Armando Guebuza chegou ao recinto da B.O para ser ouvido por um juiz que tinha toda a liberdade para gozar com o antigo presidente. Até certo ponto, parecia fazê-lo, quando se dirigiu por exemplo ao declarante e perguntou: percebeu a pergunta? E Guebuza respondeu que sim, como respondem os meninos da escola primária. Mas não foi só isso, nunca ninguém imaginou que o ex-presidente podesse levantar-se em respeito, perante um jovem zambeziano com educação irreverente dos beirenses, capaz de pisar um búfalo ferido.
Guebuza foi o último a levantar-se quando o juiz entrou na sala de audiências. A princípio parecia relutante em levantar-se, mas logo a sua consciência disse-lhe que o homem que se fazia à sala, na verdade era uma pessoa vulgar, mas investida de poderes invulgares, e Armando Guebuza sabe disso, por isso levantou-se. A contragosto. E só voltou a sentar-se quando Efigénio Baptista deu ordens para tal.
Armando Guebuza já não é um homem livre. O aparato de segurança que lhe acompanhou ao recinto da B.O. testemunha isso. Fora de ser uma manifestação de poder, aqueles homens todos que se amuralham à volta do ex-presidente, traduzem o medo de uma pessoa que parece estar a ficar sem chão. Guebuza perdeu a confiança de si próprio.
Nunca ninguém imaginou Armando Guebuza - por tudo o que nos mostrou ao longo dos anos - num lugar onde não pode fazer perguntas. Guebuza nunca foi interrompido nas suas intervenções de Estado, mas agora, Sheila Marrengula faz isso a um ídolo que dominava o país e as pessoas, sem que ninguém o impedisse. Porém, ele agora pode estar a sentir o efeito de boomerang.
Quando desceu do seu luxuoso Land Cruiser, no recinto da B.O. onde decorre o julgamento das “Dívidas ocultas”, mais parecia um condenado levado a execução numa câmara de gás. Todos queriam filmá-lo, todos desejavam ardentemente fotografá-lo, e fizeram-no profusamente como se aquele fosse o último momento de Guebuza. No fundo já não é o mesmo “Guebas”, nunca mais será. As sirenes que tocavam para anunciar a sua passagem, agora estão mudas, só ele é que as ouve no isolamento do exame da sua consciência.
Armando Guebuza era um homem obstinado, que passeava o seu porte nos palanques do país e do mundo. Desbravou matagais, isso é verdade. Era um dirigente com verve, mas todo esse edifício que sonhou e de alguma forma realizou, está agora a desabar sobre ele, já não é ele quem manda. Ele está a atravessar o deserto, e alguém já dizia, “enquanto estiveres a atravessar o inferno, não pára de andar”. É por isso que o ex-presidente continua a dar cartas. Até onde ele puder.
Corria o ano de 2009 quando, em plena tarde de sol intenso, um explorador de espécies valiosas de madeira radicado nas matas de Mwiriti, no distrito de Montepuez, província de Cabo Delgado, deparou-se com uma variedade especial e rara de pedra preciosa no subsolo. Admirado com o que acabava de ver, o homem continuou cavando como se de pedras de construção se tratasse, mas dado o brilho e a luz das mesmas, os seus companheiros acabaram aconselhando que o mesmo procurasse pessoas especializadas no assunto para saber do que se tratava.
Acatada a ideia, o jovem contactou dois cidadãos estrangeiros, que se dedicavam à venda de minérios diversos na vila, sendo que um era senegalês e o outro tanzaniano. Entregou as pedras aos visados – uma semana depois, os mesmos traziam a boa nova, tratava-se de rubis – com um peso e qualidade inestimáveis no mercado internacional das pedras preciosas. Alegre e convencido pelos dois patrões estrangeiros, Célio - o explorador de espécies valiosas de madeira em Mwiriti - começou a escavar a terra juntamente com seus parentes e amigos da zona de Namanhumbir. O negócio seguia de vento e pompa, quando certo dia os dois cidadãos estrangeiros tiveram uma desavença que culminou com o incêndio de uma viatura!
