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Crime

Muita brutalidade, insultos e desrespeito são as palavras usadas pelas vítimas da violência policial de ontem à noite, no bairro do Paquitequete, em Pemba. Há cerca de duas semanas que o local tem sido alvo de uma vigilância cerrada por parte da Unidade de Intervenção Rápida. Populares são agredidos sem motivo aparente. Ontem por volta das 21hrs, a população rebelou-se com paus, pedras e outros objectos e o caos instalou-se.

 

A polícia recorreu ao gás lacrimogéneo. O quotidiano local é marcado por incursões da Polícia, que, alegadamente persegue terroristas ali escondidos. Ontem, a Polícia entrou cedo e começou a bater; população não gostou e revoltou-se. Detalhes sobre o caso nas próximas edições. (Carta)

Grupos armados que têm protagonizado ataques em Cabo Delgado executaram 52 jovens no distrito de Muidumbe, disse ho porta-voz do comando-geral polícia moçambicana. As execuções ocorreram em 08 de abril na aldeia de Xitaxi, quando os grupos armados tentavam recrutar jovens no distrito de Muidumbe, segundo Orlando Modumane.

 

"Os jovens que estavam para ser recrutados ofereceram resistência, o que provocou a ira dos malfeitores que indiscriminadamente balearam mortalmente 52 jovens", explicou o porta-voz do comando-geral da polícia moçambicana.

 

Segundo Orlando Modumane, as autoridades moçambicanas deslocaram-se à aldeia após denúncias da população, mas os insurgentes haviam já abandonado o local. O porta-voz da polícia moçambicana disse ainda que as Forças de Defesa e Segurança reforçaram as operações nos pontos mais críticos da província.

 

"Temos estado a intensificar várias ações operativas, visando a sua neutralização e consequente responsabilização pelos atos criminosos e hediondos que têm perpetrado naquele ponto do país", concluiu Orlando Modumane.Cabo Delgado, região onde avançam megaprojetos de extração de gás natural, vê-se a abraços com ataques de grupos armados classificados como uma ameaça terrorista.

 

As incursões já mataram, pelo menos, 400 pessoas desde outubro de 2017.

 

As autoridade moçambicanas contabilizam 162 mil afetados pela violência armada naquela província, 40 mil dos quais deslocados das zonas consideradas de risco, maioritariamente situadas mais para o norte da província, e que estão a receber assistência humanitária na cidade de Pemba, a capital provincial. No final de março, as vilas de Mocímboa da Praia e Quissanga foram invadidas por um grupo, que destruiu várias infraestruturas e içou a sua bandeira num quartel das Forças de Defesa e Segurança de Moçambique.

 

Na ocasião, num vídeo distribuído na Internet, um alegado militante 'jihadista' justificou os ataques de grupos armados no norte de Moçambique com o objetivo de impor uma lei islâmica na região. Foi a primeira mensagem divulgada por autores dos ataques que ocorrem há dois anos e meio na província de Cabo Delgado, gravada numa das povoações que invadiram. (Lusa)

Em Dezembro de 2019, as autoridades moçambicanas interceptaram duas embarcações, transportando quantidades elevadas de heroína e ice. Na ocasião, o primeiro grupo de iranianos incendiou o barco e a mercadoria que seguia na mesma não foi recuperada. A segunda embarcação, que levava narcotraficantes paquistaneses, transportava 430 kg de heroína e ice.

 

Conforme confidenciou uma fonte envolvida na operação à nossa reportagem, 100kg da heroína e ice foi desviada do armazém, onde a mesma estava a ser protegida e que serviria de prova, durante o julgamento dos arguidos, que se encontram detidos na Cadeia de Máxima Segurança, em Mieze.

 

Entretanto, segundo a fonte, o engraçado é que os próprios agentes da Polícia, que deveriam proteger a droga apreendida, foram os primeiros a retirar a mesma e vendê-la no mercado negro, na Cidade de Pemba e outros locais. A fonte garantiu que a situação só parou quando uma equipa, que saiu de Maputo para Pemba, tirou a mesma para outro armazém secreto.

 

O desaparecimento da referida droga, em Pemba, deixou o Director-geral do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), Domingos Jofane, com “nervos à flor da pele” e, neste momento, correm diligências, no intuito de responsabilizar os agentes envolvidos que acabaram poluindo a Cidade de Pemba e outros locais do país, com drogas furtadas dos armazéns da instituição.

