da heresia.
6 - Forças de Defesa e Segurança
Há uma necessidade premente de uma reorientação geral nas nossas FDS, principalmente a polícia. Pode parecer uma anedota, mas há vezes em que não se sabe se a única coisa que separa agente do malfeitor não é apenas a farda, pois armas os bandidos também têm, e até mais sofisticadas.
Quando o ponto 1 acima acontece, primeiro o “modus operandi” é que se trata de gente que “trata de arma por tu”, como se diz em linguagem popular, logo depois aparece a polícia para pedir gravações de CCTV privadas!
Afinal, os 148 milhões de dólares que o Estado investiu na Rede Nacional de Segurança foram para onde? Quando o meu melhor amigo foi raptado há quatro anos, sou chamado ao SERNIC para prestar declarações e estão a perguntar-me pela estrutura accionista da empresa em que eu era o Director Geral. Mesmo?!! O fim foi aquele que se viu e o meu amigo teve de abandonar o país. É que por ele ser de origem asiática, os donos deste país, sim, esses mesmos que já sequestraram o Estado, acharam que ele era rico, não sendo, mesmo assim foi extorquido.
O Ministério do Interior não precisa de um ministro polícia e isto não é falácia. O que o ministério do Interior precisa é de um gestor, coadjuvado por um Comandante-Geral implacável. É que os generais já descobriram que qualquer um deles pode ser ministro naquela casa e daí, mais do que estancar o crime, se estão a apunhalar para um dia chegar ao posto cimeiro!
7 - SISE
Herdou-se uma máquina operacional extraordinária do SNASP, formada pela STASI, e, ao longo do tempo, aquilo que se queria como Serviços de Informação e Segurança de Estado parece mais uma extensão do departamento de segurança do meu Partido Frelimo.
É mais fácil ter gente destacada para controlar movimentos de elementos da oposição ou do Partido Frelimo que tenham alguma relação de amizade ou familiaridade com elementos da oposição, do que na verdade se fazer o serviço que se quer. Estes não são inimigos do Estado, são adversários políticos do Partido Frelimo!
O comum é estares num bar e alguém gritar que é do SISE. Ser do SISE, e às vezes nem são, pode-te conseguir uma boa donzela neste Moçambique!
Sendo um órgão central, o SISE tem delegações provinciais e quem tem delegação provincial definitivamente tem um delegado distrital! Onde estava o SISE em Palma, Mocímboa da Praia, Muidumbe, Quissanga e outros distritos onde estes terroristas foram fazendo e desfazendo como se não tivéssemos inteligência?!
Não é para uma resposta, mas se SISE também está infiltrado, então estamos entregues, pois para mim este é o último flanco de defesa da nossa soberania.
Parem de ir aos comícios políticos, um dos pontos onde está o nosso inimigo chama-se Cabo Delgado.
8 - Corrupção
É muito comum falarmos da corrupção e o seu combate, mas é mesmo discurso. É que enquanto a corrupção existe, o seu combate é inexistente. O Juiz é corrupto, o Procurador é corrupto, o Advogado é corrupto, o Polícia é corrupto, o Político é corrupto, até o empregado de mesa de um restaurante é corrupto.
A inoperância é visível a olho nu. Diz-se que justiça tardia é justiça não servida e aqui em Moçambique qualquer bandido apanhado em flagrante quer ser levado à esquadra. Uma semana depois está a passear nas mesmas ruas.
Um bandido ludibriou a minha empresa em Caia em 2015. O caso ainda não foi a julgamento e ele é uma espécie de estrela nas redes sociais! Não era melhor ir ter com aquele rapaz do Estrela Vermelha que, por 35,000 meticais, pode partir-te as duas pernas?!
A justiça pelas próprias mãos não é porque o povo ficou selvagem, é que quem de direito não faz o seu trabalho.
9 - Vice-Ministros
Figuras de que definitivamente não precisamos. Autênticos fardos para o nosso minguado Orçamento Geral do Estado e não têm função. Fica-se com um ministro que sabe porque se está ali e um Secretário Permanente para as questões administrativas. Ponto final.
