“Qualquer tentativa de violação do exercício do direito à greve, incluindo as tentativas ou consumação de ameaças ou coação, bem como a substituição dos médicos em greve por outros profissionais que à data da convocação da greve não estavam afectos a estes locais de trabalho (violação do número 8 do artigo 202 da Lei do Trabalho) levará à mudança das directrizes constantes neste documento [Directrizes da 3ª greve nacional dos Médicos], com consequente paralisação total de todas as actividades médicas, incluindo os serviços mínimos”.
Este é o aviso deixado pela Associação Médica de Moçambique (AMM) ao Governo, três dias depois de o Ministro da Saúde, Armindo Tiago, ter tentado desdramatizar a convocação da terceira greve geral dos médicos, a ter lugar entre os próximos dias 07 e 28 de Novembro.
O aviso foi emitido nesta terça-feira, 01 de Novembro, pela principal agremiação dos médicos, no âmbito da divulgação das directrizes que vão nortear a terceira greve do sector. Trata-se, na verdade, de um aviso de quem já provou dos resultados de reivindicar os seus direitos, num país onde os direitos à manifestação e à greve são cosméticos.
Em 2013, ano em que foram registadas as primeiras duas greves gerais dos médicos, lembre-se, Jorge Arroz, falecido líder da AMM, foi detido (e solto quatro horas depois), supostamente em flagrante delito, a preparar um plano de encerramento de todos os hospitais do país. Meses depois, dezenas de médicos foram penalizados por terem aderido às greves de Janeiro e Maio daquele ano.
Na próxima segunda-feira inicia o primeiro capítulo daquela que pode vir a ser a maior greve dos médicos de todos os tempos em Moçambique. Perto de 2.500 médicos moçambicanos são convocados a participarem, em todo o país, da terceira greve geral da classe, convocada no passado dia 27 de Outubro, em reunião nacional da AMM.
De acordo com a organização, a greve surge em resposta ao sucessivo insucesso alcançado pela classe nas “múltiplas tentativas de diálogo frutífero com o Governo”. Os médicos vão paralisar as suas actividades durante 21 dias seguidos, afectando apenas os serviços públicos de saúde. Contudo, garantem serviços mínimos, caso não sejam impedidos de se manifestar.
“Depois da realização das greves de Janeiro e de Maio de 2013, a AMM tem pautado pelo diálogo, na procura de soluções em relação aos desafios que a classe e o Serviço Nacional de Saúde enfrentam. Foi neste contexto que, desde 2015, a AMM enviou múltiplas cartas aos Ministérios da Saúde, da Administração Estatal e Função Pública, da Economia e Finanças e à Sua Excelência o Presidente da República, porém sem obter respostas que satisfaçam a classe médica. Em causa esteve sempre o não cumprimento, por parte do Governo, de grande parte dos direitos constantes no Estatuto do Médico na Administração Pública e seu respectivo Regulamento (lei 25/2013 e decreto n.º 43/2014)”, explicam os médicos, sublinhando que nem o Tribunal Administrativo e muito menos o Provedor de Justiça conseguiram ajudá-los nesta batalha.
Segundo os médicos, a situação agravou-se em Junho último, quando o Ministério da Saúde iniciou o processo de revisão unilateral do Estatuto do Médico na Administração Pública, em que retirou os direitos à habitação (subsídio de renda de casa), a diuturnidade especial e transformou o direito ao seguro contra riscos profissionais num dever.
Para piorar, diz a AMM, o Governo enquadrou os médicos de clínica geral e os médicos dentistas no nível 12 da Tabela Salarial Única (TSU) e os médicos especialistas no nível 16, contrariando a sua promessa: enquadramento dos médicos generalistas nos níveis 16 a 18 e os especialistas entre os níveis 19 e 21.
Também reduziu os subsídios, a saber: o subsídio de exclusividade de 40% para 5%; o subsídio de risco de 30% para 5%; o bónus especial de 75% para 0%; o subsídio de trabalho em regime de turnos de 30% para 7,5%; o subsídio de localização de 15% para 5%; o subsídio de renda de casa de 30% para 0%; e o subsídio pelo trabalho nocturno de 25% para 12,5%.
“Na última semana do mês de Outubro de 2022, começaram a ser pagos os salários. Na maioria dos casos, os médicos estão a receber salários em valores inferiores aos auferidos no mês de Setembro, mesmo com a inclusão do subsídio de ajustamento da TSU”, denunciam os médicos, garantindo já terem comunicado ao Governo, porém, teimam em não responder às suas reivindicações.
Na nota partilhada com a comunicação social, os médicos garantem que só irão cessar a sua greve após a satisfação do seu caderno reivindicativo. (A. Maolela)