 

Refira-se que, na última conferência de imprensa do SERNIC, realizada em Maputo, a 14 de Abril, Leonardo Simbine, Porta-voz da instituição, desvalorizou as informações, segundo as quais, Moçambique tornou-se num corredor de drogas, devido às últimas apreensões verificadas, desde 2018.

 

Para Simbine, não existem estudos que confirmam essa tese, o que contraria os relatórios de organizações como a ENACT que já demonstrou que a situação do narcotráfico é elevada, principalmente em províncias como Nampula, Cabo Delgado e Cidade de Maputo. (O.O.)

A violência, que se faz sentir na província de Cabo Delgado, tende a criar, cada vez mais, desordem em quase todos os distritos. De acordo com relatos dos residentes de Pemba, Mueda, Palma, Macomia e Mocímboa da Praia, nos últimos dias, o cenário deteriorou-se naquele ponto do país, não havendo espaço para o respeito dos direitos humanos, de ambas partes (insurgentes e militares).

 

Por exemplo, na sexta-feira, em Paquetiquete, um dos históricos bairros da Cidade de Pemba, que nos últimos dias vem recebendo vários deslocados, provenientes dos distritos assolados pela “guerra silenciosa” e tratada pelas autoridades como “incursões esporádicas”, os militares entraram e começaram a chicotear, indiscriminadamente, os cidadãos residentes naquele bairro e arredores, tudo porque se acredita que, entre os refugiados, existem membros integrantes do grupo terrorista que, desde Outubro de 2017, vem protagonizando decapitações, destruição de propriedades públicas e privadas e instalando a desordem na província.

 

Em Paquetiquete, os militares impuseram um recolher obrigatório, que começa as 17:00 horas e termina às 05:00 horas. Qualquer um que desobedeça esta norma é detido ou violentado. De acordo com as fontes, a situação já é insustentável, pois, os cidadãos não têm para onde recorrer, porque a Polícia que os devia proteger é a mesma que os violenta.

 

Com a violência a extremar-se naquele ponto do país, os funcionários públicos e de empresas privadas têm estado a abandonar os distritos. A título de exemplo, uma circular com o número 01/GDM/SD/900/2020, do Governo distrital de Mueda, intitulada “solicitação de funcionários e agentes do Estado” requer a apresentação, até esta segunda-feira, de funcionários no seu posto de trabalho para que não sejam descontados.

 

Nos distritos de Macomia, Muidumbe, Mocímboa da Praia, Nangade e Mueda, as populações estão sem os serviços bancários, devido à acção dos terroristas. Os serviços públicos e privados funcionam a meio gás. Há distritos quase fantasmas.

 

Refira-se que a situação que se vive em Cabo Delgado vem merecendo diversas críticas da sociedade, incluindo parceiros de cooperação do Governo, como é o caso do Bispo de Pemba, Dom Luiz Fernando Lisboa, que, à RTP África, descreveu a situação de desoladora.

 

Por seu turno, o Presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos, Luís Bitone, defendeu, em entrevista à Rádio Moçambique, que exigiu as autoridades a acionarem os mecanismos para o esclarecimento do rapto do jornalista Ibraimo Abú Mbaruco, raptado a 7 de Abril passado. (O.O. com redacção)

“Estamos todos com medo. Ninguém sabe o que pode acontecer nas próximas horas”. Estas são as palavras de um residente da vila de Palma, sede do distrito com mesmo nome, na província de Cabo Delgado, que aceitou falar à nossa reportagem, acerca do momento pelo qual a província está a passar, com o escalar da violência.

 

“A situação não está boa. Aqui todos os dias há tiroteio. Muita gente inocente está a perder a vida. Outros estão a ser espancados, quando são encontrados pelo caminho. Outros estão a ser dados tiros”, contou a fonte.

 

Segundo a fonte, nesta quarta-feira, houve disparos contra um autocarro, que leva trabalhadores para a Península de Afungi, onde estão a ser desenvolvidos projectos de exploração de gás natural do Rovuma, liderados pela Total.

 

 

Conforme conta, tudo começou quando o referido autocarro ultrapassou uma viatura, num local onde havia um blindado (numa das bermas), com armas apontadas para estrada, o que precipitou os disparos, protagonizados pelas Forças de Defesa e Segurança. A fonte afirma que não se registou vítimas mortais, apenas danos materiais, pois, os vidros do autocarro ficaram totalmente quebrados. Garantiu ainda que o condutor do autocarro terá apresentado queixa no Posto Policial local.