10 - Governo
Tem de se trazer um governo funcional. Que pague bem aos ministros para poderem comprar os seus carros e arrendar as suas casas e que tenham dinheiro para a sua vida social. Chega de engordar um sistema já falido com benesses infinitas para os nossos dirigentes. Para começar, até a aprovação do orçamento de funcionamento, cada ministro deveria ir do seu próprio carro e estar a viver na própria casa.
É que mais do que querer ser querido, é preciso saber como será, quando for querido, pois este país está cheio de gente de boa vontade, mas o que está a precisar é de gente que, para além de carregar o estandarte, possa sentir-se comprometida com a Nação Moçambicana e as suas nuances, antes de qualquer outra coisa. Ponto Final.
“Mais cedo ou mais tarde, no caso, mais tarde, a Sessão do comité Central da Frelimo irá acontecer e os pré-candidatos conhecidos. A questão que se coloca, aos membros da Comissão Política e do comité Central é: estão satisfeitos com a forma como as coisas estão, o tempo de realização das eleições internas é razoável? Se não, então, que agendem o debate desse assunto e encontrem formas de intervenção, independentes da liderança máxima, que possam corrigir o que não está certo. Isso passa, naturalmente, por rever os poderes dos vários órgãos e dos próprios membros. A Frelimo não deve estar na boca do povo por piores razões”.
AB
“Os sucessivos adiamentos da derradeira reunião da Comissão Política da Frelimo (o órgão mais importante no intervalo entre as Sessões do Comité Central), para a indicação dos três a quatro nomes que irão constituir a lista dos pré-candidatos a candidatos da Frelimo para as eleições gerais, estão a criar um grande nervosismo. Estão também a alimentar várias teorias de conspiração na corte partidária, cada uma mais extravagante que a outra”.
In Canal de Moçambique, edição nº 869 de 21 de Fevereiro de 2024
Nos derradeiros momentos, rumo às eleições Gerais para a Presidência da República, Assembleia da República e Assembleias Provinciais, 11 de Outubro de 2024, a Frelimo ainda não apresentou candidato para qualquer das eleições, sendo o mais importante, no interesse público, o candidato da Frelimo à Presidência da República. A importância do candidato da Frelimo, na minha opinião, deriva do facto de ser quase certo que será o próximo Presidente da Frelimo.
Pela narrativa de alguns membros seniores da Frelimo, que se têm prestado a dar a cara, quer me parecer que um dos grandes obstáculos é o facto de ser a “vez” do centro do País oferecer candidato a candidato para a Presidência da República, segundo um acordo de “cavalheiros” que, por ser de “cavalheiros” não foi reduzido à escrita, mas, socorrendo-me do texto publicado na edição acima, a minha reflexão é no sentido de a Frelimo manter-se coerente com os seus princípios! Passo a citar o jornal “Canal de Moçambique”.
“O Canal de Moçambique apurou que, em 2013, supunha-se que José Pacheco fizesse a vez de Filipe Nyusi, e Armando Guebuza até estava para lá inclinado, mas, para sossegar Alberto Chipande, que, entre todos, era o mais barulhento, chegou-se a um acordo sobre “a vez do norte”, e Alberto Chipande, que estava com problemas de saúde, indicou Filipe Nyusi.
José Pacheco retirou a sua candidatura e apoiou Filipe Nyusi. José Pacheco está agora em campanha como candidato natural, fruto desses arranjos” no mesmo pacote (da vez do centro), acabou por surgir um candidato que, de todos, é o que mais deixa clara a sua intenção de ser candidato. É o Jaime Basílio Monteiro”, fim da citação.
Posto isto, e porque não existe nenhum desmentido claro, através das personalidades que, supostamente, entraram para o tal acordo de “cavalheiros”, como pacato cidadão, só de opinião que a Frelimo deve manter essa coerência, pelo menos, até completar o ciclo, que será o “SUL, NORTE E CENTRO”, julgo que não é pedir muito à Frelimo, representado pelo seu Comité Central. Sejais coerentes!
É verdade que a Frelimo de ontem, a que estabeleceu o acordo de Governação de Moçambique, não é a mesma de hoje. Quando se estabeleceu esse acordo de Governação, estava-se no regime de partido único, partido “que dirige o povo”, e hoje estamos num sistema multipartidário, um sistema em que, independentemente da sua região, qualquer um pode concorrer às eleições. Este regime de livre concurso, por consciência, não devia ou não deve contar para a Frelimo, por ter assumido esse compromisso. Sabe-se também que as personalidades que fizeram esse acordo, hoje, na Frelimo, podem não ser relevantes, mas não serem relevantes é o mesmo que não respeitarem a sua própria história, entretanto, isso já não surpreende a sociedade!
