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Redacção

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Depois de Janeiro e Fevereiro de 2023 turbulentos no futebol moçambicano, com os jogadores a reclamarem uma justa premiação pela sua participação no CHAN da Argélia, agora é a vez de o atletismo assistir uma troca de acusações entre as direcções do Comité Olímpico de Moçambique (COM) e da Federação Nacional que gere a modalidade acerca do pagamento das ajudas de custo aos atletas que participaram de uma meia maratona, realizada naquela região administrativa especial da China, em Dezembro do ano passado.

 

A polémica veio a público durante a primeira semana de 2024, depois que um áudio de uma conversa telefónica entre um dos atletas integrantes da comitiva e o Secretário-Geral do COM “caiu” nas redes sociais, na qual Penalva Cézar acusa Kamal Badrú, Presidente da Federação Moçambicana de Atletismo (FMA), de ser bandido.

 

“Ele veio pedir dinheiro, eu mandei dar dinheiro para pagar visto e não pagou. Levou quinhentos e tal dólares para pagar visto de cada um e 10 mil Meticais para dar a cada um e soube que só vos deu dois mil Meticais. Ele é que levou o vosso dinheiro, eu tenho cartas que assinei para se fazer transferências. Agora o Comité Olímpico de Macau está a enviar-me cartas a dizer que tenho dívidas porque pagou vistos para vocês. O vosso presidente é um bandido”, disse Penalva Cézar, em conversa telefónica com o atleta Titosse Taimo.

 

As declarações de Penalva Cézar deixaram o mundo desportivo de boca aberta, tendo merecido uma nota de repúdio por parte do próprio COM. “A Direcção do Comité Olímpico de Moçambique repudia e condena o teor verbal da conversa por não se coadunar com a sua forma de estar e ser no desporto e na sociedade e, por isso, endereça um pedido de desculpas ao senhor Presidente da FMA, no que diz respeito aos termos usados pelo seu SG, lamentando, no entanto, os factos e razões que levaram que tal conversa atingisse níveis pouco recomendáveis”, defendeu o COM, em comunicado publicado na passada sexta-feira.

 

Tentando lavar a honra e manter a dignidade do seu líder, a FMA emitiu, na tarde de sábado, um comunicado de imprensa a explicar o que terá acontecido com o dinheiro que estava destinado às ajudas de custo dos atletas (dois) e a chefia da delegação.

 

No documento, a FMA começa por esclarecer que os vistos para Macau custavam 190 USD cada, pelo que a instituição devia desembolsar um total de 570 USD (36.467,26 Meticais, ao câmbio actual). Por cada integrante da comitiva, a FMA estimou em 10 mil Meticais, o valor das ajudas de custo, totalizando 30 mil Meticais. Isto é, a FMA precisava de 66.467,26 Meticais para realizar a operação com sucesso.

 

No entanto, a FMA dizer ter recebido 46.052,00 Meticais do COM, valor que fora convertido, em dólares norte-americanos, no mercado negro, alegadamente, “dada a indisponibilidade da banca e das casas de câmbio para executar a referida transacção”, por um lado, e, por outro, porque a “embaixada fechava o atendimento ao público às onze e trinta, associado ao facto de que as viagens estavam previstas para o período da tarde, do mesmo dia”.

 

Da operação cambial ilegal feita pela FMA, diz a nota de imprensa, os operadores amealharam 39.444,00 Meticais, sendo que a FMA ficou com 6.608,00 Meticais. Deste valor, 6.000,00 Meticais foram entregues aos integrantes da comitiva (2.000,00 Meticais cada).

 

“No dia 20 de Dezembro de 2023, através de Ofício Nr.128/SG/FMA/23, a FMA apresentou, junto do COM, o relatório desportivo e financeiro daquela actividade e justificou as despesas relativas ao montante recebido (46.052,00 MT)”, garante aquela agremiação desportiva.

 

Por essa razão, a FMA diz que “repudia, condena, despreza, refuta, repele, desacredita e declina em acreditar o teor da conversa em que foram proferidas palavras pouco abonatórias pelo Secretário-Geral dum órgão da dimensão e respeitável Comité Olímpico de Moçambique, Sr. Penalva Cézar, apelidando o seu Presidente, Kamal Badrú Juma, de bandido e nisto se concluiu a falta de ética e deontologia profissional”. (Carta)

A batalha para ser presidente da Renamo deve-se, essencialmente, ao facto de o cargo de líder do segundo partido mais votado ter centenas de milhões de meticais associados. Entre 2021 e 2022, Ossufo Momade e o seu gabinete receberam mais de 100 milhões de meticais, transferidos dos fundos do Estado. Estas mordomias justificam a ríspida reacção da ala radical da Renamo em relação à vontade de Venâncio Mondlane e Manuel De Araújo de se candidatarem à presidência do partido.

 

É a isca que Ossufo Momade mordeu, que Afonso Dhlakama evitou desde 2015 até à sua morte. Por estas mordomias, Ossufo Momade e outros seus aliados próximos lutarão pela renovação do cargo de presidente da Renamo e, logo, candidato às eleições deste ano. Só em 2022, o Gabinete de Ossufo Momade recebeu 68 milhões de meticais, o equivalente a 1 milhão de dólares.

 

Do orçamento total de 112.3 milhões de meticais (cerca de 1.8 milhão de dólares) dos dois anos, 70.8 milhões foram destinados para bens e serviços e os restantes 41.5 milhões foram gastos com o pessoal (salários e regalias).

