Há um provérbio transversal a muitas culturas que reza que não há um mal que dure para todo o sempre e, mutatis mutandi, não há um bem que perdure igualmente toda a eternidade. Ou seja, nenhum ser humano vive em sofrimento ou em felicidade eternamente. Se está em sofrimento, saiba que um dia verá o sol da felicidade; e se está em manto de felicidade, conte que um dia tal vai acabar. Dure o tempo que durar uma ou a outra coisa. Um provérbio que nos ajuda bastante a sermos moderados para com as nossas actuações, práticas e vivências! E a não acreditarmos que nada… já agora, o poder (que nalgum momento nos foi outorgado por alguém) é eterno!
O nosso partido, o partido dos moçambicanos, o governamental, viveu, sobretudo nos momentos que antecederam a reunião extraordinária que elegeu Daniel Chapo seu candidato às eleições presidenciais de 9 de Outubro próximo, um êxtase sem paralelo nos últimos quinze, dez anos, melhor: sem memória!. Um momento cuja “gota que fez transbordar o oceano” foi despojada pelo veterano Óscar Monteiro, quando, justamente na abertura da sessǎo extraordinária da Associação dos Combatentes da Luta de Libertação Nacional (ACLLIN), quebrou o gelo, atacando impetuoso e impiedosamente o sumptuoso “elefante” que inundava o horizonte de todos os militantes, mas que, paradoxa e incompreensivelmente, estava completamente invisível aos olhos de todos eles: o silêncio que emperrava na sexagenária formação política há cerca de dez anos, mas sobretudo nos últimos cinco. Ninguém via e discernia a desfiguração e deliberada desconfiguração dos fundacionais valores, princípios e práticas sacrossantos que nortearam a determinada decisão de abraçar a luta armada de libertação nacional.
É que, sabe-se agora, depois da capitulação do então êsss gêee, a gestão do party não era aquela que todos conheceram, praticavam e viveram ao longo dos imensos tempos idos. Uma gestão que, de alguma forma, permitia a articulação do que habitasse as almas ou memórias dos membros; que livremente aceitava que fossem eleitos e elegessem; que abordassem de forma franca e honesta as questões do país, incluindo as internas. Que as suas vontades fossem elaboradas e se materializassem como genuinamente eram, salvaguardando-se, naturalmente, os limites das liberdades de outrem.
Era já outra. De domesticação e confiscação de liberdades, fossem de pensamento, articulação, ou de acção. Uma fase de orientações superiores, de disciplina militar rigorosa, em que não mais existia vontade individual sobre si próprio, mas vontade da dos outros sobre o indivíduo. Uma fase que convocou o temor e, consigo, o silêncio sepulcral e ruidoso sobre todos os assuntos da vida. A amputação espiritual. Haverá espírito no reino do medo e da coarctação de vozes, ideias, sonhos e aspirações? E as perseguições e sancionamentos dos que mijassem fora do penico?
A despeito da carta estatutária da organização existir, saudável e imponente; e, de congresso em congresso, ser revista, actualizada e… modernizada. Mas a sua aplicação sincera dependia já dos casos e dos interesses, apetites e vontades de alguns dos incumbentes do dia. Assim como dependiam/dependem as actuaçǒes de todos os outros órgãos da agremiação.
Daí que o silêncio tivesse tomado conta da casa. Ninguém podia querer, ou querer-se; tinha que ser querido primeiro! O que só se quebrou a partir daqueles três dias de Maio passado. E se prolongaria por cerca de um mês, ie., ao longo dos curtos processos eleitorais internos de candidatos a cabeças de listas, de deputados e de membros das assembleias provinciais. Foi tanto barulho que pareceu que o silêncio tinha ido embora de vez! Os camaradas falaram; alguns poucos processos foram revistos, um secretariado provincial voou... Até apareceram as Artemizas da vida, que não pararam por aí; até hoje, fazem ouvir vigorosamente e nalguns momentos com certo excesso, as suas vozes! Parecia que, uma vez ateado, tinha pegado fogo o silêncio e que, doravante, elas seriam elas…
Pura ilusão de óptica: terminadas as internas… tudo voltando ao seu normal, como quando a chuva intensa pára e o sol reabre. E, na última extraordinária, voltou a emperrar. No lugar de se pôr a verdadeira questão que perpassa(va) as cabeças dos camaradas, houve uma belíssima peça daquela das melhores do Gungu: debater-se se proclamava ou não Chapo secretário-geral efectivo e não interino, como era. O que passou silencioso foi o necessário e imperioso afastamento dos restantes membros do secretariado. Chapo não merece ter ajudantes escolhidos/sugeridos por si? Esse é que era/é o assunto que aflige a organização. E nǎo houve voz para o articular! E, no escondidinho do silêncio, continuam a perguntar-se como é que não se afasta todo o elenco anterior.
O silêncio voltou!
ME Mabunda