Por outro lado, a Frelimo deveria rever os seus instrumentos de Governação interna, incluindo os poderes do seu Presidente. Com este andar, podemos vir a ter um Presidente que nem a Comissão Política do seu partido irá ouvir. Nessa perspectiva, julgo que a própria Comissão Política não devia ser refém da boa disposição do seu Presidente para agendar e debater matérias importantes do País. Dever-se-ia prever outra forma de convocação e de agendamento das matérias. O actual Presidente está de saída, o próximo permanece uma incógnita.
Para concluir esta reflexão, a ideia é que a Comissão Política da Frelimo apresente quatro nomes a pré-candidatos da Frelimo, todos do centro de Moçambique, sendo que, havendo um membro da Frelimo com vontade e direito de concorrer, fora deste acordo de “cavalheiros” existente, este possa concorrer. Assim, na minha opinião, a Frelimo manter-se-ia coerente com os seus princípios e respeitaria a sua própria história. Agora, vir a público dizer que “nunca houve acordo nesse sentido” e o que é ainda pior, exigir a cópia desse tal acordo, é uma atitude de má-fé!
Devo deixar claro que esta minha reflexão, por enquanto, não defende nenhum pré-candidato especial. Mais ainda, eu sou do Sul, da Província de Inhambane, por isso não faço parte dos cidadãos do centro de Moçambique. Por outras palavras, não tenho qualquer interesse no processo!
Adelino Buque
Virado para o mar, para sempre, o pórtico dos escravos guarda em silêncio as dolorosas memórias dos gemidos. Das torturas. Dos escárnios e das revoltas. Mas nem parece que será daqui onde vão partir sem regresso, os homens acorrentados e empurrados pelos açoites para o interior dos porões sombrios, sem sequer lhes darem a oportunidade de acenar pela última vez para as belíssimas paisagens em todo o percurso a partir da baía, passando por Mucucune e praia da Barra, com Linga-Linga à ilharga até ao Mar Alto, de onde a terra já não se vê.
Revisitei ainda esta semana, sem entusiamo, este lugar que fará da cidade de Inhambane inteira, um património da humanidade, e desta vez, em vez das dores vocalizadas dessa fase cruel das grilhetas, senti as canções cantadas em côro para celebrar a poesia. Então, os escravos estão vivos, despidos de mágoa e rancor. O que deixaram para trás cabe a nós preservar, não a eles.
Os escravos não carecem das nossas lágrimas, a quem gravita na órbita das luzes brilhantes do pós-morte não se chora, aclama-se como aos actores reais que usam os palcos como Céu, onde a dor não existe. É por isso que, passando por aqui hoje, não se sentem os arrepios dentro de nós, os escravos não estão mais onde jazem os cheiros dos seus corpos tatuados com ferro aquecido em fogo, eles já não se lembram disso, nós sim.
Mas não é justo que ao pórtico seja impedido o mar. O mar já não se vê a partir daqui. Barraram-no com construções que representam a anarquia e a desvalorização do belo. É como se eu estivesse a ouvir, passando por este memorial, as vozes dos escravos em torrente dizendo: derrubem essas barreiras por favor, queremos contemplar a nossa bela baía! Rebentem com isto! Liberdade!
Mas esses gritos não serão, comcerteza, dos escravos, são da minha imaginação, dos meus sentimentos, “Rebentem com isto!”. Os escravos já não reivindicam, jamais voltarão a materializar-se, eles agora cantam e dançam danças jamais vistas e cantam novas canções, diferentes das que entoavam nas plantações da prosperidade alheia, já não se lembram das feridas da carne e da própria alma agora livre para sempre.
Rebentem com essas construções em frente ao Pórtico dos escravos, porque queremos contemplar o mar e perscrutar os sons da história produzidos pelos pés descalços dos escravos chapinhando na água para terras de longe. O mar é a nossa poesia, é a nossa música. Então rebentem com isso, e deixem os escravos livres!