 

O Gabinete não tem uma estrutura administrativa para a uma gestão criteriosa de tanto dinheiro alocado para bens e serviços, o que significa que é um valor que é atribuído a Ossufo Momade para usar ao seu bel-prazer. O que a lei estabelece é que o Gabinete de Trabalho do Líder do Segundo Partido com Assento Parlamentar é apoiado por pessoal da sua confiança, nomeadamente um assessor, um assistente financeiro, um secretário particular, um motorista e um estafeta.

 

O assistente financeiro é responsável pela elaboração e gestão do orçamento alocado pelo Estado, através de uma Unidade Gestora Executória Especial (U.G.E.E), na dependência da Direcção Nacional de Contabilidade Pública.

 

Além do orçamento, Ossufo Momade possui uma série de regalias, de entre as quais se podem destacar: (i) ter remuneração, despesas de representação, subsídios mensais actualizados e gozar das regalias inerentes ao estatuto; (ii) dispor de meios de transporte do Estado; (iii) beneficiar do direito de alienação de viatura; (iv) ter passaporte diplomático, para si, seu cônjuge e filhos menores ou incapazes; (v) gozar de um regime especial de protecção e segurança para salvaguardar a sua integridade física; (vi) viajar em primeira classe; (vii) ter subsídio de reintegração nos termos da lei.

 

Ossufo Momade ganha 2000 mil Meticais por mês

 

O Presidente da Renamo está enquadrado na terceira categoria salarial mais elevada na estrutura do Estado, equiparada às funções de vice-presidente da Assembleia da República, vice-procurador geral da República e do vice-presidente do Tribunal Supremo.

 

O seu salário base é de 174.9 mil meticais (correspondente a 66% do vencimento do Chefe de Estado). A este valor são adicionados 26 mil MT de subsídio de representação, correspondente a 15% do salário base, o que totaliza uma remuneração mensal de 200 mil meticais.Igualmente, há outros subsídios, como 10 mil meticais de comunicação, entre outros.

 

Além das regalias acima descritas, o líder do segundo partido mais votado tem direito à vaga de membro do Conselho de Estado, com as respectivas regalias, algumas das quais já estão contidas na função do gabinete do segundo partido com assentos no parlamento.

 

Perder a presidência da Renamo significa perder mais do que poder. Significa perder, também, uma série de regalias e a gestão de milhões alocados pelo Estado ao Gabinete do segundo maior partido. (CIP Eleições)

Três ataques foram reportados entre quinta-feira e sábado, nas aldeias Malinde, Chinda e Chimbanga, em Mocímboa da Praia, resultando pelo menos em cinco (05) mortos.

 

Fontes disseram à "Carta" que, dos cinco mortos, três foram registados na aldeia Chimbanga, que fica a menos de 10 quilómetros da vila de Mocímboa da Praia, onde igualmente saquearam e destruíram bens. Os outros dois mortos registaram-se na aldeia Chinda, enquanto em Malinde, os terroristas roubaram vários produtos sem causar vítimas mortais.

 

Os recentes ataques terroristas colocam à prova as forças do Ruanda, responsáveis do cordão de segurança em Mocímboa da Praia, numa altura em que as incursões provocaram deslocamentos forçados de diversas famílias, sobretudo de Chimbanga à vila sede.

 

"Desde semana passada, estão a entrar aqui na vila sede muitas pessoas de Chimbanga e Ntotwe e, sobretudo, das ilhas, devido a estes ataques", disse Mussa Assumane, que deu a conhecer que, por conta disso, as forças do Ruanda proíbem desde sábado viagens a partir de Mocímboa da Praia para outros pontos.

 

"Pelo menos este sábado ninguém saiu de Mocímboa da Praia. Os ruandeses estão a proibir, só entram carros vindos de Pemba, Nampula, Mueda, Palma ou Nangade, mas entre nós ninguém pode sair. Muita gente que pretendia sair voltou com trouxas à casa", acrescentou Faquih Assumane, que vive próximo da estação de Massapateiro, no bairro Nanduadua.

 

Número de mortes em Ntotwe subiu de dois para três

 

Uma fonte do governo distrital de Mocímboa da Praia disse que o número de mortes em Ntotwe subiu de dois para três, uma vez ter sido localizada mais uma vítima. Igualmente mais de 20 casas e perto de 10 estabelecimentos comerciais foram queimados. 

 

Para manifestar a sua solidariedade, o administrador de Mocímboa da Praia, Sérgio Domingos, escalou a aldeia Ntotwe, atacada a 3 Janeiro, onde apesar da situação encorajou a população a engajar-se na produção agrícola.

 

Entretanto, em relação ao ataque de Chai, na passada quinta-feira (4), fontes confirmaram à "Carta" que uma pessoa foi morta, três barracas destruídas e saqueados vários produtos alimentares.

 

Em relação ao intenso tiroteio registado na aldeia V Congresso, que várias vezes foi alvo de ataques terroristas, incluindo o assalto de uma posição das FDS moçambicanas, a população ficou a saber que se tratava de militares governamentais, numa estratégia de dissuadir o inimigo. (Carta)

Está aberta a guerra entre membros da Renamo pelo controlo do maior partido da oposição no xadrez político moçambicano. Em causa está o projecto da ala mais conservadora e “tradicional” da “perdiz” em manter Ossufo Momade na liderança do partido sem recurso a qualquer votação, facto contestado pela ala mais jovem, que exige a realização de eleições, visto que o mandato de Ossufo Momade termina no próximo dia 17 de Janeiro.