Foi através das chamas do incêndio da viatura e dos tiros que se fizeram sentir no local que as autoridades locais tomaram o conhecimento de que afinal naquelas matas donde saíam variedades valiosas de madeira, havia pedras preciosas e super-valiosas que poderiam animar e impulsionar a economia da província e do país. O incidente abriu espaço para que a população local, a polícia, empresários locais, políticos e generais altamente patenteados tivessem "olhos gordos".
Mas os nacionais não conheciam realmente qual era o valor daquelas pedras, informação detida pelos estrangeiros que não paravam de chegar em Montepuez. Estes, sim, conheciam todo o circuito e quanto vale no mercado tailandês, de Singapura e outros. Em pouco tempo, a vila municipal estava infestada de bengalis, somalianos, malianos, chineses e entre outros. O nível de vida subiu. O Metical foi substituído pelo Dólar. O crescimento económico já era visível – nesta época começavam as detenções e condenações dos locais e apelidados de garimpeiros ilegais – legalmente!
Com tanto dinheiro em circulação, também diferentes gangues começaram a instalar-se no local e fazendo emboscadas caso vazasse a informação de que alguém encontrou os rubis. Na vila, viaturas de alta cilindrada inundavam os quintais de palha e casas de zinco. As moçoilas andavam espalhadas por tudo que era canto em busca de um ndengue sortudo do dia e que num piscar de olho poderia ter quatro milhões em mão e dia seguinte estar em apuros!
Tudo porque o chefe máximo da nação na altura acabava de fazer uma viagem para as terras do tio Sam em busca de ajuda. Chegando lá, eis que os gringos, sem papas na língua, dizem para o homem na cara: “sabes que o vosso país tem recursos naturais e minerais superiores aos nossos e que bem explorados podem vos colocar acima de muitas nações. Exemplo disso são os contentores de rubis identificados no mercado asiático que saíram ilegalmente!
Apavorado com a informação, o Maximus da Pérola do Índico pegou no voo para o país visado e, chegando lá, encontrou cerca de 34 contentores com o precioso minério. Indignado pela tamanha perda, principalmente pelos sinais de corrupção alfandegária, o homem regressou ao país e no mesmo dia pegou um jato privado para Cabo Delgado.
- Em reunião com as autoridades locais sobre o valor económico dos minérios por ali explorados, o Big man quis que as terras fossem atribuídas a si ou seus próximos, mas como doutro lado estava um potente general que detinha a área para exploração da madeira, acabou tratando a licença de exploração dos minérios e, no vuku vuku partidário, acabou se levantando a questão do tribalismo em voga na altura, tendo assim retraído o debate e a exploração do produto tão desejado (…).
– Hoje a luta está em Mavago, no Niassa, onde dentro de uma Reserva abriram-se coutadas, tudo porque o diamante vermelho está cheio no subsolo e os donos da terra, ar, água e armas não vêem a hora de começarem a operar. Mas quem responde pela área encontra-se de mãos atadas e a tremer caso faça uma asneira com o business!
Neste todo emaranhado, o Tales dos Rubis de Montepuez que teria os privilégios de viver uma vida condigna para sempre foi transformado num indigente e entregue às masmorras da pobreza. Hoje o homem tinha tudo para ser rico, mas acabou sendo atirado para o buraco escuro da fome e da injúria social – nos quadrantes serviria para outros fins sobre a descoberta – talvez até uma vida subsidiada – pelo menos é assim que outras nações fazem, quando prestamos um serviço importante e duradouro.
A história do Tales dos Rubis de Montepuez demonstra que podes um dia acordar rico e num zás perderes tudo e te tornares num necessitado eterno. Mas em terras onde se valoriza a descoberta, o tratamento teria sido outro e com uma riqueza eterna. Só que na terra do faz de conta, o importante é ser o primeiro a levantar o muro, agora se burlaste ou usurpaste, isto já ninguém realça, porque o eterno síndrome do fingimento de ter esquecido tudo logo que dormimos e acordamos mina que os filhos da terra também possam usufruir dos frutos que as árvores plantadas no seu quintal produziram!