“A acção dos terroristas em Cabo-Delgado dói a qualquer moçambicano consciente das responsabilidades sociais e humanas. Os cidadãos que sofrem são nossos irmãos, os cidadãos que sofrem ataques são moçambicanos como nós e, convenhamos, a solução do problema de Cabo-Delgado, que remonta a 2017, é do Estado moçambicano. Não vejo razões para ficarmos indignados com a posição da Embaixada de França. E Mais, a Total é uma empresa privada, logo, quem irá decidir sobre a permanência, retoma ou desistência são os seus dirigentes e não o Governo e tão-pouco a Embaixada Francesa.
Nós, moçambicanos, devemos assumir as nossas responsabilidades. O assunto de Cabo-Delgado é de soberania de Moçambique e o país deve resolver o problema recorrendo a todos os meios possíveis e imaginários, sem endossarmos responsabilidades a terceiros. Hoje, 21 de Fevereiro de 2024, a Embaixada de Inglaterra alinhou pelo mesmo diapasão e, acredito, muitas outras chancelarias o farrão. Assumamos as nossas responsabilidades, o povo que está a ser chacinado, junto com as residências queimadas e outros bens públicos, são pertença de moçambicanos. Isso não nos indigna? Indigna-nos a posição da Embaixada Francesa, quando defende seus concidadãos? Sejamos sérios!”
AB
“A França estabelece com Moçambique uma antiga relação de vizinhança pelo Oceano Índico. A pertença da Ilha Reunião à França e que muito cedo desenvolveu relações económicas com Moçambique (desde 1642). A presença francesa na Ilha Mayotte tornada departamento francês através do referêndum em 2009 data de 1841. Estes dois departamentos franceses agrupam aproximadamente um milhão de habitantes, a maior população francesa do ultramar e são vectores importantes da cooperação (militar, económica e cultural) entre a França, Moçambique e com outros países do Oceano Índico”
In Site da Embaixada Francesa em Moçambique
“Moçambique acolhe investimentos de Empresas francesas de grande dimensão, a exemplo da Total e Technip que, em conjunto, investem no nosso país mais de 20 mil milhões de dólares americanos. Este volume de investimentos mostra claramente que Moçambique é um parceiro vital e estratégico para a França, razão mais do que suficiente para que nos fosse endereçado o convite”.
“Ficou claro que Moçambique e França partilham interesses económicos vitais, cujo sucesso passa por um ambiente de Paz, segurança e estabilidade de Moçambique”, assegurou o Chefe do Estado, em conferência de Imprensa de balanço da visita à França.
In Presidência da República, 19 de Maio de 2021
A Embaixada Francesa em Moçambique aconselhou os seus concidadãos a não viajarem para as terras de Cabo-Delgado, porque não é seguro, devido à violência que se reporta naquela parcela de Moçambique. As reacções internas sobre esta notícia são variadas. Alguns consideram que a França ainda age como um país colonizador, usando métodos do Seculo XIX, outros, ainda, falam de desinvestimento da França em Moçambique, alegadamente, porque a declaração da Embaixada Francesa é ofensiva!
Leio e oiço tudo isso, estupefato. Não consigo compreender as razões de reacções tão virulentas, quando uma embaixada, em representação do seu país, não aconselha os seus concidadãos a irem para uma zona de guerra, onde os terroristas, quer queiramos, quer não, é que determinam a música para se dançar. Não percebo muito bem por que razão a França teria de aconselhar seus cidadãos a irem para Cabo-Delgado, sabido que a estabilidade e segurança são precárias. Mesmo os nativos estão a transferir-se para lugares seguros fora de Cabo-Delgado, a questão é: porque os franceses teriam de recomendar a ida para esse lugar!
Há muita coisa que se possa dizer sobre a guerra terrorista de Cabo-Delgado, mesmo recuando aos tempos em que a segurança dos investidores era feita por estrangeiros e falava-se de mais de 300 mil dólares americanos dia, o que levou as autoridades moçambicanas a pensarem em uma solução interna, o que culminou com as dívidas ocultas. Até isso podemos chamar à colação da instabilidade em Cabo-Delgado, mas dizer que a Embaixada de França está equivocada, por aconselhar seus cidadãos a não viajarem para Cabo-Delgado, definitivamente, NÃO!