 

A troca de palavras entre membros do maior partido da oposição teve seu início na última quarta-feira, quando o porta-voz da Renamo, José Manteigas, anunciou o actual Presidente do partido como candidato único às eleições presidenciais do dia 09 de Outubro deste ano. José Manteigas defende que Ossufo Momade foi o responsável pelos resultados eleitorais conseguidos pela Renamo no escrutínio do dia 11 de Outubro de 2023.

 

Estas declarações não foram do agrado de parte dos membros da Renamo, que entendem que o candidato presidencial deve ser eleito pelos órgãos do partido, facto que ainda não aconteceu. Manuel de Araújo, Edil de Quelimane, e Venâncio Mondlane, deputado e relator da bancada parlamentar da Renamo na Assembleia da República, acusam José Manteigas de ter violado os estatutos da “perdiz”.

 

Os dois políticos, que representam a ala mais jovem do partido, defendem que o candidato às eleições presidenciais deve ser legitimado pelos membros do partido, em sede do Congresso, e não pela Comissão Política do Partido.

 

“Como licenciado em Direito, [José Manteigas] sabe muito bem que actos desta natureza só são válidos a partir de uma deliberação e não de uma conversa de café ou circunstancial. Logo, todo o tipo de deliberação vincula um determinado órgão”, afirmou Venâncio Mondlane aos jornalistas, na última sexta-feira.

 

“Se fores a ler os estatutos do partido, vais notar que ou o meu amigo Manteigas não conhece os estatutos ou violou-os de forma flagrante. O Conselho Jurisdicional [liderado por Saimone Macuiana] deve pronunciar-se. A Renamo é o pai da democracia e ser pai da democracia significa cumprir os preceitos democráticos”, sublinhou Manuel de Araújo, em declarações à STV.

 

Na conferência de imprensa concedida aos jornalistas na última sexta-feira, após submeter um recurso ao Tribunal Administrativo contra o Conselho Constitucional por se recusar a aclarar o Acórdão que valida as eleições de 11 de Outubro, Venâncio Mondlane admitiu a possibilidade de candidatar-se à presidência da Renamo.

 

“Os pronunciamentos do Dr. Manteigas acabaram, em certa medida, sendo um catalisador para a reflexão que eu estava a fazer. Dentro de dias, eu vou dizer, de forma clara e directa, qual é a minha decisão em relação à minha candidatura ou não à presidência da Renamo. Agradeço o Dr. Manteigas porque ele foi o catalisador para que a minha reflexão seja mais rápida”, disse Venâncio Mondlane.

 

As declarações do cabeça-de-lista da Renamo na cidade de Maputo nas VI Eleições Autárquicas de 2023 não agradaram a ala “conservadora” do partido e mais próxima de Ossufo Momade, que tratou de respondê-lo.

 

José Manteigas defende que a Renamo não se guia por opiniões de pessoas, pois, tem órgãos, tem sua filosofia política, sua orientação política e objectivos bem claros: “governar e governar bem Moçambique”.

 

“O Presidente Ossufo Momade está a trazer resultados no partido. Portanto, não é um indivíduo que tem interesses pessoais que vai chegar na Renamo dizer que, a partir de hoje, eu quero dirigir a Renamo. Para ser presidente da Renamo, você tem que ter história na Renamo”, disse José Manteigas, em debate televisivo na TV SUCESSO.

 

Lembre-se que Ossufo Momade foi eleito presidente da Renamo a 17 de Janeiro de 2019, durante a realização do VI Congresso daquela formação política, que teve lugar na Serra da Gorongosa, província de Sofala. Momade ganhou o escrutínio com 410 votos, contra 238 obtidos por Elias Dhlakama, irmão do histórico líder da Renamo Afonso Dhlakama, falecido a 3 de Maio de 2018.

 

Entretanto, quando faltam menos de 10 dias para o fim do mandato de Ossufo Momade, ainda não se sabe quando a Renamo realizará o seu Congresso, o sétimo da sua história, num ano em que se realizam as eleições presidenciais, legislativas e provinciais.

 

Aliás, Manuel de Araújo disse à STV ter alertado o Presidente da Mesa do Conselho Nacional da Renamo, Leopoldo Ernesto, em Dezembro último, dos timings que o partido tinha para convocar o Congresso, visto que o mandato do actual Presidente estava prestes a findar, mas sem sucesso.

 

Refira-se que o mandato de Ossufo Momade foi marcado por contestações, tanto da ala militar, assim como da ala política, devido à sua suposta inércia na resolução dos problemas do partido. Recorde-se que a Junta Militar da Renamo, criada e liderada por Mariano Nhongo em Junho de 2019, surgiu em contestação à liderança de Ossufo Momade, que subiu de tom após as eleições autárquicas de 11 de Outubro, em que a Renamo foi atribuída quatro municípios pelo Conselho Constitucional, de mais de uma dezena em que reclamava vitória. (A. Maolela)

A COP 28 no Dubai aceitou efectivamente a meta das empresas de gás e petróleo de aquecimento global superior a 2ºC, acima dos níveis pré-industriais, em vez dos 1,5ºC acordados na COP21 em Paris em 2016. Meio grau pode parecer pequeno, mas faz uma grande diferença para Moçambique 

 

O projecto de gás de Moçambique pressupõe grandes vendas de gás durante 30 anos, o que, devido a atrasos, é até 2055. Os 1,5ºC de Paris significaria que não poderiam ser desenvolvidos novos campos de gás e significaria definitivamente que a TotalEnergies não seria capaz de vender todo o gás de Moçambique. 