Daí que todos nós um dia fomos ricos, mas a forma como somos tratados faz com que vivamos eternamente pobres! (I)
É possível que a 17 de Fevereiro de 2032 (rigorosamente) seja a data da provável notícia que se segue.
É lançado esta tarde o livro “A Poeira Assentará” que se baseia no depoimento de um antigo presidente da Pátria Índica quando da sua audição, na qualidade de declarante, no julgamento do então afamado caso das “Dívidas Ocultas”, nos anos de 2021 e 2022, hoje conhecido como o caso das “Dívidas da Queda”.
O título é parte das declarações finais do citado cuja audição, em sede do julgamento, ele tomara como uma oportunidade para a defesa e reposição do seu bom nome e de sua família que dizia terem sido manchados em praça pública.
“Sempre defendi que o tribunal era o melhor local para o assunto ora em julgamento e com esta audição decerto que a poeira assentará”. Com estas palavras o antigo presidente dera por terminado a sua audição, a última de dezenas de declarantes, entre anónimos e notáveis, arrolados e presentes ao julgamento que decorreu numa antiga cadeia de máxima segurança.
Segundo o autor do livro, o conceituado jornalista Diocleciano dos Bons Sinais, o título “A Poeira Assentará” foi propositadamente escolhido por acoplagem a uma outra expressão - Há muita poeira - também proferida pelo antigo estadista muito antes do início do julgamento, em contestação a pronunciamentos que não abonavam a seu favor.
A título de esclarecimento importa referir que a alteração da denominação do caso – de “Dívidas Ocultas” para “Dívidas da Queda” - derivou de crispações no seio do Glorioso na sequência do supracitado Julgamento e que afectaram sobremaneira a sua cadência vitoriosa nas últimas eleições.
Este livro, cujo título lembra “A História me Absolverá”, uma famosa frase (e também livro) pronunciada por Fidel Castro, o líder histórico cubano, no final do seu julgamento em 1953, poderá ser adquirido nas principais plataformas digitais e livrarias nacionais da Pátria Índica. (Fim da notícia)
NB: Voltando à realidade: há dias que iniciaram obras no estacionamento central da Av. Guerra Popular, entre as avenidas 24 de Julho e Ho Chi Min. E porque não existe nenhuma placa no local a identificar o tipo de obra e outra informação pertinente, rezo que seja o início de uma de duas promessas da edilidade da capital: a construção do BRT (Bus Rapid Transit) ou do FUTRAN (Sistema de transporte com veículos suspensos). Vamos aguardar, no mínimo pela placa.
Sempre dizia o saudoso mestre Álvaro Belo-Marques, o Bodoni, para a nossa turma de 1988 na Escola de Jornalismo, que “aquilo que você pode escrever, só você e somente você é que pode escrever, não espere que outro alguém o possa fazer por si”. Expando, aqui e agora, este preceito: aquilo que temos que ser nós a dizer, só nós e unicamente nós é que podemos dizer, ninguém mais. Não há que ditar a outrem o que nos vai na alma. Guiemo-nos sempre por esta lição.
Estamos, a nação inteira, nos últimos meses, a digladiarmo-nos impiedosamente à volta das portagens na “circular” de Maputo e recorrendo a todo o tipo de armas, até tribunais. Irmãos completamente desavindos. O argumento central do Governo é que ele não tem dinheiro para fazer a manutenção das estradas do país e onde vê um pé de meia para ir buscar tal fundo é no bolso dos cidadãos utentes das vias, automobilistas ou passageiros. Para muitos cidadãos, esta medida é uma violência extrema à sua já dificílima condição de vida; trata-se de mais um violento assalto ao bolso dos moçambicanos.
Minha leitura é simples. Estamos tão somente num autêntico virar de costas entre cidadāos e o Governo. Num ‘não diálogo’; ninguém está disposto a ouvir ninguém. Os cidadãos já não querem ouvir a razão do Governo e este, também, por seu turno, não se tem comunicado como deve ser, dando clara ideia de que não quer ouvir os cidadãos. Não há nenhum diálogo aqui. Por conseguinte, estamos diante de uma ‘ausência de comunicação’ entre partes da mesma família.