Veja, no texto acima, a intervenção do Presidente da República, depois da visita à França, reconhecendo a necessidade de Moçambique assegurar um ambiente de paz, segurança e estabilidade para que haja sucesso. Ora, pelos relatos vindos da província de Cabo-Delgado, as condições de segurança e estabilidade tendem a deteriorar e dizer que é da responsabilidade dos franceses julgo ser exagerado. Assumamos as nossas responsabilidades internas e deixemos de atirar culpas a terceiros, sobre as nossas políticas erradas!
Eu, pessoalmente, sinto-me “Cabo-Delgado”. Carrego o sofrimento dos meus concidadãos de Cabo-Delgado. Agora, exigir que um cidadão francês sinta o mesmo que nós, julgo ser injusto. E mais, a Total é uma empresa privada e não pública, o Embaixador representa os interesses do Estado Francês e não propriamente as Empresas Francesas, por isso associar o pronunciamento do Embaixador e a Total é forçar coisas que não se são iguais, embora se possam complementar. Cabe ao Governo a reacção e não aos cidadãos nacionais e ou estrangeiros. Contudo, e acima de tudo, é responsabilidade do Estado Moçambicano garantir a Paz, segurança e estabilidade em Cabo-Delgado e não de outra entidade qualquer!
Adelino Buque
“Os jornalistas também são alvos dos terroristas. A guerra terrorista, na província nortenha de Cabo-Delgado, tende a criar grandes divisões entre a sociedade, de um modo geral e entre a sociedade e a classe dirigente. Na minha opinião, isso se deve às deficiências na comunicação, na era da internet, em que as pessoas podem comunicar-se em privado e em público, estando em qualquer local. Difícil é omitir factos e, ainda que os órgãos competentes não divulguem determinada informação, esta será divulgada, de qualquer forma, com o potencial de ser divulgada com algum exagero, seguindo a velha máxima de que “quem conta uma história, aumenta um ponto”. Assim sendo, o importante, nestes casos, seria instituir-se alguém que sirva de ligação entre os factos no terreno e a sociedade, através dos órgãos de comunicação social. Acusar os jornalistas não é a melhor solução para o problema de Cabo-Delgado”.
AB
A guerra movida por terroristas, na província de Cabo-Delgado, está com tendências a criar múltiplas divisões internas, entre os moçambicanos e entre os moçambicanos e a classe dos governantes. Na minha opinião, razões não faltam para esse mal-estar entre nós e da sociedade contra os governantes. Aqui, devo referir que um dos grandes problemas, que suscita mal-estar entre a sociedade e os governantes é a comunicação.
São raras as comunicações sobre o estado de guerra em Cabo-Delgado. Das bocas dos governantes, ouve-se um exacerbado optimismo, que contrasta com os factos no terreno. Entre esse vazio, criado por quem deve comunicar, surgem os órgãos de comunicação externos, com maior domínio da situação no terreno, que propriamente os órgãos de comunicação nacionais e a questão que se coloca é: porque os nossos órgãos de comunicação não divulgam as notícias que são divulgadas por outros órgãos de comunicação para o mundo. Não havendo essa comunicação, as vítimas, muitas vezes, recorrem às redes sociais para lançarem o seu grito de pedido de socorro!
Há uma coisa inegável nos acontecimentos, quando existe um facto e os órgãos competentes divulgam esse facto, não há como especular sobre esse mesmo facto. O que pode acontecer, e acontece, é cada órgão de comunicação social produzir notícias de acordo com os seus interesses editoriais e, quando é assim, é fácil o cidadão atento tirar as suas próprias conclusões porque, certamente, terá visto nesta ou naquela televisão, nesta e outra estação de radiodifusão e lido nos jornais e por aí. Dificilmente se pode falar de estar a favor deste ou do outro, podemos falar de deturpação da notícia porque é pública.
Pessoalmente, compreendo o mal-estar do Governador de Cabo-Delgado, contudo, penso que ele próprio não é informado, tempestivamente, das ocorrências militares no território que governa. O domínio da situação está nos militares e todos sabemos que o governador não é militar. Enquanto os militares não receberem ordens claras sobre a divulgação das ocorrências no teatro operacional, continuaremos a nos acusar mutuamente. Imagino como terão ficado os jornalistas baseados em Pemba ou em Cabo-Delgado no geral com a “acusação” do Governador da Província.