 

Mas 2ºC significará vender gás até 2045 e 2,5ºC significaria vender todo o campo de gás.

 

A diferença para Moçambique é enorme, mas não imediata. Nos próximos 15 anos, a temperatura média subirá cerca de 0,6ºC, de 24,6ºC para 25,2ºC, independentemente da meta definida agora. Mas o CO2 e o metano emitidos nos próximos 15 anos determinarão o que acontecerá então. Se as empresas de petróleo e gás conseguirem o que querem, a temperatura média de Moçambique subirá para 28ºC ou 29ºC no final do século. Isto causaria secas, calor, ciclones, inundações e destruição massiva. Mas apenas o aumento de 0,6ºC, que é tarde demais para parar, causará enormes danos nos próximos 15 anos.

 

A projecção do governo para 2018 era de mais de 2 mil milhões de dólares por ano durante pelo menos 15 anos, portanto 2ºC ou 2,5ºC significa dezenas de milhares de milhões de dólares. Mas isso é só a partir de 2036. Antes disso, a receita é pequena. Em 1 de Dezembro de 2023, o Banco Mundial emitiu o seu Relatório sobre o Clima e Desenvolvimento do País em Moçambique, que "estima que o nível de investimento necessário até 2030 para alcançar a resiliência climática do capital humano, físico e natural ascende a 37,2 mil milhões de dólares". 

 

Isto destina-se a estradas, edifícios melhorados, melhor agricultura, irrigação e para lidar com a subida do nível do mar e ciclones mais fortes. Cerca de metade do dinheiro que Moçambique espera ganhar com o gás dentro de 30 anos tem de ser gasto agora para fazer face aos danos já causados ao clima. E o resto terá de ser gasto para limpar a confusão que Moçambique está a ajudar a criar.

 

Mas a 13 de Dezembro foi publicado outro relatório que mostra que Moçambique nunca conseguirá realmente tanto dinheiro. 

 

O relatório do Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável no Canadá conclui que "os negócios de GNL estão estruturados de modo que a maior parte das receitas para Moçambique chegue em meados da década de 2030 e 2040 e esteja sujeita à forma como o mercado internacional de GNL se desenvolve, transferindo o risco para o Estado”. Por outro lado, “os consórcios de extracção de gás também evitam pagar impostos retidos na fonte sobre dividendos ou juros. Moçambique tem uma participação muito limitada na cadeia de valor, por isso, embora as empresas estrangeiras ganhem dinheiro em todas as fases, Moçambique não o faz."

 

Portanto, Moçambique precisa de 37,2 mil milhões de dólares na próxima década para lidar com o clima, antes de haver qualquer receita significativa. E se as receitas do gás vierem, terão de ser gastas nos danos cada vez mais problemáticos causados pelo aumento do aquecimento global causado pelo aumento da produção de gás. Isto começa a parecer um péssimo negócio e Moçambique estaria melhor investindo em projectos industriais e energéticos locais que provavelmente serão rentáveis em menos de uma década. (Joseph Hanlon)

O número de caixas automáticas (CA/ATM) disponibilizadas pelos bancos em Moçambique caiu quase 12% nos últimos três anos, para pouco mais de 1.500 em todo o país, segundo dados do banco central a que a Lusa teve hoje acesso.

 

De acordo com um relatório estatístico do Banco de Moçambique, com dados até outubro último, em todo o país estavam disponíveis 1.507 caixas ATM, número que compara com as 1.573 em 2022.

 

Em 2021, os bancos moçambicanos tinham disponíveis 1.637 caixas ATM e em 2020 um total de 1.710, em todo o país.

 

No mesmo relatório, em que não são apontadas explicações para este declínio, o Banco de Moçambique refere ainda que o país contava no final de outubro com 27.226 terminais de pagamento automático (TPA/POS), neste caso um recuo de 25,5% face aos 36.541 POS disponíveis pelos bancos no final de 2020.

 

Em contrapartida, o número de cartões em circulação continua a subir e chegou em outubro a 3.955.038, essencialmente de débito, contra 3.194.148 em 2020.

 

No final de outubro estavam ativos em Moçambique, segundo o banco central, 3.439.120 cartões de débito, 124.718 cartões de crédito e 264.145 cartões pré-pagos.

 

Segundo dados do banco central, funcionam em Moçambique 15 bancos comerciais e 12 microbancos, além de cooperativas de crédito e organizações de poupança e crédito, entre outras.(Lusa)

Indivíduos armados, que se acredita serem terroristas, protagonizaram na última quarta-feira (03), por volta das 16h00, um ataque à aldeia Ntotwe, cerca de 20 quilómetros da vila de Mocímboa da Praia, deixando dois mortos, ambos residentes da zona.

 

Fontes referem que o ataque a Ntotwe resultou, igualmente, na destruição de estabelecimentos comerciais e palhotas da população e parte desta foi obrigada a deslocar-se à vila de Mocímboa da Praia.