 

Segundo a fonte, até às 19:00 horas, as pessoas são proibidas de circular naquela vila-sede que, há oito anos, era o destino preferencial de quase todos os cidadãos do país, devido à implementação dos projectos de prospecção do gás natural. Fala de uma reunião secreta entre os líderes locais e o Comandante Operacional das FDS destacado para aquele distrito, em que foi decidido que não será tolerada a circulação depois das 19:00 horas.

 

Outra fonte descreve episódios tenebrosos, com os militares a submeterem os cidadãos a tratamentos desumanos sem nenhuma explicação. Conta a história de um jovem comerciante (vende mandioca frita) que terá sido baleado, depois de os militares lhe terem perguntado sobre a identidade das pessoas com quem estava a conversar.

 

“Três pessoas estiveram a comprar coisas como jovem e, de repente, apareceram militares que começaram a perseguir essas pessoas. As pessoas fugiram e depois perguntaram ao jovem se conhecia aqueles senhores e o que vinham fazer. Ele respondeu que não os conheciam e que estavam a comprar mandioca. Um militar ligou a pedir que trouxessem um carro para levar o jovem, mas este tentou fugir e foi aí que dispararam contra ele. Perdeu a vida no hospital”, narra a fonte.

 

Desaparecimento de Ibraimo Abu Mbaruco

 

 

O desaparecimento de Ibraimo Abu Mbaruco, jornalista de Rádio Comunitária local e activista social, continua a suscitar muitas perguntas a nível do distrito.

 

Um amigo próximo disse à “Carta” não saber se Ibraimo Mbaruco terá sido “raptado” por ser jornalista ou por se ter encontrado fora de casa depois das 19:00 horas, pois, na noite do dia 7 de Abril, data em que Ibraimo Mbaruco desapareceu, mais de três pessoas foram dadas como desaparecidas naquele ponto do país.

 

Entretanto, uma fonte militar garantiu que o alvoroço que se verifica naquele distrito deve-se às informações que chegaram naquele local, dando conta de que os insurgentes iam atacar aquela vila, depois de terem levado a cabo acções idênticas nas vilas de Mocímboa da Praia, Quissanga e Muidumbe.

 

A mesma fonte afiançou-nos que Ibraimo Abu Mbaruco se encontra detido numa posição militar naquele distrito por suspeita de estar a colaborar com alguns órgãos de comunicação social, incluindo estrangeiros – uma tipologia criminal ainda inexistente no nosso ordenamento jurídico.

 

Aliás, desde o início dos ataques, em Cabo Delgado, qualquer jornalista que reporta a situação tem sido visto como estando a cooperar com o grupo, facto que já levou à detenção de alguns jornalistas nacionais e internacionais, incluindo Amade Abubacar, detido em Janeiro do ano passado, por estar a reportar a triste situação que se vive naquele ponto do país.

 

Refira-se que o irmão de Ibraimo Abu Mbaruco, Juma Abu Mbaruco submeteu, na passada terça-feira, uma queixa na Procuradoria Provincial de Cabo Delgado, em Pemba, para averiguar a situação. Entretanto, Augusto Guta, porta-voz do Comando Provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM), em Cabo Delgado, disse à imprensa que a Polícia não conseguiu encontrar “nenhum rastro desse cidadão”, mas que “por fontes familiares, ouvimos que esse cidadão já estaria morto”.

 

O desaparecimento de Ibraimo Abu Mbaruco vem preocupando várias organizações, que trabalham na defesa das liberdades de expressão e de imprensa, entre elas, o Comité de Protecção de Jornalista (CPJ), a Amnistia Internacional (AI), o MISA-Moçambique e a União Europeia (UE), que já repudiaram este acto e exigem a investigação do caso e restituição do jovem à liberdade.

 

Sublinhar que a limitação dos horários de circulação é extensiva a quase toda a província. Na capital provincial, Pemba, em particular no histórico bairro de Paquetiquete, fala-se também de ordens que orientam os cidadãos a circularem entre as 5:00 horas e as 19:00 horas, por se suspeitar que o grupo tenha infiltrados naquele bairro. (Omardine Omar e Carta)

Uma boa fonte de “Carta” revelou ontem que Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, já controlava o mercado local do narcotráfico e fazia boa parte do fornecimento para a Africa do Sul, para onde se deslocava de vez em quando. Ele andava por cá há anos, depois que se viu acossado, na Bolívia, pela Polícia Federal brasileira.