Por estas e outras razões, é hora, na minha opinião, de todos os órgãos de comunicação social, baseados ou não em Cabo-Delgado, conhecerem o seu interlocutor válido, os relatos esporádicos dos Administradores, o aparecimento periódico do Governador e as raras aparições dos militares são a causa da especulação. Esse interlocutor deve servir, também, para os órgãos de comunicação estrangeiros, de modo a combater as assimetrias de informação.
Para terminar esta minha reflexão, peço a sociedade moçambicana, que nos unamos em torno de Cabo-Delgado. O terrorismo que a população vive naquela província atinge-nos de qualquer forma e todos temos um familiar a residir ou em missão de serviço naquela província, para além de que são cidadãos moçambicanos, nossos concidadãos, que sofrem com a guerra. Por isso, todos nós, devemos dizer basta a guerra naquela parcela de Moçambique!
Adelino Buque
Escrevi e publiquei recentemente dois artigos de opinião. Um tinha como título (IN) Dependência: Não se esqueçam de voltar e, o outro, A Demissão do Povo. No primeiro, tentei fazer um chamamento aos libertadores de ontem, por alguns considerados opressores de hoje; conforme pode ler-se num dos parágrafos do artigo: “Os nossos libertadores, os nossos heróis e os nossos referenciais de luta e verticalidade foram se transfigurando ao sabor do vento, e alguns deles viraram, nossos opressores. Nasceram elites negras, que se esqueceram dos ideais da revolução e se preocuparam em vestir a máscara de ovelha em corpo de lobo. Os nossos libertadores, tornaram-se obcecados pelo poder e pela posição de destaque no banquete pós-independência. Recriamos e personificamos a aquilo a que Frantz Fanon designou de “Pele Negra e Máscaras Brancas”, onde pretos oprimem outros pretos e se acham dignos para o fazer em virtude do tempo emprestado na mocidade e juventude para que fossemos hoje o país livre que somos. E Será que realmente somos?”
No segundo, A Demissão do Povo, iniciei aludindo o facto de o povo ter sido demitido. Em diálogo aceso entre eu, a folha e a esferográfica, não sabia se dizia que o povo se demitiu ou se o povo foi demitido.
Disse: “O povo foi demitido do seu papel de fiscalizador. Foi demitido de monitorar, de reclamar, de pedir para ter dignidade mínima. (…) A pobreza generalizou, as assimetrias agudizaram, a corrupção institucionalizou-se, as liberdades reduziram-se, o espaço cívico afunilou-se, e o povo começou a sentir-se estranho na sua própria terra.”
Longe de pretender fazer futurologia, o alcance era lançar uma reflexão em torno do país que estamos a (des) construir, e perspectivar o amanhã que queremos para nós. Revisitei estes dois textos e vi neles alguma actualidade. Encontrei neles o mote para escrever este artigo que baptizei de resignificar Moçambique. Por resignificar entenda-se a necessidade de dar um novo significado ou recuperar a mística que com o tempo fomos perdendo – A mística da moçambicanidade.
Ouvi, recentemente, a mamã Graça Machel, numa das suas aparições públicas – se dirigir ao povo no geral, mas focando mais à juventude como alvo. Um dos pontos que mais chamou atenção foi quando ela disse: “Jovens, não se sentem em cima do legado de Samora (...) Não deixem o legado deste grande homem se perder.” Entendi como um recado, como uma chamada à acção e um convite à reflexão sobre o legado do Primeiro Presidente de Moçambique independente; à preservação e seguimento do legado deste estandarte da nossa moçambicanidade.
Na cerimónia de outorga do Doutoramento Honoris Causa à renomada e consagrada escritora e activista social – Paulina Chiziane, durante a sua alocução disse em viva voz, socorrendo-se do famoso adágio popular - “A boa fruta se conhece pela sua árvore”; a fruta que temos hoje é azeda, é tirana. O que se passa com a árvore então? E quem é a árvore? – indagou.
A árvore somos nós os mais velhos; somos nós que dirigimos o estado, as instituições, as religiões e a sociedade. E se essa geração esta assim, é porque alguma coisa está errada na árvore. - Retorquiu!