 

"É verdade. A aldeia Ntotwe foi alvo de um ataque. Não sabemos se foram terroristas ou não, mas suspeitamos que sejam eles. Duas pessoas perderam a vida e ainda queimaram barracas, casas e muitos bens", disse Paula Simão, residente do bairro 30 de Junho, acrescentando que muitas pessoas estão a sair para a vila de Mocímboa.

 

As fontes referiram ainda que a resposta dos soldados ruandeses foi tardia, uma vez que os atacantes já tinham feito o suficiente para deixar a aldeia Ntotwe destruída e em pânico. Os aldeões foram apanhados em contra-pé, depois do seu regresso à região.

 

Incursões terroristas foram igualmente registadas a sul de Mocímboa da Praia, na ilha Nhonge e aldeia Ilo, entre os dias 1 e 2 de Janeiro, não obstante as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique e do Ruanda tenham reportado, no ano findo, enormes avanços na luta contra o terrorismo naquele distrito.

 

Nas duas comunidades, a cerca de 30 quilómetros da vila sede, os terroristas obrigaram a população a vender-lhes produtos alimentares, que mais tarde foram transportados em embarcações em direcção ao rio Messalo, onde se acredita que tenham estabelecido uma base.

 

Segundo relatos, eram cerca de 50 homens armados que protagonizaram o ataque, sendo que parte destes se encarregaram pela condução de barcos a motor roubados aos pescadores das aldeias de Ulo, em Mocímboa da Praia, e Pangane, no distrito de Macomia.

  

Distrito de Macomia também alvo de ataque

 

Mais um tiroteio foi registado na noite de ontem (4) em Chai-sede, distrito de Macomia. "Carta" soube que a população se refugiou nos esconderijos durante toda a noite.

 

Entretanto, na sexta-feira passada, um outro ataque foi reportado na aldeia Litamanda, três quilómetros de Chai-sede, onde os atacantes apoderaram-se de produtos alimentares, incluindo bebidas alcoólicas, sem, no entanto, causar vítimas mortais. (Carta)

O porta-voz da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) disse na passada quarta-feira que o partido vai apostar no atual presidente para as presidenciais do próximo ano, apesar das críticas de segmentos que exigem a sua renúncia, acusando-o de inércia.

 

“Ossufo Momade é o nosso candidato e o presidente que está a trazer sucessos ao partido ”, declarou José Manteigas, porta-voz da Renamo, durante uma conferência de imprensa hoje em Maputo.

 

A liderança da Renamo tem sido, nos últimos meses, criticada externa e internamente,  com antigo líder do braço armado do partido a acusar Ossufo Momade de inércia face a alegadas irregularidades nas eleições autárquicas moçambicanas a favor do partido no poder e de negligência face à situação dos guerrilheiros do partido recentemente desmobilizados.

 

“A direção do partido e o presidente da Renamo não estão a dizer nada [face à irregularidade nas eleições]. Parece-me que ele foi comprado. Há municípios que nos foram roubados e ele parece que está amarrado. Sobre os problemas com desmobilização dos militares, também não fala nada”, disse à Lusa, em dezembro, Timosse Maquinze, que era classificado dentro da Renamo como chefe do Estado-maior general do braço armado até à desmilitarização daquele partido, no âmbito da implementação dos acordos de paz assinados com Governo em 2019.

 

Para o porta-voz do partido, a liderança de Ossufo Momade trouxe resultados, apontando, a título de exemplo, as eleições autárquicas, em que o partido alega ter vencido em vários pontos, incluindo na capital.

 

“É do domínio geral que a Renamo ganhou em muitas autarquias nas eleições autárquicas e esta vitória significa que há uma boa liderança”, frisou José Manteigas.

 

Ossufo Momade assumiu a liderança da Renamo em 2018 após a morte de Afonso Dhlakama, líder histórico e fundador do partido que morreu em maio daquele ano vítima de doença.

 

As eleições gerais, incluindo as sétimas presidenciais, estão marcadas para 09 de outubro, com um custo de cerca de 6.500 milhões de meticais (96,3 milhões de euros), conforme dotação inscrita pelo Governo na proposta do Orçamento do Estado para 2024.

 

Além de apontar Ossufo Momade como candidato da Renamo, o porta-voz do principal partido de oposição em Moçambique criticou a proclamação, pelo Conselho Constitucional (CC), na sexta-feira, da Frelimo, partido no poder, como vencedora da repetição das eleições em quatro municípios do país, somando assim a vitória em 60 das 65 autarquias do país nas sextas autárquicas.

 

“A validação e proclamação de resultados eleitorais tão problemáticos, como é recorrente, consubstancia o apadrinhamento do Conselho Constitucional à fraude eleitoral que já é  cultura implantada nesta instituição de quem se esperava ser a reserva jurídica e de imparcialidade”, declarou o porta-voz da Renamo.

 

A repetição da votação de 11 de outubro decorreu no dia 10 de dezembro em 18 mesas de Nacala-Porto (província de Nampula), três de Milange e 13 de Gurúè (Zambézia) e na totalidade das 41 mesas de Marromeu (Sofala), quatro municípios em que o processo eleitoral não foi validado pelo CC, devido a irregularidades.

