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quinta-feira, 21 outubro 2021 13:21

As manhas do neoliberalismo, a morbidade sindical dos professores e a alienação dos otários inocentes*

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  Com a crise keynesiana, no passado século XX, que advogava um Estado interventivo na economia sempre que fosse necessário, visando evitar a retracção económica e garantir o pleno emprego, os países socialistas de economias periféricas (e não só) abriram-se ao financiamento às suas economias e, consequentemente, ao sector da Educação. Isso pressupôs que, entre as reformas feitas, no âmbito dos acordos com as instituições dos Bretton Woods (FMI e BANCO MUNDIAL), o estado deixaria de financiar a Educação, ficando somente com a função regulatória, passando a tarefa de injecção pecuniária maioritária ao privado. O privado, por sua vez, passaria “implicitamente” a definir o que deve ou não ser leccionado. É aqui onde toda a “desgraça” começa. Perdeu-se o controlo total e completo sobre a gestão educativa sectorial em benefício de um financiamento que colocou o país na actual alienação gravosa.

 

  Ganhou o neoliberalismo e o comunismo, embora não seja integralmente melhor, foi enterrado para sempre. Vale a pena lembrar que os actuais ultraneoliberais herdaram a veia capitalista outrora criticada por Karl Marx e Antonio Gramsci, por terem fomentado um tipo de Educação que perpetua desigualdades de classes - formar a classe baixa para o fazer - apenas para servir o mercado (trabalhando) e formar a classe alta para o saber - capaz de conferir liberdade intelectual (pensar sem alienação) com a possibilidade de gerir as classes perenemente subordinadas.

 

  Abro parênteses para frisar que, quanto a mim, a questão não reside no combate ao neoliberalismo, tão pouco advogo a retoma ao comunismo, mas defendo a restruturação dos pressupostos de ambos. Dito de outro modo, primo pelo hibridismo - a coabitação pacífica entre os valores vitais do comunismo e do neoliberalismo capazes de existir sem colisão à favor da humanização. Do que há na memória colectiva, alguns exemplos a ter em conta são dos países escandinavos. Tudo que seja inerente à humanização não colide. Por exemplo, se os dispositivos mediáticos como são os casos da Televisão, plataformas digitais, etc. são produtos do neoliberalismo, que se usem para libertar o indivíduo e não os ter como aparelhos ideológicos que alienam este indivíduo subalterno. Idem para as igrejas que não devem firmar-se por aparelhos ideológicos alienatórios – mas este não é o âmago da minha questão – releguemos para outro momento e voltemos à minha negação sobre o tipo de Educação que perpetua desigualdades de classes - formar a classe baixa para o fazer - apenas para servir o mercado (trabalhando submissamente) e formar a classe alta para o saber capaz de conferir liberdade intelectual (pensar sem alienação e decidir por si sobre seu próprio destino) – algo que os habilita a gerir as classes perenemente subordinadas.

 

  Esta parte da desigualdade de classes é a que leva os nossos dirigentes cientes do problema e financeiramente capazes, em Moçambique, a enviarem os seus filhos para estudar no exterior, em escolas cuja qualidade é inquestionável. O fazem para que os seus não sejam parte integrante da massa subalterna no futuro, porque têm consciência plena do paupérrimo sistema educativo alienatório – havendo, todavia, alguns raros excelentes exemplos de superação de ex-subalternos que se firmaram no melhor sentido.

 

  Relativamente aos professores, como referi acima, o comunismo morreu e ganhou o neoliberalismo. Isso significa que em muitos quadrantes do mundo, a elevação do neoliberalismo veio matar os sindicatos dos professores e tantos outros. A morte de tais sindicatos, pelo neoliberalismo, não pressupõe a extinção das instituições de defesa dos direitos das classes dos professores e outros profissionais. Elas continuam existindo, mas com as suas forças inactivas senão castradas. Aliás, quem financia a tais sindicatos são os próprios neoliberais que exercem controlo sobre estes, no âmbito dos seus interesses em manter estagnado todos os organismos que agem em defesa dos interesses das classes mais desfavorecidas. Foi o que aconteceu com a ONP, SNJ, OTM e tantos outros, não foram extintos, existem, mas dentro de uma sonolência mórbida que os coloca na condição inerte.

 

  Não fomos capazes de higienizar o espírito neoliberal que se abateu sobre Moçambique. As manhas do neoliberalismo conduziram-nos a um estágio mórbido na nossa Educação, quer em termos sindicais aos professores, quer sob ponto de vista de alienação aos educandos, empurrados a serem otários inocentes e permanentes escravos de um mercado cujos mentores e seguidores devotam-se para o manter, ignorando todas as insensibilidades contra a condição humana. Somos insensíveis e alheios às preocupações do professor, e à sorte do aluno, quando o colocamos a leccionar, por exemplo, uma disciplina prática sem laboratório e o cobramos resultados. Somos insensíveis aos professores pesquisadores quando cobramos artigos científicos e afirmamos estar sem verba para financiar uma investigação, entretanto conseguimos colocar chamussas e castanhas por cima de uma mesa para entreter os estômagos dos gestores educativos numa reunião de rotina. Somos insensíveis ao aluno quando o obrigamos a participar numa aula virtual, sujeita à avaliação, mesmo sabendo que o Censo moçambicano 2017 informa-nos que 52% têm acesso ao telemóvel em Moçambique e somente 7% têm acesso à internet, sendo 8.9% com acesso ao computador. Somos insensíveis quando tomamos decisão de avançar com pacotes educativos aprovados mesmo sabendo que as nossas utopias de formação colidem com estes números sobre a realidade do país. Somos insensíveis quando as grandes decisões tomadas não são em função dos resultados de investigação, mas apenas políticos. Somos coadjuvantes da qualidade educativa que os neoliberais “impõem” às massas subalternas.

 

  Se, para os capitalistas, a Educação das massas deve ser de baixa qualidade e formar somente para o mercado, tais sindicatos não vão vincar porque o sistema educativo mundial que foi pensado pela classe dominante é o de manter, através da própria Educação, a distinção entre essas duas classes (dominante e dominada proletária). Portanto a ideia de cindicalizar o sector da Educação em Moçambique é boa, mas, para que não seja uma ideia romântica, precisamos estar bem cientes da magnitude do problema, de modo a estarmos melhor preparados (sem emoção) para jorrar muito sangue porque o assunto é estrutural, sistemático e de dimensão universal. É por causa de tudo isto e mais alguma coisa que tenho dito: “ser professor não é apenas uma profissão, é mais do que isso, é uma MISSÃO cuja meta revela quão árdua foi a trajetória”.

 

*Circle Langa

Comunicólogo e Pedagogo

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