Poderia trazer algumas vozes que ecoam de forma audível entre os mais comprometidos com o projecto de dar um rumo ao país. Vozes de valor agregado para o debate da construção de uma nação em que os valores sociais são mais importantes que todos restantes. Severino Ngoenha, Adriano Nuvunga, Óscar Monteiro, Teodoro Waty, Elísio Macamo, Mia Couto, e outros tantos nomes que não trarei por economia de tempo e espaço, são unanimes em afirmar que precisamos repensar Moçambique e dar um significado a luta pela independência e construção do Estado-nação.
Urge pensar um país mais inclusivo, onde as liberdades individuais e colectivas sejam respeitadas. Um país com independência das instituições, dos três poderes e com uma máquina estatal mais capaz, progressista, comprometida e livre de amarras político-partidárias. Um país em que a corrupção, o despesismo e o nepotismo não figurem entre as primeiras palavras do dicionário social e político.
Precisamos criar uma narrativa para o presente e que possa criar bases de um futuro onde a moçambicanidade possa rimar com a integridade. Uma narrativa que se desconstrói a ideia de existência de sucesso sem trabalho, sem mérito e sem sacrifício. Uma narrativa que coloca o cidadão, e a pessoa humana no centro de todo o processo governativo e como elemento primordial para o desenvolvimento do país. Enfim, uma narrativa que o forte não é quem tem mais recursos e mais poder, mas aquele que pensa de forma mais inclusiva, englobante e acima de tudo nutre amor pelo país.
Precisamos igualmente de sedimentar o pluralismo na nossa sociedade; revigorar a unidade nacional e a aceitação do diferente, combatendo o divisionismo e o etnicismo. Uma sociedade em que os vários pensares confluem para a solidificação deste longo, contínuo e complexo processo da moçambicanização da nossa identidade, de edificação de bases fortes para uma governação forte, altruísta e progressista.
No país conhecido comummente como o país de Mondlane e Machel, onde as liberdades vem sendo sistematicamente reprimidas e asfixiadas, a dúvida é uma realidade não assumida e o medo tomou conta de vários sedimentos da sociedade.
Sim, temos medo de reivindicar o direito de sermos nós mesmos. Sentimento este que gera um questionamento sobre o nosso contributo social e humano para o país, e ao mesmo tempo convida-nos a abandonar esta longa noite escura que nos engole; noite esta caracterizada por discursos vazios, demagogias e descrédito sobre o nosso ser como país.
Agora temos dúvidas sobre a nossa gloriosa epopeia e medo de afirmar que Moçambique é dos Moçambicanos. Parafraseando Mia Couto: Há quem tenha medo que o próprio medo acabe. E eu acrescento, que há quem tenha medo de dormir e acordar sem personalidade jurídica.
A herança da violência do homem branco contra o homem preto – o chicote colonial -, não pode nem deve ser replicada pelas instituições de defesa nem pelos famosos esquadrões na sua mais crua forma de reprimir aquilo que julgávamos ter conquistado com a independência – a liberdade, o direito à autodeterminação e a participação no processo de construção de um estado-nação.
É meu entendimento, e talvez não apenas meu, que a bolha social da tolerância estoirou, e, é resultado de um acumular de situações que levaram anos e talvez décadas para se cristalizarem. Com ela (a bolha social), emergem e as ditas formas de ação popular punitiva e apelo a alternativa e a alternância, ainda que se subassuma que seria mais do mesmo. Nesta manifestação silenciosa, mas bastante ruidosa assistimos a segunda vaga da auto-demissão do povo.
Neste exercício de resignificar precisamos buscar as referências e as bases da criação do nosso Estado - O Estado que outrora foi motivo e objecto de orgulho e júbilo. Um estado onde o bem-estar social e o respeito pelas liberdades individuais e colectivas são respeitadas; onde a educação é um instrumento emancipador e não fonte de opressão e destruição, e onde os mais básicos serviços estejam disponíveis para a maioria.
Entre consonâncias e dissonâncias, uma coisa está a ganhar forma - há uma tentativa de busca incessante por um significado para a nossa existência como povo – a busca por um futuro melhor em que todos nos sintamos parte integral e integrante deste projecto chamado desenvolvimento.
No final o sonho de todos é apenas ter um Moçambique para todos.
Por: Hélio Guiliche