 

As sextas eleições autárquicas moçambicanas foram fortemente contestadas pela oposição, que não reconheceu os resultados oficiais, e pela sociedade civil, alegando uma “megafraude”, levando a dezenas de manifestações em todo o país.

 

A Resistência Nacional Moçambicana (Renamo, maior partido da oposição) reclama vitória nas maiores cidades do país, incluindo Maputo, com base na contagem paralela através das atas e editais originais, nestas eleições, mas foi declarada vencedora em apenas quatro municípios, metade dos que tinha anteriormente, enquanto o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) manteve o município da Beira.(Lusa)

No âmbito da polêmica validação das autárquicas de Outubro de 2023, uma coisa foi omitida da opinião pública: o Parecer do Ministério Público junto do Conselho Constitucional. 

 

 

O acordo do Conselho Constitucional sobre o pleito de Outubro faz tábua rasa deste parecer, mencionando-o apenas de passagem. “Carta de Moçambique” entende que a divulgação desse parecer é fundamental para que a sociedade possa efectuar um julgamento cabal sobre o recente processo eleitoral.

 

Como essa divulgação não foi feita prontamente nem pelo CC nem pela Procuradoria Geral da República (a quem também dirigimos este pedido), "Carta” decidiu enveredar pela via da litigação, usando suas faculdades legais para exigir publicamente a publicação do aludido parecer. 



Isso (via da litigação) será também feito relativamente à actuação da Comissão Nacional de Eleições: ou seja, a legislação nacional possibilita um escrutínio judicial sobre a actuação dos órgãos eleitorais. Isso não está a ser feito por quem deveria fazê-lo – os partidos políticos – deixando esse trabalho para a comunicação social ou para organizações da sociedade civil como o CIP. Eis o texto integral do pedido formulado ao CC.

 

MARCELO MOSSE, jornalista, Editor de “Carta de Moçambique”,  no exercício do direito de petição consagrado no artigo 79 da Constituição da República de Moçambique, e previsto no artigo 5 da Lei n.º 26/2014, de 23 de Setembro, vem requerer se digne mandar que lhe seja facultada cópia do “Parecer do Ministério Público junto do Conselho Constitucional”, representado pelo Procurador-Geral da República, no Plenário, como dispõe a alínea a) do n.º 1 do artigo 10 (Representação) da Lei n.º 1/2022, de 12 de Janeiro, louvando-se nos termos e fundamentos seguintes:

 

1. A liberdade de expressão e informação (Liberdades de expressão e informação) integra o CAPÍTULO III – Direitos, Deveres e Liberdades Fundamentais, da Constituição da República de Moçambique.

 

2. Dispõe o n.º 1 do citado preceito constitucional que todos os cidadãos têm direito à informação, direito fundamental este que não pode ser limitado por censura, como preceitua o n.º 2.

 

3. O instrumento legal que estabelece os termos e procedimentos visando o exercício desse direito constitucionalmente consagrado é a Lei n.º 34/2014, de 31 de Dezembro, que dispõe no artigo 13 (Direito à informação) que:

 

O exercício do direito à informação compreende a faculdade de solicitar, procurar, consultar, receber e divulgar a informação de interesse público na posse das entidades definidas no artigo 3 da presente Lei”.

 

4. Já quanto às competências do Procurador-Geral da República em matéria de emissão de pareceres, consta apenas na alínea c) do n.º 1 do artigo 19 (Competências) a de “emitir pareceres sobre a legalidade dos contratos internacionais em que o Estado seja outorgante, quando a lei o exija, ou quando solicitado pelo Conselho de Ministros”, da Lei n.º 1/2022, de 12 de Janeiro (Lei Orgânica do Ministério Público e o Estatuto dos Magistrados do Ministério Público).

 

5.  Indubitavelmente, o supra referido preceito legal não confere ao Procurador-Geral da República competência para emitir qualquer outra modalidade de parecer, nomeadamente no processo de validação e proclamação dos resultados eleitorais, retirando-se essa competência, numa interpretação “excessivamente” extensiva, pois, o n.º 2 do artigo 124 (Distribuição e apreciação) da Lei n.º 2/2022, de 21 de Janeiro (Lei Orgânica do Conselho Constitucional) apenas determina que “O processo vai ao visto de todos os Juízes Conselheiros e do Ministério Público por três dias (...)”, não definindo a lei qual a natureza quer do processo, quer do visto do Ministério Público, nem especifica se é meramente visto de má-fé, ou então para emissão de parecer. Nesta última hipótese, a lei deveria prever que o representante do Ministério Público seja notificado para estar presente na sessão plenária marcada pelo Presidente do Conselho Constitucional para apreciação e discussão, e defender o seu “parecer”, se fosse caso disso.

 

6. Não é nosso objectivo, aqui e agora, enveredamos pela análise de tão polêmica e lacunosa lei, pelo que, retomando ao objecto do nosso requerimento, apraz-nos referir que um dos órgãos colectivos que funcionam na Procuradoria-Geral da República é o Conselho Técnico, como previsto na alínea a) do artigo 37 (Órgãos colegiais), cuja natureza e composição consta nos números 1 e 2 do artigo 38, ambos da Lei n.º 1/2022, de 12 de Janeiro.

 

7. As competências do referido órgão colegial estão expressamente catalogadas nas alíneas a), b) e c) do artigo 39, do citado diploma legal, de cuja leitura se conclui que emite pareceres por solicitação de dois órgãos de soberania, o Conselho de Ministros e a Assembleia da República pelas suas Comissões de Trabalho.