 

Veio para Moçambique, país que era, aliás, um dos destinos dos seus embarques de contentores com cocaína, e onde já tinha uma lista de conhecidos. Fonte policial local disse que Fuminho assentou arraiais em Moçambique há alguns anos, quase dez (ontem, “Carta” escrevia que Fuminho chegara em Março deste ano; Março, exactamente 30 de Março, foi a data do seu “check in” no Montebello, a estância hoteleira da Sommerschield. Ele tinha aprazada sua saída para o dia 29 de Abril, eventualmente para uma moradia na periferia da cidade de Maputo).

 

“Fuminho” é um notório narcotraficante brasileiro procurado desde 12 de Janeiro de 1999, quando fugiu da Casa de Detenção de São Paulo (mais conhecida como Carandiru). Nasceu em São Paulo a 24 de Agosto de 1970 e sempre viveu no mundo do crime. Quando cruzou as grades na fuga de Carandiru, ele se escondeu na Bolívia, onde continuou sua actividade criminosa, juntamente com seu parceiro Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Marcola viria a ser capturado e Fuminho esfumou-se por entre suas teias criminosas e redes de protecção

 

Procurado caninamente por todo o Mercosul, Fuminho não pensou duas vezes: seu destino de maior protecção seria a zona sul de África, e num país, Moçambique, com fama mundialmente dupla: a de corredor preferencial e impune do narcotráfico. Boa parte da droga que abastece a Europa e a África do Sul, chega das américas, mas passa antes por Moçambique.

 

 

A partir da Bolívia, Fuminho já tinha contactos locais. Uma fonte disse que ele vivia entre Maputo e a África do Sul. Aqui, partilha negócios e vida íntima com sua companheira, de nome Maria Caroline Marques Gonzaga, que há poucos meses escapou a uma quase certa detenção pela Interpol (a Polícia Internacional). Em Cape Town. Ou seja, Fuminho tinha um pé na idílica cidade sul-africana do atlântico...

 

E veio o Covid 19

 

...e outro em Moçambique. Fugido da caçada cerrada na África do Sul, o “lockdown” de Ramaphosa no quadro da contenção do Covid 19, apanha-o em Moçambique, onde tem negócios (distribuição de drogas e lavagem de dinheiro) com pessoas e empresas locais, mas já não podendo regressar para a RAS. Seu vai-e-vem entre Kampfumo e a terra do Rand era feita de forma clandestina e ele optou por não se expor, ficando por cá.

 

O apartamento no Montebello era um lugar de passagem. Seus parceiros locais, entre as quais uma empresa nigeriana de “Export/Import”, lhe haviam prometido guarida, em lugar de menor visibilidade. A empresa, cujo nome ocultámos, é apontada por fonte policial como a responsável pelo escoamento de todo o narcotráfico de Fuminho partindo de Maputo para os países vizinhos.

 

Parte da droga que Fuminho recebia do Brasil era transportada por correios humanos, alguns dos quais eram detidos no Aeroporto de Mavalane, em Maputo, e outros serviam de disfarce para permitir a entrada de quantidades maiores. Alguns desses detidos, maioritariamente mulheres, encontram-se presos em Moçambique, mas, na reclusão, gozam de privilégio que só podem ser obtidos por via de subornos. Fuminho é justamente apontado com tendo arregimentando uma rede de funcionários prisionais em sua sinistra folha salarial.

 

Ontem, depois que “Carta” publicou a notícia em primeira mão, ela foi logo confirmada pelo Ministério da Justiça brasileiro. E a “mídia” brasileira, grosso modo, noticiava erradamente que a detenção tinha sido feita pela Policia Federal brasileira, quando foram agentes do SERNIC que tomaram as rédeas da operação (NE: nenhuma autoridade estrangeira tem o poder de dar ordens de detenção em Moçambique).

 

Sérgio Moro, o ministro da Justiça, faria uma comunicação mais prudente. Ele disse que a detenção decorreu de uma operação conjunta entre a Polícia Moçambicana, o DEA (Drug Enforcement Agency, dos EUA) e da Polícia Federal Brasileira. As autoridades moçambicanas ainda não se pronunciaram. Uma comunicação poderá ser dada hoje, clarificando-se muitas das pontas soltas sobre as circunstâncias da chegada ao país e da actuação de Fuminho em Moçambique. Sérgio Moro espera que Fuminho seja extraditado para o Brasil, o mais rapidamente possível. (O.O. e M.M.)

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