Claramente, o Governo tem-se, amiúde, comunicado muito mal com os cidadãos. Às vezes, nem chega a comunicar-se mesmo. Estando nós nesta guerra de manutenção de estradas, vou-me cingir apenas nesta questão para demonstrar esta asserção que faço.
É sólido que no Orçamento do Estado há, anualmente, uma verba para a manutenção de estradas em todo o país. As então direcções provinciais de obras públicas (como insistentemente estamos a mudar de nomes, não sei como se chamam agora) e as delegações provinciais da Administração Nacional de Estradas (ANE) recebem anualmente uma dotação orçamental para a manutenção de estradas. Isto é bem líquido. Pouco ou insuficiente, sempre tem lá!
Primeira ausência de comunicação por parte do Governo. Nunca foi dito quanto é esse valor. Nunca nos foi dito quanto é que Niassa, Zambézia, Manica, Tete, etc. recebem, ou recebiam para a manutenção das suas estradas. Nunca foi dito quanto é que cada uma das nossas províncias recebe para a manutenção das estradas no seu território de jurisdição. Mas que recebem, recebem!
Segunda ausência de comunicação por parte do Governo. Nunca nos foi dado a saber se o valor que se aloca às províncias para a manutenção das estradas é exíguo, insuficiente ou satisfatório; ou se já deixou de existir. Nem uma única palavra. Podia dizer que tudo foi sempre segredo, mas prefiro dizer “esta informação foi sempre omitida; não disponibilizada ao país”.
Terceira falha de comunicação do Governo. Nunca em um único dia uma direcção provincial qualquer apareceu a dizer ou a queixar-se sobre suficiência ou insuficiência, ou ainda ausência total, de fundos para a manutenção das estradas na sua área de jurisdição. Nada. Never!
Quarta e última falta de comunicação do Governo. Em nenhum ano jamais nos foi dado o balanço de quantos quilômetros e em quais estradas e em que província foi feita manutenção; nunca nos foi dito quanto se alocou às províncias, quanto se fez com o que se alocou, o défice, o que ficou por fazer; nunca nos foi dito que os valores alocados às províncias para a manutenção das estradas são suficientes ou insuficientes; ou existem ou inexistem. Never. Nunca.
Agora, como é que nos vêm agora dizer que não há dinheiro para a manutenção das estradas. Pelo que vemos a olho nu - a não manutenção de estradas - calculamos que não haja dinheiro. Mas o Governo nunca nos apareceu a dizer preto no branco. E nós não podemos, nem devemos, adivinhar. Péssima comunicação. O cidadão não tem que calcular nada. Tem que ser informado.
Como, então, exigir que os moçambicanos compreendam que as ideias do Governo são genuínas, lícitas, dignas de serem ouvidas e consideradas? Se os nossos governantes, em qualquer que seja a área - melhor dizendo, em todas as áreas -, querem cooperação, colaboração, compreensão, apoio e solidariedade dos cidadãos, colaboradores e parceiros, têm que se comunicar como deve ser. A comunicação é uma arma chave para tudo na vida: para o sucesso, para a compreensão, para a solidariedade, para a colaboração e ou cooperação; mas também para o descalabro, insucesso, desgraça, guerras e destruições. Em suma, para a consecução dos objectivos pretendidos. Ou o objectivo pretendido é esta desunião, disputa, conflito… barulho… é isso? É só escolhermos.
Assim como estamos a fazer vai ser difícil criarmos harmonia, solidariedade e a tão almejada unidade entre nós moçambicanos. Lamentável.
Mas o Governo ainda vai a tempo de nos trazer estas informações todas que não nos dá.
ME Mabunda
Ernesto Golize nasceu em Maputo, numa família equilibrada, com um pai locutor e uma mãe comerciante. Ernesto era um rapaz alegre e amigo dos livros. Logo cedo evidenciou-se no seio dos amigos e familiares como uma esperança intelectual da tradicionalista família Golize com raízes na histórica província de Gaza, lá nas bandas de Manjacaze. Com 12 irmãos de diferentes mães, Golize começou a correr logo cedo atrás do money. Com diferentes habilidades, seguiu os passos do pai, tendo sido estagiário na Rádio Moçambique, após uma formação média na Escola de Jornalismo.