 

8. Por último, referir que dispõe o artigo 43 (Homologação dos Pareceres e sua Eficácia) que: 

 

 

Quando homologados pelas entidades que os tenham solicitado, os pareceres do Conselho Técnico são publicados no Boletim da República (...)”,

 

Ou seja, mesmo pareceres solicitados ao Conselho Técnico da Procuradoria-Geral da República são do interesse público e publicados para conhecimento geral da Nação, e nem constam, nem poderiam constar do Classificador de Informações na Função Pública, com o grau de segredo de Estado, secreto, confidencial ou restrito previstos no Decreto n.º 36/2007, de 27 de Agosto (Alterou o Sistema Nacional de Arquivos) criado pelo Decreto n.º 33/92, de 26 de Outubro, diploma do qual não consta qualquer referência à resposta do visto do Ministério Público no processo de validação e proclamação dos resultados eleitorais, solicitado pelo Presidente do Conselho Constitucional.

 

 

Assim, não havendo qualquer impedimento legal, e sendo o direito à informação um dos direitos fundamentais consagrados na Constituição da República, e sendo a República de Moçambique um Estado de Direito baseado no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais do Homem (cfr. artigo 3 da Constituição da República de Moçambique) e subordinando-se o Estado à Constituição (cfr. n.º 3 do artigo 2) e tendo em conta que as normas constitucionais prevalecem sobre todas as restantes normas do ordenamento jurídico (cfr. n.º 4 do artigo 2 da Constituição da República de Moçambique), entende o requerente que V.Ex.ª considerará a legalidade e pertinência e a justeza do pedido, ordenando que seja facultada a cópia requerida.

(Carta de Moçambique)

O nosso 2024 não pode ser de disputa entre pessoas ou famílias poderosas - reis e rainhas, cavaleiros e renegados, homens honestos e mentirosos, tribos ou regiões, famílias nobres ou dinásticas, alianças mafiosas ou conspiradoras - lutando pelo controlo político-económico do país como no “Game of Thrones. Moçambique não é e não pode ser transformado numa série de televisão imaginada para distrair as pessoas nos tempos de ócio.

 

Porquanto possamos negar, até a pés juntos, os sinais da nossa crise são muitos, graves e dramáticos. Não é só a constante e continuada crise da nossa política, democracia e economia, mas é, sobretudo, a nossa incapacidade de assumir a nossa soberania.

 

Na primeira visita ao Moçambique independente, Julius Nyerere (1975) deixou uma profunda advertência sobre as diferentes espécies de tramoias que nos assolam: Moçambique está no mar alto, está livre e independente, mas ainda não alcançou os objectivos pelos quais o seu povo lutou – paz, progresso e felicidade do povo (Cabral) – devido às dificuldades próprias do processo e à oposição “daqueles que não querem que a África se desenvolva em liberdade”.

 

Por isso, lutar por Moçambique é um desafio contínuo. A asserção de Frantz Fanon nunca foi tão verdadeira e pertinente: cada geração tem uma missão a cumprir, realizá-la ou traí-la. Algumas vezes até parece que a “geração da insurreição” teve uma missão muito árdua: lutar contra o colonialismo debaixo de perseguições, prisões, torturas e até assassinatos. Outras vezes, parece que, na sua dificuldade, teve sorte e tarefa facilitada: identificou e definiu com exactidão o inimigo – o colonialismo - e o objectivo fundamental da sua luta, a autodeterminação política.

 

A geração da insurreição e da independência, apesar das críticas que lhe possamos fazer por causa de alguns dos seus feitos – nos procedimentos, nas ideologias, nos processos económicos –, em retrospectiva e com a distância histórica que temos, somos obrigados a reconhecer que se engajou para realizar aquilo que pensava ser a sua missão.

 

Precisamos de continuar a “Lutar por Moçambique”, mas o tempo e as circunstâncias mudaram. Já não se trata de lutar contra o colonialismo do minúsculo e periférico Portugal, mas de resistir aos mastodontes e colossos que, ainda por cima, se fundem em grandes unidades com vocação imperialista. A necessidade de resistir para continuar o nosso caminho de liberdade é tão importante hoje, como foi no passado (ou talvez mais) e o percurso certamente mais árduo.

 

Hoje, na época da complexidade (Edgar Morin), do ultraliberalismo caracterizado pela Necropolítica (Achile Mbembe), da sociobiologia, é quase aporético identificar o inimigo contra o qual lutar, como também -e sobretudo-, é aporético identificar com quem contar para essa luta, dentro dos partidos em concorrência e mesmo entre os líderes que nos governam.

 

Contudo, somos chamados a ser amigos do nosso tempo, a apreendê-lo através de conceitos (Hegel) e a partir das nossas circunstâncias (Ortega e Gasset); a falar a sua linguagem (Jacques Derrida) e a partir do nosso lugar, mesmo se periférico (Enrique Dussel).

 

É nestas circunstâncias aporéticas que temos o desafio de realizar a nossa missão, de continuar a lutar por Moçambique contra novos inimigos e novas adversidades. Esses inimigos e adversidades são, antes de mais, internos, não só no sentido de que estão dentro das nossas instituições, mas também no sentido de que estão dentro de cada um de nós e se chamam individualismo (solipsismo, com os seus corolários de corrupção), promiscuidade, etc. Mas as adversidades são também a globalização neoliberal e o poder corruptor do seu dinheiro, são a corrida desenfreada e selvagem aos recursos naturais, são a constituição de grandes blocos hegemónicos, é a possível re-transformação de Moçambique em campo de batalha de antigas e novas potências imperialistas e predadoras.

