As incidências do PREC (Processo Revolucionário em Curso) venancista no país mostraram uma vez mais que Moçambique é uma nação multiétnica com um Estado falido. Falhado! O apelo venancista para paralisar a vida social e económica ao longo desta semana parece ter surtido efeito, assim como seu subproduto de vandalização contra a propriedade pública e privada.
O factor marcante das "manifs" não foi o respaldo pacifista que VM7 apregoa nas suas preces - nunca concretizado - mas a violência sem paralelo dos jovens arregimentados na revolta diante de uma predisposição policial a tiracolo, pronta para matar de forma desenfreada, suscitando mais violência.
No dia anterior ao início da etapa “todo o terreno” das "manifs", uma figura de relevo da elite castrense do Estado garantiu que a segurança pública estaria controlada. Foi um logro!
Na quarta-feira, um autocarro da firma Lalgy foi incendiado (ver texto nesta edição). Instalações do partido Frelimo em vários locais e um Tribunal foram destruídos por fogo posto. Um pouco por todo o lado, bens privados foram visados. A circulação foi interrompida em muitas estradas deste imenso país. O país ardia a olhos vistos e não havia bombeiro disponível. Era a imagem de um país descontrolado, sintomas de um Estado rebentado.
As elites da Frelimo acumularam tanta riqueza ao longo destes anos todos, corroendo o Estado por dentro, mas esqueceram-se de investir na sua própria protecção, na reprodução do regime. Eneas Comiche quase que ia sendo recebido com paus e pedras algures em Sofala; Shafee Sidat foi expulso da sua edilidade, Marracuene; edifícios da Frelimo foram vandalizados.
Houve violência por todo o lado e uma ausência cruel da violência legítima do Estado. E depois deste terror, é razoável concluir que o poder do Estado e da Frelimo esvaiu-se. O partido, esse, está moribundo. Sua ausência e a impotência do Governo são os indicadores críticos desse estado fúnebre. Filipe Nyusi está pregando o prego final no caixão do seu próprio partido.
Agora, qualquer que seja o desfecho deste quadro de violência pós-eleitoral, uma coisa é certa: a Frelimo “morreu”…
Vejam o subconsciente de aversão da adesão à narrativa da revolta contra o regime na população estudantil de Gaza! No bastião de Gaza, a Frelimo foi vexada, humilhada. Em Chibuto e no Chókwè, a juventude chamou por “Venâncio”. Aliás, foi assim em quase todo o país. A demolição da estátua de Alberto Chipande em Pemba foi outro indicador pujante de que, para as novas camadas juvenis, as elites da libertação anticolonial já não servem para nada. São bonecos descartáveis!
Isto significa que a revolta em curso está sedimentando na consciência de uma camada jovem de eleitores um profundo sentimento de rejeição anti-Frelimo, cujos líderes são agora conotados com as coisas feias como a ladroagem e a corrupção. Esta era uma realidade impensável há poucos anos. Quem augurava o tamanho vilipêndio anti-Frelimo algures numa praça de Chibuto?
De modo que o factor X do venancismo é talvez o seu efeito positivo de fazer cair a máscara do medo, libertando as mentes da sociedade de cinco décadas de clausura na narrativa revolucionária frelimista, nas suas promessas nunca cumpridas de futuro melhor.
Por outro lado, quer se queira quer não, outro efeito positivo da luta de VM7 foi o de despoletar nas comunidades excluídas da grande mineração um élan de reivindicação mais audível e aguerrido dos seus direitos espezinhados por empresas estrangeiras que esburacam nossa terra, levam toda a riqueza e deixam nada, como se viu agora em Topuito nas minas de areias pesadas da irlandesa Kennmare - uma derradeira chamada de atenção à Mozambique Rubi Mining e a Vulcan, para não falar da Jindal, entre outras mineradoras.
A sociedade estava cooptada numa cantiga de fadas que proclamava a redistribuição da riqueza para todos, mas ela só chegava a uns poucos e, muitas vezes, por meios ínvios.
Esta “libertação” vai trazer consigo a punição da Frelimo nas urnas, certamente, a breve ou a médio trecho. O partido não tem como tapar o sol com a peneira. Sua única solução é nascer de novo. Como? Através da ruptura!
Ou seja, nem tudo na Frelimo é lixo. O Partido está cheio de boas pessoas com boas intenções, e muitas delas não tiveram qualquer espaço de afirmação desde a emergência da auto-estima estomacal do guebuzismo à autocracia corrupta do nyussismo.
O que fazer?
Os elementos dessa Frelimo-boa devem desde já abandonar esta máquina, corroída até ao tutano durante as últimas duas décadas e abraçar um novo projecto político. A actual máquina está cheia de vícios terríveis, que são difíceis ou mesmo impossíveis de extirpar. Ela é o epítome de todos os males. Desde a corrupção ao enriquecimento ilícito, com a captura do Estado por pano de fundo.
A Frelimo está moribunda, mas ainda pode renascer...fora desta Frelimo, deste legado perverso de Guebuza e Filipe Nyusi.