Com boas habilidades na escrita e na locução, liderava ovelhas na sua congregação religiosa – tudo corria devidamente. Através de um tio que era Chefe nacional dos Recursos Humanos no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), Ernesto Golize conseguiu um emprego no Gabinete de Comunicação Social naquela instituição estatal.
A vida corria a mil maravilhas, viagens de trabalho para aqui e para acolá. Conheceu vários países do mundo – avião era seu transporte diário. Passou as noites nos melhores hotéis possíveis. Mesmo casado, o jovem Ernesto tinha as melhores gatas que quisesse – era um mulherengo e boêmio assumido. Há quem dizia que o dinheiro lhe havia mudado a cabeça.
Em pouco tempo foi promovido no departamento, passou a ser adjunto-chefe. Com as capacidades que tinha, conseguiu admitir ao ensino superior no curso do Direito, onde viria a estudar três semestres e depois trocou para jornalismo pós-laboral que não chegou a terminar, já que passava a vida em constantes viagens. A vida do homem mudou, abandonou o quartinho de 1.500 meticais no bairro Benfica para um apartamento no terceiro andar no bairro do Jardim – afinal tudo corria a mil maravilhas.
A ambição subiu, aparição de novos actores políticos na arena política moçambicana foi vista por Ernesto como uma oportunidade de fazer nome. Levou as habilidades aprendidas nas várias formações investidas pelo Estado moçambicano, através do INSS, para assessoria política no aludido partido. O homem queria ser deputado com a idade que tinha – 27 anos! O jovem foi correndo, atacando fortemente o partido no poder – Frelimo. Ganhou espaço em colunas de jornais, rádios e grandes programas televisivos. Já era estrela.
Na busca constante pelo dinheiro e acerto de projectos que nunca saíram da mente para o papel e de lá à execução – Ernesto Golize mesmo com salário que ganhava no INSS e os vários subsídios de viagens que levavam dias e meses, decidiu contrair empréstimos bancários em dois bancos – comprou uma baita viatura – as shuggas aumentaram. A terapia sexual era feita em qualquer canto, desde que houvesse escuridão.
Ernesto Golize era o que tinha a voz mais alta na família, afinal era quem tinha pujança financeira. Quando pensava que tudo estava sob controlo, repentinamente tudo viria a mudar depois de receber uma visita ilustre de um irmão – quando o acompanhava à casa, bateu, mesmo com razão, num fulano na zona da Junta. O que Ernesto não sabia é que o homem era pai de oito filhos e tinha três mulheres, e apenas ele trabalhava e alimentava as mesmas. No atropelamento, a viatura teve um problema e quando levada ao mecânico explodiu dias depois.
Com medo das autoridades e de ir parar no tribunal, numa fase em que concorria a deputado e aguardava uma promoção no serviço e no partido, Ernesto Golize decidiu fazer um acordo com o fulano que havia atropelado – chegaram a um acordo – ele assumiria todas as despesas do homem, enquanto este recuperava em casa e não apresentaria nenhuma queixa. O que Golize não sabia é que o homem tinha oito filhos e três mulheres e cada uma, em sua casa, e dos filhos, cinco estudavam.
Com os empréstimos no banco, um apartamento luxuoso para pagar, mensalidades escolares suas e de dois irmãos, para além das ajudas constantes às despesas da casa da mãe solteira, o homem tinha que assumir por seis meses todas as despesas da casa do fulano atropelado por ele. Os dias foram passando, as despesas crescendo e a vida caminhando para o buraco.
Do investimento feito no partido tudo correu mal, acabou por ficar como suplente. Os seis meses de pagamento das despesas do homem atropelado acabaram se tornando em nove, onde tudo que faltava era imediatamente solicitado, até quando as crianças quisessem um rebuçado. O homem não aguentou, caiu doente, teve que parar de trabalhar por um longo período e, para além disso, teve que voltar para a casa da mãe com a família. Com o salário repartido para os bancos, a família do homem atropelado e as despesas de casa – sem trabalhar e com a falta das viagens que realizava, Ernesto Golize teve que encontrar outra forma de estar – dever todo o mundo que lhe aparecia pela frente!