 

No mundo da adoração narcisista do “Eu” temos que ousar (aude, Horácio) continuar a pronunciar a palavra ‘Nós’, a ser comunidade (cum munia), a ser nação; deslocar os moçambicanos, do “eu” e das tribos de interesses colaterais (partidos, grupos, oligarquias...) para um “Nós” assertivo, um Nós-Moçambique.

 

Não se trata simplesmente de pronunciar a palavra, mas de convocar o seu sentido (bíblico) criador e vivificador. Isto é, assumir as consequências que o pronunciamento da palavra implica.

 

Tautologicamente, o nós-Moçambique deve ser o pressuposto e, ao mesmo tempo, o único baluarte da possibilidade de continuação da nossa luta.

 

Não de um Moçambique que nos adormece com doadores, petróleo e ONG, mas do Moçambique da maioria dos moçambicanos cuja condição nos deveria impedir de dormir… O nós-Moçambique é o conteúdo simbólico de um projecto histórico para o qual se impõe reforjar o sentido, a fim de o possuir plenamente. Trata-se de nos apropriamos desse projecto, fazê-lo nosso e actualizá-lo nas condições actuais do país e do mundo. Para isso, é necessária muita criatividade para renovar e actualizar as formas de luta. A batalha visa também travar e barrar um modelo que faça recuar o nosso sentido de fraternidade e de comunhão.

 

Não obstante as suspeitas que suscita a utopia hoje, ela deve ser encarada como uma narrativa que fala de esperança, que porta uma visão de futuro. Ela faz entrever algo que ainda não existe, prefigura o que ainda não é. Fala de um espaço livre, aberto, terrestre, imaterial que pode traduzir concretamente a verdade de amanhã.

 

Tivemos utopias emancipadoras, distopias, utopias de baixo forjadas no baixo fundo das narrativas e perspectivas actuais. Essas distopias tinham o lomuku (emancipação) e a igualdade no coração dos seus projectos. A falência das utopias passadas – descolonização, independência, desenvolvimento – pode levar à resignação, a passarmos do comunitário ao individualismo. 

 

O espírito das afrotopias (utopias africanas), assim como das “moçambitopias” (utopias moçambicanas) tem que ser retomado com mais força e com espírito renovado, pois o conceito continua válido, mesmo se a forma tiver que ser repensada.

 

Temos que ousar (aude) determinar-nos em função das nossas necessidades e concepções. A nossa via não pode ser dirigida por outros e pelos seus interesses, assim como não pode ser prisioneira dos feitos das gerações passadas. Cabe-nos inventar um discurso – e uma prática – em conformidade com a nossa linguagem – e circunstâncias –, habitar um espaço infrequentado do imaginário a partir do qual dar vida a uma realidade fecunda.

 

Na mediocridade ambiente - em termos de valores, pensamentos, convicções -, o desafio de Horácio é mais do que nunca actual: sapere aude. Ter coragem de pensar por nós mesmos, reivindicar o direito à iniciativa e tomar a palavra no espaço-mundo.

 

Precisamos de um pensamento moçambicano – não de uma maneira moçambicana de pensar –, de um pensamento de moçambicanos para Moçambique, pragmático e emancipado de posturas e diferendos ideológicos; de um pensamento (e propostas políticas) que parta(m) de uma análise lúcida e realista dos problemas do país, susceptível de propor soluções para os nossos impasses. Precisamos de elaborar estratégias de infusão e difusão desse pensamento e mobilizar os diferentes actores políticos, sociais, culturais e intelectuais.

 

Temos que continuar a correr, mas sobretudo temos que aprender a correr a nossa própria corrida e não a corrida de outros. Para isso, é necessário que tomemos decisões com ciência e em consciência, mas sempre 'em-comum’ - o que requer diálogo e consenso - muito para além das clivagens; tribais, regionais, raciais ou partidárias. O (em) comum requer políticas devotas à causa e instituições à altura das suas responsabilidades.

 

Estamos a atravessar um momento crucial, um tempo de desafios que devemos catapultar em novas oportunidades de mudança. A crise actual, embora grave, oferece-nos uma chance para uma transformação significativa. Precisamos discernir com sabedoria entre o que necessita ser mudado e o que deve ser preservado. É hora de fortalecer as nossas instituições, moralizar a vida política e garantir uma democracia robusta e justa. Devemos focar-nos não só em purificar o país da corrupção, mas também em manter firmes as conquistas históricas como a nossa independência e a unidade nacional.

 

Para além da corrupção, da promiscuidade e do vazio axiológico, o problema de Moçambique hoje é a necessidade de introduzir novas solidariedades num país cada vez mais individualista, incrementar uma demanda de liberdade numa sociedade cada vez mais neocolonizada, manter uma exigência de paz num país cada vez mais marcado pela violência e até pela guerra, realizar o espírito democrático num sistema cada vez mais autoritário.

 

Se Game of Thrones pode ensinar-nos alguma coisa, é que, para fazer face ao longo e severo inverno que se aproximava, os beligerantes tiveram de se unir.

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