Tendo adoecido por três meses, Golize perdeu a forma elegante que tinha – a barriguinha da felicidade se foi – os fatos lindos já não lhe cabiam – pareciam roupas de Museveni. O homem mudou de congregação. De tanto dever agiotas e amigos havia caminhos pelos quais não passava. Os agiotas, cansados de serem aldrabados, já o procuravam no local de trabalho – onde chegavam a pegá-lo pelas golas. O homem estava ferrado!
Procurou curandeiros, maziones e profetas. Teve vários banhos tradicionais. Mas nada resolvia. Ernesto Golize vivia um autêntico pesadelo. Estranhamente, a família tentava pensar que tudo estava sob controlo. O homem era resistente. Entretanto, num certo dia, alegadamente, o irmão mais novo foi parar numa boleia errada – os ocupantes transportavam quilos de cocaína e foram detidos pelas autoridades que lhes exigiam para a soltura por cabeça 50 mil meticais.
Ernesto Golize, como irmão mais velho, quis estar por frente do problema e saiu atrás do dinheiro, mas estava difícil – eis que apresentou o problema a um colega que prontamente emprestou-lhe parte do dinheiro, mas faltava-lhe alguns mil. Sem alternativas, teve que recorrer ao património do serviço, que foi penhorar aos agiotas.
Sucede que o colega teve problemas em casa e já queria o dinheiro de volta. Ernesto Golize levou a parte do empréstimo no agiota e reembolsou. Horas depois era solicitado no serviço, porque a máquina fotográfica estava a ser precisada para constar no inventário local que estava a ser exigido pelo Conselho de Direcção. O homem estava tramado! Sem alternativas, foi implorar para os agiotas, mas estes não cederam – os colegas do serviço, comunicaram-no que, caso não trouxesse o bem, o caso seria levado ao SERNIC – coitado do Ernesto Golize!
Horas passaram, os pés tremiam. Não parava de transpirar –devido à situação tenebrosa que o Ernesto vivia, a esposa havia o abandonado – com pena do mesmo, emprestou-lhe o valor, mas quando chegou lá, a instituição já havia recuperado a máquina fotográfica através da inteligência local que havia rastreado o bem.
Cansados com a conduta do jovem, Ernesto sofreu um processo disciplinar que culminou em expulsão. Mas mesmo com este fim, o vício pelo dinheiro alheio e fácil havia se aculturado no homem.
Com bons amigos que tinha, como Abel Nhancale e Abdul Remane. Ernesto Golize foi recebendo apoio dos seus companheiros. Nhancale, um jovem que acabava de terminar o ensino superior, na área de jornalismo e que já vinha perdendo dinheiro com as tramoias de Golize, conseguiu um emprego numa Organização Não-Governamental (ONG) como oficial de comunicação. Mas dadas as limitações profissionais que tinha, recorria a Golize para o apoiar em troca de uma verba mensal estimada em 10 mil meticais. No entanto, Ernesto roubava o companheiro, tendo extraviado um laptop, telemóvel, discos externos e bens não quantificáveis.
Já Abdul Remane era um amigo batalhador que passou por diferentes pesadelos da vida, mas que havia conseguido colocar os pés no chão, vivendo uma vida familiar e profissional em constante ascensão. A amizade deles era de constante ajuda – haviam se conhecido em tempos de militância política. Abdul Remane pretendia tirar da lama Ernesto Golize. Convidou-o para um projecto. Combinaram os valores mensais. Remane disponibilizou-lhe um laptop como material de trabalho. Entretanto, em vez de usar o mesmo para o trabalho, Golize vendeu o material.
As burlas de Golize são tantas que teve que se afastar da vida pública e do activismo social nas redes sociais, para além de ter trocado os contactos telefónicos. Ernesto Golize ainda continua num sono profundo – vivendo o pesadelo!